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A investigação sobre as «necrópoles céltico-romanas» alto-alentejanas – vicissitudes e limitações, fontes e coleções museológicas

ENQUADRAMENTO HISTÓRICO II.1 Sobre Abel Viana – vida e obra

II.2. A parceria entre Abel Viana e António Dias de Deus e a investigação sobre as «necrópoles céltico-romanas» alto-alentejanas

II.2.2. A investigação sobre as «necrópoles céltico-romanas» alto-alentejanas – vicissitudes e limitações, fontes e coleções museológicas

Não obstante o contributo e mérito reconhecido às intervenções de Abel Viana e A. Dias de Deus, a ausência da publicação de monografias finais sobre os arqueossítios explorados, volvido mais de meio século sobre os trabalhos de escavação e recolha de materiais, facilmente se explica pelas “confusões

e perdas de informação irreparáveis“ e pela impossibilidade de “substituir a evidência que a alteração de um «depósito» selado – como é um conjunto funerário – destruiu” (ALARCÃO, A., 1988, pp. 205 e

207). De facto, a intenção de explorar todo o potencial informativo das designadas «necrópoles céltico- romanas» alto alentejanas revela-se uma tarefa condicionada, por um lado, pelas limitações inerentes às vicissitudes dos trabalhos de escavação, registo, e posterior tratamento e acondicionamento dos materiais; e, por outro, pelas lacunas de informação verificadas ao nível da descrição e inventário das peças, e pelos lapsos nas ilustrações e legendas dos textos publicados à época, que se traduzem em dificuldades acrescidas na tentativa de reconstituição dos conjuntos funerários. Facilmente se compreende a ocorrência de tais lacunas e lapsos se tivermos em linha de conta a não presença e colaboração ativa de Abel Viana em todos os trabalhos de campo realizados, assim como o próprio ritmo de trabalho revelado por esta ‘equipa’ – “(…) consegui, ainda na tarde desse mesmo dia, (…),

iniciar em Vila Fernando, com António Dias de Deus, o estudo e inventariação dos materiais (…). Ficaram registados e fotografados mais de 400 objectos. Este trabalho continuou nos dias 22, 24, manhã de 25 e primeiras horas da manhã de 26. Em 23, ocupamo-nos [sic], durante a manhã, em escavações na Herdade dos Serrones, e durante a tarde, na necrópole da Herdade do Padrãozinho. Na tarde de 25 fui examinar a necrópole do Padrão, e visitei a vila de Juromenha, onde colhemos notícias de novas estações arqueológicas” (MRB: VIANA, 30/04/1952, p. 1). A escavação destas

necrópoles parece ter sido cuidadosa mas não convenientemente documentada76, situação que deverá sido particularmente gravosa até ao início da colaboração de Abel Viana – “Dias de Deus não tinha

apontamentos das suas numerosas investigações, mas a sua viva memória permitiu que eu redigisse as seguintes notas” (VIANA, 1950, p. 290). Analisando a documentação conhecida, e em particular os

relatos sobre as Descobertas arqueológicas feitas no concelho de Elvas atribuídos a A. Dias de Deus (AFCB: DEUS, [s.d.]c), parece verificar-se que só após o início da colaboração com o arqueólogo

76 Informação gentilmente facultada pela Doutora Adília Alarcão. As indicações da Doutora Adília Alarcão foram preciosas

para a compreensão das vicissitudes que marcaram a recolha, tratamento e estudo do espólio atribuído a estes espaços funerários.

