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V ISÃO GERAL DOS TIPOS PENAIS AMBIENTAIS

8 EFICÁCIA DA NORMA PENAL EM BRANCO NA TUTELA PENAL

8.2 V ISÃO GERAL DOS TIPOS PENAIS AMBIENTAIS

Não obstante ser designada por Lei dos Crimes Ambientais, a Lei 9.605/98, não é o único diploma legal em vigor sobre o meio ambiente, vez que ao dispor no texto do artigo 82, os seguintes dizeres: - "Revogam-se as disposições em contrário" - o legislador, dada a enorme quantidade de leis esparsas, lidaria melhor se tivesse especificado exatamente o que estaria revogado.

Assim, além da Lei 9.605/98, estão em vigor o artigo 250 do Código Penal (Decreto-lei 2.848, de 07.12.1940); os artigos 31 e 32 da Lei de Contravenções Penais (Decreto-Lei 3.688, de 03.10.1941); o artigo 26, alíneas 'e', 'j', 'l' e 'm' da Lei 4.771, de 15.09.1965, os artigos 23, 26 e 27 da Lei 6.453, de 17.10.1977; o artigo 2º, da Lei 7.643, de 18.12.1987; e o artigo 13, incisos I a V, da Lei 8.974, de 05.01.1995, Lei de Biossegurança.

A Lei de Crimes Ambientais - Lei 9.605/98, pode ser considerada como um exemplo de fúria do legislador, se se atentar para, o excesso de elementos normativos do tipo, normas penais em branco, e conceitos totalmente imprecisos, sem se falar da questão da responsabilidade penal da pessoa física e jurídica.

O foco do presente estudo não é a análise de todos os tipos penais ambientais, mas sim um questionamento quanto à efetividade das normas penais em branco na tutela penal ambiental, ou seja, no modo como a estrutura da norma penal ambiental foi criada e os resultados atingidos, frente aos desafios de proteção e repressão do bem jurídico meio ambiente.

E é com base nesse enfoque que se pode afirmar ter, o legislador negligenciado a técnica jurídica e exagerado no emprego de "elementos normativos do tipo", no emprego de "normas penais em branco" pendentes de remissão a leis, regulamentos, atos administrativos, decisões judiciais, licença, autorização, parecer, registro, proibição, além dos conceitos imprecisos como "espécie rara", "recursos alternativos", "dano indireto", "especial preservação", "níveis tais", "destruição

significativa", "imprópria para ocupação humana" e "obrigação de relevante interesse ambiental"209.

Esse excesso de normas penais em branco e elementos normativos do tipo acarretaram a construção de uma lei ambiental altamente questionável do ponto de vista constitucional, negligenciando-se por completo a regra da urgência e da exigência de certeza legal para o Direito Penal.

Em crítica explícita à Lei dos Crimes Ambientais, Luiz Regis Prado censura seus inúmeros delitos que, contemplou e que a bem da análise, não deveriam passar de meras infrações administrativas ou, quando muito, de contravenções penais, em total afronta aos princípios penais da intervenção mínima e da insignificância210. Dentre os muitos exemplos, cita os artigos 33, III, 34, 42, 44, 49, 52, 55 e 60, todos da Lei 9.605/98.

Dentre os tipos penais, alguns causam tamanha discussão que a pergunta a realmente exigir resposta é a de como o legislador conseguiu ser tão inexperiente ao redigir determinados artigos e como os estes, após submissão a todo o trâmite legislativo, tornaram-se lei.

Como aplicar, por exemplo, o art. 32 da Lei 9.605/98, cuja redação é a seguinte: "Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres,

209 LEONARDO, Marcelo. Crimes Ambientais e os Princípios da reserva Legal e da

Taxatividade do Tipo em Direito Penal. In Revista Brasileira de Ciências Criminais.

São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, vol. 37, p. 157. 210 PRADO, Luiz Regis. Crimes contra ...ob. cit., pp. 16-17.

domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos". E ainda, no parágrafo 1º, "incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos".

Nem seria preciso dizer que as expressões "ato de abuso" e "recursos alternativos" tornam o tipo penal aberto, cuja interpretação é de difícil realização. Com essa previsão legal, as pesquisas científicas feitas em laboratório com animais são exemplos freqüentes de que o tipo penal aberto acarreta muita dificuldade ao ser empregado.

Como justificar que o crime de "maus-tratos" em seres humanos previsto no art. 136 do Código Penal tem pena menor que o crime de "maus-tratos" aos animais.

Outro dispositivo que gera séria polêmica é o art. 40, da Lei 9.605/98, "Causar dano direto ou indireto às Unidades de Conservação e às áreas de que trata o art. 27 do Dec. 99.274, de 06.06.1990, independentemente de sua localização"

A expressão "causar dano indireto" é tão genérica e imprecisa que não se pode dizer que a segurança jurídica não foi afetada, assim como o princípio da taxatividade.

Isso sem se falar das discussões jurídicas geradas pela referência na lei, a artigo de mero decreto, passível de ser revogado ou modificado a qualquer momento, somado ao fato de que "unidades de conservação" também depender de definição legal prevista no art. 2º, da Lei 9.985/00.

Reforçando as críticas acima destacadas, Édis Milaré menciona outras "tipificações altamente questionáveis" elaboradas pelo legislador, tais como:

caçar animais silvestres tanto pode ser ilícito penal como fato atípico, porquanto a caça tanto pode ser proibida como permitida, mediante autorização. Se permitida, porém dependente de autorização, o agente será processado não por ter praticado o fato, mas por tê-lo sem antes munir-se da necessária autorização.

O mesmo acontece com a pesca, que tanto pode ser um ilícito penal como um fato atípico, dependendo de estar ou n]ao o agente autorizado para tal, e de ter obedecido (se autorizado) às disposições regulamentares respectivas. Assim também o desmatamento ou corte de árvores podem estar ou não autorizados.

Outra não é a situação do que ocorre em relação à poluição. Alguém pode estar agredindo o ambiente através de queimadas, de explosão em pedreiras, etc., e não estar cometendo nenhuma infração, seja no campo do Direito Administrativo como do Direito Penal, desde que esteja legal e devidamente autorizado211.

Tantos são os exemplos de manifesta insegurança jurídica que, não acrescenta maior valor a discussão mencionar a todos, merecendo destaque específico o crime de poluição quer seja pela sua abrangência transnacional, quer seja pela complexidade e incidência na sociedade.