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A Literatura infantil na Base Nacional Comum Curricular (BNCC – BRASIL, 2017)

2.4 A Literatura em diferentes documentos oficiais que regem a Educação Infantil

2.4.4 A Literatura infantil na Base Nacional Comum Curricular (BNCC – BRASIL, 2017)

Não é nosso objetivo fazer uma crítica à BNCC, apesar de necessária, mas o de apontar como esse documento aborda a Literatura infantil. Trata-se de um documento que estabelece o conjunto de aprendizagens essenciais e indispensáveis a que todos os estudantes, crianças, jovens e adultos têm direito. “As redes de ensino e instituições escolares públicas e particulares passam a ter uma referência nacional obrigatória para a elaboração ou adequação de seus currículos e propostas pedagógicas” (BRASIL, 2017, p. 5).

Trata-se, portanto,

[...] da implantação de uma política educacional articulada e integrada. Para isso, o MEC será parceiro permanente dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, trabalhando em conjunto para garantir que as mudanças cheguem às salas de aula. As instituições escolares, as redes de ensino e os professores serão os grandes protagonistas dessa transformação.

A BNCC expressa o compromisso do Estado Brasileiro com a promoção de uma educação integral voltada ao acolhimento, reconhecimento e desenvolvimento pleno de todos os estudantes, com respeito às diferenças e enfrentamento à discriminação e ao preconceito. Assim, para cada uma das redes de ensino e das instituições escolares, este será um documento valioso tanto para adequar ou construir seus currículos como para reafirmar o compromisso de todos com a redução das desigualdades educacionais no

Brasil e a promoção da equidade e da qualidade das aprendizagens dos estudantes brasileiros. (BRASIL, 2017, p. 5).

Ainda, a Base Nacional Comum Curricular (BNCC)

[...] é um documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica, de modo a que tenham assegurados seus direitos de aprendizagem e desenvolvimento, em conformidade com o que preceitua o Plano Nacional de Educação (PNE). Este documento normativo aplica-se exclusivamente à educação escolar, tal como a define o § 1º do Artigo 1º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB, Lei nº 9.394/1996), e está orientado pelos princípios éticos, políticos e estéticos que visam à formação humana integral e à construção de uma sociedade justa, democrática e inclusiva, como fundamentado nas Diretrizes Curriculares Nacionais da Educação Básica (DCN). (BRASIL, 2017, p. 7).

A BNCC trata a competência como uma mobilização de conhecimentos, que são os conceitos e procedimentos, e as habilidades que são as práticas, cognitivas e socioemocionais, como atitudes e valores importantes que podem resolver as dificuldades do cotidiano, do exercício da cidadania e do mundo do trabalho (BRASIL, 2017). As competências gerais da BNCC se inter-relacionam e se desdobram no tratamento didático proposto para as três etapas da Educação Básica que são: Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio, articulando-se na construção de conhecimentos.

A BNCC também ressalta sobre a construção dos currículos, uma vez que as redes de ensino e as escolas particulares terão que construir os seus currículos baseados nas aprendizagens essenciais estabelecidas pelo documento. Dessa forma, os currículos das redes de ensino e os projetos pedagógicos das escolas devem conter os conhecimentos, competências e habilidades que são explicitados na BNCC. Assim, as metodologias e os projetos pedagógicos devem contextualizar as suas aprendizagens de acordo com o contexto ao seu redor e tratar de especificidades educacionais, como, por exemplo, a educação inclusiva, quilombola e indígena.

Em relação à Educação Infantil,

Com a Constituição Federal de 1988, o atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a 6 anos de idade torna-se dever do Estado. Posteriormente, com a promulgação da LDB, em 1996, a Educação Infantil passa a ser parte integrante da Educação Básica, situando-se no mesmo patamar que o Ensino Fundamental e o Ensino Médio. E a partir da modificação introduzida na LDB em 2006, que antecipou o acesso ao Ensino Fundamental para os 6 anos de idade, a Educação Infantil passa a atender a faixa etária de zero a 5 anos.

Entretanto, embora reconhecida como direito de todas as crianças e dever do Estado, a Educação Infantil passa a ser obrigatória para as crianças de 4 e 5 anos apenas com a Emenda Constitucional nº 59/2009, que determina a obrigatoriedade da Educação Básica dos 4 aos 17 anos. Essa extensão da obrigatoriedade é incluída na LDB em 2013, consagrando plenamente a obrigatoriedade de matrícula de todas as crianças de 4 e 5 anos em instituições de Educação Infantil. (BRASIL, 2017, p. 33).

