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Jornalismo online, webjornalismo e jornalismo digital

Para falar em jornalismo digital na década de 2010 é imprescindível repensar a estrutura de produção e distribuição do jornalismo bem como as organizações que controlam ou pensam que controlam esse processo. Assim, em contraposição ao "thinking the unthinkable"9, o desafio pré-estabelecido é "rethinking journalism rethought", ou em tradução livre, "repensar o jornalismo reconfigurado", em que questões morais e normativas da profissão como credibilidade, formas de participação e ações jornalísticas emergentes fazem parte do contexto (PETERS e BROERSMA, 2012). Na mesma perspectiva, as estratégias e modelos de negócios para o campo jornalístico também vêm sendo tentadas pelas organizações para criar e incorporar valor, desenvolvendo ações digitais para o jornalismo, buscando adequá-lo às características da sociedade digital.

Rosental Calmon Alves (2006) ao parafrasear Gabriel García Márquez, infere que o jornalismo digital seria como a crônica de um "jornalismo anunciado", previsto por muitos há décadas, mas só percebido de fato com a criação da WorldWide Web (www) que integrou computadores à internet e levou o jornalismo para uma mudança sem volta: a ambiência da rede criaria uma nova forma de pensar, pesquisar e produzir digitalmente.

9 Frase de grande repercussão do matemático Clay Shirky, que, em tradução livre quer dizer "pensando o impensável". Ela pode ser acessada através do link disponível em : http://www.shirky.com/weblog/2009/03/newspapers-and-thinking-the-unthinkable/.

47 As redações, antes mesmo da internet, tentavam estabelecer uma "Comunicação Mediada por Computador" com iniciativas de vídeo integradas ao texto até surgir a internet e transformar todas estas atividades (CALMON ALVES, 2006).No entanto, as empresas de comunicação passam a entender a rede como uma ferramenta de distribuição de conteúdos em outros formatos ou até como complemento do produto tradicional dessas empresas - e não como uma mídia com características próprias e diferenciais, o que podemos considerar como um modelo de negócios assimilado pelos jornais diários, por exemplo, e que ainda persiste.

Assim, esta primeira década do jornalismo digital foi caracterizada por este pecado original: a simples transferência do conteúdo de um meio tradicional para outro novo, com pouca ou nenhuma adaptação. Nos Estados Unidos, esse processo ficou conhecido como shovelware, um termo que acabou sendo pejorativo, por demonstrar a preguiça e a falta de visão das empresas que se lançavam muito timidamente à web. (CALMON ALVES, 2006, p.94).

Nesse sentido, em meio a uma crise econômica mundial que atinge o jornalismo, acreditar e investir na internet como meio de comunicação que pode garantir a sobrevivência de mídias tão tradicionais parece premissa para o jornalismo do século XXI. No entanto, nos últimos anos, parece que essa classificação está voltada apenas ao fato de transpor conteúdo noticioso de plataformas impressas e audiovisuais para uma ambiência digital.

O jornalismo digital não é o jornalismo online e também não é o webjornalismo pois, em síntese, esses dois últimos fazem parte de um conjunto amplo de características de dois campos: o do jornalismo, com suas premissas basilares de estruturação (normas e práticas), e o das tecnologias digitais, que transformam a concepção de visão, distribuição e consumo informativo. Dessa forma, a junção desses dois campos forma o conjunto amplo do jornalismo digital, que com o passar dos anos e com as transformações tecnológicas também recodifica a modelagem das práticas jornalísticas e vai estabelecendo outras formas de produzir notícia com internet. Os conjuntos menores começam a serem usados, então, como definição, sendo os principais: webjornalismo e jornalismo online, mais referenciadores da produção de informação para a rede e em rede, respectivamente (CALMON ALVES, 2006).

