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CAPÍTULO 2 – MILITÂNCIA E REVOLUÇÃO EM OPERACIÓN MASACRE

2.3 Sequências da película

2.3.2 Invasão da polícia e prisão

Quando Torres sai da casa, se depara com a polícia que logo invade as duas residências, diz, a todo instante, “Donde está Tanco?”, dá coronhadas e revista tudo. O clima de tensão que estava sendo construído é substituído por um sentimento de confusão e medo. Naquele

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momento, ao serem reunidos para entrar no carro da polícia e levados para a delegacia, muitos pensam que o mal-entendido seria resolvido com rapidez, enquanto outros sentem que não voltariam mais para casa. Mas a dúvida pairava no ar, mesmo porque ainda não sabiam se a revolução tinha acontecido ou não.

Figura 12 – Policial atendendo ao telefone (42 min 11 s)

Fonte: Operación Masacre (1973).

Figura 13 – A espera na delegacia (42 min 39 s)

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Após ser preso e levado à Segunda Delegacia de Florida junto aos outros homens, Troxler conhece os policiais e pergunta porque estão ali. Então, um delegado aumenta o volume do rádio para ouvir notícias sobre a declaração da Lei Marcial. Nesse momento, o telefone toca e a câmera se encontra atrás de Troxler e de Benavídez, preso junto com ele, mostrando o policial sentado à sua mesa que atende ao telefone com um ar de preocupação (Figura 12). Atrás do profissional da segurança há uma cruz pregada na parede, e, ao lado, a bandeira da Argentina. Assim que desliga o telefone, a câmera passa rápido em close-up pelo rosto dos dois homens que se entreolham e se volta ao policial, posicionada atrás de Troxler, o que transforma a cena em uma situação subjetiva – aparentemente, Troxler percebe a preocupação do inspetor. Nada é explicado, e os dois sujeitos saem da sala do policial. Desse modo, a dúvida permanece.

A próxima cena se refere aos homens sentados e em espera. A câmera está embaixo, na altura dos pés dos policiais que andam de um lado para o outro e custodiam os prisioneiros (Figura 13). Depois, aparece um close-up de Don Horacio e Giunta, que tentam descobrir porque estão presos e quem era Tanco. A cena seguinte indica a conversa entre os amigos Livraga e Vicente Rodríguez, que leva a entender que ambos não sabiam da revolução. Além disso, são mostrados os homens que passavam pela rua naquele momento em reclamações por terem sido detidos.

O delegado Rodríguez Moreno ouve no rádio sobre a Revolução de Valle e fica preocupado. Diante disso, um policial conta para os homens: “¿ustedes son detenidos políticos? Estalló la revolución. No tenemos contacto con La Plata”. Giunta e Don Horacio não sabem do que ele estava falando, mas Gavino e Carranza se entreolham e acreditam que serão soltos. O policial não dá detalhes; então, os amigos não saberiam que a revolução acontecera em lugares isolados e que logo seria contida. Gavino conversa com Troxler sobre a hora em que a Lei Marcial foi anunciada e pressupõe que nada ocorreria com eles, pois foram detidos antes.

A polícia começa a chamá-los para o interrogatório. Perguntam nome, sobrenome, o que faziam naquela noite e se eram peronistas. Quando o escrivão questiona Carranza, forma- se um clima de muita tensão: sem ser questionado, ele começa a explicar que estavam escutando a luta, mas todos desarmados, algo que o interrogador não queria saber. Com o enquadro da câmera em ambos, um sentado e o outro em pé, o escrivão pergunta: “¿Peronista?”. Conforme a Figura 14, a câmera se posiciona atrás do escrivão para ter uma imagem subjetiva de um interrogado claramente apreensivo, mas que se esforçava para não demonstrar isso.

Logo, Carranza responde: “Tengo seis hijos”. A câmera fica em close-up a cada pergunta e resposta. O escrivão insiste: “¿Peronista, Carranza?”. Então, a filmagem se

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aproxima mais: “Y de los chicos, ¿no lo ponen?”. O escrivão repete a pergunta, dessa vez um pouco mais enfático: “Carranza, ¿es peronista?”. E Carranza se rende: “Sí, soy peronista”. Essa cena indica um grande sentimento de ansiedade ao espectador, na qual Carranza apela para o lado emotivo do escrivão, quando diz que tem seis filhos, mas o homem permanece firme em descobrir se o interrogado era ou não peronista, porque, para a polícia e os militares, era tudo que importava de fato.

De repente, chega a mensagem para o inspetor maior Rodríguez Moreno, vinda do tenente-coronel Fernández Suárez, com a ordem de fuzilar os homens detidos naquela noite. Enquanto lê o recado e reflete sobre ele, a câmera segue a mesma perspectiva de antes com Carranza: aos poucos, fica em close-up no delegado, em um clima de tensão e confusão. Pouco depois, há uma cena de voice-off do delegado, em que reflete sobre a missão difícil e ingrata que lhe foi dada. Nesse caso, sua sala se torna interessante para ser analisada: de acordo com a Figura 15, a câmera está localizada um pouco acima da mesa, muito bem organizada, com poucos objetos em cima. No canto esquerdo se encontra uma pequena bandeira da Argentina e, logo atrás, no lado direito, há outra em tamanho maior. Atrás do inspetor está uma cruz e, acima, uma imagem do presidente Aramburu. Esse design da sala passa a impressão não apenas da extrema nacionalidade representada pelas duas bandeiras, mas também de o Estado estar acima da Igreja, em que esta serve como apoiadora do governo, e não o contrário. A decisão a ser tomada por Rodríguez Moreno se baseia nas ordens superiores e no seu dever com o país – se as desobedecesse, seria um traidor da pátria.

Por fim, decide soltar as três pessoas que foram presas enquanto passavam pela rua naquele momento, que não participavam do encontro nas casas de Don Horacio e Torres. Também havia a ordem de fuzilá-los, mas tomou essa decisão para se livrar de um “peso na consciência”. Enquanto isso, os outros foram encaminhados para o carro – os policiais disseram que os levariam a La Plata.

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Figura 14 – Carranza sendo interrogado na delegacia (48 min 47 s)

Fonte: Operación Masacre (1973).

Figura 15 – Sala do delegado e inspetor Rodríguez Moreno (44 min 00 s)

Fonte: Operación Masacre (1973).

Apesar de o espectador saber o que acontece no final, já que a primeira sequência do filme mostrou os mortos no aterro, o sentimento de angústia é dividido entre os homens que estão presos e quem assiste à película. A espera no banco da delegacia com homens indefesos

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e a tomada de decisão do delegado passam uma sensação de tortura, mas, ao mesmo tempo, apresenta certa empatia por Rodríguez Moreno. Se não fosse pela posição de superioridade e de máximo respeito à autoridade concedida pela sala, talvez o espectador conseguiria sentir compaixão pelo fato.