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3. RECURSOS II: MÚSICA E ELECTRÓNICA

6.2. Köln

Na origem do estúdio de Köln e da elektronische Musik está o encontro, entre 1948 e 1950, de quatro indivíduos com perspectivas complementares sobre a relação entre recursos electrónicos e música: Werner Meyer-Eppler, director do Departamento de Fonética da Universidade de Bonn; Homer Dudley, que em 1948 apresentou a Meyer-Eppler o récem- criado Vocoder (cf. 3.8), Robert Beyer, da NWDR, que já em 1928 tinha escrito um artigo em que discutia o uso de instrumentos electrónicos na composição musical, e que assistiu em 1949

Fig. 6.3 – Stockhausen operando a mesa rotativa,

em 1 958 (Ho lmes 200 2: 141).

a uma conferência de Meyer-Eppler, na Nord-West Deutsche Musik Akademie, em Detmold; e Herbert Eimert, compositor, que dirigiu inicialmente o novo estúdio (Manning 1993: 43-44). Nos cursos de Darmstadt de 1950 – em que Varèse esteve presente como professor convidado (cf. cap.5; 2.5.4) – Meyer-Eppler, Beyer e Eimert associaram-se informalmente com o fim de fomentar o desenvolvimento da elektronische Musik (Manning 1993: 44). Entretanto, após algumas experiências baseadas na síntese por gravação sucessiva em fita magnética (Klangmodelle) decidiram, juntamente com Fritz Enkel, criar um estúdio, que ficou parcialmente operacional a partir de fins de 1952 (Manning 1993: 44-45). Uma parte considerável do equipamento foi projectada pelo próprio Enkel.

No início de 1954 havia no estúdio três gravadores – de uma pista, de quatro pistas e de velocidade variável (Manning 1993: 53). Holmes (2003: 102-103) refere que em 1957 a maioria dos estúdios ainda usavam gravadores de duas pistas: como vimos Paris possuia apenas de um três pistas (embora dispusesse de facilidades de espacialização graças ao potentiomètre d’espace). No mesmo ano em

que era estreado o Poème Electronique, Stockhausen explorava as possibilidades de sugerir movimentos espaciais através de quatro canais, inventando um processo semi-mecânico de obter movimentos de translação do som: uma mesa rotativa, accionada manualmente, com um altifalante em cima, colocado numa caixa que o tornava mais direccional (fig. 6.3). Este dispositivo, usado em Kontakte, é um testemunho de como nesta época o equipamento era frequentemente inventado ad hoc, em função de necessidades específicas do compositor.69

O gravador de velocidade variável era um Magnetophon da AEG – um dos primeiros modelos – adaptado para ter uma gama de velocidades de 9 cm/s a 120 cm/s (Manning 1993: 53-54), i.e., numa relação de 1:13,33, permitindo numa só operação transposições até três oitavas e uma sexta.

A curva de resposta dos gravadores seria extensa nos agudos, devido às velocidades elevadas então usadas. No gravador de velocidade variável podiam mesmo ser usados sinais inaudíveis de 30 kHz, que aplicados a um modulador em anel o transformavam numa forma elementar de VCA (Manning 1993: 62-63): como o modulador em anel só apresenta sinal à

saída se ambas as entradas tiverem sinal, ao aplicar um sinal intermitente a uma das entradas é possível fazer que o sinal aplicado à outra apareça na saída alternando entre breves fragmentos de som e de silêncio, sem necessidade de corte e colagem.

Uma outra técnica de modulação de amplitude disponível consistia num amplificador cujo volume era controlado por uma LDR (light dependent resistor, componente electrónico cuja resistência varia com o nível de luminosidade incidente) associada a uma fonte luminosa, da qual estava separada por uma película transparente móvel, pintada com um verniz opaco de forma a deixar passar mais ou menos luz conforme se pretendia mais ou menos som (Manning 1993: 64).

Havia um filtro passa-banda, com possibilidade de variar a frequência central e o factor Q (e consequentemente a largura de banda),70

e que podia ainda actuar como filtro passa-baixos ou passa-altos (Manning 1993: 58). Se por um lado havia limitações por ser um único filtro, por outro lado ele permitia variar continuamente a frequência central – ao contrário dos bancos de filtros que mais tarde se vulgarizaram (cf. Manning 1993: 59).

O estúdio dispunha também de um banco de filtros, com frequências centrais de 75, 150, 300, 600, 1.200, 2.400 e 4.800 Hz (Manning 1993: 60), que podiam ser ligados ou desligados a partir de uma fita contendo sinais de controlo entre 1.000 e 5.000 Hz. O sinal desta fita de controlo atravessava filtros ressonantes com um factor Q elevado, ligados a detectores de sinal e relés (Manning 1993: 64), um princípio idêntico ao que foi usado no pavilhão Philips para controlar as luzes e a espacialização (cf. 7.1.3).

Como fonte de sinal o estúdio dispunha inicialmente de um único oscilador sinusoidal (Manning 1993: 48) e toda a síntese era feita por sobreposição sucessiva. Mas a concepção do estúdio previa três outras fontes: um gerador de ruído branco e dois instrumentos electrónicos, um Melochord e um elektronik Monochord (Manning 1993: 48-49).

O Melochord era um instrumento electrónico solista com dois teclados monofónicos, cujas saídas eram independentes. Cada teclado tinha 37 teclas (3 oitavas, ampliáveis a sete por transposição de oitava) e estava afinado em temperamento igual. Possuia um pedal regulador de volume e para cada nota era possível activar, cada vez que era tocada a tecla, um gerador básico de envolvente que controlava apenas ataque e decaimento (Manning 1993: 48). Este gerador de envolvente podia ser colocado em auto-triggering, produzindo uma modulação periódica de amplitude, mas esta possibilidade não foi alvo de grande atenção (Manning 1993:

62). O Melochord oferecia ainda possiblidades básicas de filtragem dos harmónicos agudos (Manning 1993: 49), mas numa versão de 1953 um dos teclados podia mesmo activar filtros que controlavam o timbre do outro teclado (Holmes 2003: 102; Davies 2001a: 770).

O elektronik Monochord era uma variante do trautonium, mas com teclado. Encomendado a Trautwein e completado na oficina do estúdio por Fritz Enkel, possuia dois teclados monofónicos, com saídas independentes (Manning 1993: 48). Permitia controlar independentemente o tamanho dos intervalos (não estava assim limitado ao sistema temperado). Gerava onda em dente de serra. Possuia um pedal de volume e a dinâmica dependia também da pressão nas teclas (Manning 1993: 48). Dispunha ainda de possiblidades básicas de filtragem dos harmónicos agudos (Manning 1993: 49)

Na prática estes instrumentos foram pouco explorados, já que os músicos de Köln – em virtude de uma filosofia algo dogmática da parte de Eimert – trabalhavam essencialmente em dois sentidos: criar sons por acumulação de componentes sinusoidais (síntese aditiva) e filtrar selectivamente ruído branco (síntese subtractiva).