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3 A MODULAÇÃO DOS EFEITOS DA DECISÃO DE

4.4 Isenção da COFINS das Sociedades Profissionais

O reconhecimento da revogação pelo artigo 5635 da Lei nº 9.430/96 da isenção da COFINS anteriormente concedida às sociedades civis de prestação de serviços de profissão legalmente regulamentada, consoante dispunha o inciso II do artigo 6º da Lei Complementar nº 70/91, ao fundamento jurídico de que inexiste relação hierárquica, seria possível em razão de eventual reserva material específica.

No âmbito do Supremo Tribunal Federal, inicialmente a orientação foi no sentido de que a matéria era de índole infraconstitucional, razão pela qual os recursos interpostos não eram conhecidos ou providos.

Com base na Súmula nº 276 do STJ: “As sociedades civis de prestação de serviços profissionais são isentas da COFINS, irrelevante o Regime Tributário adotado”, O STF fundamentou, alegando que a obrigatoriedade do pagamento da COFINS devesse ocorrer somente após o trânsito em julgado do pronunciamento definitivo do caso em trâmite junto ao Plenário.

A decisão do Ministro Celso de Mello fundamentou seu voto a partir do postulado da segurança jurídica e do princípio da confiança. Ao final de sua decisão, esclareceu que o próprio Tribunal sistematicamente decidiu que a matéria era de índole infraconstitucional, respaldado pela Súmula nº 276 do STJ.

A persistência da Procuradoria da Fazenda logrou êxito conforme decisão nos autos do RREE nº 377.457/PR e 381.964/MG; o plenário do STF decidiu pela incidência da COFINS sobre as Sociedades Prestadoras de Serviço, entendimento contrário ao do STJ, cuja Súmula nº 276 foi revogada.

35 Art. 56. As sociedades civis de prestação de serviços de profissão legalmente regulamentada

passam a contribuir para a seguridade social com base na receita bruta da prestação de serviços, observadas as normas da Lei Complementar nº 70, de 30 de dezembro de 1991. Parágrafo único. Para efeito da incidência da contribuição de que trata este artigo, serão consideradas as receitas auferidas a partir do mês de abril de 1997.

A isenção da COFINS para as sociedades de profissão regulamentada, prevista no artigo 6º, II, da LC 70/91, não encontra fundamento de validade no art. 146, III, alínea “a”, da CF/88, que exige disciplina por lei complementar, mesmo que se entenda consoante a melhor doutrina, que este dispositivo é meramente exemplificativo.

Conclui-se que a lei complementar é necessária não apenas para a definição dos contribuintes dos impostos discriminados na Constituição, mas também para definição dos contribuintes das contribuições sociais; no caso, ainda assim a isenção em tela não se subsumiria àquela norma constitucional.

Isso porque não se pode confundir uma norma que concede isenção de determinado tributo com a norma que define os contribuintes tal como prevista no citado artigo 146, da CF/88, já que a isenção consiste, por definição, na retirada de parcela da hipótese de incidência; diferentemente, da norma que define os contribuintes da COFINS, conforme se depreende do próprio artigo 195, caput, inciso I, da CF/88. Assim, a regra de isenção prescinde de lei complementar, podendo ser veiculada por simples lei ordinária, como se constata do teor do art. 176 do CTN.

De outra parte, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou entendimento, desde o julgamento da ADC nº 01, segundo o qual a instituição das contribuições sociais cujo perfil está previsto na Constituição Federal, como é o caso da COFINS, pode-se fazer mediante simples lei ordinária federal, não se tratando de nova fonte de custeio decorrente da competência residual da União (CF/88, art. 195, § 4º). Somente é exigível por lei complementar para instituição de contribuição nova, o que não é o caso da COFINS.

A Lei Complementar nº 70/91, que concedeu a isenção, não cuida de matéria reservada pela Constituição Federal, razão pela qual poderia ter sido veiculada por lei ordinária.

Tais observações, embora pertinentes no que diz respeito à tão almejada celeridade processual junto aos Tribunais Superiores, que passa por uma maior racionalidade no sistema e redução no número de recursos dirigidos a esses Tribunais, são de ordem metajurídica, não constituindo critério seguro nem cientificamente válido para aferir-se o regime jurídico da lei complementar.

Desse modo, a lei complementar deve ser compreendida e identificada a partir da presença conjunta dos elementos formais e materiais, que lhe formam a essência, conforme já concluído. Apenas o aspecto formal (elemento de forma), relativo ao processo legislativo especial de votação, não tem o condão de, por si só, transmudar a substância da lei complementar, uma vez que representa tão- somente o requisito de validade formal do instrumento normativo.

A doutrina em geral construiu a noção de superioridade material da lei complementar, quando esta atua dentro de sua esfera constitucional de competência. O melhor exemplo é a lei complementar de normas gerais em matéria de legislação tributária, prevista no artigo 146, inciso III, da CF/88, uma vez que, consoante referido, é lei nacional que condiciona a atuação dos poderes legislativos parciais dos entes da Federação, incluindo o da União. Vale dizer, todas as leis a elas devem observância, tanto que o desbordar de seus limites acarreta vício de inconstitucionalidade.

