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A limitação do poder estatal como requisito dos direitos fundamentais: a questão da probidade administrativa

3. A probidade administrativa como um direito fundamental: contornos normativos (dinamismo constitucional)

3.7 A limitação do poder estatal como requisito dos direitos fundamentais: a questão da probidade administrativa

A probidade administrativa (dever de probidade), no mais, é evidente e auspiciosa limitação do poder estatal276, requisito este também identificador de um direito fundamental.

Saliente-se que “[...] o princípio da dignidade da pessoa impõe limites à atuação estatal, objetivando impedir que o poder público venha violar a dignidade pessoal.” (SARLET, 2008, p. 114). Assim, também o requisito em tela é cumprido à risca pelo direito à probidade, uma vez que a conjugação desta com o fundamento da dignidade servem de escudo para a atuação estatal desregrada. Não resta dúvida, neste contexto, que “Reprimir juridicamente a improbidade administrativa é, sem dúvida, tarefa aliada à incessante busca de redução das imunidades daqueles que detêm poderes políticos e administrativos de enorme relevância.” (OSÓRIO, 2007, p. 21 e 22).

Dimoulis e Martins (2011, p. 49), quando conceituam os direitos fundamentais como “[...] direitos público-subjetivos de pessoas (físicas ou jurídicas), contidos em dispositivos constitucionais e, portanto, que encerram caráter normativo supremo dentro do Estado, tendo como finalidade limitar o exercício do poder estatal em face da liberdade individual”, deixam claro a finalidade em tela dos direitos fundamentais, de “limitar o exercício do poder estatal”. De mesma forma, Marmelstein (2011, p. 20): “[...] normas jurídicas, intimamente ligadas à

276 Cardoso (2006, p. 18) ensina que “[...] o Estado Liberal ou burguês, o Estado Social e o Estado Neoliberal ou

Regulador, são modalidades de Estado de Direito ou constitucional. As características básicas são as mesmas: a liberdade protegida, poder limitado, e o povo como titular do poder político.”

ideia de dignidade da pessoa humana e de limitação do poder, positivados no plano constitucional de determinado Estado Democrático de Direito277.”

Ao delimitar o conceito de direitos fundamentais, Marmelstein (2011, p. 20) apresenta cinco elementos básicos: “[...] norma jurídica, dignidade da pessoa humana, limitação de poder278, Constituição e democracia.”

Valle (2011, p. 82) faz a seguinte observação:

Ora, se é no âmbito da função administrativa que se assegura a concretização dos direitos fundamentais no que toca aos deveres de atuação do Estado, evidente a indissociação entre resultado (normalmente tutelado no elenco do Título II) e meio, cujos parâmetros de atuação se veriam definidos no direito fundamental à boa administração.

Tal colocação é interessante uma vez que a limitação do poder estatal funciona, aqui, sob um segundo ângulo que difere do primeiro, não no sentido de se (poder) exigir do Estado que não adote determinada medida, mas sim no sentido de que ele assim o faça. Disto se diz que a limitação pode ser para impedir como para compelir. Assim, como disse a ilustre autora (VALLE, 2011, p. 82), “[...] é no âmbito da função administrativa que se assegura a concretização dos direitos fundamentais no que toca aos deveres de atuação do Estado.”

277 Bertoncini (2007, p. 130) anota que “A superação da ideologia predominante permitirá que no nível retórico a

decisão venha com uma nova justificativa, comprometida com o Estado Democrático de Direito, inaugurado pela Constituição de 1988, quebrando-se, assim, com a referida ´reiteração periférica do sistema´. A relevância do Poder Judiciário, neste sentido, é fundamental, porque sem a sua atuação firme, incumbida de decidir a respeito dos casos de improbidade e da aplicação das sanções correspondentes, será bastante difícil a superação dos valores atualmente dominantes. Assumindo o seu real papel, a partir de uma nova hermenêutica, poderá o Judiciário da Constituição de 1988 romper com o ciclo vicioso de justificação do sistema.”

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Barroso (2013a, p. 107), ao escrever sobre o sucesso do constitucionalismo, aponta uma de suas razões exatamente a limitação do poder.

Dessa forma, a concretização dos direitos fundamentais depende (em grande monta) do exercício regular e efetivo da função administrativa. E é o exercício desta função administrativa, necessariamente proba, que induzirá e possibilitará a concretização dos direitos fundamentais. O poder estatal limita-se, desta forma, pela existência ou não de uma administração pública que exerça as suas obrigações constitucionais. Enfim, de uma administração pública proba.

No mais, Muñoz (2012, p. 69) cita o exemplo, na Espanha, do acordo do Conselho de Ministros da Ética pública, datado de 18 de janeiro de 2005. De acordo com o eminente publicista (MUÑOZ, 2012, p. 70), “O acordo, desde a perspectiva ética do serviço público, estabelece alguns princípios básicos, alguns princípios éticos e alguns princípios de conduta.” Entre os princípios básicos selecionados, exemplifica-se, expressamente, a probidade. Assim, a ideia da probidade administrativa como um componente, um qualificativo intransigível do agente público, remonta ao Direito europeu, que também concebe este direito como um verdadeiro limitador do poder estatal.

Não por outro motivo (a limitação do poder estatal), Dimoulis e Martins (2011, p. 57) ensinam que “A principal finalidade dos direitos fundamentais é conferir aos indivíduos uma posição jurídica de direito subjetivo [...] e, consequentemente, limitar a liberdade de atuação dos órgãos do Estado.” No mesmo sentido, Marmelstein (2011, p. 18) ensina que os direitos fundamentais “[...] estão intimamente ligados à idéia de dignidade da pessoa humana e de limitação do poder.”

Consigne-se, em tempo, que “[...] o princípio da legalidade, em sua conformação atual, é contemporâneo do Estado de Direito279, tendo nascido com o Estado Liberal, sendo essencialmente ligado à idéia de limitação do poder.” (SANTOS NETO, 2008, p. 208 e 209).

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Santos Neto (2008, p. 209 e 210) ensina que “A expressão Estado de Direito, por seu turno, foi construída pela dogmática alemã, já no século XIX, e teve em Von Mohl seu grande expoente. Constituía ela a tradução literal da expressão Rechtsstaat. Foi difundida na França por Carré de Malberg e, posteriormente, por seus discípulos da chamada Escola de Direito Público de Estraburgo.”

E, como se sabe, a ofensa ao princípio da legalidade, “[...] um dos pilares do Estado de Direito [...]” (CARDOSO, 2006, p. 26), pode configurar ato de improbidade administrativa (art. 11 da LIA).

Enfim, a limitação do poder estatal é requisito indispensável à conceituação dos direitos fundamentais. E também aqui o direito fundamental à probidade administrativa cumpre à risca uma de suas tarefas, que é justamente limitar o poder estatal.

3.8 Os objetivos fundamentais da República, a cidadania e a função garantidora do

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