Porém, neste estudo, o jornalismo digital é encarado e definido como campo de atuação e de produção, não só como segmentação do jornalismo para audiências específicas, já que vivemos uma realidade conectada, na qual a notícia aparece primeiro em formato de tópicos na rede social, por exemplo (CANAVILHAS, 2006; PETERS e BROERSMA, 2013). Dessa forma, nesta pesquisa, pensa-se o jornalismo digital como status do jornalismo contemporâneo como

48 um todo, isto é, onde todas as operações de uma redação, não importa a plataforma, são digitalizadas.

Nesse sentido, o jornalismo digital não é simplesmente uma extensão do que se produz para as versões impressas, por exemplo, e também já não pode ser encarado como uma tendência, pois a ambiência digital faz parte do entendimento do que se é produzido na atualidade. O jornalismo digital também não pode ser encarado como um jornalismo baseado em interatividade unicamente, portanto não é só comunicação online; também não se caracteriza pelo fato de ter um site e estar "publicado" em uma página web. O jornalismo digital emerge da rede, associa plataformas de atuação que envolvem preceitos da contemporaneidade como conexão e mobilidade.

1.3 - O jornalismo digital como campo de estudos e segmentações:

As terminologias são muitas: jornalismo online, webjornalismo, ciberjornalismo, jornalismo interativo, jornalismo de novas mídias, jornalismo multimídia, no entanto todos esses citados fazem parte de um grande campo, cada vez mais denotado para as organizações jornalísticas, sendo parte da preocupação estratégica e futura das mesmas, que é o jornalismo digital ou jornalismo de redes digitais.

Para diferenciá-lo dos outros tantos termos similares e provenientes da prática profissional para internet ou pela internet, começa-se com uma diferença preliminar: a internet não significa o mesmo que a web.

De acordo com Castells (2001), a internet é uma plataforma virtual que reúne um extenso número de dados provenientes de um conglomerado de redes nacionais e internacionais, sendo possível acessá-los via rede. Ela nasce em 1969 com a iniciativa da Arpanet, criação do Departamento de Defesa dos Estados Unidos por meio do financiamento do Advanced Research Projects Agency (Arpa), primeira rede operacional de computadores à base de comutação de pacotes, com o objetivo de integrar as bases militares norte-americanas com os departamentos de pesquisa. Tal feito é entendido como precursor da internet que, anos depois, continua sendo uma plataforma digital com elevado processamento de dados. Assim, em meados da década de 1960, ter uma rede de computadores interligados e preparados para o contexto de possíveis guerras era uma arma simbólica de informação concentrada por meio da transmissão de dados que evolui com a disseminação da conexão à internet até seu uso comercial. A internet, então, emerge com a função de transmissão de conteúdos de diversos tipos.

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Diante dessa plataforma multifacetada, diferencia-se a web como uma parte integrante da internet, já que a World Wide Web foi criada pelo físico Tim Berners-Lee, na década de 1990, para oferecer um dos possíveis e inúmeros serviços que a internet ainda iria disponibilizar, agregando texto, aúdio e vídeo, por exemplo, fazendo com que conteúdos hipermidiáticos fossem cada vez mais consumidos. Nesse sentido, a web pode ser caracterizada como uma interface que começou a facilitar o acesso dos usuários assim que a conexão se espalhou, servindo para que a intercomunicação entre usuários e máquinas pudesse ser facilitada. Assim, a informação aparecia de uma forma mais amigável ao leitor e a partir de então a web seria uma espécie de interface da internet que se tornaria global e reconhecida pelos usuários através das URL's das páginas que iniciam com www. (CASTELLS, 2001).

É por isso que, de antemão, não se pode considerar o webjornalismo como sinônimo do jornalismo digital, já que essa denominação implica a limitação do jornalismo de web, isto é, de conexão e interação,a páginas/interfaces tipicamente denominadas de homepages, sites, websites.

