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Internet: alguns limites dessa comunicação

Com os diversos tipos de interação em mente, é importante refletir agora sobre a realidade da Internet, enquanto espaço livre de interação humana. Para Wolton (2007), hoje existe uma verdadeira fascinação pelas novas tecnologias. Fala-se somente da “Net”, como detentora de todas as virtudes, e que constituiu o exato simétrico de tudo que desagrada nas mídias de massa. No que diz respeito a estas, fala-se apenas de “dominação cultural” e de “passividade”: quanto à “Net”, trata-se apenas de “liberdade individual”, de “criatividade”.

Com o advento das novas tecnologias houve uma inversão da problemática. Tudo parece possível novamente, a exemplo da época onde somente a interação face a face existia. Como vimos, interagir sem a mediação dos meios de comunicação de massa, possibilitava aos indivíduos estarem mais próximos, estabelecendo uma comunicação em tempo real, que só poderia acontecer simultaneamente (“um-um”).

A chegada dos meios de comunicação de massa, ou generalistas, como denomina Wolton (2007), trouxe uma interação onde o indivíduo, apesar de entretido e encantado, foi perdendo cada vez mais o contato direto com outras pessoas, assim como a possibilidade de reagir àquela comunicação. Durante muito tempo, essa limitação dos meios de comunicação de massa foi amplamente criticada pelos mais diversos segmentos da sociedade, por apresentar um modelo de comunicação “um-todos”, isto é, um modelo que via os indivíduos na outra extremidade da comunicação como uma massa única e passiva. Hoje, a performance das ferramentas trouxe de volta muitas características do universo da comunicação interpessoal, sendo possível comunicar-se em tempo real novamente, mas agora sem as limitações geográficas. Mais uma vez é possível a comunicação “um-um”, assim como a comunicação “um-todos”.

Para Wolton (2007), essas e outras inúmeras possibilidades das novas tecnologias fazem com que se esqueçam as dificuldades da comunicação interpessoal, e a individualização acentua ainda mais este sentimento de um indivíduo só, livre, que inicia a comunicação.

Todo o pensamento do autor é construído em cima dessa problemática, que insiste em acreditar que os limites e dificuldades da comunicação estão resolvidos com o advento da interação mediada pelo computador. Wolton pede que mantenhamos os pés no chão quanto às novas tecnologias, pois o modelo “um-um”, como modelo ideal da comunicação, que enaltece ao indivíduo e não mais a uma massa de indivíduos, apresenta também uma série de

armadilhas que devem ser levadas em conta e analisadas em profundidade.

Segundo o autor, em uma sociedade em que informação e comunicação são onipresentes, o desafio não diz respeito à aproximação dos indivíduos e das coletividades, mas, ao contrário, à administração de suas diferenças; não diz respeito à celebração de suas semelhanças, mas àquela muito mais complexa, à de suas alteridades. Não há nada mais perigoso do que ver na presença das novas tecnologias cada vez mais performáticas a condição para a aproximação entre os homens. É na realidade o contrário. Quanto mais estão próximos uns dos outros, mais as diferenças são visíveis.

A questão é analisar em que sentido essa nova forma de comunicação dá mais autonomia e liberdade aos indivíduos, qual o verdadeiro grau de comunicação possível através da interação mediada por computador e se existe, de fato, uma comunicação aberta, livre e democrática.

O aporte teórico de Wolton (2007) é particularmente interessante, pois, em diversas de suas obras, nos convida a pensar a comunicação. O autor denuncia que com o surgimento das Novas Tecnologias, a comunicação está reduzida às técnicas, e as técnicas tornam-se o sentido, a ponto de se chamar a sociedade de “Sociedade da Informação”, criticando a terminologia adotada por Castells (1999). Para pensar a comunicação, ele defende que o essencial é menos a performance da ferramenta do que a ligação existente entre esta técnica, o modelo cultural de relacionamento dos indivíduos e o projeto para o qual a tecnologia está destinada.

Nesse sentido, Primo (2007) chama a atenção para que saibamos refletir sobre as questões pertinentes. Pois, segundo o autor, quando a reflexão sobre os impactos sociais decorrentes do desenvolvimento das tecnologias digitais e da popularização do computador pessoal conectado à rede é dedicada somente às questões tecnológicas ou transmissionistas, o verdadeiro debate acaba desfocado e reduzido, desestimulando o olhar curioso. E talvez seja esta a intenção, pois como enfatiza Lévy (1999), os enfoques tecnicistas do atual processo comunicacional acabam por desviar a verdadeira curiosidade com o tema.

Quanto à isso, Vicente (2006, p.112-113) é enfático: “Aparentemente estamos numa época na qual nunca se divulgou tanta informação, mas também nunca se vivenciou tanta desigualdade e falta de referenciais”. É como se o ciberespaço ocultasse a verdadeira dinâmica deste processo.

Por exemplo, a evolução tecnológica caminha para que haja computadores e redes em todos os lugares, mas o conjunto da economia cognitiva, técnica, cultural permanece em outras mãos. Isto é, o mais importante é a maneira com que cada cultura se apropria da técnica

em relação ao seu universo social, mental e cultural. Certamente, sendo o acesso livre, facilita para quem sabe usar os sistemas, o problema não é então o acesso à informação, mas sim a capacidade em saber o que procurar: “o contexto de competência é essencial”. De que adianta acessar, se não se tem nenhuma relação com este universo, se não se sabe o que fazer com estas informações? Portanto, o autor acredita que “se não se tem a competência para assimilar o aprendizado, os sistemas de informação e de conhecimentos erguerão outros tantos muros intransponíveis”. Acessar diretamente a informação e o conhecimento coloca problemas bem mais radicais (WOLTON, 2007, p.135).

Para dizer de outra maneira, a facilidade de consulta e de acesso à informação expõe às claras a questão evidentemente cultural e muito mais complexa dos meios cognitivos que dispõe o indivíduo para contextualizar a informação e dela se servir. O acesso direto não muda em nada a divisão e a hierarquia dos conhecimentos. Mas o que, de uma forma geral, é um problema para a sociedade democrática, para o universo do luxo pode ser solução. É justamente essa hierarquia dos conhecimentos que vai segmentar e filtrar os acessos aos websites, permitindo que só se interesse pelo luxo on-line aqueles que de alguma forma já pertencem a este universo premium. Tudo indica que o luxo na Internet não muda em nada as barreiras de acesso já existentes neste universo de consumo.

Dado o caráter hermenêutico da apropriação, mesmo que os sites das grifes sejam acessíveis globalmente, devido aos contextos diferenciados de cada um, o próprio interesse pelo acesso ao site será uma forma de direcionar o conteúdo. Afinal, nem todo mundo que tem Internet se interessará por acessar ao site de uma grife de luxo. Esse interesse se dá não apenas pela liberdade de acesso à mídia, mas, essencialmente, pelo contexto sócio-cultural de cada indivíduo (THOMPSON, 1998).

Diferentemente da televisão ou das revistas, que podem atingir a um público bem mais amplo, a Internet, no caso dos sites das grifes, é uma mídia que exerce influência em um receptor já filtrado a partir dos seus próprios interesses. Essa questão fica ainda mais clara se compreendermos a Teoria da Cauda Longa e suas relações com o universo do luxo.