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JOGOS DE LINGUAGEM – ORALIDADES POSSÍVEIS E UMA EXPERIÊNCIA PRÁTICA

5 O TEXTO QUE NASCE DO CORPO

6 JOGOS DE LINGUAGEM – ORALIDADES POSSÍVEIS E UMA EXPERIÊNCIA PRÁTICA

Neste capítulo abordarei uma experiência de pesquisa prática, na qual fui organizadora e ministrante, realizada durante o desenvolvimento desta pesquisa de mestrado. A pesquisa foi realizada durante o primeiro semestre de 2011 e teve como convidadas atrizes vinculadas ao curso de Graduação e Pós-Graduação em Teatro da UDESC: Gabriela Giannetti (durante o período da pesquisa aluna do último semestre da graduação em Teatro), Luana Garcia (graduada em Licenciatura em Teatro pela UDESC e, durante a realização da pesquisa, aluna do Mestrado em Teatro na UDESC,) e Cláudia Oliveira (graduada em Filosofia na UFRGS, com experiência em dança e teatro, e, durante o período da pesquisa, aluna ouvinte do Mestrado em Teatro na UDESC). A prática durou aproximadamente quatro meses, sendo organizada com um encontro semanal e uma finalização aberta à comunidade acadêmica (realizada no dia 29 de junho de 2011), com a apresentação dos exercícios desenvolvidos durante a pesquisa.

O primeiro objetivo dessa prática foi aproximar questões discutidas nos capítulos anteriores, como a relação da palavra criada oralmente com o corpo, a questão da criação oral do ator sem um texto escrito – suas características, dificuldades e desafios, e o modo como essa criação essencialmente oral pode se relacionar com aspectos estéticos da dramaturgia contemporânea, entendida principalmente sob a noção de texto performativo233, que será

233 Prefiro utilizar o termo “performatividade” para me referir as pesquisas em dramaturgia contemporânea porque ele não se opõe à palavra drama, tal como outros termos utilizados para referir-se à dramaturgia contemporânea expressam. Ele coloca em evidência o aspecto da linguagem como modo de construir realidades discursivas, a instância verbal como fazer. Contudo, o termo “performatividade” também pode ser associado ao sentido expresso por Hans-Thies Lehman sobre o “teatro pós-dramático”. Ele escolhe este porque entende certas tendências teatrais como opostas ao drama, entendido basicamente como forma dialógica ligada a uma estrutura causal de base psicológica. Ligado a esse outro sentido estaria também, em sua visão, o teatro da Grécia antiga como uma forma não-dramática. Para o autor: “No teatro pós-dramático, a respiração, o ritmo e o agora da presença carnal do corpo tomam a frente do lógos. Chega-se a uma abertura e a uma dispersão do lógos de tal maneira que não mais necessariamente se comunica um significado de A (palco) para B (espectador), mas dá-se por meio de uma ligação “mágicas”, especificamente teatrais. (…) O que caracteriza o novo teatro, assim como as tentativas radicais de “linguagem poética” dos modernos, pode ser entendido como tentativa de restituição da chora: de um espaço e de um discurso sem télos, hierarquia, causalidade, sentido fixável e unidade. (…) Por isso, o status do texto no novo teatro deve ser descrito com os conceitos de desconstrução e polilogia. Assim como todos os elementos do teatro, a linguagem passa por uma dessemantização. O que se visa não é diálogo, mas multiplicidade de vozes, “polílogo”. Portanto, a desagregação do sentido não é por sua vez, destituída de sentido. Ela parodia, por exemplo, a violência da colagem de linguagens da mídia, que se mostra como a versão moderna da linguagem “encrática”, da linguagem do poder e da ideologia.” (LEHMANN, Hans-Thies. Teatro pós-dramático. São Paulo: Cosac Naify, 2007, p. 246, 247)

definida a seguir. O interesse dessa prática foi tentar buscar um modo de entender a improvisação do ator chamando atenção para o aspecto essencialmente efêmero da criação oral, e, principalmente, o modo como ela pode se relacionar com o momento presente da situação existencial da improvisação (o aqui e agora do processo teatral) até percebê-la sob o ponto de vista do jogo teatral.