Nesse sentido, a BNCC reafirma que, na Educação Infantil, as aprendizagens e o desenvolvimento das crianças estão pautados em dois eixos estruturantes: as interações e a brincadeira, e assegura seis direitos de aprendizagem: conviver, brincar, participar, explorar, expressar-se e conhecer-se. Dessa forma, será possível aprender por meio de situações que possibilitem desempenhar papel ativo e desafios que propiciem a construção de significados sobre si, os outros e o mundo social e natural.

Em função disso, a organização curricular da Educação Infantil na BNCC foi estruturada em cinco campos de experiência, que definem os objetivos de aprendizagem e desenvolvimento das crianças. Os campos de experiências constituem uma organização curricular que é importante por acolher as situações e as experiências concretas da vida cotidiana das crianças e seus saberes. Considerando esses saberes e conhecimentos, os campos de experiências em que se organiza a BNCC são:

O eu, o outro e o nós – É na interação com os pares e com adultos que as crianças vão constituindo um modo próprio de agir, sentir e pensar e vão descobrindo que existem outros modos de vida, pessoas diferentes, com outros pontos de vista [...].

Corpo, gestos e movimentos – Com o corpo (por meio dos sentidos, gestos, movimentos impulsivos ou intencionais, coordenados ou espontâneos), as crianças, desde cedo, exploram o mundo, o espaço e os objetos do seu entorno, estabelecem relações, expressam-se, brincam e produzem conhecimentos sobre si, sobre o outro, sobre o universo social e cultural, tornando-se, progressivamente, conscientes dessa corporeidade [...].

Traços, sons, cores e formas – Conviver com diferentes manifestações artísticas, culturais e científicas, locais e universais, no cotidiano da instituição escolar, possibilita às crianças, por meio de experiências diversificadas, vivenciar diversas formas de expressão e linguagens, como as artes visuais (pintura, modelagem, colagem, fotografia etc.), a música, o teatro, a dança e o audiovisual, entre outras [...].

Escuta, fala, pensamento e imaginação – Desde o nascimento, as crianças participam de situações comunicativas cotidianas com as pessoas com as quais interagem. As primeiras formas de interação do bebê são os movimentos do seu corpo, o olhar, a postura corporal, o sorriso, o choro e outros recursos vocais, que ganham sentido com a interpretação do outro. Progressivamente, as crianças vão ampliando e enriquecendo seu vocabulário e demais recursos de expressão e de compreensão, apropriando- se da língua materna – que se torna, pouco a pouco, seu veículo privilegiado de interação [...].

Espaços, tempos, quantidades, relações e transformações – As crianças vivem inseridas em espaços e tempos de diferentes dimensões, em um mundo constituído de fenômenos naturais e socioculturais. Desde muito pequenas, elas procuram se situar em diversos espaços (rua, bairro, cidade etc.) e tempos (dia e noite; hoje, ontem e amanhã etc.) [...]. (BRASIL, 2017, p. 38-41).

O campo de experiência “Escuta, fala, pensamento e imaginação” é o que especifica as competências e as habilidades que devem ser trabalhadas quanto à leitura e a escrita da criança pequena. As situações comunicativas são essenciais desde o nascimento para que haja um melhor estabelecimento das relações sociais com os adultos e com todos. O vocabulário é enriquecido e se fortalece com variados recursos de expressão e compreensão nas diversas interações. As experiências com a Literatura infantil, oferecidas pelo(a) professor(a) que é o(a) mediador(a), contribuem para o gosto pela leitura e desenvolvem a imaginação, ampliando o conhecimento de mundo da criança.

Esse campo de experiência ainda busca promover experiências significativas nas quais as crianças possam falar e ouvir, possibilitando a sua imersão na cultura oral. Por meio da escuta de histórias, na participação em conversas, nas descrições, nas narrativas que devem ser elaboradas de forma individual, ou em grupo, é possível que a criança se constitua em sujeito singular e pertença a um grupo social de maneira produtiva e ativa.

A Educação Infantil deve promover situações nas quais as crianças possam falar e ouvir, auxiliando a participação delas em diversos contextos. Ouvir histórias, participar de conversas, prestar atenção nas descrições, as narrativas que são elaboradas individualmente ou em grupos, são ferramentas educativas que promovem o conhecimento das múltiplas linguagens em que a criança se constitui como um ser ativo.

De acordo com a BNCC, as crianças são curiosas e essa curiosidade se inicia cedo. Em relação à escrita, ouvem e acompanham a leitura de textos, prestando atenção àqueles que circulam no meio familiar, escolar e social. Dessa forma, vão tecendo relações com a língua escrita, seus diferentes usos sociais, gêneros etc.