minhoto, e certamente sob a influência e orientação deste, terá o funcionário da Colónia Correcional passado a dedicar parte do seu tempo a compilar as suas ‘memórias’ sobre as pesquisas e recolhas efectuadas ao longo de mais de quinze anos de atividade exploratória (AFCB: DEUS, [s.d.]a). De um modo geral, estas ‘memórias’ correspondem a descrições sumárias, nas quais A. Dias de Deus se esforçou por elencar o conjunto de sítios identificados/ explorados e as circunstâncias da descoberta dos mesmos, sem revelar, no entanto, preocupação com dados de natureza estratigráfica, a reconstituição de contextos ou a desejável articulação com o espólio recolhido. Para além disso, o facto dos relatos a que tivemos oportunidade de aceder se encontrarem incompletos condiciona irremediavelmente o nosso conhecimento sobre estas explorações e os arqueossítios identificados. O interesse fundamental dos autores parece ter recaído sobre a morfologia das sepulturas (conforme evidenciam os trabalhos publicados) e, apesar de parecer haver a noção da importância dos conjuntos funerários, as descrições do espólio tendem a ser bastante concisas e superficiais (ALARCÃO & ALARCÃO, 1967, p. 1; SEPÚLVEDA & CARVALHO, 1998, p. 241). A propósito da importância reconhecida à reconstituição dos conjuntos funerários, vejam-se os seguintes excertos: “Teníamos

intención de reproducir, al lado de cada dibujo o esquema de sepultura, el ajuar que proporcionó. Pero esta publicación se haría más costosa.” (VIANA & DEUS, 1955c, p. 7); (a propósito da organização da

Secção Arqueológica da Fundação da Casa de Bragança) “Assim, os objectos deverão ficar

agrupados, não por exemplares da mesma espécie, mas sim por conjuntos representativos do espólio funerário de cada sepultura ou tumulação, visto só deste modo se poderem tirar conclusões sérias e expressivas acerca da evolução das culturas sociais e sua ordenação cronológica” (AFCB: VIANA,

12/03/1953, p. 9). As limitações do registo de campo (na verdade, a ausência deste em grande parte dos casos ou, pelo menos, até meados de 1949) explicam as dificuldades na posterior identificação do espólio associado a cada uma das sepulturas exploradas, dificuldades estas reconhecidas por Abel Viana como irremissíveis, logo no decurso do trabalho de inventariação e estudo preliminar dos materiais levado a cabo nas décadas de 50 e 60 do séc. XX.77 O registo constituiu, assim, uma das principais limitações apontadas às intervenções dos ‘pesquisadores’ de Vila Fernando, que viria inclusive a justificar a suspensão dos trabalhos na necrópole da Chaminé e na villa do Carrão.78 Em nosso entender, a observação de Manuel Heleno a propósito da necrópole da Chaminé – “Sem uma

exploração científica do que ficou desta necrópole, estudo minucioso dos seus ritos e relacionação do material com os depósitos que o continham, nenhuma interpretação segura se pode fazer da mesma”

77 Informação gentilmente facultada pela Doutora Adília Alarcão. 78 Assunto abordado nos subcapítulos II.2.1 e IV.6.1.

(HELENO, 1951, p. 89) – pode considerar-se aplicável a todos os demais arqueossítios que compõem a nossa amostra de estudo.

Outra das dificuldades sentidas na abordagem da temática em análise decorre do tratamento dado ao vasto espólio recolhido no decurso destas intervenções. Não nos parece que a gestão de tão significativa quantidade de materiais, de diversas categorias e com distintas proveniências, aliada a um registo de campo deficiente ou mesmo ausente, tenha sido tarefa fácil para A. Dias de Deus e Abel Viana – “(…) limitações diversas, entre as quais sobressaíam a falta de condições materiais e apoio

académico, conduziram a alguma dispersão do espólio das necrópoles que Abel Viana e António D. de Deus escavaram nas décadas de 40 e 50, na região de Elvas. As mesmas razões explicam que o tratamento dado aos objectos (incluindo a publicação) não tenha sido tão cuidado como o trabalho de escavação” (ALARCÃO, A., 1988, p. 203). À distribuição pouco criteriosa do espólio por diferentes

