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Intemperismo químico vs. intemperismo físico

5. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

5.3. EVIDÊNCIAS RELATIVAS À GLACIAÇÃO (PRÓS E CONTRAS)

5.3.8. Intemperismo químico vs. intemperismo físico

De Martonne (1940) defende que, a partir de um regime de temperaturas

frequentemente maiores que 20°C, com precipitações mensais ultrapassando sempre 100 mm,

índices de aridez maiores que 20 e umidade sempre acima de 75%, o intemperismo químico é

preponderante sobre o físico, o que explica a raridade de terraços, cascalhos nos leitos e cones

de dejeção. O autor reconhece ainda o poder do intemperismo físico através do vento e da

água e a eficiência da dissolução química na formação das caneluras e marmitas. O autor

afirma também que, durante a maior parte do ano, a decomposição química deve ser menos

ativa e a desagregação mecânica mais eficaz do que nas baixas altitudes.

Na discussão dos possíveis processos geradores das feições observadas, tais

como as caneluras, Silveira (1942) ressalta que a altitude seria um fator limitante da

decomposição exclusivamente química. Desta forma, para o autor, embora a decomposição

química seja um fato, o intemperismo físico, particularmente de origem eólica, tem grande

papel na formação das estruturas observadas.

O autor defende que nas faces noroeste e sudeste das Prateleiras, Pedra do Altar

e Agulhas Negras, é comum a presença de marmitas eólicas oriundas da corrosão pelo vento.

Segundo ele, os sulcos orientados segundo os ventos dominantes, encontrados nas rochas e no

terreno são encontrados com frequência. Outra evidência da ação abrasiva do vento seria a

aspereza das rochas e a formação da pequena barragem – orientada de NO para SE – por

deflação eólica que formou a Lagoa do Coração.

Lamego (1942) desconsidera completamente a argumentação sobre a ação

eólica do intemperismo no Itatiaia com o argumento de que, frente à elevada altitude dos picos

isolados, seria impossível partículas serem alçadas de modo a atingir as porções elevadas para

atuarem com tamanho vulto na erosão.

Segundo Ruellan (1943), os foiaítos são decompostos com relativa facilidade.

Tal fato se deve a hidratação dos feldspatos que, através do aumento de volume, exercem

grande esforço interno na rocha, o que causa sua desagregação. O autor reconhece ainda a

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importância do gelo como agente intempérico relevante na desagregação das rochas alcalinas

do Itatiaia. Completa ainda que as rochas não possuem superfície lisa com cristais

relativamente soltos, resultado do intemperismo químico que, foi precedido por intemperismo

físico. A hidratação dos feldspatos causaria a principal desagregação dos sienitos. Outro

agente, segundo Ruellan (1943), seria o vento que causa deflação e denuda constantemente as

rochas, deixando-as mais susceptíveis ao desgaste. A chuva seria outro agente importante para

o intemperismo, principalmente nos meses de verão.

Domingues (1952) observou que na superfície rochosa, os líquens e musgos

permitem conservar a água caída por mais alguns dias sobre a crosta vegetal que reveste as

rochas após a chuva, permitindo a penetração da água. Segundo o autor, é muito evidente a

supremacia da decomposição química sobre a desagregação mecânica, única responsável por

todo o modelado. Ele afirma ainda que a própria formação das depressões é facilmente

explicada pela ação química. Com a hidratação dos feldspatos e feldspatoides, estes podem ser

evacuados em suspensão ou sob a forma coloidal. Além disso, outra parte é levada em

dissolução. Forma-se, assim, a primeira cavidade e, a partir daí a evolução torna-se mais

eficaz, tendo os ácidos orgânicos um papel ativo na dissolução, ampliando-se assim a

depressão.

Rich (1953) defende que as rochas alcalinas do MI são frescas e sãs, revelando

pouquíssima ação do intemperismo químico, e quase não se encontra solo residual,

completamente contrário ao que afirmam Dusén (1903) e Domingues (1952).

Odman (1955) atribui a formação das feições morfológicas do planalto a

diferentes composições mais ou menos resistentes ao intemperismo químico, no qual o

material residual foi removido pela água das chuvas. Segundo ele, esse fenômeno de

intemperismo químico profundo ocorreu num período pré-Quaternário ou talvez durante o

Quaternário Recente e pode estar associado a períodos pluviais intensos.