O segundo objetivo que motivou essa experiência prática foi o desejo de elaborar exercícios que ajudassem os atores a desenvolver um olhar específico sobre esse tipo de criação cênica, a elaboração de enunciados verbais. Uma vez que não conheço em minha experiência teatral e acadêmica exercícios exatamente voltados para isso, vi a necessidade de tentar buscar práticas de improvisação que pudessem servir de apoio a esse tipo de criação na qual o ator é o autor (pelo menos em parte) do texto verbal da cena. Além disso, foi importante para meu amadurecimento diante desse objeto de pesquisa explorar, a partir de uma prática pessoal, como a discussão sobre a oralidade pode se relacionar com a criação da dramaturgia verbal de um espetáculo teatral. Meu interesse foi pensar em como levar para o trabalho do ator essas questões sobre a oralidade a partir da criação de exercícios de improvisação, fazendo ele perceber-se enquanto criador de suas falas. Outros questionamentos foram sobre como experienciar o silêncio e a palavra que nasce dessa ausência em relação com os signos do corpo no tempo e no espaço teatral; e como desenvolver exercícios de improvisação que ajudem o ator a perceber a palavra como necessidade e invenção, ao mesmo tempo. Essas foram as questões que orientaram a prática.

Para isto, foram desenvolvidas propostas de exercícios que eram levadas para os encontros a fim de serem vivenciados e explorados pelas atrizes que participaram da pesquisa prática. A seguir estes exercícios serão descritos e analisados a partir das questões sob a oralidade trazidas nos capítulos anteriores, tentando ver a criação oral do ator como uma fonte ampla de pesquisa em teatro, uma vez que apresenta muitas possibilidades de propostas de jogo, de projetos estéticos e de modos de improvisação para o ator, além de formas distintas de experienciar a relação com a linguagem verbal no fenômeno teatral.

A relação dessa prática com a dramaturgia contemporânea deu-se principalmente a partir da vontade de entender como poderia se constituir uma pesquisa sobre a oralidade em nosso contexto atual, relacionando a oralidade imediata (sem a escrita enquanto técnica textual) com as pesquisas em dramaturgia desenvolvidas pelos dramaturgos da segunda metade do século XX e início do século XXI, tais como Heiner Müller, Sarah Kane, Valère Novarina, Martin Crimp, René Pollesch, entre outros. Como pode a oralidade, entendida como uma forma de complementariedade entre a palavra e o corpo na construção se sentido, relacionar-se com uma textualidade performativa, a qual propõe a ruptura da relação de

identidade entre composição corporal e texto verbal, visando justamente criar uma fissura e um conflito entre o que o corpo do ator faz e o que é dito verbalmente?

O teatro performativo234, entendido como um tipo de dramaturgia que coloca a linguagem como uma realidade autônoma, cria um tipo de relação entre corpo e texto verbal diferente da relação proposta em um texto classificado dentro da estética realista235, organizado em torno dos diálogos dos personagens. Nos textos teatrais performativos236, a linguagem propõe um tipo de oralidade que parece captar discursos estranhos ao corpo do ator, como um discurso estrangeiro até mesmo à própria cena, explorando o signo linguístico como uma instância do fazer, no qual a fala do ator não está vinculada a uma identidade psicológica ficcional claramente reconhecível.

René Pollesch propõe em Cidade Roubada um uso da linguagem verbal que pode ser interpretado, nos trechos em caixa alta, como o descontrole da própria expressão linguística pelo corpo que fala:

B: Eu vou passear e aí percebo que essa estação de merda lá fora ainda não foi ativada como imóvel. E de repente o novo uso de aterros excedentes da cidade e sua ativação como imóveis é aplicado nos organismos humanos. EM MIM! OU EM VOCÊ! Essa puta aqui está desenvolvendo um perfil empreendedor. Como esse empreendimento de prestação de serviços ali fora. E aí você regula sua vida precária e vive por exemplo ilegalmente nesse município e como bordel sem registro. E A MERDA! Você vive nesse gás só como bordel sem registro. Aí essa tecnologia líquida de poder em você é CAÇA, você ativa marketing em você e libera poderosas áreas de venda. Aí tem lugares, e esses são regulados de maneira restritiva, sendo acessíveis ou não para você. ESSE LUGAR AQUI por exemplo! Ou esse lugar lá fora. Essa CIDADE NÃO É ACESSÍVEL PARA QUALQUER UM. O seu passeio é regulado por mercados desregulados. Você só anda lá fora PELA ADMINISTRAÇÃO DA CIDADE! E de qualquer jeito você só passeia pela administração. Seu passeio é ADMINISTRAÇÃO! Você anda pela cidade e o seu passeio é regulado pelo consumo, café com leite e design de arquitetura que você pode ver ou DISCUTIR.

