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Inicialmente é pertinente destacar que há uma intenção, previamente pensada pela professora, de que as crianças realizem movimentos corporais tendo como suporte a música. Tal proposição a ser dirigida ao grupo de crianças pode ser notada, no início do episódio, quando a ADI, referindo-se à proposta planejada para o dia, pergunta à professora: “O que tem para fazer hoje com as crianças?”. Dessa forma, na interlocução com a ADI, a intenção pedagógica da atividade se evidencia nas palavras da professora: “Vamos cantar e dançar juntos” (pausa). “Pensei em botar uma música bem alegre para ir conduzindo alguns movimentos e estimular que eles (as crianças) levantem as pernas, corram, pulem...”.

Fernando Ayana

Gabriel

Kailane

Apesar de seguir a ideia previamente planejada pela professora, a ADI participa ativamente da construção da atividade de vários modos. Inicialmente, isso pode ser observado nas ações da educadora: ao escolher uma música animada, ao buscar orientar a atenção das crianças para sua proposta, iniciar e manter a atividade com as crianças que socialmente mostraram-se responsivas.

As crianças demonstram motivação para participar da atividade proposta pela ADI desde o momento inicial do convite, quando ela diz: “Olha a música!” (pausa). “Hoje vamos cantar e dançar com Patati Patatá!”. Ayana, Kailane, Fernando e Gabriel aproximam-se, olham para a ADI, levantam os braços, balançam as mãos, batem palmas e pulam. Dessa forma, a busca de proximidade física, a orientação da atenção e os movimentos expressivos das crianças são recursos indicadores das formas de engajamento nas ações do adulto.

Há uma atenção dirigida para as ações do outro que engaja os parceiros. Nesse caso, o compartilhamento do foco da atenção entre os parceiros sustenta a construção e o emparelhamento de ações entre eles de forma que cada parceiro apreende e comunica ao outro o movimento do parceiro desdobrado em seus próprios movimentos corporais.

Ao observar a ADI saltitar, Ayana e Kailane mexem seus pés, demonstrando interlocução com os movimentos da ADI. Na sequência do episódio, Ayana abre os seus braços, olhando para a ADI, e começa a se remexer tal como o adulto está fazendo; Ayana emparelha seus movimentos aos da ADI na ocasião em que esta se baixa, abre e balança os braços falando: “Olha o avião!”.

A ADI levanta os braços acompanhando o movimento indicado pela letra da música, e as crianças fazem do mesmo jeito, como se buscassem ajustar os movimentos ao ritmo musical e às ações que a educadora executa.

No contínuo interacional, Fernando introduz outra forma de se movimentar: balança- se, mexendo ligeiro os seus pés e braços, provocando uma reação em Kailane, que se regula por ele. Ela imita o parceiro ao balançar o corpo e levantar os braços também, olhando para Fernando.

Na trama interativa, Gabriel bate num pandeiro que segura, apresentando para os parceiros movimentos corporais através do uso do instrumento musical. Fernando reapresenta o mesmo gesto de Gabriel, olhando para ele.

A ADI gira e levanta os braços, propondo outro movimento de corpo. Kailane se regula por ela e ajusta-se aos novos movimentos, rodando com os braços levantados e olhando para a educadora. Juju, no berço, levanta-se e segura nas grades; olha para a ADI e movimenta o corpo para frente e para trás, demonstrando que também compartilha a proposta.

A ADI bate palmas e canta, marcando o ritmo através das batidas alternadas. As crianças se regulam e emparelham suas ações com a ação da educadora, batendo palmas e olhando para ela. A sincronia de movimentos entre as crianças e a educadora pôde ainda ser observada no final do episódio, quando a ADI saltita e o grupo dá uns pulinhos.

Esse comportamento interativo do grupo remete à reflexão das relações entre a imitação e o movimento no estabelecimento de elos entre as pessoas, conforme explica os pressupostos wallonianos. Nessa direção, o ajustamento de ações provoca um acordo psicomotor que culmina em uma sintonia de movimentos ou afinidade mimética. Essa afinidade, por sua vez, revela como a imitação facilita a interação social de crianças que ainda não possuem fala articulada.

Nesse sentido, o comportamento imitativo, revelador da adesão ao modelo, pode ser considerado como um importante canal de significação que pressupõe uma determinada compreensão do significado da ação do outro no estabelecimento de nexos entre os eventos ocorridos gerados na tentativa de compreendê-los.

Partindo dessa compreensão, esse modo de apreender informações pelo viéis imitativo revela os modos como a criança se desenvolve: participando de situações pessoalmente significativas e socialmente envolventes, construindo significados por meio da observação atenta, exame, seleção e reinvenção interpretativa das ações do outro social (WALLON, 1986).

Dessa forma, ao explorar movimentos ajustados a um ritmo ou ações, incentivadas pelos adultos ou parceiros de idade, as crianças ampliam seus repertórios expressivo- comunicativos através da imitação e alcançam novos patamares cognitivos. E mais: ao imitar um modelo de ações que lhe é oferecido, a criança se exercita, porque busca apreender e identificar as expressões comunicativas do outro e responder por meio de ajustes corporais e vocais.

A experiência interativa intitulada Dançando e remexendo o corpo (nº 15), descrita a seguir, permite ampliar essa discussão demonstrando uma situação em que a criança protagonista  Kailane (F/1;5)  exercita seus recursos motores aproveitando a música que toca no ambiente sem a condução do adulto.

1º Momento – 00min 50seg

Andrey (M/1;7) levanta os braços e remexe o corpo, olhando para Kailane. Em seguida, a garota também levanta os braços e se remexe com o olhar dirigido para o parceiro. Ele bate palmas olhando para ela. Kailane se requebra e bate palmas também, olhando para

ele. Depois, Andrey gira com os braços estendidos e Kailane começa a girar com os braços abertos até ficar tonta e cair sentada. (...)