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A Intervenção Psicomotora em Meio Aquático na Qualidade de Vida de Pessoas com DID Qualidade de Vida de Pessoas com DID

Intervenção Psicomotora em Meio Aquático

Artigo 2: A Intervenção Psicomotora em Meio Aquático na Qualidade de Vida de Pessoas com DID Qualidade de Vida de Pessoas com DID

Resumo

O objetivo deste artigo prende-se com a análise do contributo da intervenção psicomotora em meio aquático na QV e nas competências aquáticas de adultos com DID, procurando avaliar a sua eficácia. A amostra foi constituída por 29 participantes, 4 do género masculino e 25 do feminino, com um diagnóstico de DID “moderada” e “ligeira” (utilizou-se esta terminologia dado estas constarem nos diagnósticos individuais), com idades entre os 19 e 45 anos (M=28,55 5,49). Todos os sujeitos estavam no Centro de Atividades Ocupacionais. Foram aplicadas a versão portuguesa da Escala Pessoal de Resultados e a Ficha de Avaliação do Comportamento em Meio Aquático, em três momentos distintos (avaliação inicial/baseline, final e retenção). Em seguida, implementou-se um programa de intervenção psicomotora em meio aquático com a duração de quatro meses e com uma periodicidade de três sessões/semana (de cerca de 50min cada). Conclusões: Os resultados obtidos apontaram os benefícios da intervenção psicomotora na promoção da QV dos participantes. Foram verificadas diferenças em alguns domínios de QV, e ao nível das competências aquáticas constatou-se que não houve uma evolução significativa em todos os domínios, talvez devido à abrangência dos itens inerentes à QV associadas à curta duração do programa que pode não ter sido suficiente para a aquisição, consolidação e transfer das competências vivenciadas.

Palavras–Chave: Intervenção Psicomotora em Meio Aquático, Qualidade de Vida, Dificuldades Intelectuais e Desenvolvimentais

Abstract

The purpose of this study is to analyze the contribution of the psychomotor intervention in the QOL and water skills of adults with IDD. The sample is composed by 29 participants, four males and twenty-five females, with ages ranging from 19 to 45 years old (M=28,55 5,49) and diagnosed with mild and moderate IDD. All participants were at the Occupational Activity Center. The Portuguese version of Personal Outcomes Scale and the Ficha de Avaliação do Comportamento em Meio Aquático were applied in three different moments (initial, final and retention). Later on, a program of Psychomotor Intervention in aquatic environment was implemented during four months, consisting of three 50 minutes sessions per week. Findings showed benefits of psychomotor intervention in the promotion of some QOL domains and water skills of adults with IDD. Differences were found in some areas of QOL, and in the aquatic skills was found that there was no significant progress in all areas, a fact which can be explained by the range of items related to the QOL associated with short program duration which may not have been sufficient for the acquisition, consolidation and transfer of experienced skills.

Key-words: Intellectual and Developmental Disability, Quality of Life, Psychomotor Intervention, Aquatic Environment.

Introdução

A concretização das responsabilidades profissionais no campo da Dificuldade Intelectual e Desenvolvimental (DID) envolve a compreensão e aplicação das melhores práticas baseadas em modelos concetuais relevantes enquadrados no modelo de funcionamento humano (Luckasson & Schalock, 2013), apoios e qualidade de vida (Buntinx & Schalock, 2010).

No âmbito da intervenção psicomotora com populações com DID, e à luz das mais recentes concetualizações, procura-se otimizar a funcionalidade pessoal para a melhoria da qualidade de interação da pessoa com o contexto ecológico, através da provisão de serviços e apoios adequados a cada caso (Valente, Santos & Morato, 2012). A utilização de terapias que permitem a exploração/conhecimento do corpo tem vindo a ganhar alguma relevância nos últimos tempos, dado permitirem interações que conduzem à definição do eu (Costa, 2003), num jogo permanente entre a pessoa e o seu desenvolvimento multidmensional (motor, psicológico, emotivo, social…).