A Educação Infantil é uma etapa fundamental para o aprendizado e para as experiências com a Literatura infantil. Nesse sentido, o educador possui um papel importante em mediar os textos com as crianças, pois podem contribuir para desenvolver na criança o gosto pela leitura, estímulo da imaginação e ampliação do conhecimento de mundo.

O contato com as histórias, contos, poemas, fábulas, cordéis, livros ilustrados etc., promovem a aproximação dos textos ao universo das crianças, criam familiaridade. Trabalhar diferentes gêneros literários, livros ilustrados e livros escritos propicia a aprendizagem da

leitura e escrita e essa manipulação insere o livro no contexto da criança. Por meio desse convívio, as crianças podem construir hipóteses sobre a escrita, começam a conhecer as letras, iniciam com escritas espontâneas, e isso significa que estão iniciando o processo de compreensão da escrita como um sistema de representação da língua.

Essas aprendizagens envolvem comportamentos, habilidades, conhecimentos e vivências das crianças. Elas promovem a aprendizagem e o desenvolvimento nos diversos campos de experiências. As interações e a brincadeira estão sempre presentes como eixos estruturantes, visto que fazem parte dos objetivos de aprendizagem e desenvolvimento, sendo indispensáveis para a constituição dessa etapa da Educação Infantil.

Portanto, o campo de experiência “Escuta, fala, pensamento e imaginação” traz possibilidades de os pequenos expressarem ideias, desejos e sentimentos em diferentes situações que envolvem a interação. Poder argumentar por meio de fatos oralmente, de forma que haja organização e adequação da fala ao contexto, é primordial para incentivar a criança pequena. A importância de o educador proporcionar momentos em que as crianças possam ouvir, compreender, contar, recontar e criar narrativas favorece o desenvolvimento, principalmente quando são utilizados diferentes gêneros textuais, porque esses fazem parte do contexto social da criança.

Vale lembrar que nenhum campo de experiência deve ser trabalhado de forma fragmentada para não incorrermos no erro do RCNEI (1998), documento muito criticado por apontar diferentes eixos de atividades de forma fragmentada.

Após a análise dos documentos Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil (1998), Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica (2013), Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil (2010), Brinquedos e brincadeiras de creches: manual de orientação pedagógica (2012) e Base Nacional Comum Curricular (2017), foi possível perceber algumas diferenças entre eles; contudo, os documentos se complementam.

O RCNEI (1998) estabelece aquilo que deve ser ensinado, e de certa forma era uma orientação dos conteúdos e objetivos de aprendizagem e não fazia com que a criança fosse o foco principal. As DCNEB (2013) e DCNEI (2010) colocam a criança como o foco central do aprendizado e se aprofunda na forma de garantir o que ela tem direito de aprender; apresentaram um avanço no sentido de colocar a criança em foco e serviram como fundamentação teórica para a BNCC.

O documento Brinquedos e brincadeiras de creches: manual de orientações pedagógicas (2012) tem a pretensão de ressaltar o papel do brincar na constituição da

infância, uma vez que entende que é por meio da brincadeira que a criança se expressa, interage, investiga e aprende sobre o mundo e as pessoas, onde as propostas pedagógicas devem considerar a criança como o centro do planejamento curricular. A BNCC (2017) reforça a concepção de criança como protagonista no aprendizado e institui os cinco campos de experiências, além dos objetivos de aprendizagem, que são baseados em seis direitos de aprendizagem.

Desde 1988, com a creche e a pré-escola como um dever e direito da criança, até a Base, em 2017, mudanças significativas contribuíram para o aprimoramento pedagógico, curricular e para o protagonismo infantil.

3 O PAPEL DO PROFESSOR FACE À LITERATURA COM CRIANÇAS DA EDUCAÇÃO INFANTIL NO CONTEXTO ESCOLAR

Eu tive desde a infância várias vocações que me chamavam ardentemente. Uma das vocações era escrever. E não sei por que, foi esta que eu segui. Talvez porque para as outras vocações eu precisaria de um longo aprendizado, enquanto que para escrever o aprendizado é a própria vida se vivendo em nós e ao redor de nós. É que não sei estudar. E, para escrever, o único estudo é mesmo escrever. (LISPECTOR, 2003, p. 4).

Esta parte tem por finalidade abordar o papel de mediação do(a) professor(a) no trabalho com a Literatura para crianças pequenas no contexto escolar da Educação Infantil. Abordamos a importância de a leitura ser realizada nos primeiros anos de vida no contexto familiar; a biblioteca escolar como fonte de leitura e descobertas; a Literatura como função social de informação, conhecimento e cidadania; o ler e o contar; Literatura como forma de conscientização; caráter didatizante do livro; o livro como um brinquedo ou livro-brinquedo; relações entre texto e imagem; importância da história e cultura afro-brasileira e africana no contexto escolar.