instituições museológicas, isto é, motivada acima de tudo pela premência em encontrar um local de depósito, oficial e definitivo, para os materiais (que não as instalações da Colónia Correcional de Vila Fernando), e aparentemente sem ter em linha de conta outro critério que não fosse o da distribuição equitativa de peças de ‘relevância’ ou valor idênticos aos olhos dos ‘pesquisadores’, deve também acrescentar-se alguma negligência verificada na organização, tratamento e acondicionamento do espólio (peças danificadas, peças com intervenções de restauro comprometedoras, peças que se perderam ou atualmente não localizáveis, peças sem informação de proveniência), e incontornáveis lacunas de informação registadas ao nível da descrição e inventário dos materiais. Um dos desafios que se colocou ao presente estudo está relacionado com os inúmeros lapsos nas ilustrações e legendas dos textos publicados por A. Dias de Deus e/ou Abel Viana.79 Frequentemente se verifica que uma mesma peça, em diferentes publicações e até na mesma publicação, é atribuída a diferentes necrópoles ou sepulturas, o que, à falta de outros dados disponíveis, pode comprometer irremediavelmente a identificação da respetiva proveniência e contexto de achado, e a eventual reconstituição do conjunto funerário. Veja-se, por exemplo, a peça de vidro ilustrada em VIANA, 1955c, n.º 26; VIANA & DEUS, 1958, Est. XIV, n.º 184; e em VIANA, 1960-1961b, Est. V, n.º 82 – nas duas primeiras publicações citadas, a peça é atribuída à sepultura 18 da necrópole de Horta das Pinas, e na terceira e última é atribuída à necrópole de A-do-Rico. Registe-se igualmente o caso do anel de prata com sinete ilustrado em VIANA, 1955c, p. 7, Fig. 1; e em DEUS, LOURO & VIANA, 1955, p. 159 – no primeiro caso, a peça é atribuída à necrópole de Horta das Pinas, e no segundo é descrita como sendo

79 Acerca destes lapsos, “por causa da rapidez exigida na feitura das coisas”, e de algumas “«erratas»” atribuídas a Adília

proveniente da sepultura 9 da necrópole do Padrão. No que se refere a exemplos de atribuição da mesma peça a contextos de sepultura distintos, na mesma publicação, vejam-se a peça ilustrada com o número 72 em VIANA & DEUS, 1955c (p. 14 – Fig. 9), atribuída às sepulturas 17 e 105 da necrópole de Padrãozinho 4 (idem, pp. 8 e 20); ou a peça ilustrada com o n.º 67 na publicação citada (idem, p. 34 – Fig. 19), atribuída às sepulturas 6 e 7 da necrópole de Serrones (idem, p. 24). Noutros casos ainda, a peça ilustrada e identificada com determinado número não corresponde à peça descrita com esse mesmo número ao longo do texto da publicação, suscitando dúvidas quanto à composição do conjunto funerário em causa e quanto à real proveniência da peça retratada – atente-se, por exemplo, entre o espólio atribuído à necrópole de Serrones, à peça identificada com o número 14 (VIANA & DEUS, 1955c, pp. 27 e 29 – Fig. 16). A propósito, veja-se também o caso da peça inventariada com o número MME Arq 2986 (NOLEN, 1985, n.º 210, p. 194, Est. XXVII)80, pretensamente atribuída às recolhas efectuadas nas necrópoles alto alentejanas, e para a qual a correspondência mais aproximada identificada nas publicações da autoria de VIANA e/ou VIANA & DEUS seria, na nossa opinião, a peça ilustrada como o n.º 25 em VIANA, 1955b (fig. 8), atribuída à sepultura 17 de Padrãozinho 4. Todavia, o número em questão é descrito pelo autor como "taza de terra sigillata muito fragmentada" (VIANA, 1955b, p. 8), não coincidindo nem com a peça observada nem com a peça retratada com o n.º 25 nas estampas da obra citada. Coloca-se, pois, a hipótese de se tratar de um lapso na descrição apresentada e/ou na indicação do número da peça, permanecendo em aberto a respetiva proveniência.