Para Ab’Saber & Bernardes (1956), a nudez das massas culminantes poderia

ser explicada pela sensibilidade das rochas granulares – compostas essencialmente por

feldspatos alcalinos – à hidratação, às violentas chuvas de tempestades e à ação constante do

vento. Mencionando o trabalho de Ruellan (1943), Ab’Saber (1956) parafraseia o primeiro

autor: “Nos modelados das serras do Mar e da Mantiqueira há quem veja apenas falhas ou

apenas a ação da erosão. O melhor é ficar entre essas duas hipóteses no qual grandes falhas

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ocorrem na parte oriental do planalto brasileiro e, depois, a erosão se adaptando a estes

movimentos”.

Birot (1957) destaca o intemperismo químico como peça chave para o

desenvolvimento da paisagem no MI, exaltando a profunda ação da erosão diferencial como

modelador do relevo. O autor compara ainda a morfologia do Itatiaia com a do maciço

granítico de Ransa (Escócia) que está além dos limites de atuação dos processos glaciais

referentes a última idade do gelo e, portanto, não foi moldado por geleiras.

Birot (1957) ressalta que a decomposição química das rochas parece ocorrer de

duas etapas distintas, na qual a primeira gera a argila comum como subproduto, e a segunda

gera a migração de ferro redepositado no limite das juntas e das esfoliações alteradas ao redor

da rocha sã, podendo esta migração estar relacionada diretamente com o clima atual e a

abundância de ácido húmico.

Para Dresch (1957), a morfologia do alto do Itatiaia explica-se

satisfatoriamente pela alteração química diferencial no maciço sienítico, no qual a exumação

ocorre durante os períodos secos e a alteração química profunda durante os períodos

excessivamente úmidos. Nos dias atuais a alteração química seria o processo dominante.De

acordo com o autor, o alto das vertentes do Itatiaia foi denunado em um ou dois períodos de

chuvas torrenciais no qual os blocos e detritos carregados para os vales são agora atacados

pelo intemperismo químico.

Hamelin & Cailleux (1957) descrevem que a 2.200 m não são encontrados

grãos alterados de feldspatos, estando estes sempre frescos, angulosos e intactos

estruturalmente, formando cerca de 50% da composição amostral. Essa abundância, segundo

os autores, deve-se ao predomínio do desgaste mecânico sobre a alteração química diante do

clima seco, razão pela qual não se encontra argila no alto do Itatiaia. Os autores afirmam ainda

que a esfoliação percebida nos blocos não é causa da alteração química, visto que a parte

inferior das escamas (ou placas que se soltam) é tão sã quanto o resto da rocha em suas

porções superiores, fato percebido pela clivagem intacta e angularidade dos feldspatos e

outros minerais.Hamelin & Cailleux (1957) especulam que nos cortes das estradas a alteração

química apenas segue os contatos das esfoliações pré-formadas devido a maior facilidade de

passagem de água. Portanto, a esfoliação é, pelo menos em superfície, um fenômeno físico ou

que não alterou a sanidade das rochas. Os autores sugerem adicionalmente a ação do fogo

como possível agente gerador de esfoliação.

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Outro aspecto discutido por Hamelin & Cailleux (1957) é a completa ausência

de argila na parte alta do Itatiaia, mesmo no interior das fendas e barragens de água.

Adicionalmente, no fundo das caneluras, a rocha é completamente sã e inalterada. Este é outro

argumento usado contra o intemperismo químico, visto que, este, teoricamente, deveria gerar

argila ou fragmentos frágeis. Assim, os autores embasam a hipótese de predomínio

discrepante do intemperismo físico em detrimento da alteração química acentuada.

Lefevre (1957) refuta a hipótese da glaciação e defende que as rochas

arredondadas e outras feições podem ser perfeitamente explicados pela natureza litológica do

material subordinado à decomposição química. Adicionalmente, a ação térmica, segundo o

autor, poderia ser a responsável pela desagregação da rocha nua, e a hidratação seria o

processo responsável pelo arredondamento dos blocos entulhados nas vertentes e vales.

