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4.3 ISENÇÃO E OUTRAS FIGURAS JURÍDICAS AFINS

4.3.4 Isenção e imunidade

Assim como ocorre em relação a anistia e a remissão, não há divergência seja doutrinária seja jurisprudencial de que imunidade e isenção se tratam de institutos diferentes. Aliomar Baleeiro368 destaca que a imunidade corresponde a uma limitação ao poder de tributar, na medida em que suprime o referido poder, delimitando o campo de incidência da norma que confere competência para tributar. A isenção por outro lado, atua no plano infraconstitucional, decorrendo de lei e dirigindo-se à autoridade administrativa.369

Misabel Derzi,370 fazendo um resumo sobre as clássicas obras destinadas ao tema concluiu que essas usualmente encontram dois pontos de semelhança entre os institutos: a) tratam-se de normas de exceção, que reduzem ou mutilam a validade de outra norma mais ampla; b) serem limites ou proibições de incidência aos Entes estatais e permissões sob a ótica do contribuinte.

Edvaldo Brito, ao traçar a diferença entre os institutos destaca que ambas redundam na liberação do devedor de cumprir prestação da obrigação tributária.371 A imunidade consiste, porém, no afastamento da materialidade da hipótese do fato gerador prevista na Constituição, pela negativa constitucional, ao titular da competência para instituir o tributo, de instituí-lo com

368 BALEEIRO, Aliomar. Limitações constitucionais ao poder de tributar. atl. Misabel Derzi. 7ª ed. rev. ampl.,

Rio de Janeiro: Forense, 1997, p. 14-15.

369 BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro. atl. Misabel Abreu Machado Derzi, 12 ed. Rio de Janeiro:

Forense, 2013, p.1340.

370 BALEEIRO, 2013, p. 1344.

371 BRITO, Edvaldo. Direito tributário: imposto, tributos sinalagmáticos, contribuições, preços e tarifas,

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relação a determinadas pessoas ou bens.372 A isenção por outro lado, ocorre relativamente à libração de um devedor em razão de ato do credor quanto a prestação que deveria cumprir.373 Essa é a mesma escola de Amilcar Araújo Falcão374. Para o doutrinador, a imunidade é modo de não incidência juridicamente qualificado (pois previsto na Constituição), pela supressão da competência tributária sobre certos fatos, situações ou pessoas. A isenção, entretanto, se caracteriza pela incidência da norma ao fato e surgimento do crédito tributário, que se torna inexigível, em razão de diminuta ou ausência de capacidade contributiva , bem como por motivo extrafiscal.375 Conclui, portanto, que enquanto na não-incidência a obrigação sequer nasce, na isenção a obrigação surge, mas a lei dispensa o seu pagamento.376

No que os diferencia, ressalta que enquanto a imunidade decorre da constituição e dirige- se ao legislador tributário, a isenção decorre de lei e objetiva a autoridade administrativa.377 Em notas complementares à obra de Baleeiro, Misabel Derzi acrescenta que a imunidade corresponde a “regra constitucional [...] que estabelece a não competência das pessoas políticas da federação para tributar certos fatos e situações, de forma amplamente determinada, delimitando negativamente, por meio de redução parcial, a atribuição de poder tributário.”378

Ao tentar definir a imunidade, Ricardo Lobo Torres conclui que este instituto é indefinível, e qualquer tentativa neste sentido o reduz a aspectos periféricos e superficiais.379 Apesar disso, propõe um conceito lógico-jurídico: “relação jurídica que instrumentaliza os direitos fundamentais, ou uma qualidade da pessoa que lhe embasa o direito subjetivo público à não-incidência tributária ou uma exteriorização dos direitos da liberdade que provoca a incompetência tributária do ente público.”380

372 BRITO, 2015, p 111. 373 BRITO, 2015, p. 172.

374 FALCÃO, Amílcar de Araújo. Fato gerador da obrigação tributária. 4 ed. São Paulo: revista dos Tribunais,

1977, p. 117.

