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1. INTRODUÇÃO

1.4 Linhagem celular

Após a caracterização dos biomateriais que podem ser utilizados na bioengenharia e, constatada a necessidade da utilização de células para aperfeiçoar e promover a osteoindução, uma tarefa importante e crucial é a escolha do tipo celular a ser utilizado em conjunto com os materiais, ou injetado sistemicamente para a neoformação óssea (KITER et al., 2017).

Células tronco mesenquimais (CTM) humanas têm sido utilizadas em numerosos estudos, incluindo a regeneração óssea, onde apresentam papel fundamental em ambos os processos de regeneração e fixação do osso (RICHARDSON et al., 2016). Em 2005, a International Society for Cellular Therapy (ISCT, Vancouver, Canada) recomendou o uso do nome multipotent mesenchymal stromal cell, também denominadas como mesenchymal stem cells: “MSCs” (HORWITZ et al., 2005). Em 2011, a International Society of Stem Cell Research (ISSCR, Toronto, Canada) permaneceu adotando o termo mesenchymal stem cells, também abreviado como MSCs.

As CTM podem ser extraídas, isoladas e cultivadas em condições definidas com um protocolo específico para cada caso e são células com potencial para utilização em engenharia de tecidos, incluindo os tecidos dentário, ósseo e neonatal (KIM, Sunil et al., 2015). As suas vantagens são: uso autólogo, divisão moderada sem riscos de formação de teratomas e o seu comprometimento com tipos celulares específicos enquanto que as desvantagens incluem quantidade insuficiente de células para o uso clínico terapêutico, o tempo de obtenção da quantidade necessária pode ser muito longo bem como questões éticas e reações imunológicas (KITER et al., 2017).

A identificação das CTM é realizada por um conjunto de marcadores e metodologias (KOBOLAK et al., 2016). Além de sua propriedade de aderir à superfície plástica e de formar colônias fibroblásticas e da capacidade de diferenciação nas três linhagens mesodérmicas (osteoblastos, condrócitos e adipócitos), torna-se necessária a determinação da presença e ausência de certos marcadores de superfície celular por citometria de fluxo (PITTENGER et al., 1999). A caracterização imunofenotípica de CTM apresenta-se positiva para os marcadores CD90 (proteína de matriz extracelular, Thy-1), CD105 (receptor

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de endoglina, SH2), CD73 (enzima de superfície, ecto-5’ nucleotidase), CD117, CD44, CD166, CD29 e STRO-1 e negativa para os marcadores CD45 (proteína tirosina fosfatase, tipo receptor C, PTPRC), CD34 (fosfoglicoproteína transmembranar), CD31 (molécula de adesão celular endotelial plaquetária, PECAM-1) e CD14 (proteína membranar de macrófagos). Entretanto, apenas a expressão dos marcadores CD105, CD73 e CD90 associada à ausência de expressão dos marcadores hematopoiéticos: CD45, CD19 (antígeno de linfócitos B), CD19 ou CD79 (proteína transmembranar de 2 cadeias distintas, CD79A e CD79B), CD14 ou CD11b (integrina alfa M, ITGAM) e HLA-DR (antígeno de leucócitos humanos, isótopo DR) é suficiente para a caracterização imunofenotípica das CTM (DOMINICI et al., 2006) (Figura 5). Atualmente, não há um marcador único para definir as CTM. No processo de isolamento de CTM nos distintos tecidos, evidencia-se que apenas a subpopulação de CTM, diante de outras células que fazem parte dos tecidos, apresenta aderência à superfície plástica e multipotencialidade (RUSSELL et al., 2010).

Figura 5- Esquema representativo das características de auto-renovação e diferenciação de CTM. Existem marcadores positivos e negativos para a identificação de CTM de camundongo

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Com o avanço de técnicas de extração e pesquisa foram identificadas uma enorme quantidade de fontes de onde podem ser isoladas células-adultas, como: medula óssea, sangue periférico, sangue do cordão umbilical, tecidos fetais, membrana sinovial, tecido adiposo, líquido amniótico, cordão umbilical, polpa dental adulta e de dente decíduo (HASS et al., 2011).

As células-tronco mesenquimais humanas do tecido dentário (CTMH-TD) são usadas para induzir a regeneração da polpa e tratar dentes permanentes imaturos de forma conservadora, de forma que populações de células-tronco podem ser isoladas de diferentes tecidos das regiões bucomaxilofaciais e são originadas de diferentes estágios de desenvolvimento do dente. Cerca de oito populações únicas de CTMH-TD foram isoladas e caracterizadas (Figura 6) (KAUR, M. et al., 2017):

 células-tronco derivadas da polpa dentária (DPSCs - dental pulp stem cells);  células-tronco de dentes humanos decíduos esfoliados (SHED - stem

cells from human exfoliated deciduous teeth);

 células-tronco derivadas do ligamento periodontal (PDLSCs - periodontal ligament stem cells);

 células-tronco progenitoras do folículo pericoronário (DFPCs - dental follicle progenitor cells);

 células-tronco mesenquimais derivadas de osso alveolar (ABMSCs - alveolar bone-derived mesenchymal stem cells);

 células-tronco da parte apical da papila dentária humana (SCAP - stem cells from the apical part of the human dental papilla);

 células-tronco progenitoras de germe dentário (TGPCs - tooth germ progenitor cells);

 células-tronco mesenquimais gengivais (GMSCs - gingival mesenchymal stem cells).