F: Merda. E eu aqui trabalhando numa fábrica sem corpo. Num empreendimento que está se liqüefazendo. E toda essa MERDA à minha volta! Alguém está na construção progressiva dessa nova forma de domínio AQUI! Que é polvilhada em você, 234 Sobre esse tipo de textualidade, Stephan Baumgärtel, estabelece que: “Nestas práticas, assume-se a performatividade da cena para fins não representacionais, ou seja, fins que colocam no centro do interesse a semiose cênica e a percepção humana. Este teatro (que alguns chamam de pós-moderno, outros de pós- dramático, e outros de performativo) cria uma mimesis predominantemente não referencial, ou seja, não representa um espaço externo, mas faz os espectadores vivenciarem processos semióticos que simulam e assim problematizam os modos de criação e percepção das imagens, a invés de julgar o produto final segundo categorias (obsoletas no contexto atual) de veracidade e verossimilhança. (BAUMGÄRTEL. Op. Cit., p. 133).

235 Segundo Patrice Pavis, o realismo costuma ser aproximado do sentido de naturalismo ou ilusionismo. No teatro ele corresponde a “vontade de duplicar a realidade através da cena, imitá-la da maneira mais fiel possível. O meio cênico é reconstituído de modo a enganar sobre sua realidade. Os diálogos se inspiram nos discursos de determinada época ou classe socioprofissional. O jogo do ator torna o texto natural ao máximo, reduzindo os efeitos literários e retóricos pela ênfase na espontaneidade e na psicologia. (…) Muitas vezes, no entanto, o naturalismo não ultrapassa o realismo em razão do seu dogma da cientificidade e do determinismo do meio ambiente. A realidade descrita se apresenta como intransformável, como essência eternamente hostil ao homem. (PAVIS. Dicionário de teatro. Op. Cit.). 236 Como já foi citado anteriormente, são exemplos dessa teatralidade textual o textos de Heiner Müller,

portanto em MIM! Chamado gás, que tira a corporalidade da fábrica. QUEM ERA MESMO? MERDA! Eu não tenho mais uma maldita vida, deve ter sido vendida de algum jeito, bem quando eu não estava olhando. Não tenho MAIS A VIDA DE MERDA! QUE BOSTA! Tinha uma coisa, e algumas coisas me fazem lembrar de alguma coisa que eu tinha, mas que de algum jeito se dissolveu no ar. E aí, onde eu vivia, ali agora tem uma área de vendas. ESTÁ ALI AGORA! E ali eu me vendo. EU NÃO ESTOU AGÜENTANDO! 237

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Esse aspecto não causal na relação entre expressividade corporal e linguagem verbal aponta para uma experiência linguística aparentemente caótica, polifônica, organizada sob uma lógica distinta da de causa e consequência, apresentando, algumas vezes, os discursos de forma não linear.

A linguagem performativa, nesse sentido, é entendida a partir de teorias sobre o texto teatral contemporâneo, as quais definem certos textos (como os de Heiner Müller e Valère Novarina, por exemplo) como pertencentes a uma textualidade que estabelece a linguagem verbal como um plano autônomo dentro do texto espetacular (conjunto de signos linguísticos e não-linguísticos do evento teatral). Esse sentido de autonomia difere do estabelecido na

Poética238 de Aristóteles, na qual a catarse pode existir na leitura do texto trágico,

independentemente da sua encenação. Como na linguagem textual performativa o texto está sob uma relação não naturalista entre corpo e fala e as ações que movem o texto se dão por motivações não causais, a enunciação verbal pode então conflituar com o corpo do falante e fazer-se perceptível como algo que atravessa o próprio locutor do discurso. Com isso, esses textos propõem outros modelos de uso da linguagem verbal no teatro, distintos dos que propõe os textos de estética realista, por exemplo. Nestes, constituídos por textos de organização causal e dialógica, o texto verbal desaparece sob um modelo de ação naturalista e as falas passam a ser identificadas como pertencentes a uma unidade psicológica, comumente identificada pela noção de personagem239. Dessa forma, nos textos teatrais performativos, o que se estabelece é uma relação polifônica (na qual um self organizador do discurso não consegue ser identificado) podendo ser entendida a partir do sentido que Mikhail Bakhtin estabelece para esse termo240.

