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3 FUNDAMENTOS TEÓRICOS DO GASTO PÚBLICO DESCENTRALIZADO

3.3 INVESTIMENTO PÚBLICO LOCAL E CONDICIONANTES POLÍTICOS

A literatura também aponta que os fatores de ordem política são fortes condicionantes do gasto público local. As decisões de gasto deveriam, teoricamente, atingir o ótimo social. No entanto, a economia política assumiu o planejador social como principio organizador da economia do setor público. O impacto das decisões dos políticos (policymakers) em matéria de política fiscal em geral relacionada ao investimento público tem sido amplamente estudado. Existem duas linhas de pesquisa nessa área que auxilia na compreensão dos determinantes políticos do gasto público; a teoria dos ciclos orçamentários eleitorais e a teoria dos incentivos partidários. Os modelos dessa linha de pesquisa formam um subcampo da teoria do ciclo político de negócios, linha de pesquisa que estuda o comportamento cíclico de variáveis macroeconômicas como fruto do período eleitoral.

A teoria dos ciclos orçamentário-eleitorais ressalta a sensibilidade das variáveis de política fiscal frente á vigência do calendário eleitoral. Os ciclos se caracterizam quando algum componente de despesa do governo é induzido pelo processo eleitoral. Isso ocorre quando o aumento nos gastos do governo ou reduções de impostos é motivado pelo desejo de reeleição para o policymaker ou para o respectivo partido político. A literatura aponta como um influente trabalho nessa linha de pesquisa, o que foi desenvolvido por Nordhaus (1975). O autor descreve o comportamento ‘oportunista’ dos policymakers ao arbitrarem sobre as variáveis macroeconômicas como, a taxa de desemprego e inflação, para obter a reeleição. Os estímulos na economia ocorrem antes das eleições, de maneira a reduzir o desemprego no curto-prazo, com o custo inflacionário desta política aparecendo apenas depois do período eleitoral. O modelo é baseado em expectativas adaptativas onde agentes (eleitores) formam suas expectativas de inflação com base no comportamento passado. Isto permite que a defasagem entre o ajustamento das expectativas pelos eleitores e o tempo para que a política macroeconômica tenha efeito seja uma ‘oportunidade’ explorada pelos policymakers.

A teoria dos incentivos partidários coloca a ênfase dos ciclos políticos de negócios como fruto das diferenças de ideologia e objetivos econômicos entre os grupos políticos. O trabalho de Hibbs (1977) mostra a estimação de um modelo para verificar a existência de diferenças partidárias na condução da política econômica e dos resultados macroeconômicos para os Estados Unidos e Inglaterra. O modelo é aplicado num sistema econômico representado por uma curva de Phillips com expectativas adaptativas, no qual os policymakers possuem controle total sobre os instrumentos de política econômica. Os resultados indicaram que os partidos mais ‘inclinados’ à esquerda produzem uma combinação com baixo desemprego e orçamentos maiores, menos ênfase no equilíbrio e maior permissividade em relação á inflação. Os partidos de direita por sua vez são voltados à taxação mais branda, inflação baixa, orçamentos equilibrados e aceitam mais o aumento do desemprego do que a inflação.

Alguns estudos tem produzido evidência empírica sobre as duas vertentes da teoria do ciclo politico de negócios. Tufte (1978) demonstrou através de pesquisa histórica que os presidentes americanos consideram o calendário eleitoral na tomada de decisão sobre a política fiscal. A pesquisa revelou a existência de movimentos sistemáticos nas políticas de transferências de acordo com o calendário de eleições. A maioria dos períodos de recuperação ocorreram entre outubro e novembro dos anos eleitorais. O autor também apresentou evidências sobre o movimento cíclico de indicadores como o crescimento, desemprego e inflação. Os resultados mostraram que essas variáveis são mais difíceis de se controlar politicamente, uma vez que estão mais ligadas a economia real. O trabalho de Franzese (2002) traz uma gama de trabalhos empíricos internacionais que pesquisaram sobre o tema.

Na literatura nacional, o trabalho de Cossio (1998) tenta explicar a postura fiscal dos estados brasileiros com base nas características do sistema político de cada estado. O autor testa seis elementos que explicam a postura fiscal dos estados; a existência de ciclos eleitorais, participação da população no processo eleitoral, a fragmentação da representação política, a orientação ideológica dos governantes, o grau de competitividade política, e a afinidade partidária dos cargos do executivo entre os níveis de governo. Os dados são estimados num painel que compreende os anos de 1985 a 1997, com a inclusão de variáveis dummy anuais para captar algum impulso no gasto em anos eleitorais. Os resultados indicaram que os primeiros três elementos se mostraram estatisticamente significante. Coube destaque para os

coeficientes da fragmentação partidária na assembleia legislativa e o grau de participação do eleitorado.