O webjornalismo traz novas linguagens e formas de se reportar na web e devido à web, reorganizando a disposição da notícia, criando novos modelos como o proposto também por Canavilhas (2007)de transposição da pirâmide invertida para a deitada, que remete a um outro tipo de leitura na web, a horizontal. E esse é só um dos exemplos de algumas ferramentas próprias da web que começaram a ser utilizadas para produção e distribuição de notícia.

Para Canavilhas (s/a), a denominação correta para o momento que vividopelo jornalismo com a internetnão só altera a forma de produzir, mas muda "radicalmente" a forma do leitor acessar a notícia. Por isso, segundo o autor, não se pode denominá-lo de jornalismo online.

Outros pesquisadores tratam essa área do jornalismo como um segmento e o denominam como jornalismo online, o que, na ótica desta pesquisa, não seria adequado, já que se limitaria a um jornalismo feito estritamente em conexão ativa com a internet, restringindo bastante o tipo de jornalismo que se tenta classificar, aqui, baseado no suporte, no meio de distribuição e de transmissão de inúmeros dados informacionais, unindo dois campos de conhecimento.

O jornalismo online seria, então, o jornalismo transposto ao meio online, que significa estar disponível em tempo real, que remete à comunicação instantânea com transmissão de dados com imediatez seja por áudio ou texto.No contexto dos sistemas de informação, o jornalismo online é aquele que está em operação, ativo por causa da internet. Isso, então, limitaria o jornalismo digital à conexão em tempo real, bem como o webjornalismo limitaria o

50 JD ao jornalismo produzido para interfaces "amigas", que permitem leitura adaptável a novos nichos de audiência que se formam com a internet - públicos com leitura cada vez mais segmentada e fragmentada (CANAVILHAS, s/a).

Para concluir essa diferenciação, concordando com Canavilhas (2006) e Deuze (2001), a pesquisa entende que o webjornalismo representa uma evolução do jornalismo online. Em outras palavras, o online seria o jornalismo que atende à conexão com atualização constante, utilização de hipermídia, guardadas às proporções e restrições de cada mídia, o que seria uma transposição do suporte de origem para o online. Já na fase do webjornalismo/ciberjornalismo, "as notícias passam a ser produzidas com recurso a uma linguagem constituída por palavras, sons, vídeos, infografias e hiperligações, tudo caminhado de forma a que o utilizador possa escolher o seu próprio percurso de leitura" (CANAVILHAS, 2006, p.114).

A internet e a web promoveram uma nova concepção da produção de conteúdos noticiosos, remodelando as práticas jornalísticas quase que obrigatoriamente. Nesse sentido, o jornalismo para além do online e do webjornalismo faz parte de um mundo virtual não palpável, classificado como ciberespaço (LÉVY, 2010), mais facilmente identificado pela conexão à grande rede mundial de computadores conectados à internet.

Então, as novas formas de produção e distribuição do jornalismo dentro da ambiência digital, explorando as características do meio internet, é o que esta pesquisa entende como amplo campo de atuação: o jornalismo digital, que transforma e reconfigura as práticas profissionais, os próprios jornalistas e, especialmente, a estruturação dos modelos de negócios das organizações jornalísticas. Estas, na última década, passam a lidar mais intensamente com ele enquanto parte integrante da estratégia de mercado e não meramente como um segmento dialético entre online e offline e impresso versus digital.

O jornalismo digital, então, pode ser diferenciado das terminologias e conceituações anteriores (como jornalismo online e webjornalismo) a partir do entendimento de que a internet é um suporte que auxilia e reconfigura a produção de notícias. De certa forma, ele pode ser definido de acordo com o suporte técnico e o meio de difusão de conteúdos semelhante às discussões para definir jornalismo impresso, televisivo, radiofônico e de internet, mas que por ser um tema em mutação, vai desenvolvendo terminologias que mudam/evoluem por causa dos avanços das pesquisas sobre internet e dispositivos tecnológicos influenciadores do jornalismo (MURAD, 1999 apud CANAVILHAS, 2006).