A palavra falada coloca-se, dessa forma, como uma experiência, um caminho a ser

237 POLLESCH, René. Cidade Roubada. Tradução não publicada de Christine Röhrig, 2003, estreia alemã no Prater/Volksbühne Berlin, 2001.

238 ARISTÓTELES; HORÁCIO; LONGINO. A poética clássica. São Paulo: Cultrix, 1997.

239 A linguagem verbal na estética naturalista integra a seguinte concepção de uso da linguagem verbal: “A língua empregada reproduz sem modificações os diferentes níveis de estilo, dialetos e modos de falar próprios de todas as camadas sociais. Dizendo seu texto de modo hiperpsicológico, o ator procura sugerir que as palavras e a estrutura literária são talhadas no mesmo estofo que a psicologia e a ideologia da personagem. Acha-se assim banalizada e negada a fatura poética ou literária do texto dramático: a estética burguesa da arte como expressão psicológica esforça-se para camuflar todo o trabalho significante da encenação, trabalho de produção de sentido, dos discursos e dos mecanismos inconscientes da cena (prática significante, efeito de real)”. (PAVIS, Patrice. Dicionário de teatro. Op. Cit., grifo meu.)

trilhado no qual a lógica é construída passo a passo. O que há são relações que formam uma identidade textual, um universo de falas que dialogam. Cada núcleo frasal pode ser entendido como uma unidade semântica, de forma a perceber o texto como um mosaico de vozes e, consequentemente, com um sentido pulverizado. Não é mais alguém que nos fala, com uma identidade reconhecível como faziam os personagens do drama realista241, mas a língua e os múltiplos textos (de fontes infinitas) que compõe nossa experiência contemporânea.

Desse modo, se no drama realista a linguagem pode ser explorada de modo a criar um certo domínio sobre o universo ficcional construído pelo texto, artificialidade que em parte pode ser reconhecida com o uso racionalista da linguagem, no qual o sujeito que fala tem controle sobre o que diz, os textos performativos apontam para o rompimento desses aspectos. Os textos chamados realistas representam um tipo de escrita, a qual propõe um tipo de oralidade específica: uma oralidade ligada às ações cotidianas e envolvida em diálogos causais. Porém, essa forma específica de entender a linguagem verbal estabelece no palco um tipo próprio de oralidade e, consequentemente, uma relação específica entre a língua e o corpo. A linguagem também permite outras formas de expressão e propõe outros tipos de relação com o corpo, o contexto e a vida.

Esses novos tipos de escrita textual como os textos de Heiner Müller, Martin Crimp, René Pollesch e outros, interessam a uma pesquisa que privilegia a discussão sobre a oralidade imediata porque suas estruturas podem embasar a criação de novas formas de improvisação para o ator. Consequentemente, podem ser utilizados para novas propostas de criação oral, o que corresponde ao uso dessas textualidades escritas para a ampliação da ideia de teatralidade na língua e, consequentemente, a criação de outros tipos de oralidade, além das formas dialógicas cotidianas ou causais, organizadas em torno de uma identidade psicológica definida.

A partir desses questionamentos foram desenvolvidos na prática exercícios de improvisação oral que tentam problematizar a relação entre texto verbal e composição corporal, assim como ver a criação oral como forma de jogo para o ator e tentar perceber como essa dramaturgia se relaciona com a noção de encontro e contexto cênico, discutidos no capítulo anterior.

Foram, então, elaborados e experimentados os seguintes exercícios de construção oral:

241 Além dos aspectos apontados anteriormente, o realismo, segundo Patrice Pavis, “é uma corrente estética cuja emergência se situa historicamente entre 1830 e 1880. É também uma técnica capaz de dar conta, de maneira objetiva, da realidade psicológica e social do homem”. No teatro, ele costuma ser identificado com a ideia de ilusão ou naturalismo, os quais tem o objetivo de tentar reproduzir a realidade através da cena, de modo que o ator torna o texto o mais natural possível. Isso o leva a colocar ênfase na espontaneidade e na psicologia da realidade descrita no texto dramático. (PAVIS, Dicionário de teatro. Op. Cit.).

