O texto abaixo pertence à parte 3 do capítulo 1 do romance Jerusalém, em que a personagem Mylia, ex-interna de hospícios, sente dores após querer entrar numa igreja de madrugada.
A riqueza do romance está na proeza do autor em amalgamar a ação dramática e o fluxo de pensamentos.
A igreja continuava à sua frente, silenciosa. Em menos de três horas o dia começaria e a claridade era para Mylia uma ameaça evidente, uma ameaça material. Não encontrara a igreja aberta, porque era de noite, mas agora não cometeria o erro de ser vista por ali, de manhã; todos perceberiam que ela estivera à procura de algo e nada encontrara. Detestava exibir-se no momento em que estava fraca e depois da breve humilhação frente ao homem mesquinho que lhe abrira a porta lateral da igreja, depois dessa fraqueza: procurar algo que estava fechado, Mylia começava a recuperar o instinto, conhecia-o ao milímetro, bem se poderia dizer, pois a sua doença obrigava-a constantemente a adiar a possibilidade de cruzamentos: nunca se encontraria com alguém num dia em que estivesse com demasiadas dores. Tal seria desistir de ser humana, já o percebera. E Mylia, mesmo sabendo que não duraria mais do que alguns meses, e que poderia mesmo morrer que em poucas semanas, não desistira de ser humana. Orgulho, repetia por diversas vezes. Nunca percas o orgulho.
No entanto, Mylia, começou a sentir algo no estômago. A princípio esse aviso deixou-a perplexa: não era a sua dor, era outra coisa, mas igualmente forte, mais forte ainda.
Que ridículo, apeteceu-lhe dar uma gargalhada. Estou com fome, murmurou, há horas que não como. Estou aqui de noite, sozinha, mas o meu estômago veio; estou acompanhada.
O motivo da troça foi, logo de imediato, motivo de reflexão e de certo temor, pouco explicável. Aquela dor no estômago, que manifestava a vontade comer, essa dor era agora mais forte que a outra: a dor constante da doença, a dor que lhe traria rapidamente aquilo de que todos os grandes e pequenos medos fogem. Como é possível, perguntou-se Mylia, que a dor provocada pela vontade de comer pão seja mais forte? Porque os médicos já o garantiram: vou morrer da dor que agora não consigo ouvir.
Ela percebeu, claramente, que ali, junto à igreja, estavam em competição duas dores grandes: a dor que ia matar, a dor má, assim ela a designou, e, do outro lado, a dor boa, a dor do apetite, dor da vontade de comer, dor que significava estar viva, a dor da existência, diria ela, a evidente manifestação da humanidade, mas também das suas relações ambíguas com os mistérios de que nada se sabe. Estava viva, e essa circunstância doía mais, naquele momento, de um modo objectivo e material, do que a dor de que ia morrer, agora secundária. Como se naquele momento fosse mais importante comer um pão do que ser imortal.
Gonçalo Tavares (Angolano, estreou na literatura em 2001; em 6 anos, publicou 21 obras, sendo consagrado com o romance Jerusalém)
QUESTÃO
1
No final do 1º parágrafo, tem-se o trecho “Orgulho, repetia por diversas vezes. Nunca percas o orgulho.” A repetição da palavra “orgulho” tem efeito retórico.
O primeiro “orgulho” pontua o fim de um raciocínio anterior da personagem, que o segundo: a) antagoniza, atribuindo ao vocábulo valor genérico.
b) efetiva, aprofundando o sentido dado ao termo. c) individualiza, limitando a palavra a uma patologia. d) suaviza, traduzindo conformismo.
QUESTÃO
2
Em Jerusalém, o autor faz do sombrio o diapasão e a base de seu relato. Essa direção, entretanto é abandonada pelo fragmento:
a).“Em menos de três horas o dia começaria e a claridade era para Mylia uma ameaça evidente” b) “e que poderia mesmo morrer em poucas semanas”
c) “Estou aqui de noite, sozinha”
d) “Que ridículo, apeteceu-lhe dar uma gargalhada”
QUESTÃO
3
Em escala menor, uma das premissas da obra é a de flagrar a bondade. Este signo da vida, textual e literalmente, emerge da dor:
a) da vontade de comer. b) que ia matar. c) má. d) agora secundária.
QUESTÃO
4
Entre o 2° e 3° parágrafos do texto, um vocábulo afasta o leitor do foco da doença terminal. Essa sinalização se confirma, preparando o leitor para outra coisa, com a palavra:
a) forte. b) perplexa. c) sozinha. d) acompanhada.
P á g in a 2 1938 Angico Os caçadores de cangaceiros
Para despistar, os cangaceiros imitam ruídos e pegadas de bichos e usam falsas solas com o calcanhar no bico. Mas quem sabe, sabe; e um bom rastreador reconhece os rumos do passo humano através dessa moribunda vegetação: pelo que vê, galhinho quebrado ou pedra fora do lugar, e pelo olfato. Os cangaceiros são loucos por perfume. Derramam no corpo litros de perfumes, e essa fraqueza os delata.
Perseguindo pegadas e aromas, os rastreadores chegam ao esconderijo do chefe Lampião; e atrás deles, a tropa. Os soldados se aproximam tanto, que escutam Lampião discutindo com sua mulher. Maria Bonita o amaldiçoa, enquanto fuma um cigarro atrás do outro, sentada numa pedra na entrada da gruta, e ele responde tristemente lá no fundo. Os soldados armam as metralhadoras e esperam a ordem de disparar.
Cai uma garoinha de leve.
