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Capítulo II – A Autogestão da Condição Crónica

2.2 Lay Leds e os programas de educação para a autogestão

Lorig e seus colaboradores (2001) foram pioneiros na utilização de pares como mentores na implementação de programas de autogestão. A sua intervenção focaliza-se na motivação dos doentes crónicos para a adesão ao regime terapêutico e uma gestão eficaz da sua vida. A utilização de pares peritos na condição crónica nos programas de educação representa uma mudança radical no papel dos pacientes peritos na sua condição crónica, tradicionalmente considerados utilizadores dos serviços de saúde, para um papel de colaboradores e parceiros na prestação de cuidados. O “Lay-Led”, de um modo geral, tem a mesma condição crónica dos participantes do programa ou pode ser um cuidador perito nessa doença crónica, e desempenha o papel de modelo na autogestão da sua condição.

Os autores procuraram avaliar os benefícios da inclusão de lay-led’s no seu programa de educação para a autogestão. Num ensaio clinico (RCT), participaram 489 sujeitos e o programa CDSMP foi realizado essencialmente por Lay Leds que foram submetidos a vinte horas de treino que incluía estratégias de promoção da autoeficácia (construção de planos de ação e feedback da evolução, modelagem dos comportamentos de autogestão e persuasão social) e um manual de apoio à educação para a autogestão. Os resultados revelaram que os participantes, após um ano, melhoraram significativamente os comportamentos relacionados com o estado de saúde (exercício físico, fadiga, dor, funcionalidade, depressão), na perceção e gestão dos sintomas, na comunicação com os médicos, na autoeficácia e ainda reduziram as suas visitas à urgência hospitalar quando comparado com o grupo de controlo que não foi submetido ao programa (Bodenheimer et al., 2002; Holman & Lorig, 2004).

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Apesar destes resultados demonstrarem, de forma evidente, os benefícios associados ao programa, ainda permanecia a dúvida na comunidade científica acerca das vantagens na utilização de Lay Led’s nos programas de educação para a autogestão. Deste modo, Lorig e seus colaboradores (2001) realizaram um estudo experimental aleatório (RCT) onde procuraram avaliar a eficácia do programa de educação com a utilização de Lay- Led’s. Os participantes foram divididos em três grupos: o grupo A orientado por Lay Leds; o grupo B orientado por profissionais de saúde; e o grupo C que não foi submetido a intervenção. Após quatro meses da intervenção, os resultados revelaram que os grupos A e B apresentaram melhorias nos conhecimentos sobre a condição e a prática de exercício. Apenas o grupo A revelou melhoria no relaxamento e no estado funcional. Não se observaram diferenças significativas no grupo C (controlo). Quatro anos após a intervenção, os resultados foram relevantes na melhoria do estado de saúde no grupo A, na diminuição significativa do número de hospitalizações e de recorrências aos serviços de urgência, resultados que permitiram destacar não só os benefícios dos Lay Led’s ao nível da saúde mas também as vantagens na diminuição dos gastos relacionados com a saúde (Holman & Lorig, 2004; Newbould et al., 2006).

A relação custo benefício, também tem sido uma preocupação dos autores que construíram programas de educação para a autogestão da condição crónica. Marks, et al., (2005) referem-se ao estudo realizado por Janz e Dodge, (1999) que procuraram associar os custos hospitalares e o custo do programa (Lay Led’s colaboradores em regime voluntariado), e demonstraram que os participantes do programa diminuíram em 46% o número de dias hospitalizados e 49% nos gastos com a saúde (diária internamento, consultas em ambulatório e recorrências à urgência). De assinalar que os custos hospitalares poupados excederam 5 vezes os custos do programa (cit. in.

A inclusão de pares com a mesma condição nos programas de educação para a autogestão, para liderar os grupos de participantes, demonstrou que quando devidamente preparados e treinados, permitem resultados muito positivos, tais como a melhoria dos conhecimentos relacionados com a condição crónica e nas competências técnicas na utilização dos dispositivos terapêuticos (Horner & Fouladi, 2008), diminuição do número de recorrências aos serviços de urgência e do número de dias com atividade limitada (Lorig, 2002; Magzamen, Patel, Davis, Edelstein, & Tager, 2008), melhoria na qualidade de vida e bem-estar (Mérelle, Sorbi, van Doornen, &

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Passchier, 2008), aumento dos níveis de conhecimento e da autoeficácia relacionada com a gestão do regime terapêutico (Horner & Fouladi, 2008).

Foster, (2008) realizou uma revisão sistemática da literatura com metanálise que procurou avaliar sistematicamente a eficácia dos programas de autogestão com Lay- Leds em indivíduos com doença crónica. Foram incluídos 17 estudos envolvendo 7442 participantes. Não foi encontrado nenhum estudo que envolva crianças ou adolescentes. Relativamente ao estado de saúde, os resultados revelaram pequena mas estatisticamente significativa redução na dor (11 estudos), na incapacidade (8 estudos), fadiga (7 estudos), pequena mas estatisticamente significativa melhoria na depressão (6 estudos), no bem-estar psicológico (5 estudos) e melhorias significativas na saúde em geral (6 estudos). Relativamente aos comportamentos de saúde, 7 estudos revelaram pequena melhoria na autopercepção do exercício físico. Relativamente à utilização dos serviços de saúde, encontraram redução significativa no tempo/duração de hospitalização, no entanto não foi demonstrada redução na recorrência ao médico ou clínico assistente (9 estudos). Quanto à autoeficácia, os resultados revelaram pequena, embora estatisticamente significativa, melhoria em 10 estudos. Os autores concluíram que os programas educacionais de autogestão “Lay-Led” podem conduzir a pequenas melhorias a curto prazo na autoeficácia, na perceção da saúde, na gestão de sintomas e na frequência de exercício físico. Não existe evidência que demonstre eficácia no bem- estar ou na qualidade de vida. Recomendam futuras investigações com desenhos que permitam uma perspetiva longitudinal, avaliar o seu efeito nas variáveis clínicas e ainda que explorem o seu potencial em crianças e adolescentes.

Apesar dos inúmeros benefícios para os participantes associados à introdução de Lay Leds em programas educacionais de promoção da autogestão da doença, esta prática tem suscitado alguma discussão na literatura atual. Lindsay e Vrijhoef (2009) questionam o papel dos Lay Leds e o modo como é feito o seu processo de seleção, sobretudo em programas que envolvem participantes com diferentes tipos de doença crónica. Numa visão economicista, as autoras relacionam os benefícios da utilização de Lay Led’s (regime voluntariado) com o elevado número de doentes crónicos a necessitar de cuidados especiais e os gastos exorbitantes com a saúde que lhes são inerentes, decorrentes do aumento da esperança de vida. No entanto alertam para as questões éticas que envolvem esta prática, e questionam se os Lay Led’s estarão capacitados para

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respeitar os direitos dos participantes (anonimato, privacidade) e dar resposta às suas necessidades.

Foster, (2008) demonstra também alguma preocupação e sugere alguma cautela na generalização desta prática. Refere que o conteúdo das intervenções de suporte/apoio aos pares não é programado e questiona se os “Lay Led’s” estarão preparados para dar uma resposta adequada. Sugere que esta prática seja supervisionada por profissionais de saúde, até haver mais evidência que comprove a sua inocuidade relativamente a outras variáveis psicossociais, culturais e espirituais.