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I.1. Atualidade e relevância do tema

I.1.1. Pertinência do estudo

No geral, a pertinência deste trabalho reside na possibilidade de contribuir para a construção de um conhecimento que permita esclarecer qual o lugar, implícito e explícito, das práticas educativas decorrentes da concretização dos processos de ensino-aprendizagem-avaliação num contexto de transição incitado pelo PB, constituindo-se, eventualmente, como uma base indutora de processos de melhoria ao nível da qualidade pedagógica do ES.

Paralelamente, a justificação da pertinência deste trabalho ganha ainda maior relevância quanto se tem em consideração que, através de uma análise do estado-da-arte neste domínio de investigação, se verifica que existe uma elevada necessidade de aumentar a quantidade de trabalhos de pesquisa sobre a temática em estudo. Neste sentido, na perspetiva de uma pesquisa de nível macro, a investigação nesta área ainda se encontra numa fase relativamente embrionária, originando uma produção de conhecimento acelerada e muito recente que parece ainda algo desarticulada. Assim, observa-se que a nível europeu, a investigação sobre o ES desenvolveu-se algo tardiamente, quer em relação aos E.U.A., quer em comparação com outras áreas de pesquisa (Amaral & Magalhães, 2007).

As causas deste atraso, assim como os motivos que despoletaram este recente desenvolvimento da investigação sobre o ES europeu, enquanto área de estudo específica, parecem prender-se fundamentalmente com o facto de esta passar a constituir “um grande foco de interesse apenas a partir do momento em que o ensino superior entrou no limiar das massas, configurando deste modo uma questão financeira, administrativa e política muito importante” (Amaral & Magalhães, 2007: 174). De facto, só quando, recentemente, este sistema de ensino se transformou num gigantesco negócio, passando simultaneamente a ser usado enquanto fator estratégico para o desenvolvimento económico e envolvendo uma enorme população de estudantes e de profissionais ligados ao ES, é que se tornou um tema prioritário nos programas de investigação (Altbach, Bozeman, Janashia & Rumbley, 2006).

As repercussões deste fator, impulsionador de estudos sobre o ES, traduziram-se inicialmente numa menor focalização em pesquisas de nível

micro, centradas sobre os processos de ensino-aprendizagem-avaliação, opostamente à crescente produção de trabalhos de investigação na Europa que se tem debruçado essencialmente sobre alguns aspetos organizacionais, políticos e económicos do ES. Posteriormente, face a estes desenvolvimentos da pesquisa de nível macro, tem sido possível observar também que o foco da pesquisa se move para o nível institucional, na linha do que é apontado por Amaral e Magalhães (2007), verificando-se que a “tendência para a pesquisa se deslocar para um nível micro é concomitante com uma mudança da pesquisa «sobre» […] no sentido da pesquisa «para» o ensino superior” (p. 186).

Para esta situação, e em particular em Portugal, tem também contribuído o facto da implementação do PB obrigar as universidades a enfrentar significativas mudanças e desafios que implicam repensar e renovar as conceções que existiam de ensino, aprendizagem e avaliação (CEDEFOP, 2009; Boud, D. and Associates, 2010). Neste cenário de transição, justifica-se a realização de pesquisas que contribuam para um conhecimento mais aprofundado sobre as modificações ocorridas no ES, nomeadamente ao nível da conceção e desenvolvimento dos processos de ensino-aprendizagem- avaliação. Conforme foi anteriormente exposto por Hand, Sanderson e O’neil, (1996),

“o mundo do ensino superior está atualmente a enfrentar um período de imensas mudanças. Os estilos e metodologias antigas que têm servido bem no passado estão a ter que ser reexaminadas para acomodar uma mudança dramática no quadro em que o ensino superior opera. A estrutura dos cursos, as estratégias de ensino e aprendizagem e os métodos de avaliação estão bem abertos a questionamento à luz das novas exigências” (p. 103).

Esta afirmação de há mais de uma década e meia, mantém-se atual, tendo em consideração o respetivo enquadramento das políticas de educação e formação em desenvolvimento a nível europeu, nacional e local/institucional, revela-se necessário incrementar outro tipo de pesquisas que consigam preencher esta lacuna e possam contribuir para um conhecimento mais aprofundado sobre as mudanças em curso e os respetivos impactos resultantes, nomeadamente ao nível dos modos de trabalho pedagógico (MTP) e dos tipos de avaliação da aprendizagem (AA) veiculados no ES, tópicos que

constituem justamente o campo de estudo sobre o qual a presente investigação se insere.

Desta forma, este estudo pretende também vir a contribuir para explicar as consequências originadas pela omissão constatada no plano legislativo acerca da clarificação sobre as mudanças desejáveis ao nível dos tipos de avaliação face às mudanças promovidas sobre os processos de ensino- aprendizagem. Por outro lado, apesar de existir alguma progressão do conhecimento científico sobre este objeto de estudo no domínio das Ciências da Educação (CE), é possível concluir que as práticas pedagógicas utilizadas no ES ainda não foram, até ao momento, suficientemente estudadas, sobretudo relativamente às possibilidades de conceção e respetivas condições de implementação dos MTP. Além disso, tal situação, parece verificar-se não só sobre as orientações que presidem à definição e ao desenvolvimento dos métodos de ensino e das estratégias de aprendizagem concretizadas, mas também em relação aos subsequentes tipos de AA, pressupostamente mais ajustados à transição de paradigmas1 e que contribuam para melhorar a qualidade destes processos educativos.