Eduardo Galeno
QUESTÃO
5
Consciente de que o leitor deve saber de antemão o resultado da emboscada, o escritor trabalha a intensidade dos momentos, sem, no entanto, perder tempo, descrevendo linearmente uma dessas passagens.
A sentença que rompe esse fluxo descritivo, criando uma pausa de expectativa e permitindo uma margem de manobra interpretativa é:
a) e atrás deles, a tropa.
b) Os soldados se aproximam tanto, (...). c) (...) e ele responde tristemente lá do fundo. d) Cai uma garoinha de leve.
QUESTÃO
6
Os conectores conjuncionais são vocábulos cuja pertinência estrutural é a de relacionar termos ou orações. Apresenta um fragmento do texto cuja oração mantém uma relação semântica de simultaneidade com a estrutura anterior a opção:
a) Derramam no corpo litros de perfume, e essa fraqueza os delata. b) Maria Bonita o amaldiçoa, enquanto fuma um cigarro após o outro.
c) Os soldados se aproximam tanto, que escutam Lampião discutindo com sua mulher. d) Mas quem sabe, sabe.
AS PRÓXIMAS QUESTÕES FORAM CRIADAS, A PARTIR DO ROMANCE TRISTE FIM DE POLICARTPO QUARESMA, DE LIMA BARRETO
“O amor que tenho por ela/Já não cabe no meu peito;/Sai-me pelos olhos afora/Voa às nuvens direito.”
QUESTÃO
7
Estes versos são de uma poesia popular que um personagem, um velho poeta, recita para o major Quaresma e para o personagem Albernaz.
Afora o recurso estilístico da hipérbole existente em um dos versos, pode-se notar, também, uma figura de linguagem caracterizada corretamente em:
a) “Voa às nuvens direito” (Prosopopeia). b) “O amor que tenho por ela” (Anáfora). c) “Já não cabe no meu peito” (Metonímia) d) “Sai-me pelos olhos afora” (Ironia)
QUESTÃO
8
Há uma recorrência do fenômeno metalinguístico no romance Triste Fim de Policarpo Quaresma, como é o caso de: a) Errava quem quisesse encontrar nele qualquer regionalismo; Quaresma era, antes de tudo brasileiro.
b) Ele amava sobretudo os rios; as montanhas lhe eram indiferentes. Pequenas talvez...
c) Além desses, havia livros subsidiários: dicionários, manuais, enciclopédias, compêndios em vários idiomas. d) Sentado no sofá, empunhando o “pinho” na posição de tocar, o major, atentamente, ouvia: “Olhe, major, assim”.
QUESTÃO
9
Em algumas passagens do romance Triste Fim de Policarpo Quaresma, o argumento de autoridade é um recurso utilizado pelo protagonista, exemplificado em:
a) Na ficção, havia unicamente autores nacionais ou tidos como tais: Bento Teixeira, da Prosopopeia; o Gregório de matos, o Basílio da Gama (...), além de muitos outros.
b) A modinha é a mais genuína expressão da poesia nacional e o violão é o instrumento que ela pede.
c) Nós é que temos abandonado o gênero, mas ele esteve em honra em Lisboa, no século passado com o padre Caldas, que teve um auditório de fidalgas.
P á g in a 3
QUESTÃO
10
“Por mais que quisesse, ela não podia julgar o ato do padrinho sob o critério de seu pai.” A oração sublinhada mantém com a estrutura seguinte uma relação de sentido de: a) proporcionalidade b) conclusão c) oposição d) causa
QUESTÃO
11
Em muitos trechos da obra Triste Fim de Policarpo Quaresma, o narrador se manifesta na ação, apresentando suas impressões e, até mesmo, sugerindo sua opinião.
Essa marca narrativa não se observa em:
a) “Recordava (é melhor dizer assim), afirmava certas noções de seus estudos, visto estar organizando um sistema de cerimônias e festas que se baseasse nos costumes dos nossos silvícolas e abrangesse todas as relações pessoais.”
b) “Tinha todos os climas, todos os frutos, todos os minerais e animais úteis, as melhores terras de cultura, a gente mais valente, mais hospitaleira, mais inteligente e mais doce do mundo – o que precisava mais?”
c) “Ele amava sobremodo os rios; as montanhas lhe eram indiferentes. Pequenas talvez...”
d) “_Não é bonito?...Muito! Se os senhores conhecessem então o ciclo do macaco, a coleção de histórias que o povo tem sobre o símio?”
QUESTÃO
12
“ Levara ela atrás da miragem de estudar a pátria, por amá-la e querê-la muito, no intuito de contribuir para a sua felicidade e prosperidade. Gastara a sua mocidade nisso, a sua virilidade também; e, agora que estava na velhice, como ela o recompensava, como ela o premiava, como ela o condecorava?”
O tom dessa narrativa sobre o estado de espírito do personagem Major Quaresma configura uma demonstração de: a) conformismo
b) resiliência c) insatisfação d) desapontamento
Vestibular 2021
QUESTÃO
1
Um sistema heterogêneo bifásico
• A e B são miscíveis entre
• C é imiscível com A e com
• A é mais volátil que B. Com base nessas informações, a) centrifugação e decantação. b) decantação e fusão fracionada. c) filtração e centrifugação. d) decantação e destilação
QUESTÃO
2
Ao se colocarem hexano (d como funil de separação (figura
a) A b) B c) C d) D
QUESTÃO
3
(UERJ) A aguardente é uma de que se trata de uma substância
Na realidade, ela não é uma seguinte processo físico de a) filtração b) destilação c) decantação d) centrifugação