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3 A HOMOLOGAÇÃO DE ACORDOS EXTRAJUDICIAIS NA JUSTIÇA DO

3.1 CONDIÇÕES PARA A HOMOLOGAÇÃO DE ACORDO EXTRAJUDICIAL

3.2.2 Jurisdição voluntária e contenciosa

153 DIDIER JUNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. v. 1. 18. ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 164. 154 CINTRA; Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria

Geral do Processo. 31. ed. São Paulo: Malheiros, 2015. p. 343.

A doutrina clássica admite a divisão dicotômica da jurisdição, a qual se traduz em jurisdição voluntária e contenciosa. Todavia, a corrente majoritária entende que aquilo que se chama de jurisdição voluntária, em verdade, é administração pública de interesses privados, ou seja, atividade tipicamente administrativa.

Leonardo Greco adverte que apesar de a diferenciação entre a jurisdição voluntária e contenciosa ainda existir, esta perdeu muito da sua importância, principalmente no sistema processual brasileiro que adota procedimentos muito parecidos para os dois casos.156

Inicia-se, então, pelo conceito de jurisdição contenciosa, o qual se confunde com o próprio conceito clássico de jurisdição.

Em termos singelos, a jurisdição contenciosa é aquela que pressupõe lide, aqui entendida em seu conceito Carneluttiano, caracterizada pelo conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida.

Cintra, Grinover e Dinamarco, adeptos da ideia de que jurisdição voluntária é atividade meramente administrativa, elegem como critérios distintivos da jurisdição (a qual para eles se resume na sua modalidade contenciosa): a presença de lide, a substitutividade e o escopo de atuação do direito.

A substitutividade, consiste na substituição das partes por um juiz ou árbitro, o qual dirá de maneira definitiva quem está com a razão. Nas palavras dos autores, “A única atividade admitida pela lei quando surge o conflito é a do exercente da jurisdição (juiz ou árbitro), que substitui a das partes”.157

O escopo jurídico de atuação do direito é a própria realização no plano concreto do direito material. “Trata-se de garantir que o direito objetivo material seja cumprido, o ordenamento jurídico preservado em sua autoridade e a paz e a ordem na sociedade favorecidas pela imposição da vontade do Estado”.158 Observe-se que não há como negar que esse fim também se aplica à jurisdição voluntária.

Agora, cabe tratar do conceito de jurisdição voluntária.

Conforme Fredie Didier Júnior, “a jurisdição voluntária é uma atividade estatal de integração e fiscalização. Busca-se do poder judiciário a integração da vontade, para torná-la apta a produzir determinada situação jurídica”.159

156 GRECO, Leonardo. Jurisdição Voluntária Moderna. São Paulo: Dialética, 2003. p. 61.

157 CINTRA; Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria

Geral do Processo. 31. ed. São Paulo: Malheiros, 2015. p. 166.

158 Ibidem, p. 166.

159 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil. v.1. 18. ed. Salvador: Ed. JusPodivm, 2016.

Cândido Rangel Dinamarco sintetiza as características da jurisdição voluntária:

Em síntese, as características distintivas da jurisdição voluntária são essas: a) é atividade jurisdicional e não administrativa, (b) destina-se à tutela de pessoas em casos de conflito, (c) não consiste em dirimir diretamente conflitos entre elas, (d) consequentemente, não são julgadas pretensões antagônicas e (e) destina-se a dar tutela a uma das partes, previamente determinada, ou a ambas, sem se colocar para o juiz a escolha entre tutelar um delas ou a outra.160

Nas palavras de Leonardo Greco:

a jurisdição voluntária é uma modalidade de atividade estatal ou judicial em que o órgão que a exerce tutela assistencialmente interesses particulares, concorrendo com o seu conhecimento ou com a sua vontade para o nascimento, a validade ou a eficácia de um ato da vida privada, para a formação, o desenvolvimento, documentação ou a extinção de uma relação jurídica ou para a eficácia de uma situação fática ou jurídica.161

A jurisdição voluntária se justifica como instituto, porque existem certos atos decorrentes da vontade humana que só podem produzir os efeitos desejados depois de fiscalizados pelo Estado, corporificado, nesse caso, na figura do magistrado. Este integrará a vontade das partes, fazendo com que essas possam produzir os efeitos por elas desejados.

Leonardo Greco afirma que todas as tentativas e critérios utilizados para distinguir a jurisdição voluntária da contenciosa são falhos, dado o grau de heterogeneidade de procedimentos que se encaixam no rol da primeira:

Apesar das divergências de opinião, há algumas características que geralmente são apontadas pela doutrina para diferenciar a jurisdição contenciosa e a jurisdição voluntária.

Na primeira haveria lide, na segunda não; na primeira haveria partes em posições subjetivas antagônicas, na segunda apenas um ou mais interessados concordantes em suas postulações; a primeira incidiria sobre situações fáticas preexistentes, enquanto a segunda teria caráter constitutivo; a primeira seria repressiva e a segunda preventiva; na primeira a atividade judicial seria substitutiva da vontade das partes, na segunda os interessados dependeriam da concorrência da vontade estatal manifestada pelo juiz, sem a qual não poderiam alcançar o efeito jurídico almejado; na primeira o juiz tutelaria direitos subjetivos, enquanto na segunda, meros interesses; na primeira, os procedimentos previstos em lei não seriam exaustivos, na segunda o juiz somente poderia atuar com expressa previsão legal; na primeira haveria formação de coisa julgada, na segunda não; na primeira o juiz estaria adstrito ao pedido do autor, enquanto na segunda o juiz poderia agir de ofício ou adotar providencia diversa da que lhe fosse requerida.

160 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 6. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.

p. 329.

Todos esses critérios são imperfeitos, porque a jurisdição voluntária abrange uma variedade tão heterogênea de procedimentos, nos quais sempre vamos encontrar o desmentido de um ou de outro desses critérios.162

Em que pese a crítica do autor, levando em consideração que a distinção aqui é feita tomando por base o procedimento objeto deste estudo - homologação de acordo extrajudicial - distinguir-se-á as duas espécies de jurisdição da maneira como comumente é feita.

Portanto, a jurisdição contenciosa é aquela em que o juiz resolve um conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida, ou seja, é aquela que em sua essência carrega a lide. E, a jurisdição voluntária, por sua vez, não tem como foco a decisão de um conflito de interesses, mas sim o objetivo de integrar um negócio jurídico celebrado entre as partes que vão a juízo para que ele possa produzir legitimamente os efeitos desejados, dada a necessidade de fiscalização pelo Estado. É, portanto, a jurisdição exercida sem a lide posta em juízo.