Contrariamente ao exposto por Levefre (1957), Macar (1957) defende uma

ação predominantemente do intemperismo químico em detrimento do físico. Para ele, a

influência das diaclases aparece de maneira nítida quando associadas ao desgaste químico

esferoidal. A penetração da alteração estaria associada a blocos gradualmente mais

arredondados. Macar (1957), entretanto, contradiz seus próprios argumentos quando afirma

que nas Agulhas Negras predomina a desagregação mecânica principalmente pelo gelo. O

autor faz ainda menção aos mesmos fragmentos inalterados de feldspato angulosos estudados

por Lefevre (1957) e afirma: “a intensa desagregação química parece não coexistir com tal

processo”.

Raynal (1957) não exclui a ação do gelo relacionado às diaclases para explicar

o modelado formado pelos blocos na base das Agulha Negras. O autor reconhece tanto a ação

do frio como a atuação do intemperismo químico no modelado do alto Itatiaia a partir das

depressões e caneluras formadas pelo escoamento superficial e, no inverno essas depressões

formam filmes avermelhados sobre a rocha. O autor estipula ainda, a partir da comparação de

feições observadas no Itatiaia e em Campos do Jordão, duas fases principais de evolução

climático-morfológicas:

1. a primeira fase corresponde a um sistema de erosão cujo intemperismo físico

predomina, permitindo a supracitada solifluxão periglaciária nas zonas mais altas e

maior carregamento de material para formação de depósitos heterogêneos nas porções

mais baixas;

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2. posteriormente, os processos químicos retornam provocando, inicialmente, o

soterramento dos depósitos cascalhosos sob um manto de siltes variados. Hoje ainda

se insere a fase química a partir da observação de esfoliação dos sienitos e dissolução

local da rocha.

Diferentemente do sugerido por Maack (1956), o autor deste trabalho não

notou ou identificou qualquer feição geomorfológica que sugerisse a presença de geleiras na

Pedra do Camelo. Esta seria apenas, assim como as Agulhas Negras e os outros picos mais

pronunciados na paisagem, um relicto de maior resistência aos processos intempéricos

vigentes no Planalto do Itatiaia.

Ebert (1960) defende que análises microscópicas indicam forte decomposição e

textura de material interpretado como flúvio-glacial ou de fluxo de água de degelo. Para

Barbosa (1962), a ação mecânica das chuvas e enxurradas é muito mais relevante do que a

desagregação química.

Para Segadas-Vianna (1965) a única explicação para a intensa erosão observada

nas rochas do Itatiaia é o intemperismo químico controlado pela concentração de ácidos

nítrico e carbônico na água da chuva e ácido carbônico dos líquens. E a variedade de formas

observadas no planalto seria o resultado das diferentes resistências de tipos de rochas distintos

frente aos processos químicos de intemperismo atuando sobre um relevo previamente

moldado pela ação glacial de geleiras.

Bigarella el al. (1969) defendem que os depósitos seriam individualizados por

ação profunda do intemperismo químico subordinado ao padrão de diaclasamento das rochas

alcalinas do maciço. Posteriormente, sob condições de clima seco correspondente à última

época glacial, o material solto teria sido facilmente removido.

Diferentemente do que foi observado por Hamelin & Cailleux (1957), que

afirmam que a 2.200 m de altitude não são encontrados nem grãos de feldspato alterados e

tampouco argila, Modenesi (1992) encontrou não apenas ambos, mas também duas gerações

de colúvios com características distintas, refletindo as condições climáticas e

consequentemente de intemperismo vigentes durante sua formação. A autora afirma que a

esfoliação é um fenômeno muito comum nas rochas do Itatiaia.

Apesar de não ser explicitamente contra a hipótese da glaciação pleistocênica

no Itatiaia, Modenesi & Toledo (1993,1998) convergem para a ideia da gênese em que

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intemperismo químico e o desgaste mecânico causado pelo conjunto de processos

geocriogênicos seriam os responsáveis pelo modelado do planalto.

Por fim, da mesma forma que Penalva (1974) e tantos outros, embora não

mencione sua posição diante da hipótese da glaciação do Itatiaia, Neto & Filho (2014) citam a

discussão e defendem que a morfologia do planalto é o resultado conjunto das condicionantes

estrutura, tectônica, litologia e intemperismo químico, de forma tal que é possível inferir sua

posição contrária à glaciogênese do planalto.

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