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A análise histórica do processo de internacionalização das empresas brasileiras permite verificar que ele é tardio em comparação com empresas de países desenvolvidos ou mesmo de outras nações emergentes (ROCHA; SILVA; CARNEIRO, 2007). Ainda que nas últimas décadas a América Latina tenha se aberto mais intensamente para o mercado mundial, o Brasil, assim como outros países da região, apresentou lentidão ao reagir aos desafios e oportunidades da globalização (SULL; ESCOBARI, 2004).

A literatura sobre economia e negócios internacionais aborda uma série de razões pelas quais as empresas podem demorar a iniciar sua internacionalização, tentando explicar por que elas preferem atuar com foco no mercado doméstico. No caso brasileiro, segundo Rocha et al (2007), podem-se apontar:

Existência de grande mercado doméstico: que sustenta as operações da empresa e diminuem a necessidade de recorrer a consumidores externos.

Proteção governamental: ao interferir na regulação da competição e dificultar a entrada de empresas estrangeiras, o governo torna mais confortável e segura a operação das companhias domésticas no próprio país. Além disso, essa proteção contribui para o desincentivo à obtenção de economias de escala em diversos setores e também colabora para manutenção de práticas gerenciais, operacionais e tecnológicas muito aquém das melhores práticas internacionais. Como resultado, verifica-se o baixo grau de integração das exportações às estratégias de investimento e crescimento das firmas (MOTTA VEIGA, 2002).

Fatores macroeconômicos: instabilidade econômica da década de 1980 e primeira metade dos anos 1990 com sete planos econômicos, que reduziram os incentivos à internacionalização com aumento temporário do poder de compra das classes média e baixa, além da apreciação da moeda. Adicionalmente, a ausência de um mercado de capitais desenvolvido e a baixa disponibilidade de crédito no longo prazo também colaboraram para o baixo envolvimento internacional das empresas brasileiras (IGLESIAS; MOTTA VEIGA, 2005).

Fatores comportamentais: em consonância com o Modelo de Uppsala, a falta

empresas brasileiras a não prosseguir para fases mais avançadas da internacionalização.

Competição baseada em custos: de forma geral, as empresas brasileiras que se internacionalizaram não buscaram a diferenciação de seus produtos e serviços ou a criação de valor superior frente aos concorrentes. Desse modo, ao enfocar apenas as variáveis preço e custo e competir em função das vantagens específicas do país (abundância de matéria-prima e mão de obra barata), as companhias deixaram espaço para que concorrentes de outros países com vantagens específicas mais atrativas que as brasileiras – como a China e seu custo de mão de obra mais barato – tomassem o mercado.

De fato, até a década de 1970, o IDE das organizações brasileiras ainda era tímido e incipiente, com poucas firmas possuindo subsidiárias fora das fronteiras. As primeiras movimentações nesse sentido foram de empresas estatais – como a Petrobras e a então Companhia Vale do Rio Doce –, conglomerados financeiros e algumas grandes firmas industriais exportadoras. Entretanto, esses investimentos eram restritos ao suporte comercial e operacional das atividades de comércio exterior (ROCHA; SILVA; CARNEIRO, 2007).

Nos anos 1980, uma série de problemas macroeconômicos afetou a economia brasileira, além de dificuldades com os instrumentos de promoção do comércio exterior e a estagnação da produção industrial. Mesmo que a manutenção de alguns incentivos à exportação e as altas taxas de câmbio reais tivessem permitido um crescimento da internacionalização de muitas empresas brasileiras, tais problemas macroeconômicos e as incertezas derivadas da alta inflação reduziram os estímulos à expansão da produção de itens para exportação, levando à diminuição dos investimentos tanto no mercado local quanto no exterior (IGLESIAS; MOTTA VEIGA, 2002).

No início da década de 1990, as reformas econômicas promovidas pelo governo brasileiro contribuíram para modificar as condições do ambiente em que as empresas operavam. A abertura comercial estimulou um processo de reestruturação empresarial, já que a liberalização reduziu o grau de controle das companhias domésticas sobre o mercado local. As importações e a concorrência externa incentivaram as firmas brasileiras a investir e concorrer no mercado internacional de forma permanente (IGLESIAS; MOTTA VEIGA, 2002).

Na segunda metade da década de 1990, o comportamento da balança comercial foi influenciado por diversos fatores, a maioria com efeitos expansionistas sobre as importações. Entre os principais motivadores estão a estabilização econômica após o lançamento do Plano Real em 1994 e o aprofundamento do programa de privatizações, além da retomada dos investimentos e a crise asiática em 1997 (AVERBUG, 1999).

Como resultado, observou-se uma significativa ampliação do mercado doméstico e uma apreciação da taxa de câmbio real, o que desestimulou a expansão internacional das firmas domésticas especialmente nos dois primeiros anos do programa de estabilização. Porém, as estratégias de internacionalização não foram totalmente revertidas, mas basicamente concentradas no Mercosul, como resultado das oportunidades trazidas pelo processo de integração regional (IGLESIAS; MOTTA VEIGA, 2002). Essa integração regional entre Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai propiciou não apenas a redução de barreiras institucionais e comerciais, mas também a diminuição da distância psicológica a outros mercados (ROCHA; SILVA; CARNEIRO, 2007).