Parece-nos que parte das incongruências detectadas nas publicações de Abel Viana e A. Dias de Deus, se explicam, quer pelos condicionalismos inerentes à metodologia do trabalho de campo e às perdas de informação daí decorrentes, quer pelas vicissitudes que terão marcado o processo de inventário e organização da informação e espólio reunidos. Em relação a este processo recorde-se a circunstância de se tratar de um trabalho feito por Abel Viana sobre materiais e dados recolhidos, na sua grande maioria, por A. Dias de Deus, sem contar com a presença do arqueológo no campo, bem como o facto de ser uma tarefa à qual o arqueólogo se dedicava de forma descontinuada, aquando das suas visitas a Vila Viçosa. O envio das remessas de espólio para Vila Viçosa, destinadas à Secção Arqueológica da Fundação da Casa de Bragança, estaria a cargo do funcionário da Colónia de Vila Fernando, cuja logística, desde logo em virtude da proximidade geográfica, estaria naturalmente facilitada. O envio dos materiais seria acompanhado, regra geral, por uma “Relação de objectos

80 Não tendo sido possível apurar a origem da peça ou confirmar uma eventual atribuição às necrópoles alto alentejanas,

enviados ao Museu de Vila Viçosa”, na qual se listava o espólio entregue (com ou sem indicação da

proveniência e, no caso das necrópoles, eventualmente agrupado por arqueossítios mas sem indicação do respetivo contexto de sepultura) e se indicava a quantidade de itens correspondente (AFCB: [s.a.], ?/05/1950; MRB: [s.a.], [s.d.]d; DEUS, [s.d.]d). No que se refere aos materiais provenientes das necrópoles alto alentejanas, podia ainda verificar-se a indicação de um outro número associado a cada uma das peças e identificativo das mesmas (AFCB: [s.a.], ?/05/1950).81 À luz dos dados conhecidos, não nos foi possível inferir qual o critério subjacente à atribuição de tal numeração, a não ser tão somente uma eventual tentativa de ‘ordenação’ do espólio à medida que este ia sendo recolhido. Assim sendo, supõe-se que tal número pudesse ser atribuído e grafado nas peças numa fase inicial de organização dos materiais, eventualmente a cargo de A. Dias de Deus, no decurso ou após a conclusão dos trabalhos de campo. A este propósito, tome-se como exemplo a publicação dedicada aos Campos de Urnas do concelho de Elvas (VIANA & DEUS, 1958), na qual, para a descrição dos materiais e apresentação da respetiva listagem (idem, pp. 45-61), os autores optaram um sistema de identificação composto por dois números: um primeiro número referido como “número

de ordem”, respeitando a enumeração sequencial das peças; e um segundo número, grafado entre

parêntesis, que deveria corresponder, simultaneamente, ao número “posto na peça, à medida que

estas se foram inventariando” e ao número apresentado nas estampas (VIANA & DEUS, 1958, p. 45).

Contudo, no decorrer do nosso estudo e da tentativa de estabelecer o maior número possível de correspondências entre o espólio disponível e as fotografias publicadas por Abel Viana e A. Dias de Deus, constatou-se que, nas estampas da publicação citada, e ao contrário da informação dada pelos autores, as peças são identificadas pelo designado «número de ordem», e não pelo número supostamente atribuído aquando da respetiva inventariação. Veja-se, por exemplo, a peça apresentada como 44 (60) na listagem de espólio (VIANA & DEUS, 1958, p. 47), e identificada na Estampa X-3 da publicação com o número 44. Incongruências à parte, é de registar que, numa das fotografias constantes da dita publicação, a peça ilustrada com o número 56 (idem, Est. X-1), e correspondente à peça apresentada como 56 (37) (idem, p. 48), permite confirmar a marcação das

81 Note-se que das listagens de remessas de espólio enviado para Vila Viçosa conhecidas, apenas uma apresenta esta

indicação. Na verdade, de um modo geral, das referidas listas consta apenas a designação genérica dos materiais e a quantidade de exemplares entregue, sem qualquer indicação de proveniência ou informação adicional sobre as peças (MRB: DEUS, [s.d.]d).

