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procedimentos são necessários e fazem parte da rede de atenção em saúde. Ao contrário da desospitalização, a internação continua sendo uma prática freqüente e considerada ainda necessária pelos órgãos públicos, pela sociedade e por alguns profissionais do CAPSad.

A desinstitucionalização é o principal e atual eixo de discussões e práticas do processo da RP. Ela é entendida como

[...] transformações e desconstruções no paradigma da atenção às pessoas com sofrimento psíquico, nas relações institucionais e na forma de sua organização, e os principais atores desse processo são antes de tudo, os profissionais do serviço que mudam a organização, as relações e as regras do jogo (ROTELLI, 1990, p. 29-31).

As transformações partem do interior das instituições de saúde mental para o território e, evidentemente, para que isso ocorra, são necessários recursos diferenciados aos que são usualmente oferecidos pelo sistema tradicional de tratamento psíquico.

Esses aspectos não foram devidamente problematizados na instituição. A reflexão desse eixo de mudanças, empreendida pela equipe será importante para o entendimento da questão em seu fundamento e para criação de novos dispositivos de mudanças. Ela só aparece na forma de desospitalização ou mais precisamente na redução da internação ou redução de leitos. Contudo, percebemos a preocupação dos profissionais quanto ao avanço da RP no CAPSad e nos serviços de saúde mental do município.

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A continuidade da discussão no grupo tomou rumo com a problematização do tipo de atenção definida pela instituição e oferecida aos usuários que a procuram. A sinalização do grupo foi para a atenção baseada no acolhimento, na escuta, no cuidado, no respeito às particularidades do sujeito e

sua subjetividade. Estes fundamentos foram considerados pela equipe como princípios psicossociais.

O usuário do serviço, sujeito das ações institucionais, ao chegar ao local, encontra uma equipe preocupada com suas questões, e utiliza estratégias já estabelecidas, com as quais irá iniciar a abordagem e estabelecer o tratamento. Explicitamos abaixo fragmentos de pontos de discussão do grupo:

Inclusão Social – quando se fala em inclusão social, entende-se que seja uma inserção no contexto social, em que o psicótico, o deficiente mental e o usuário de drogas, comumente estão afastados. Na verdade trata-se de reinserção social, porque em algum momento de suas vidas já existiu uma inserção.

Os usuários de drogas sofrem bastantes discriminações, no momento da inserção social têm bastante dificuldade em “convencer” a sociedade de suas mudanças, de que voltaram a ser “bonzinhos” que saíram da condição de “marginalidade” e que agora podem ser incluídos de outra forma, não pela forma da delinqüência ou outras ações e atitudes socialmente proscritas.

O CAPSad oferece várias formas de inclusão: escolar, trabalho, família, porém os usuários passam por um processo de avaliação pela equipe,a qual acredita que para a inclusão, eles precisam ter aumentado a auto- estima, a autonomia para cuidar de si. Isto é necessário porque as exigências fora do CAPSad são grandes, e normalmente eles ficam de fora, se, por exemplo, concorrem com pessoas não usuárias de drogas. Os usuários temem fazer as coisas. Em parte é por conta do excesso de cuidado da equipe, por querer sempre fazer por eles e acaba que eles não aprendem a andar sozinho e não constroem sua autonomia. Podemos citar três fatores impeditivos da conquista da autonomia pelos usuários: a equipe não construiu o espaço de liberdade deles, faz as coisas por eles, acomodação do usuário devido aos cuidados da equipe. A inclusão pela cidadania é um campo complexo e amplo, é um processo reflexivo de conquista de autonomia, de olhar para o sujeito na busca de suas escolhas.

Para alguns membros da equipe, a inclusão passa pelo cuidado, proteção, assessoramento, apoio, piedade, dó. Para outros, pela cidadania. Mas essa conquista não é uma tarefa fácil, quando se observa o relato acima. A proposta de tratamento estabelece o respeito ao usuário, seu tempo, seu percurso em busca da cidadania possível.

