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CAPÍTULO

7. O engajamento político Por fim, sugere Zeichner, que os professores transcendam os limites de suas atividades in loco dentro da escola participando,

3.4.1. Intelectuais transformadores/as

Em Giroux a categoria “intelectuais transformadores”, indicados a partir de suas múltiplas análises em Gramsci, Freire, Dewey, Zeichner, etc., fazem emergir a figura do professor oriundo de qualquer grupo, no sentido de desenvolver culturas e tradições emancipatórias, dentro e fora das esferas públicas alternativas (GIROUX, 1988, p. 32); utilizando, para isso, de um instrumental específico: a linguagem da crítica. Decididamente o discurso que provoca o afastamento de atitudes descompromissadas, ganha fôlego na medida em que a autocrítica torna visível às estratégias pedagógicas em favor do que Giroux denomina “pedagogia radical”. Sua premissa, nesse sentido, aborda, como tarefa central, para categoria de intelectuais transformadores, a de:

Tornar o pedagógico mais político e o político mais pedagógico. No primeiro caso, isto significa inserir a educação diretamente na esfera política, afirmando que a escolarização representa tanto uma disputa por significado, como uma luta a respeito de relações de poder (Idem, ibidem).

Essa situação peculiar não pode ocorrer se a escola deixa de explorar as relações dialéticas entre poder e política, indivíduos e grupos, mapeando sob quais bases estruturais o efeito desses binarismos se processam. Giroux dirá que tanto a escolarização, a reflexão crítica e a ação dos sujeitos tornaram-se essenciais a fim de possibilitar a construção de um projeto politicamente transformador, capaz de motivar os alunos “a desenvolverem uma profunda e inabalável fé no combate para vencer as injustiças e mudarem a si mesmo” (Ibidem). Um dos pressupostos radicais para essa passagem é justamente compreender a sutileza e dinâmica das reificações da realidade e construir estratégias (estratégias claras, conforme

pensava MAKARENKO, 1986) que transcendam esses limites. Nesse caso defende o autor:

Conhecimento e poder estão inextricavelmente ligados, pois há o pressuposto de que, para mudar a vida de maneira a torná-la possível, é necessário compreender as precondições necessárias para lutar por ela (idem, ibidem).

Assumindo o papel de repetidor procedimental, de condutor instrucionista e/ou conteudista formal, o professor reduz seu campo do ensino e imobiliza sua autonomia intelectual. Comportamento controlado significa enfraquecer a capacidade de atuar reflexivamente sob objetivos pedagógicos cruciais. A ênfase dada, por sua vez, aos aspectos instrumentais, desperdiça a oportunidade de se questionar diferentes práticas, métodos didáticos, formas de pesquisa, programas e teorias educacionais, eximindo também do doscente a tarefa de pensar, propor e avaliar a natureza e os princípios dessas ações. No tocante aos estudantes às implicações são ainda piores: “com freqüência preocupam-se em apreender o como fazer, o que funciona ou o domínio da melhor maneira de ensinar um dado campo de conhecimento” (GIROUX, 1997, p. 153). Paradoxalmente entre aqueles que se espera o desenvolvimento do pensamento crítico, muitos têm ordenado a estrutura de suas vidas práticas em normas de “gerenciamento pedagógico”.71

Analisando os programas de treinamento de professores nos Estados Unidos, Giroux (1997, p. 159), denuncia à excessiva orientação behaviorista, mostrando as implicações desta abordagem – que não deixa de ter significação para o caso brasileiro - com relação ao debate sobre formulação de programas de formação de professores. Subscreve o autor, citando Zeichner:

Subjacente a esta orientação na formação dos professores encontra-se uma metáfora de “produção”, uma visão do ensino como “ciência aplicada”

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e uma visão do professor como principalmente um “executor” das leis e princípios de ensino eficaz. Os futuros professores podem ou não avançar no currículo em seu próprio ritmo e podem participar de atividades de aprendizagem variadas ou padronizadas, mas aquilo que eles têm que dominar tem escopo limitado (por exemplo, um corpo de conhecimentos de conteúdo profissional e habilidades didáticas) e está totalmente determinado com antecipação por outros, com base, muitas vezes, em pesquisas na efetividade do professor. O futuro professor é visto basicamente como um receptor passivo deste conhecimento profissional e participa muito pouco da determinação do conteúdo e direção de seu programa de preparação (op. cit., p. 159).

Tornar o pedagógico mais político significa, portanto, recolocar a escolarização no domínio da “esfera pública”, isto é, desenvolver alternativas pedagogias inclusivas, heterogêneas, plurais e, criticamente situadas, em experiências da vida cotidiana. O ponto de ebulição dessa perspectiva entende que o conhecimento é problemático e que não se pauta a partir de um projeto pronto. Compreende a história como possibilidade, se recusa a assumir neutralidade da ciência de resultado; não aceita “domesticação do tempo” e o fim dos sonhos emancipatórios da condição humana.72 Interroga, repetidamente, a função social da escola, o papel do professor, as questões de poder, de controle e produção do conhecimento. Por aperceber a não imparcialidade do lugar da escola, onde se tecem discursos com interesses políticos, culturais e ideológicos (não menos livres de valores que legitimam relações sociais) é vital o desvelamento dessas questões. Lembra Giroux (1997, p. 162) que as escolas fazem muito mais que repassar um conjunto comum ou específico de valores e conhecimentos. Ao contrário, representam formas de conhecimentos, práticas de linguagem, relações e valores sociais, pois são

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pré-seleções e exclusões particular da cultura mais ampla. Significa afirmar, que tanto servem para introduzir e confirmar caracteres gerais da vida social, como para escamotear demandas específicas.