Inserido neste novo paradigma, e face à necessidade emergente de investigação no nosso país em diversas áreas, torna-se crucial não só a validação de instrumentos adaptados e validados à nossa realidade (Morais et al., 2015; Simões & Santos, 2013, 2014; Simões, Santos & Claes, 2015), bem como estudos que abordem a avaliação da eficácia das intervenções, e neste caso particular, da intervenção psicomotora.

A intervenção psicomotora engloba duas grandes vertentes que se complementam (Probst, Knapen, Poot, & Vancampfort, 2010): uma intervenção mais centrada na ação focada no desenvolvimento das capacidades intelectuais, motoras (e.g.: fatores psicomotores) e sociais; e uma intervenção que valoriza a experiência e a vivência emocional. O sujeito é confrontado com a consciencialização dos seus comportamentos e a sua compreensão, sendo “conduzido” para antecipar, elaborar e planear, e finalmente, concretizar respostas/soluções alternativas. Na intervenção psicomotora não é apenas valorizado o produto psicomotor final, havendo uma atenção a todo um conjunto de capacidades de receção, processamento e expressão da mesma (Fonseca, 2010).

Matias (2005) afirma que o Meio Aquático implica uma série de adaptações tendo em conta a necessidade de uma reorganização motora aquática. A intervenção neste meio tem um impacto a nível motor (desenvolvimento do esquema corporal que conduz à melhoria do programa motor), a nível sócio-emocional (promoção da

confiança individual e da comunicação que culminam num processo de socialização adequado às necessidades do indivíduo), a nível cognitivo (em que a intervenção procura estimular e desenvolver as capacidades de aprendizagem) e a nível visuo- auditivo (nomeadamente na noção e identificação de objetos – (Matias, 2010). A autora refere ainda a importância da intervenção psicomotora em meio aquático, dado possibilitar a exploração de um espaço diferente onde são trabalhados os fatores psicomotores verificando-se uma influência positiva no funcionamento do organismo humano.

A intervenção deve assentar em três eixos de ação: criação de oportunidades, desenvolvimento de competências e mudança de normas e valores numa perspetiva longitudinal ao longo da vida dos sujeitos, para potenciar a qualidade de vida (QV) de todas as pessoas (incluindo as pessoas com DID) em diferentes domínios: desenvolvimento pessoal (educação e competências pessoais, autodeterminação e poder de escolha/decisão), participação social (relações interpessoais, inclusão social e direitos, sistema de apoios) e o bem-estar (emocional, físico e material - Loon, Claes, Vandevelde, Hove, & Schalock, 2010). A descrição de todos os indicadores da QV (Schalock, Bonham & Verdugo, 2008; Schalock, 2002; Schalock, Keith & Verdugo, 2010) permitem o listar de diferentes conteúdos a trabalhar com cada caso, numa intervenção centrada na pessoa, em que a mesma atribui o valor próprio aos domínios da sua vida. Existem duas tendências, no campo da DID, que se encontram estreitamente relacionadas e com impacto no que respeita à prestação de serviços e apoios: a funcionalidade diária e a forma como percecionam e decidem sobre as suas próprias vidas para uma vida com qualidade (Loon et al., 2010).

A promoção da Qualidade de Vida é então um dos objetivos inerentes a toda e qualquer intervenção psicomotora (Valente, Santos, & Morato, 2012), podendo atuar como guia (Simões & Santos, 2014): as aprendizagens devem ser concretas, reais e funcionais, assentando nos interesses subjacentes aos pares com a mesma idade cronológica, preterindo-se os conteúdos desnecessários (Thompson et al., 2004).

Bramston, Chipuer, & Pretty (2005), compararam a QV (importância e satisfação pessoal) de 200 sujeitos, com idades entre os 17 e os 25 anos, de ambos os géneros, dos quais 80 tinham o diagnóstico de DID, através da aplicação das escalas Comprehensive Quality of Life (ComQoL) e a ComQoL-ID, e concluíram que a importância atribuída pelas pessoas com DID (vs. os seus pares com desenvolvimento típico) aos mesmos domínios é menor, à exceção do bem-estar material.

Saviani-Zeoti & Petean (2008), através da aplicação da escala de WHOQOL- BREF a 15 adultos com DID, de ambos os géneros (H=8; M=7) e com idade superior a 20 anos e aos seus respetivos prestadores de cuidados (n total=30), compararam os índices de satisfação e concluíram que os indivíduos com DID “ligeira” são capazes de expressar o que está a acontecer com a sua própria vida, reconhecendo a sua satisfação com a vida.