42 Figura 6- Fontes de células-tronco mesenquimais derivadas de tecidos dentários. Os exemplos

ilustrados são DPSCs, SHED, PDLSCs, DFPCs, ABMSCs, SCAP, TGPCs e GMSCs. Fonte: adaptado de KAUR et al., 2017.

DPSCs foram as primeiras CTM de tecido dentário a serem isoladas e caracterizadas, possuindo a capacidade de se diferenciar em células semelhantes a odontoblastos e formar complexos semelhantes à dentina/polpa quando implantados em espaços subcutâneos de camundongos imunocomprometidos (KIM, Sunil et al., 2015). Estudos de DPSCs com biomateriais poliméricos colocados subcutaneamente em ratos Wistar formaram ossos adultos, inclusive com vasos tanto no interior como no exterior do tecido, demonstrando também uma capacidade de angiogênese além da osteoindução comprovada (D’AQUINO et al., 2007). DPSCs e SCAP apresentam características semelhantes, no entanto, em estudos realizados com células isoladas do mesmo dente foi observado um melhor potencial de regeneração proveniente das SCAP (HUANG, G. T.-J. et al., 2008), e ambas foram menos potentes na diferenciação adipogênica comparando com CTM da medula óssea (KAUR, M. et al., 2017). Após transplante in vivo com um biomaterial cerâmico de hidroxiapatita e tricálcio fosfato, as SHED também foram capazes de induzir formação óssea, além de terem gerado dentina e sobrevivido no cérebro de camundongos expressando marcadores neurais (MIURA et al., 2003).

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Células tronco mesenquimais humanas da medula óssea (CTMH-MO) são as mais utilizadas, contudo seu protocolo de isolamento pode ser invasivo e sua capacidade de diferenciação diminui com a idade (JACCHETTI et al., 2014;KWON et al., 2016;WANG, H.-S. et al., 2004). Nesse contexto, os tecidos neo-natais, como o células-tronco mesenquimais humanas do cordão umbilical (CTMH-CU), podem prover uma fonte de fácil acesso sem a utilização de técnicas invasivas e estão disponíveis em larga quantidade (LIU, S. et al., 2014). É possível que CTMH do cordão umbilical estejam em um estágio mais inicial de desenvolvimento do que as células da medula óssea (WANG, H.-S. et al., 2004) resultando em baixa imunogenicidade, aumento na taxa de proliferação e tempo de vida (KWON et al., 2016).

No que diz respeito a abordagens de regeneração tecidual, especificamente no tecido ósseo, as reações biológicas aos materiais são de extrema importância. O tecido ósseo está sendo continuamente remodelado, um processo vital que mantém a integridade do esqueleto onde o osso “velho” é removido do esqueleto pelos osteoclastos (reabsorção óssea) e o osso “novo” é formado pelos osteoblastos para substituí-lo (ossificação) (RUCCI, 2008). O metabolismo ósseo é a sequência complexa de renovação óssea (osteoclastogênese) e formação óssea (osteoblastogênese). As funções metabólicas do osso envolvem principalmente a homeostase de cálcio e fosfato. A liberação ou absorção de cálcio pelo osso é amplamente regulada pela calcitonina, paratormônio, estrógeno e androgênio, vitamina D e outras citocinas, fatores de crescimento, prostaglandinas e outras moléculas (SIDDIQUI; PARTRIDGE, 2016).

A regeneração óssea envolve o recrutamento de CTM e a sua diferenciação em osteoblastos funcionais que sintetizam a matriz extracelular regulando a sua mineralização durante o processo de formação óssea (ORYAN et al., 2017). O processo de mineralização da matriz mediada por osteoblastos está relacionado com a expressão diferencial de genes que ocorre durante a sua sequência de diferenciação, partindo de células osteoprogenitoras, proliferativas até à sua diferenciação terminal em osteoblastos e osteócitos, cada qual com as suas características funcionais distintas (STEIN; LIAN, 1993). Em estudos de parâmetros que afetam a sequência de diferenciação, como fatores de crescimento e hormônios, uma estratégia interessante é avaliar a expressão de

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moléculas consideradas marcadores iniciais de osteoblastos, o que inclui ALP (fosfatase alcalina), RUNX2 (fator de transcrição relacionado com o Runt 2), BMP2 (proteína morfogenética óssea 2), OCN (osteocalcina) também conhecida como BGLAP (proteína contendo ácido gama-carboxiglutâmico do osso) e OPN (osteopontina) também conhecida como BSP1 (sialoproteína óssea 1) (HUANG, W., 2007).