No primeiro caso a tarefa de tornar o pedagógico mais político, Giroux deixa claro o papel da escola quanto ao significado das relações de poder, inserindo a educação na esfera política. A segunda tarefa, “tornar o político mais pedagógico”, não des-intersecciona da primeira abordagem. Seu argumento teórico privilegia a correspondência entre interesses políticos, dialogicidade, reflexão, autonomia e emancipação. Sugere que os intelectuais transformadores estejam atentos para a necessidade de dar aos alunos voz ativa (1988); que os trate como agentes críticos tornem o conhecimento problemático, utilizem o diálogo com um vernáculo reflexivo e, por conseguinte, argumentem em prol de um mundo qualitativamente melhor para todas as pessoas (1997). Essa ênfase emancipadora é um imperativo fundamental quanto às peculiaridades da relação entre linguagem crítica e linguagem da possibilidade, ou seja:

Os intelectuais transformadores devem considerar seriamente a necessidade de enfrentar aqueles aspectos ideológicos e materiais da sociedade dominante que tentam superar a questão do conhecimento da questão do poder. Isto significa trabalhar para criar condições materiais e ideológicas na escola e na sociedade mais ampla que dêem aos alunos a oportunidade de se tornarem agentes de coragem cívica, isto é, cidadãos que possam atuar como se uma autêntica democracia realmente prevalecesse, fazendo o desespero parecer inconveniente e a esperança exeqüível (GIROUX, 1998, p. 33).

Segundo as disposições dessa perspectiva, num sentido lato, ela se afasta por definitivo da idéia de compreender isoladamente os problemas ou os sujeitos. Seu intento transcende, portanto, o imediatismo. Busca captar múltiplos argumentos,

articulando-os à natureza e função dos discursos, das relações sociais; dos valores produzidos nos diferentes ambientes culturais ao lugar das classes, gêneros, raças, e, por fim, compreender a história política.

Entretanto para que os intelectuais transformadores/as possam promover mudanças dessa envergadura praxiológica, precisam, segundo Giroux (1997, p. 163), desenvolver um discurso que una a linguagem da crítica e a linguagem da possibilidade, indicando novas formas de cultura, práticas sociais alternativas com outros modos de comunicação, ancorados numa visão realizável do futuro, ampliando, assim, o campo da cultura escolar enquanto espaço de luta politicamente contra-hegenômico. Juntamos a essas duas categorias outros pressupostos: a necessidade de se fazer valer no tempo presente o desejo de um ideal político - superando a espontaneidade - a falta de qualidade no desempenho intelectual ou o pouco engajamento quanto à ausência de um plano de conquista da autonomia cultural e domínio moral. Dentro dessa tarefa, cabe lembrar que a imobilidade de iniciativa dos sujeitos é um componente específico relativo à meta de desenvolvimento das ações estratégicas, e deva ser analisado a partir dos interesses gerais das lutas políticas. Constituir uma vanguarda que resista, combata e proponha alternativas possíveis é um esforço sumamente necessário à luta contra as desigualdades. A “teoria revolucionária sem movimento revolucionário” pensada por Lenin (1981, p. 134) - o armamento das massas - pode parecer para alguns uma sentença escaldada. Porém, o menosprezo dessa articulação revelou em práticas diversas, quão frágeis podem ser as lutas políticas sem estratégias solidamente claras. Ensina uma lei da mecânica que a ação iguala a reação; já na história, conforme Lenin (1978, p. 79) a força destruidora de uma revolução também depende, em medida apreciável, da força e da duração da regressão que sofreram

as aspirações à liberdade; depende da profundidade do antagonismo entre a “superestrutura” arcaica da sociedade e as forças vivas da época considerada.

Assim, é fundamental rechaçar, o voluntarismo espontaneísta, isto é, aquelas ações sem definição política precisa, isso por que a linguagem da possibilidade é uma disposição possível quando subverte radicalmente toda a pérfida enfermidade que acompanha a dominação de classes, seja ela de que forma se apresente. Em alguns casos a resistência pode parecer fraca, desarticulada ou dispersa, mas não significa sua inexistência. São forças que se complementam, embora contraditoriamente. Aqui a liberdade não pode ser apenas uma “grande palavra” (Lenin), um superficial juízo de valor moral, uma representação metafórica ou a ingênua intenção de planificar as “raças”, mas uma meta verdadeira, com força suficiente, capaz de assegurar mudanças real e constitutivas de um futuro, onde todos/as consigam em vida serem aceitos com suas diferenças.

Não há superação de relações capitalistas se a estrutura de exploração também capitalista permance inalterada. Nesse caso, cabe aos professres/as enquanto intelectuais trasformadores/as, significar, no plano praxiológico, os diversos equívocos interpretativos listados como referenciais e/ou paradigmas teóricos, seja quanto aos processos de uma exploração exacerbada, exclusão contínua, formas de alienação, produção de violências ou mesmo quanto às redutoras análises sobre ensino/aprendizagem e fracasso escolar.