Stevens, Caputo, Fuller, & Morgan (2008), tentaram relacionar o nível de atividade física e a QV de 62 indivíduos (H=32; M=30) entre os 18 e os 50 anos (35±10) com lesão na medula. Para avaliar o nivel de atividade física utilizarams The Physical Activity Scale for Individuals with Physical Disabilities (PASIPD) e para a QV a Quality of Well-Being Scale (QWB). Os resultados obtidos mostram uma falta de atenção para a intervenção nesta área, apesar da relação positiva entre o nivel de atividade física e a QV, quando comparados com indivíduos sem atividade física.

Também Blick, Saad, Goreczny, Roman & Soresen (2015) investigaram o impacto da atividade física na QV, comparando indivíduos com um estilo de vida fisicamente ativo com aqueles que não têm. Participaram neste estudo 788 pessoas com DID, entre os 11 e os 92 anos de idade (M=49; sd=16,4). Foram avaliados vários indicadores de qualidade de vida (através do questionário Independent Monitoring for Quality Program – IM4Q), que compreende a inclusão e participação da comunidade; satisfação com os serviços profissionais, vida doméstica, e atividades do dia; dignidade, direitos e respeito recebidos de outros; medo; escolha e controlo; e satisfação da família. Os autores concluem que os indivíduos que praticam regularmente atividade física apresentam melhores índices de satisfação pessoal, social e emocional.

Harada & Siperstein (2009) analisaram a relação entre a prática desportiva e a QV de 579 atletas com DID, com idades superiores a 19 anos (M=25≠11,9), dos quais 64% eram do género masculino e 36% do género feminino. O instrumento utilizado foi o The Special Olympics Athlete Participation Survey (SOAPS – Siperstein, Harada, Parker, Hardman & McGuire, 2005), constituído por uma parte respondida pelos atletas (autorrelato) e a outra pelos seus familiares. Os autores concluíram que as atividades desportivas são fundamentais para as interações sociais destes indivíduos e suas famílias, além de proporcionar benefícios afetivos e sociais, as atividades proporcionam ganhos físicos e motores.

Claes, Hove, Vandevelde, Loon & Schalock (2012), estudaram o papel que os apoios, as estratégias, os fatores ambientais, e as características dos clientes

influenciavam a QV e as conquistas pessoais. 186 indivíduos com DID (H=54,8%; M=45,2%), entre os 19 e os 83 anos (M=45,66±14,34) preencheram a Personal Outcomes Scale e a Intensity Supports Scale e os resultados indicaram melhorias na QV com um bom sistema de apoio nas atividades de vida diária.

Por outro lado, de acordo com Teixeira-Arroyo & Oliveira (2007), os benefícios das intervenções em meio aquático evidenciam-se, pois as atividades realizadas nesse meio são indicadas para uma estimulação psicomotora, facilitando o movimento e, promovendo novas competências. Outro dos beneficios está relacionado com o facto de haver um maior controlo e segurança nos movimentos realizados pelos clientes, devido às propriedades físicas da água desses movimentos tornam-se mais acessíveis, permitindo o trabalho ao nível da amplitude e força dos diferentes grupos musculares (Silva & Lima, 2011).

Teixeira-Arroyo & Oliveira (2007) investigaram a influência de atividades psicomotoras em meio aquático em indivíduos com Paralisia Cerebral Espástica. Através de análise descritiva foram estudados dois casos (7 e 12 anos de idade) avaliados pelo instrumento de Avaliação Psicomotora Adaptada (Oliveira, 2004) no início das atividades na piscina e no final das intervenções. Os resultados apontam para uma melhoria significativa em todos os itens da escala (coordenação e equilibração, esquema corporal, lateralidade, orientação espacial e orientação temporal).

