• Nenhum resultado encontrado

5. ABORDAGEM TEÓRICO-METODOLÓGICA

5.3 INSTRUMENTOS E PROCEDIMENTOS

A entrevista no âmbito da pesquisa acadêmica vem sendo comumente entendida como uma ferramenta, uma técnica que possibilita a imediata coleta de informações, dados, sobre os mais variados assuntos, podendo ser aplicada praticamente a qualquer sujeito informante. Esse entendimento da entrevista, como técnica que ajuda o informante a expor uma informação a ser coletada pelo entrevistador em um processo de interação entre os dois, afere-a um papel de simplificação de determinada declaração sobre o que o informante sabe e aquilo que o entrevistador precisa conhecer. Essa declaração teria o status de verdade que, após ser coletada, responderia aos questionamentos de quem a analisa. Dessa maneira, tal visão corresponde à compreensão de uma linguagem homogênea, monológica, transparente, na qual o que é enunciado por um sujeito uno é tido como a representação da verdade (ROCHA et al., 2004)6. Ainda de acordo com Rocha et al. (2004), neste panorama de pesquisa, há a noção de que eu - o pesquisador - evidencio o que está oculto por meio da dedução, sendo essa uma maneira de suplantar qualquer impressão ou intuição. Faço isso em prol do rigor cientifico, responsável pela seleção do procedimento de análise, no intuito de me oportunizar traduzir o dito apresentando a verdade que se encontrava oculta.

Contudo, essa compreensão de entrevista exposta até o momento está distante daquilo que almeja esta pesquisa, visto que de acordo com o pensamento de Foucault a linguagem e o discurso são vistos como campos de lutas constantes, em que os enunciados não são claros e exclusivos. Faz-se necessário atentarmo-nos para as práticas discursivas e não discursivas, mantendo uma conduta de dúvida perante às questões investigadas. Nessa perspectiva, o discurso não é uma representação, mas possui um ofício produtivo, o qual junto aos efeitos de verdade gera subjetividades. Dessa maneira, não há a intenção de desvelar verdades no discurso, mas refletir seus efeitos na constituição dos sujeitos (ALVES; PIZZI, 2014).

Em contrapartida, Pinheiro (2000) apresenta uma perspectiva de entrevista como pratica discursiva, compreendendo-a como a ação (interação) localizada e conjecturada, na qual se produzem sentidos e se constituem versões da realidade. Destarte, essa interação acontece em um determinado contexto, em uma condição de relação constantemente negociada. O locutor posiciona a si e ao outro (entrevistador), elegendo o tom, os recortes de cada história contada, seus personagens que decorrem do posicionamento exercido diante do outro que é

6 Essa compreensão de entrevista citada por Rocha et al. (2004) está difundida em diversos trabalhos que se

posicionado por ele. Assim, a entrevista se distancia daquela noção norteadora de busca pela verdade oculta e reconhece nas práticas discursivas seu movimento, sentido e ressignificação. De acordo com Rocha et al. (2004), a entrevista é um dispositivo enunciativo, objeta qualquer prisma que a coloque como “ferramenta” que possibilita o acesso à verdade daquele que é entrevistado. De acordo com o autor, ao entrevistar, ocorre uma condensação de diferentes situações de enunciados, mantendo-se uma distância entre a situação empírica e a situação discursiva. Nesse sentido, recorremos à entrevista porque ao contrário do que pensamos não temos acesso a uma gama de textos já existentes. Ao entrevistar, o pesquisador estaria incitando uma atualização de textos que foram produzidos por esses atores entrevistados em momentos anteriores. Desse modo, a entrevista seria uma nova situação de enunciação, gerada em um determinado tempo e espaço, envolta de um êthos, não uma ferramenta de apreensão de saberes, mas um dispositivo de produção de textos que permite retomar e condensar diversas situações de enunciação.

Portanto, adoto, nesta pesquisa, a perspectiva de entrevista sugerida por Rocha et al. (2004), que se divide em três momentos. O primeiro momento consiste na preparação prévia de um roteiro de entrevista, considerada uma “interação antecipada com o entrevistado”. O segundo momento dirige-se à realização da entrevista, que tem por objetivo atualizar os textos outrora produzidos pelo entrevistado em diferentes situações de enunciação. Por sua vez, o terceiro e último momento é aquele posterior à entrevista, em que o pesquisador poderá delimitar um corpus a ser analisado, mediante a um conjunto de textos produzidos.

Para tanto, foram convidados a participar desta pesquisa estudantes devidamente matriculados em instituições de ensino superior nos cursos de graduação e pós-graduação do estado do Rio Grande do Sul que possuíam alguma deficiência física. O convite a eles ocorreu por meio de contato inicial com instituições de ensino superior e redes de contato estabelecidas por mim, expondo os objetivos deste estudo. Ao aceitarem participar deste estudo o Termo Livre e Esclarecido fora assinado pelos estudantes participantes.

No que tange à coleta de dados, utilizei o critério de saturação teórica de uma amostra intencional preconizado por Minayo (2001), no qual se seleciona uma amostra da população pesquisada que possa ser considerada representativa. Nesse sentido, o fechamento amostral por saturação teórica define-se pela decisão de cessar a inclusão de novos participantes. Esse momento se deu quando as informações e dados obtidos se tornaram repetitórios de acordo com a minha observação, demostrando ser pouco relevante dar prosseguimento à coleta de dados. Com cada participante realizei uma entrevista de duração de aproximadamente uma hora, em local de maior conveniência para o entrevistado, gravei em áudio e as transcrevi na

íntegra. A análise das entrevistas foi realizada por meio da Análise Discursiva Foucaultiana nos moldes apresentados por Fischer (2001) e Foucault (2008a). Nesse sentido, procuro empregar aos enunciados um olhar arqueogenealógico, tal qual fora discorrido anteriormente, visando perceber os jogos de verdade, as relações de saber – poder que se estruturam nas falas dos estudantes com deficiência, subjetivando a experiência e o seu percurso no ensino superior.