A ALP é uma ectoenzima ligada à camada externa da membrana celular por meio de uma âncora de glicosil fosfatidilinositol (GPI) que proporciona às fosfatases a capacidade de interagir com substratos presentes no meio extracelular (CIANCAGLINI et al., 1990). A isoforma TNAP relacionada a tecidos mineralizados, é expressa na membrana celular e na membrana de vesículas de matriz de odontoblastos, condrócitos e osteoblastos, sendo essenciais no tecido ósseo para o início da mineralização da matriz de colágeno, além de serem importantes para o diagnóstico de doenças ósseas (MIAO; SCUTT, 2002). A TNAP desempenha funções na restrição de PPi, mantendo a proporção Pi/Ppi que permite a mineralização fisiológica da matriz óssea (Hessle et al. 2002). Mutações no gene que codifica a ALP conduzem ao desenvolvimento de um fenótipo caracterizado pela ausência de mineralização óssea (WHYTE, 2010).

O RUNX2 é considerado um importante regulador na formação óssea com função de mediar a ativação e/ou repressão temporal do crescimento celular e de outros genes que participam no processo de diferenciação celular (KOMORI, 2018). Durante o processo de diferenciação osteoblástica, o RUNX2 induz a diferenciação celular e aumenta o número de osteoblastos imaturos, estando envolvido na expressão de genes da matriz óssea Col1, OPN, OCN e na manutenção da expressão de OPN e de BSP (BRUDERER et al., 2014). No entanto, é necessário que a sua expressão seja reduzida para que ocorra diferenciação de osteoblastos que formam o osso maturo (JONASON et al., 2009). Assim, o RUNX2 desencadeia a expressão de genes importantes da matriz óssea durante os estágios iniciais da diferenciação osteoblástica, mas não é essencial para a manutenção desse processo em osteoblastos terminalmente diferenciados (BRUDERER et al., 2014;KOMORI, 2018). Durante o processo de diferenciação condrócita iniciado por condensação mediada por Sox9, Runx2 é crucial para a maturação dos condrócitos de imaturos para hipertróficos terminais, e inibe os condrócitos imaturos de adotarem o fenótipo permanente

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de cartilagem (BRUDERER et al., 2014). Estes processos de diferenciação estão esquematizados na Figura 7.

Figura 7- Regulação das diferenciações osteoblástica e condrócita por Runx2. Fonte: adaptado

de BRUDERER et al., 2014.

As BMPs pertencem à superfamília de fatores de crescimento de transformação β (TGF-β) e estão envolvidas em vários processos durante a embriogénese, organogénese, proliferação e diferenciação celular e mecanismos de formação óssea. Atualmente estão descritos e caracterizados mais de 20 membros pertencentes a esta família, que foram divididos em várias subfamílias, de acordo com a semelhança da estrutura primária das suas proteínas. A subfamília BMP2/4/16 foi uma das primeiras a ser identificada e caracterizada, sendo BMP2 uma das proteínas que possui uma maior capacidade osteogênica e é, desde há muito tempo, considerada um potencial agente terapêutico para o tratamento de doenças relacionadas com o osso, sendo mesmo utilizada em alguns casos clínicos de fraturas ósseas (MALIK et al., 2013).

A BGLAP, ou osteocalcina, é uma proteína da matriz óssea não colágena encontrada no osso e na dentina, sendo secretada apenas por osteoblastos. Pensa-se que esteja envolvido na regulação metabólica do organismo, sendo

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pro-osteoblástica por natureza e envolvida na mineralização óssea e na homeostasia de cálcio (MOSER; EERDEN, VAN DER, 2019). A BSP, ou osteopontina, é também uma proteína da matriz óssea não colágena, matricelular e multifuncional, cuja deposição temporoespacial na matriz extracelular e sua habilidade de nucleação dos cristais de HAp nas fibrilas colágenas indica um papel crucial nos estágios iniciais da mineralização (OGATA, 2008). Foi relatado que a osteocalcina é mais dominante na regulação das propriedades físicas do mineral ósseo, enquanto a osteopontina é mais dominante na regulação da composição mineral (POUNDARIK et al., 2018).

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2. OBJETIVOS

2.1 Objetivo geral

O objetivo geral deste trabalho é a caracterização biológica de citotoxicidade, genotoxicidade, capacidade de diferenciação osteoblástica e atividade antimicrobiana de eludatos do cimento endodôntico de base resinosa, AH Plus, na ausência e na presença de uma fase mineral de nanohidroxiapatita (NHAp) com diferentes concentrações de zinco (NHAp-Zn) com o intuito de obter um cimento com propriedades antibacterianas acrescidas e conferir osteocondutividade ao cimento, para uma melhor regeneracão dos tecidos perirradiculares.

2.2 Objetivos específicos

(i) Isolar e caracterizar células-tronco mesenquimais humanas da geléia de Wharton (CTMH-GW);

(ii) Determinar a viabilidade e proliferação de células tronco mesenquimais humanas após a exposição a NHAp, aos eludatos de AH Plus e à mistura; (iii) Analisar a influência das amostras na atividade osteogênica de CTMH-GW; (iv) Avaliar o sistema antioxidante das células expostas às amostras;

(v) Avaliar a instabilidade genética das células expostas às amostras por meio do ensaio cometa e do ensaio CBMN;

(vi) Avaliar a atividade antibacteriana das amostras; (vii) Avaliar a atividade antifúngica das amostras.

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