Algumas reflexões são cabíveis nesse momento de percepção do modo como produzem saúde dentro do CAPSad. A equipe entende que olhando

o sujeito, em sua subjetividade e em sua demanda, conduzirá melhor o tratamento que passa sempre pela inclusão social. Mas para onde definitivamente esta olhar será dirigido? Para o sujeito ou para o drogado ou o marginalizado?

O processo de tratamento com os usuários do serviço parte inicialmente desta demanda, e a leitura da equipe sobre essas demandas é de perdas sociais e conseqüentemente as ações para o tratamento serão no sentido do resgate dessas perdas, por meio do trabalho, da criação e da produção. A equipe acredita que dessa forma o usuário pode apoderar-se de suas capacidades e fazer o caminho inverso da alienação, à qual foi submetido pela sociedade. Encontramos neste ponto um nó contraditório, a alienação do sujeito é justamente a subjetividade apreendida que logo será submetida ao tratamento.

A equipe considera um bom resultado desse investimento no tratamento, quando os usuários adquirem auto-estima, afetividade, mudam a aparência física, tornam-se educados, melhoram a atenção e a concentração, aceitam regras e adquirem controle sobre o uso de drogas. Percebemos medidas pedagógicas e educativas na condução do tratamento e nas expectativas de melhora.

Por outro lado, apontam fatores que dificultam esse estado de melhora e que estão relacionados à subjetividade dos usuários, quando não desejam mudanças em suas vidas; são pessoas já institucionalizadas; apresentam condutas de risco; comportamentos auto-lesivos; são dependentes de drogas ilícitas; adaptados ao sistema de assistência social; vivem em condições familiares adversas; apresentam condições psiquiátricas como transtornos mentais.

Pelos resultados obtidos com o tratamento, a equipe avalia a coerência e a pertinência das ações em relação à demanda apresentada. Ressalta que os conceitos e os parâmetros da atenção na instituição são resultados do entendimento das políticas públicas de saúde mental, da convivência com a problemática dos usuários, da análise dos erros e acertos e do conhecimento da realidade dessa população.

Percebemos que não há um discurso de cura considerado pelo parâmetro da abstinência, como resultado final do tratamento, mas uma definição do usuário como sujeito social, pronto para se apresentar e conviver na sociedade. Contudo, uma relação verticalizada veladamente pode se produzir entre os profissionais e os sujeitos do tratamento. Há um saber sobre o outro, que determina quando ele está pronto para conviver socialmente. Isso pode caracterizar como um tratamento moral e/ou uma forma de subjetivação do sujeito.

Pelos dados obtidos nas discussões em grupo, o CAPSad, em seu discurso teórico, não se configura aparentemente como uma instituição de saúde tradicional, médico centrado, nem aparenta visão organicista. Porém, em suas práticas observamos contradições: o discurso médico existe por meio de outras disciplinas, da internalização desse discurso pelos profissionais e usuários; a visão organicista se faz presente nas práticas institucionais, o alcoolismo é ainda associado à doença e o encaminhamento para internação psiquiátrica ainda é freqüente, assim como as preocupações com a organicidade provocadas pelo uso das drogas.

A autonomia da equipe ainda é uma condição a ser conquistada. Percebemos, por exemplo, que ela não pode ainda interferir nas determinações da Ação Social e do Pronto Socorro do CAPSIII quanto aos encaminhamentos dos usuários de álcool e outras drogas para o hospital psiquiátrico, sendo que esses serviços são parceiros e fazem parte da rede de atenção municipal. Será necessária a conquista da autonomia dos profissionais, não só do CAPSad, mas de todos os outros que trabalham nos serviços de saúde mental do município, para que dessa forma possa ser criado um campo estratégico para as mudanças efetivas no paradigma da atenção à saúde mental.

A instituição segue a lógica de ofertas à necessidade do momento. Tais ofertas também são reguladas pelos saberes e as relações transferenciais dos profissionais para com os usuários, também pelo nível de comprometimento com as questões apresentadas pelos usuários e o nível do envolvimento pessoal com eles. Esse assunto foi largamente discutido pela

equipe e conclui-se que existe um fator transferencial e contratransferencial na relação profissional-usuário e que isto conta no momento de definir as ações, mas a problemática ficou “em aberto” para futuras considerações da equipe.

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