Entretanto, a retomada de investimento direto do exterior no Brasil nos anos 1990 acentuou a assimetria existente entre a elevada presença de empresas estrangeiras na estrutura produtiva brasileira e o baixo grau de internacionalização produtiva das empresas nacionais. A atuação externa das firmas domésticas continuou majoritariamente através do comércio de produtos de menor valor agregado e conteúdo tecnológico e os investimentos eram concentrados em poucas empresas e áreas de serviço (engenharia e construção civil e setor financeiro) e da produção de commodities, realçando o caráter defensivo da estratégia de internacionalização (HIRATUKA; SARTI, 2011).

A partir dos anos 2000, os efeitos das reformas realizadas na década anterior e a melhoria das condições de infraestrutura econômica – em especial no que tange às telecomunicações –, associadas à revisão da legislação tributária sobre produtos exportados, contribuíram para um aumento significativo no desempenho exportador do país. Além disso, a crescente globalização da economia brasileira também impulsionou maiores investimentos de companhias nacionais no exterior (GOUVÊA; SANTOS, 2004).

Nesse contexto, sobretudo a partir de 2004, o fluxo de saída de investimento direto foi liderado por grandes empresas nacionais, seguindo uma tendência observada em outros países emergentes, em especial os asiáticos. Algumas dessas empresas passaram a disputar a

liderança global em seus setores de atuação, o que deu destaque internacional ao país, que agora participava de forma mais abrangente da economia mundial em termos de número e porte de empresas e setores, mas ainda com relativa importância da dimensão regional (Mercosul e América Latina) (HIRATUKA; SARTI, 2011).

Esse movimento foi influenciado pela melhoria nas condições macroeconômicas do Brasil, refletidas em taxas de crescimento mais elevadas e puxadas inicialmente pelo aumento das exportações de commodities agrícolas e minerais, além do dinamismo da demanda doméstica (consumo e investimento). A redução da vulnerabilidade externa a partir da geração de consideráveis superávits comerciais e financeiros também teve impacto nesse novo quadro da economia brasileira, proporcionando o acúmulo de elevadas reservas cambiais e contribuindo para tendência de valorização da moeda doméstica (HIRATUKA; SARTI, 2011).

Outro fator que colaborou para o fortalecimento desse movimento foi o aumento do apoio do governo à formação de grupos multinacionais brasileiros através de fusões e aquisições, o que até recentemente não era prioridade na agenda política. A facilitação do acesso a financiamentos via Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o apoio à inovação com as iniciativas da Política do Desenvolvimento Produtivo, do Plano de Ação em Ciências, Tecnologia e Inovação e do Plano de Desenvolvimento da Educação representam essa nova postura de suporte do governo (ALÉM; MADEIRA, 2010).

Desde então, o Brasil vem assistindo a um incremento crescente no processo de internacionalização de empresas e dos fluxos de investimento direto no exterior, inclusive em setores como tecnologia da informação, hardware e software, em que firmas brasileiras passam a fazer parte do conjunto de empresas com participação em mercados globais (GOUVÊA; SANTOS, 2004).

Entretanto, as empresas brasileiras que investem na internacionalização ainda apontam uma série de desafios a serem superados nesse processo, como a elevada competitividade em mercados maduros, a bitributação de lucros no exterior e a falta de disponibilidade mais ampla de financiamentos (ALÉM; MADEIRA, 2010).

No conjunto de fatores e políticas que podem inibir a disposição empresarial para competir no mercado externo estão ainda a qualidade e distribuição geográfica da infraestrutura, a disponibilidade de informações sobre o mercado-alvo, as diferenças entre

normas e padrões técnicos domésticos e aqueles adotados internacionalmente, a língua nacional, políticas públicas creditícias e fiscais e a cultura empresarial (CASTELAR, 2002).

Nesse sentido, a mentalidade preponderantemente local dos executivos brasileiros também se mostra um obstáculo para expansão das firmas nacionais, especialmente em função da sua falta de experiência internacional (TANURE; BARCELLOS; FLEURY, 2009). A América Latina ainda é escolhida mais frequentemente pelas empresas domésticas como primeiro destino da internacionalização, que somente após o aprendizado adquirido com as operações no exterior passam a buscar mercados mais distantes psiquicamente (CYRINO; BARCELLOS; TANURE, 2010).

Estimular essas empresas que já operam internacionalmente a buscar novos mercados é uma das formas de aumentar o coeficiente de exportação das firmas brasileiras, visto que elas já têm experiência exportadora e a diversificação de sua atuação em outras regiões do globo tende a ser mais bem sucedida do que empresas que nunca exportaram (CASTELAR, 2002).

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