Constata-se também que, paradoxalmente, apesar de existirem inúmeros estudos no âmbito do contexto “escola”, muitos autores consideram ainda que, no que concerne à dimensão da avaliação do processo educativo, esta persiste como um tema sobre o qual é necessário continuar a investigar:

“A avaliação é a peça central da «modernidade escolar». […] Nenhum tema deu origem a tantos estudos e pesquisas. […]. Não é fácil encontrar os processos mais adequados para que as aprendizagens tenham efetivamente lugar, para que os alunos tenham verdadeiramente sucesso. Não basta escrever meia-dúzia de banalidades e de frases feitas para que o problema se resolva. É preciso refletir, investigar, trabalhar. É preciso ter a capacidade e a coragem de formular as perguntas certas. É preciso esforço, rigor e muita determinação para ir inventando e reinventando as respostas necessárias. Em educação, como em qualquer outro campo social, nada se fará sem estudo, sem criatividade, sem ciência” (Nóvoa, 2005: 13).

Ainda nesta ótica, Fernandes (2005), na sua obra “Avaliação das aprendizagens: desafios às teorias, práticas e políticas” considerada como uma

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No âmbito deste trabalho, utiliza-se o conceito de «paradigma» com um significado aproximado à perspetiva de Kuhn (1962), segundo a qual, quando há um consenso geral na comunidade científica em relação a alguma conclusão trata-se de um paradigma, quando o conhecimento científico origina contestações trata-se de um novo paradigma.

boa apresentação sobre o “estado da arte” relativamente à avaliação, alerta para o facto de que

“uma das constatações que […] parece poder ser feita com legitimidade é a da ausência quase total de investigação consequente no domínio da avaliação das aprendizagens […]. O que existe é uma dispersão exagerada de pequenos projetos, nomeadamente de mestrado e de doutoramento, mais ou menos desgarrados uns dos outros. Como consequência, existe um número muito reduzido de publicações na área da avaliação das aprendizagens que sejam apoiadas em dados empíricos” (Fernandes, 2005: 136).

Deste modo, considerando o subdesenvolvimento da investigação também sobre os processos de avaliação, o presente estudo inscreve-se numa ótica de conceção destas práticas como elementos indissociáveis, congruentes e, por isso, inseridos no cerne dos processos de ensino-aprendizagem. Assim, as indagações que estiveram na origem deste trabalho, se bem que inseridas num contexto mais específico e com um objeto de estudo diferente, a saber o ES, vão ao encontro das necessidades existentes de investigação neste domínio, conforme advoga Fernandes (2005):

“Precisamos de investigar questões como:

1. Como é que os professores integram a avaliação no ciclo do ensino e da aprendizagem?

2. Que dificuldades e constrangimentos parecem caraterizar os pensamentos, as conceções e as práticas dos professores no domínio da avaliação da aprendizagem?

3. Que critérios de avaliação utilizam e como os articulam com o desenvolvimento das aprendizagens estruturantes que os alunos têm de realizar?

4. Que estratégias, técnicas e instrumentos de avaliação privilegiam?” (p. 136).

Emerge, assim, uma oportunidade para que este trabalho possa procurar responder a algumas questões relevantes neste domínio de investigação, enquanto pretende simultaneamente proporcionar uma sistematização do(s) saber(es) produzido(s) face às implicações da transição que se vive atualmente no âmbito do ES em função das mudanças preconizadas pelo PB e, sobretudo, contribuir consequentemente para a criação de novas condições para a determinação e realização de processos de ensino-aprendizagem-avaliação devidamente articulados, considerando assim “importante que se definam e concretizem modos de avaliar adequados aos objetivos definidos e aos contextos em que o processo ensino/aprendizagem decorre” (Leite, 2007: s/p).

Em síntese, parece pertinente concluir, de um ponto de vista epistemológico, que o campo da pesquisa sobre o ES se situa ainda numa fase de amplo crescimento, após duas décadas de desenvolvimento francamente acelerado, procurando atingir um estatuto de maior coerência para o conhecimento produzido neste âmbito, sem contudo perder de vista as subjetividades e tensões próprias que a complexidade que este tipo de estudos naturalmente implica.

Neste cenário atual de uma contínua e crescente produção de conhecimento sobre uma área de estudo tão importante para as CE, é, provavelmente, pertinente continuar a intensificar este tipo de trabalhos de investigação, procurando articular cada vez mais compreensivelmente os planos macro e micro da pesquisa sobre o ES sem deixar de colocar algumas reservas sobre os resultados imediatos a que vamos tendo acesso e ponderar cuidadosamente as conclusões e eventuais orientações que seja possível extrair de todo este corolário de informações produzido tão intensivamente sobretudo nas últimas décadas. Tem-se em consideração que

“a clivagem entre informação/conhecimento não deve ser tomada como um absoluto, mas como um campo de batalha ideológico, onde a agência (intervenção) dos investigadores, dos professores e dos movimentos sociais se ativa. […] A educação dificilmente surge hoje, nas investigações das ciências sociais e humanas, como um campo privilegiado de condução da mudança social, nem o seu conteúdo é apresentado como universal e definitivo” (Stoer & Magalhães, 2004: 332-333).

Esta posição parece prudente sobretudo quando perspetivada pela assunção de que a produção de “informação” não significa necessariamente “conhecimento”. Assim, espera-se, com o desenvolvimento deste trabalho, contribuir para a produção de conhecimento, através da análise e reflexão crítica das informações recolhidas durante a investigação, à luz da égide das CE, sobre uma temática de pesquisa atualmente tão significativa e pertinente quanto o ES.

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