De ressalvar que, do conjunto documental consultado, conhecem-se unicamente quatro destas listagens (uma das quais em versão triplicada) – a mais antiga corresponde a um conjunto de materiais entregue por A. Dias de Deus em Maio de 1950, e a mais recente data de Janeiro de 1954 (AFCB: [s.a.], [s.d.]b; [s.a.], ?/05/1950; MRB: [s.a.], [s.d.]c; [s.a.], [s.d.]d; DEUS, [s.d.]d; [s.a.], 25/01/1954).

peças com um número distinto do número de ordem com que as mesmas surgem identificadas nas estampas – na foto em questão é visível o número “37” inscrito na superfície externa da peça. Reforça- se assim, uma vez mais, a ideia de que o espólio recolhido deverá ter sido numerado e marcado, de forma mais ou menos sistemática, numa fase anterior ao inventário propriamente dito, quiçá ainda no campo aquando da respetiva exumação. Entre outros, citem-se os exemplos das peças Catál. SER.tsh.012 (MBCB Arq n.º 2048) e HPI.tsh.006 (MBCB Arq n.º 2352), que apresentam os números “75” e “76”, respetivamente, mas sem que estes permitam estabelecer eventuais correspondências com o contexto de achado, número de sepultura, ou com números de identificação em publicações, levando-nos a pensar tratar-se de numeração atribuída numa fase inicial de contagem e organização do espólio recolhido. Não obstante, em inúmeros casos, como por exemplo os das peças Catál. HPI.tsh.014 (MBCB Arq n.º 2606), HPI.tsh.021 (MBCB Arq n.º 2095), e HPI.tsh.022 (MBCB Arq n.º 2523), a identificação do espólio que compõe a nossa amostra de estudo nas ilustrações dos opúsculos de VIANA e/ou VIANA & DEUS só se revelou possível em virtude dos números anotados nas peças. Esta situação verificou-se, com particular incidência, no caso dos materiais atribuídos à necrópole de Horta das Pinas e em relação à publicação de VIANA & DEUS, 1958. Note-se ainda que esta numeração originalmente marcada nas peças nada tem que ver com os números de inventário posteriormente definidos por Abel Viana na listagem referente à Coleção da Secção Arqueológica da Casa de Bragança (AFCB: VIANA, [s.d.]). Parte do espólio atribuído às «necrópoles céltico-romanas» alto alentejanas constante da Coleção de Arqueologia do Museu-Biblioteca da Casa de Bragança conserva ainda estas marcações e, nalguns casos, apresenta um outro tipo de anotação – a indicação “S” seguida de um numeral que, supõe-se, devesse corresponder ao número da sepultura de origem da peça, ainda que esta correspondência nem sempre se afigure linear. Neste sentido tome-se como exemplo a peça Catál. SER.tsh.031_8 (MBCB Arq n.º 2010), com a anotação “S8” inscrita na parede externa e correspondente a espólio atribuído à sepultura 8 da necrópole de Serrones (VIANA & DEUS, 1955d, pp. 24 e 35 – Fig. 20, n.º 134). Por oposição, atente-se ao caso da peça Catál. SER.cc.040 (MBCB Arq n.º 2179)– com indicação “Serrones/ S/ 14” mas sem correspondências identificadas que possibilitem a respetiva atribuição ao contexto da sepultura 14 da necrópole em questão; ou da peça Catál. HPI.pf.014 (MBCB Arq n.º 2181), com anotações diversas – “XI/ Padrão” e “38”, sem que nenhuma delas tenha possibilitado uma eventual correspondência com o respetivo contexto de achado. Presume-se que também este tipo de anotações tenham sido feitas aquando da exumação das peças, por A. Dias de Deus e/ou Abel Viana, com vista à identificação do contexto de origem destas. Contudo, a quantidade de materiais em que pudemos atestar a presença destas ‘anotações’