Em trabalho semelhante, Nakaguma e Bender (2006) buscaram analisar o impacto da promulgação da Emenda da Reeleição e da Lei de Responsabilidade Fiscal sobre os ciclos políticos orçamentários e sobre o desempenho fiscal dos estados brasileiros. Os resultados foram estimados num painel de dados entre 1986 a 2002. Os resultados mostraram que a emenda da reeleição implicou na elevação dos ciclos políticos devido às manipulações oportunistas durante o período eleitoral. Além disso, também foi verificado que as diferenças partidárias não influem de maneira relevante no comportamento fiscal dos estados. Finalmente, os autores mostraram que a amplitude dos ciclos políticos diminui ao longo do tempo. Esse resultado final pode ser atribuído ao amadurecimento das instituições democráticas e do eleitorado, que com o tempo passa a ser capaz de identificar comportamentos oportunistas da classe política.

Assim como na literatura sobre interação espacial e efeitos de transbordamento, poucos trabalhos exploram as evidências empíricas dos determinantes políticos do investimento público municipal categorizado enquanto gasto público local. Nessa linha de pesquisa, o trabalho de Sakurai e Gremaud (2007) avalia se o comportamento das despesas dos municípios paulistas está sujeito a fatores de ordem política. Os autores consideraram a vigência do calendário das eleições municipais e a postura dos partidos políticos que governaram tais instâncias administrativas, entre os anos de 1989 e 2001. As despesas com investimento estão entre os itens das despesas. Os resultados apontaram que tais rubricas não sofrem interferência de ciclos eleitorais. No entanto, existem diferenças no volume de recursos investidos entre os partidos políticos.

O trabalho de Menezes (2005) utiliza informações fiscais sobre todos os municípios brasileiros que enviaram os respectivos dados para o Tesouro Nacional entre 1997 a 2003. O autor também utiliza a metodologia de dados em painel. Os resultados mostram que o grau de competitividade política, a participação da população no processo eleitoral e a afinidade partidária possuem poder explicativo sobre o nível de investimentos nos municípios. Um aumento de um candidato por vaga na câmara dos vereadores aumentaria o gasto com investimentos. Este resultado estaria ligado ao desejo da população em expressar sua demanda

por investimentos. Além disso, a coincidência entre o partido dos prefeitos e o partido do Governo Central implicaria em um gasto adicional em investimentos.

Um destaque recente na literatura internacional é o trabalho de Goeminne e Smolders (2011). Os autores investigam o impacto conjunto de vários determinantes políticos sobre os investimentos em infraestrutura pública em municípios Flamencos19. Para isso, utilizaram um painel com 308 municípios de 1996 a 2006. Os resultados mostraram que o nível de investimento em infraestrutura interagindo com o tamanho do município e a fragmentação da representação política, explicam as decisões de investimento. Por outro lado, às coligações partidárias afetam o nível de investimento de acordo com o número de membros associados às coalizões do governo. Apesar de se tratar de um regime político diferente do Brasil20, os resultados revelaram que o investimento público local é fortemente dependente das características politicas.

A análise conjunta de fatores de interação espacial e determinantes políticos do gasto em investimento público é parte de uma literatura muito escassa sobre os determinantes dos gastos públicos locais com investimento. As duas abordagens possuem características em comum. Uma delas é a dificuldade em se obter dados desagregados a nível local. Este fato restringe a eficácia dos métodos estatísticos e prejudica a análise. A outra similaridade advém do fato de que tanto a decisão sobre investimento público local quanto os fatores políticos possuem pouca participação popular. Apesar do esforço de disseminar informações ao cidadão e de incorporar mecanismos que o aproximem da gestão pública, o tema é restrito a um público de “técnicos”, o que torna as decisões de gasto público, teoricamente apresentado, sujeitas a desvios em relação a um ótimo social. Diante desse contexto teórico apresentado neste capítulo, verifica-se que existe na literatura uma boa base teórica e empírica para os determinantes políticos e de interação espacial do investimento público. Desse modo, o objetivo desta monografia é averiguar se existe efeito de interação espacial entre os determinantes políticos no gasto público local de investimento nos municípios do Estado da Bahia. Para atingir esse objetivo, será necessário obter uma base de dados sobre variáveis de investimento para o Estado da Bahia e respectivos determinantes e aplicar procedimentos econométricos adequados utilizando essa base, o que será feito no próximo capítulo.

19 Região Norte da Bélgica.

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