O encontro – Uma vez que a construção oral é entendida como uma criação que nasce principalmente do encontro entre as pessoas presentes, fez-se importante experienciá-lo junto à ideia de percepção do outro. Para isso, com os atores espalhados pelo espaço de ensaio propôs-se as ações de: Caminhar livremente; parar; olhar a pessoa que está diante de si; perceber; recomeçar a caminhar; parar; olhar, até que cada um pudesse ter passado por vários colegas de trabalho. O objetivo foi experienciar esse encontro silencioso até que todos tivessem experimentado essa sensação de encontrar alguém sem expectativas sobre o que se daria nesse encontro, apenas voltando-se para a apreensão das sensações, das impressões e dos sentidos que essa ação lhe proporciona e instiga a sentir no momento presente da aproximação com essa outra pessoa.

O abraço – A instrução para esse exercício foi: formar um círculo em grupo; caminhar em sentido horário ou anti-horário; parar; pedir que um ator fosse até o centro do círculo e os outros (um de cada vez) fossem até ele e o abraçassem242. Nesse exercício surgiu uma dramaturgia cênica do encontro e do abraço entre os atores. Já foi possível identificar núcleos de sentidos que podiam ser explorados e desenvolvidos. Nesse primeiro momento, ainda não foi proposto aos atores que falassem. O exercício foi realizado em silêncio. O objetivo era que fosse experimentado o encontro com o outro, a relação (através do olhar, do encontro e do abraço) e a necessidade de comunicação. Esperava-se que eles sentissem no encontro com a outra pessoa o impulso anterior à fala.

Os atores que realizaram esse exercício disseram que ao realizá-lo já sentiam vontade de falar alguma coisa, que a proposta é carregada de sentidos e que veio a sua imaginação coisas que poderiam ser ditas.

A proposta, mesmo sendo muito simples na sua forma, já apresenta esboços de uma dramaturgia muito forte. É possível identificar núcleos de sentido em cada dupla que se encontra.

Uma reflexão que se deu a partir da observação do exercício é que a noção teatralidade está vinculada à ideia de dramaturgia. O exercício é muito teatral porque nele é possível verificar a existência de núcleos de sentido, o que corresponde a uma dramaturgia não-verbal em potencial. Esse sentidos, de forma alguma, aparecem fechados ou definidos, porém a teatralidade do exercício só surgiu porque esse sentidos estavam latentes. A dramaturgia, por sua vez, também se deu por causa desses sentidos propostos. Não havia o uso de falas, mas era possível remeter cada encontro a um universo ficcional, a alguma narrativa ou algum tipo

242 Conheci esse exercício do círculo em que um ator vai até o centro e alguém vai até ele para abraçá-lo numa oficina sobre tragédia grega realizada com Marisa Bentancur, realizada no 14º Porto Alegre em Cena, chamada de “Os coros trágicos”. O exercício de encontrar e abraçar era todo realizado em silêncio.

de conflito. A abertura para vários sentidos deixava muitas construções ficcionais latentes ao mesmo tempo. Dessa forma, se esse exercício do encontro for desenvolvido para a construção de uma cena, esse leque de possibilidades pode ser desenvolvido em mais ações e, talvez, ir fechando-se em sentidos mais específicos. Contudo, nesse momento, sua força cênica está em que essa abertura faz dele um objeto que contém múltiplas leituras possíveis.

Encontro com pequenas palavras – Com os atores organizados em duas filas ou colocados em pontos afastados da sala (um grupo de frente para o outro), pediu-se que um a um de cada lado caminhasse até o centro da sala. Ao chegar ao centro, de frente para o outro colega, deveria apenas olhar em silêncio e despedir-se (experienciando o encontro e o afastamento). Na segunda vez, deveria parar, olhar, perceber os sentidos que esse encontro lhe proporcionava e, sem pressa, dizer uma palavra para ao outro (cada ator de uma vez). Depois disso, uma vez mais repetiu-se essas ações (caminhar, encontrar, olhar, perceber,

sentir, despedir) e cada ator, em seu tempo, deveria dizer uma frase ao outro. A fala não