revelou-se minoritária. Tal constatação leva-nos a considerar a hipótese de se tratar de espólio que pudesse ter tido outro tipo de informação associada (como, por exemplo, eventuais ‘etiquetas’ com a indicação da proveniência e número atribuído), e a possibilidade de, em virtude de vicissitudes do posterior tratamento dado às peças, sobretudo após o falecimento do arqueológo e ao longo de toda a segunda metade do séc. XX, simplesmente não se ter conservado até aos nossos dias nenhum tipo de anotação feita pelos seus colectores. No caso do espólio das necrópoles alto alentejanas constante da Coleção de Arqueologia do Museu-Biblioteca da Casa de Bragança (espólio que, recorde-se, continuou a ser inventariado e estudado por Abel Viana, após o falecimento de A. Dias de Deus, e até meados da década de 60), coloca-se a hipótese de os antigos números terem sido apagados das peças (intencionalmente ou não), no decurso de trabalhos de limpeza, tratamento e acondicionamento das mesmas, sobretudo durante o último quartel do séc. XX [como parece verificar-se, por exemplo, com a peça Catál. HPI.cc.027 (MBCB Arq n.º 2431), que apresenta o número “42” quase imperceptível na parede externa do bojo]. Apesar das referências de Jeannette Nolen (Inventário da Coleção de Arqueologia do Museu-Biblioteca da Casa de Bragança) à existência de anotações/ marcações em diverso espólio cerâmico da referida Coleção, não nos foi possível, na maioria das situações, corroborar tal informação no decurso do nosso estudo desse mesmo espólio. Para além disso, registou-se que, se nalguns casos (como, por exemplo, as peças Catál. CHA.cc.051, PDZ4.cc.112_38, SER.pf.014_51, PDZ.cc.008 – MBCB Arq n.ºs 1312, 2173, 2413, e 2490, respetivamente), as peças conservam pequenos papéis, da autoria de A. Dias de Deus ou Abel Viana, com anotações referentes à respetiva proveniência; na sua grande parte, e atendendo às indicações constantes do Inventário da Coleção de Arqueologia do Museu-Biblioteca da Casa de Bragança, elaborado por J. Nolen, já não nos foi possível confirmar as indicações da autora e a existência de tais notas associadas ao espólio (veja- se, por exemplo, a peça Catál. HSE.cc.19 – MBCB Arq n.º 1354). Algumas das peças estudadas, em especial do acervo do museu calipolense, apresentam ainda outras anotações (grafadas nas próprias peças), cujo significado se desconhece. Correspondem a numerais romanos grafados a tinta da china na superfície externa das peças ou a anotações compostas por “J – (numeral árabe)”, inscritas, a grafite, também na parede externa das peças. Desconhece-se não só como interpretar tais anotações, mas também a respetiva autoria e a data a que remontam (vejam-se, por exemplo, a peça Catál. PAD.pf.004 – MBCB Arq n.º 2454, com as anotações “XXIII” e “J-7”, ou a peça Catál. PAD.lu.002 – MBCB Arq n.º 2291, com a anotação “J-15”). De assinalar ainda a identificação de materiais com etiquetas antigas idênticas em duas das coleções estudadas – a do antigo Museu Municipal de Elvas e a da Fundação da Casa de Bragança, parecendo sugerir a possibilidade de tais etiquetas terem sido

colocadas pelo(s) funcionários(s) da Colónia Correcional de Vila Fernando e/ou Abel Viana, num momento prévio à distribuição dos materiais pelas diferentes instituições museológicas de depósito (vejam-se, por exemplo, as peças Catál. TDA.cc.070 – MME Arq n.º 5731, e PDZ.cc.012 – MME Arq