Nem toda lei complementar ao atuar dentro do campo material de competência, previsto na Constituição Federal, goza de superioridade hierárquica, uma vez que pode não exercer a referida função intercalar de intermediação entre a Constituição e as demais leis, hipótese em que sua eficácia é “direta”.

Fez-se necessário determinar os casos em que existe hierarquia entre lei complementar e lei ordinária, para, por exclusão, aferir quando ela é inexistente. A Lei complementar fora de seu campo de atuação normativa, tal como expresso na Constituição, não se submete ao regime jurídico próprio dessa

espécie, razão pela qual aqui não se há falar em superioridade hierárquica. É lei complementar apenas na forma, mas, na substância, é lei ordinária. Em resumo, é formalmente complementar, todavia, materialmente ordinária.

Ora, a existência de um campo de reserva de lei complementar, dado pela Constituição, não impede o legislador de adotar a forma de lei complementar para cuidar de outras matérias que entenda devam ser reguladas por essa espécie normativa. Contudo, a análise de ambos os pontos deve partir necessariamente da constatação do verdadeiro papel que desempenha o legislador infraconstitucional em tais contextos. Assim, diante de todo o exposto, resta muito claro que a previsão do campo material de incidência da lei complementar só pode decorrer do Texto Constitucional, não ficando em poder de o legislador infraconstitucional fazê-lo a pretexto de imprimir maior estabilidade e proteção a determinadas assuntos.

Além disso, o postulado da segurança jurídica reside justamente em só exigir-se o processo legislativo especial inerente à lei complementar quando for ela materialmente exigida, já que somente nesses casos a Constituição pretendeu conferir a característica de rigidez relativa, vedando a disciplina da matéria mediante legislação ordinária.

Atualmente, está praticamente firmado no Tribunal, no sentido da validade da revogação da isenção da COFINS para as sociedades civis de profissões regulamentadas. Com efeito, a 2ª Turma da E. Corte acolheu a proposta do Ministro Eros Grau, ao submeter os REs 377.457/PR e 381.964/MG à apreciação do Plenário, ocorrido no dia 14/03/2007. Na ocasião, o Tribunal, por maioria, resolveu questão de ordem (rejeitando-a) levantada pelo Ministro Marco Aurélio quanto à prejudicialidade do julgamento, em razão de o assunto ainda não ter sido analisado pelo Superior Tribunal de Justiça, por entender que a decisão da Corte de origem apresentara fundamentos legais e constitucionais.

Portanto, este julgamento, uma vez concluído, encerra definitivamente a discussão sobre a validade da revogação da isenção da COFINS em apreço, proporcionando estabilidade jurídica e previsibilidade à matéria, papel importante da jurisprudência. De outra parte, aponta diretriz no sentido de que a análise das relações entre lei complementar e lei ordinária (aí incluídos os conflitos entre essas espécies normativas); é questão de índole constitucional, cuja apreciação deve ser decidida, em última instância, pelo Supremo Tribunal Federal, sob pena de usurpação da sua competência. Tal diretriz, diga-se, já se fazia necessária, bastando vislumbrar a jurisprudência que se formou no Superior Tribunal de Justiça sobre a questão, decidida em nível infraconstitucional e, invariavelmente, mediante a aplicação da Súmula 276/STJ e com fundamento no princípio da hierarquia das leis.36

Será realmente que ao limitar a possibilidade de aplicar a modulação de efeitos do artigo 27 da Lei 9.868/99 apenas à hipótese da declaração de inconstitucionalidade é a forma mais adequada? E a expectativa do contribuinte quanto à isenção da COFINS? Trata-se apenas de matéria de natureza infraconstitucional? A matéria não era de competência do STF, portanto cabível a concessão da modulação.

É inegável reconhecer que, a partir do julgamento realizado pelo Plenário do STF do RE 377.457/PR, em 2008, declarando constitucional a revogação da isenção da COFINS das Sociedades Civis feita pela Lei nº 9.430/96, a manutenção dos inúmeros acórdãos já transitados em julgado em sentido contrário se tornou insustentável, não apenas por representarem um pronunciamento de um Poder Público contrário à ordem constitucional, criando a denominada “coisa julgada inconstitucional”, mas, também, por criar uma situação anti-isonômica entre contribuintes em iguais condições – as Sociedades Civis –,

36 Andamento Processual. Retirado de mesa ante a aposentadoria da Senhora Ministra Ellen

Gracie (Relatora). Ausente o Senhor Ministro Joaquim Barbosa, licenciado. Presidência do Senhor Ministro Cezar Peluso. Plenário, 10.08.2011.

ao conferir um tratamento fiscal mais benéfico apenas aos contribuintes que obtiveram judicialmente um pronunciamento neste sentido.

Uma proposta talvez seja a adoção do artigo 471, inciso I, do Código de Processo Civil, para limitar temporalmente os efeitos destes acórdãos – sem se pretender desconstituí-los ou relativizá-los – até o momento da entrada em vigor da legislação que tratou da COFINS para conferir um novo suporte jurídico à sua incidência, que não foi objeto de apreciação daqueles julgados.

4.5 Inconstitucionalidade da Inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e