375 FALCÃO, 1977, p. 118. 376 FALCÃO, 1977, p. 120. 377 BALEEIRO, 2013, p. 1340. 378 BALEEIRO, 2013, p. 1344.

379 TORRES, Ricardo Lobo. Tratado de direito constitucional financeiro e tributário – os direitos humanos e

a tributação: imunidades e isonomia. 3. ed. rev. atual., Rio de Janeiro: Renovar 2005, p. 41.

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Roque Antônio Carrazza afirma que a competência tributária é tanto compreendida como uma autorização, legitimação para a criação de tributo, como uma limitação para fazê-lo.381 E prossegue asseverando que as imunidades outorgadas pela Constituição Federal garantem o direito subjetivo público de não ser compelido a recolher tributo na ocorrência das hipóteses constitucionalmente previstos.382

Sacha Calmon Navarro Coêlho afirma que a imunidade não gravita apenas no âmbito do capítulo atinente à competência tributária. Segundo entende, à luz da teoria da norma jurídica, os dispositivos relativos à imunidade compõem a hipótese de incidência das normas tributárias, excluindo de certos fatos ou aspectos destes a “virtude jurígena”.383

Paulo de Barros de Carvalho conceitua imunidade, por outro lado, como conjunto de normas jurídicas previstas na Constituição Federal e que estabelecem expressamente a incompetência de pessoas jurídicas de direito público interno para instituir regras instituidoras de tributos em situações específicas e suficientemente delimitadas.384

Este jurista ataca a conclusão de que as imunidades seriam uma limitação constitucional às competências tributárias. Para o doutrinador, não faz sentido se pensar que a Constituição outorga prerrogativas para inovação da ordem jurídica, pelo exercício de competências tributárias definidas na Constituição, para, em momento seguinte, fazer uma “mutilação” dessas mesmas competências. Assim, a dita limitação seria, na verdade, um conjunto de normas jurídicas direcionadas ao legislador ordinário, correspondentes às atribuições conferidas às pessoas políticas.385

No mesmo sentido, Paulo de Barros rechaça a afirmação de que a imunidade seria uma exclusão ou supressão do poder de tributar. Assim, a imunidade não excluiria nem suprimiria competências tributárias, uma vez que estas resultariam justamente de um conjunto de normas constitucionais, dentre as quais estão as de imunidade.386 Desse modo conclui que “As imunidades tributárias gravitam como uma espécie de privilégio explicado como proteção a

381 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de Direito Constitucional Tributário. São Paulo: Malheiros, 28 ed. rev.

ampl. atual. até a Emenda Constitucional n. 68/2011., 2012. p. 808.

382 CARRAZA, 2012, p. 808.

383 COÊLHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário brasileiro. 14. ed. rev. atual. Rio de Janeiro:

Forense, 2015, p. 138-139.

384 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 26. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 190. 385 CARVALHO, 2014, p.181.

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valores sociais e políticos de desempenharem livremente a profecia de sua fé e disseminação nas crenças qualificadas pela doutrina religiosa.”387

Paulo de Barros ainda critica os que defendem que a imunidade seria uma hipótese de não incidência constitucionalmente qualificada. Para ele, a impropriedade da expressão reside em antecipar um fenômeno que é inerente à regra-matriz, da qual se ocupa o legislador ordinário. Destarte, no âmbito constitucional, o objeto de preocupação normativa é definir os campos de competência dos Ente políticos tributantes.388

O autor adverte também que as imunidades tributárias não estão adstritas aos impostos, como se poderia concluir após a leitura do art. 150, VI, da CF. Além das regras previstas no referido artigo, outros fazem alusão a outros tipos de tributos, sendo descabido excluí-los do conceito deste instituto.389

A imunidade integra o Estatuto do Contribuinte, sendo, portanto, um princípio que se configura num direito subjetivo público do particular,390 não podendo ser diminuído à simples qualidade de regra. Além disso, independentemente da teoria doutrinária acerca da natureza jurídica da isenção, por se tratar essa de norma que está no plano infraconstitucional, não pode ser confundida com a imunidade que está no plano constitucional.