Uma das mais-valias de todas estas investigações foi a consideração das perspetivas subjetivas dos participantes com DID vs. a utilização exclusiva das opiniões de terceiros (e.g.: familiares ou técnicos - Saviani-Zeoti & Petean, 2008), que emerge como um dos principais procedimentos ao nível da intervenção e da investigação no seio destas populações (Sheppard-Jones, Prout, Kleinert & Taylor, 2005), exigindo que seja o próprio sujeito a estabelecer o que pretende da sua própria vida, exercendo os direitos de todos os cidadãos. Por outro lado, a programação deve estar centrada na pessoa e não nos défices, na satisfação pessoal e não em necessidades de outros interesses, esperando-se que o resultado seja o aumento da QV na sua multidimensionalidade (Simões & Santos, 2013).

Desta forma, o objetivo deste artigo é analisar a potencialidade e o contributo da intervenção psicomotora em meio aquático na melhoria da qualidade de vida de adultos com DID, procurando-se analisar a existência (ou não) de:

 diferenças (melhorias) significativas ao nível do índice de qualidade da vida depois da implementação de um programa de intervenção psicomotora em meio aquático;

 diferenças (melhorias) significativas ao nível das competências em meio aquático depois da implementação de um programa de intervenção psicomotora em meio aquático;

 diferenças significativas no domínio de Desenvolvimento Pessoal depois da implementação de um programa de intervenção psicomotora em meio aquático;  diferenças significativas no domínio de Autodeterminação depois da

implementação de um programa de intervenção psicomotora em meio aquático;  diferenças significativas no domínio de Relações Interpessoais depois da

implementação de um programa de intervenção psicomotora em meio aquático;  diferenças significativas no domínio de Inclusão Social depois da implementação

de um programa de intervenção psicomotora em meio aquático;

 diferenças significativas no domínio de Direitos depois da implementação de um programa de intervenção psicomotora em meio aquático;

 diferenças significativas no domínio de Bem-Estar Físico depois da implementação de um programa de intervenção psicomotora em meio aquático;

 diferenças significativas no domínio de Bem-Estar Material depois da implementação de um programa de intervenção psicomotora em meio aquático;  diferenças significativas no domínio de Bem-Estar Emocional depois da

implementação de um programa de intervenção psicomotora em meio aquático;  estudo comparativo das perceções sobre a melhoria (ou não) da QV entre os

indivíduos com DID e os prestadores de cuidados após a aplicação de um programa de intervenção psicomotora em meio aquático.

Metodologia

Amostra

A amostra deste estudo foi constituída por 29 participantes, 4 do género masculino e 24 do feminino, com um diagnóstico clínico de DID “moderada e ligeira” (optou-se pela utilização desta terminologia no âmbito da classificação dado serem as presentes nos diagnósticos médicos dos respetivos processos), com idades entre os 19 e os 45 anos (M=28.55±5,49). Todos os sujeitos se encontravam em situação de Centro de Atividades Ocupacionais. Os participantes foram distribuídos por três grupos: 1) CAO Santa Cruz (n=13); 2) CAO Funchal (n=7); estes dois grupos beneficiaram da implementação do Programa de Intervenção Psicomotora em Meio Aquático – PIPMA)

e 3) CAO Machico (n=9); que apenas beneficiou de Atividades de Adaptação ao Meio Aquático – Natação (AMAN), tal como previsto no seu plano individual de vida). Há a realçar que este último grupo não tinha no seu plano, a frequência de um programa de intervenção psicomotora, tendo sido estabelecido que se o programa a implementar tivesse resultados “positivos” esta hipótese seria equacionada. É, ainda, de se referir que todos os participantes tinham competências ao nível da compreensão e da linguagem expressiva para responder aos itens da escala utilizada para avaliar a qualidade de vida.

Instrumentos

O ponto de partida para o programa de intervenção psicomotora implementado foi a avaliação (Pitteri, 2004), indispensável para um melhor conhecimento dos casos com quem se iria intervir e que atuou como linha de orientação para o estabelecimento de objetivos funcionais e práticos. Para este estudo foram utilizadas duas escalas: a avaliação da Qualidade de Vida dos indivíduos com DID foi concretizada através da versão portuguesa da Escala Pessoal de Resultados (Simões & Santos, 2014) e ao nível das competências aquáticas, uma Ficha de Avaliação do Comportamento em Meio Aquático (Matias & Vieira, in press).