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3 AS FERRAMENTAS DO NOSSO TRABALHO: UM CAMINHO ETNOGRÁFICO

3.1 Local e período de estudo

O pesquisador qualitativo quer entender diferentes ambientes sociais no espaço social [...]. (BAUER; AARTES, 2002, p. 57).

As mulheres, sujeitos desta investigação, participam do Instituto de Promoção da Nutrição e do Desenvolvimento Humano (IPREDE), situado em Fortaleza, Ceará.

A pesquisa de campo foi realizada no período de maio a outubro de 2011. A população estudada constituiu-se de sete mulheres mães de crianças desnutridas consideradas mais graves pelo IPREDE, com idade acima de 18 anos e que estavam sendo acompanhadas lá por mais de seis meses, tendo desenvolvido vínculo com a instituição e participado de vários projetos e de setores de acompanhamento à mãe e à criança. Das sete mulheres participantes, três frequentavam a instituição no turno da tarde e quatro no turno da manhã.

Dentre as 60 crianças desnutridas com magreza ou magreza extrema (WHO/ANTHRO, 2010) identificadas na relação da instituição, excluímos os casos de comprometimento do estado nutricional por problemas neurológicos ou sindrômicos, como também aquelas que moravam fora de Fortaleza por motivo de dificuldade de acesso às suas residências. Várias dessas crianças não estavam frequentando o IPREDE há mais de três meses, portanto seus prontuários foram arquivados.

Consideramos importante esclarecer sobre os diversos setores de atendimento institucional, com foco naqueles frequentados pelas mães da pesquisa, para a compreensão da abordagem terapêutica oferecida pelo IPREDE, facilitando o entendimento dos resultados, como passamos a discorrer a seguir.

A instituição realiza diversas ações, por meio de programas e projetos, contando com uma equipe multidisciplinar constituída por médicos, nutricionistas, psicólogos, psicomotricistas, pedagogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos e assistentes sociais, além do corpo técnico. O trabalho tem início com o acolhimento das mães e seus filhos com desnutrição, seguindo-se dos atendimentos específicos para cada caso, como mostra a figura 1.

Figura 1 – Programas assistenciais do IPREDE para a criança, sua mãe e sua família.

Fonte: IPREDE (2010).

Os programas assistenciais apresentados na Figura 1 realizam suas atividades no espaço ambulatorial da instituição, nomeado CENTRO DE SAÚDE E DO DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA, DO ADOLESCENTE E DA FAMÍLIA, composto por dois grandes núcleos: Núcleo de Atenção à Criança e ao Adolescente e Núcleo de Promoção do Desenvolvimento da Criança e da Família.

O Núcleo de Atenção à Criança e ao Adolescente envolve dois programas de atendimento: o Programa Acolhimento e Assistência Psicossocial e o Programa de Crescimento e Nutrição na Primeira Infância, dos quais participam as crianças e as mães de nossa investigação .

O Programa Acolhimento e Assistência Psicossocial é responsável pelo primeiro contato da família e suas crianças com a instituição. O objetivo é oferecer às famílias e às crianças um programa de assistência psicossocial, por meio de uma equipe multidisciplinar, com atendimento pautado no acolhimento e atitude humanizada.

O setor é formado por assistentes sociais, psicólogos e enfermeiras, equipe encarregada de realizar as primeiras aproximações com a clientela, por meio de roda de conversa, no sentido de acolher expectativas, apresentar a instituição e delinear os termos de

FAMILIA

PROGRAMA DE CRESCIMENTO E NUTRIÇÃO NA PRIMEIRA INFANCIA PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO NA PRIMEIRA INFANCIA PROGRAMA DE FORTALECIMENTO DAS COMPETENCIAS FAMILIARES PROGRAMA GERAÇÃO DE RENDA FAMILIAR PROGRAMA DE ACOLHIMENTO E ASSISTENCIA PSICOSSOCIAL

relacionamento e das ofertas. A estimativa que procuram cumprir atualmente é de que cada criança e sua família sejam assistidas na instituição por um período aproximado de 18-24 meses.

O Programa de Crescimento e Nutrição na Primeira Infância está organizado para avaliar o estado nutricional das crianças, promover atividades de educação e aconselhamento nutricional e oferecer orientações em consultas individuais ou em grupo. É realizado por médicos, enfermeiras e nutricionistas, com base nos conceitos da segurança alimentar, do aconselhamento e educação nutricional.

Os critérios de avaliação do estado nutricional das crianças estão baseados no WHO/ANTHRO, conforme tabelas seguintes.

Quadro 2 - Classificação do estado nutricional de 0 a 10 anos, considerando P/A, P/I E A/I, segundo a OMS (2006, 2007).

CLASSIFICAÇÃO DO ESTADO NUTRICIONAL

(Crianças de 0 a 10 anos de idade) – OMS 2006 e 2007.

ÍNDICE

ESCORE

Z

DIAGNÓSTICO NUTRICIONAL

PESO para ALTURA (P/A) < -3 Magreza acentuada ≥ -3 a < - 2 Magreza ≥ -2 a ≤ +1 Eutrofia ≥ +1 a ≤ +2 Risco de sobrepeso ≥ +2 a ≤ +3 Sobrepeso > +3 Obesidade PESO para IDADE (P/I)

< -3 Muito baixo peso para a idade

≥ -3 a < - 2

Baixo peso para a idade

≥ -2 a ≤ +2

Peso adequado para a idade

> +2 Peso elevado para a idade*

ALTURA para IDADE (A/I)

< -3 Muito baixa estatura para a idade

≥ -3 a < - 2

Baixa estatura para a idade

Quadro 3 - Classificação do estado nutricional de 0 a 10 anos, considerando o IMC, segundo a OMS (2006, 2007).

CLASSIFICAÇÃO DO ESTADO NUTRICIONAL

(Crianças de 0 a 10 anos de idade) – OMS 2006 e 2007.

ÍNDICE

ESCORE

Z

DIAGNÓSTICO

NUTRICIONAL

0 a 04 anos

DIAGNÓSTICO

NUTRICIONAL

05 a 10 anos IMC

< -3 Magreza acentuada Magreza acentuada

≥ -3 a < - 2 Magreza Magreza ≥ -2 a ≤ +1 Eutrofia Eutrofia ≥ +1 a ≤ +2

Risco de sobrepeso Sobrepeso

≥ +2 a ≤ +3

Sobrepeso Obesidade

> +3 Obesidade Obesidade grave

As ações do programa com as crianças e suas mães estão divididas conforme o resultado da avaliação do estado nutricional de cada criança e suas necessidades específicas, conforme a figura 2:

Figura 2 – Resultado da avaliação do estado nutricional e ações correspondentes

Fonte: IPREDE (2010) GRUPO ALEITAMENTO GRUPO INTERVENÇÃO NUTRICIONAL GRUPO VIGILÂNCIA NUTRICIONAL • Crianças em amamentação menores de 0 a 2 anos. • Crianças de 0 a 6 anos. • Em risco nutricional. • Escore Z ≥ -2 a ≤ -1. • Crianças de 0 a 6 anos. • Com desnutrição primária e secundária. • Escore Z ≥ -2.

Para as crianças de zero a dois anos serão desenvolvidas ações de incentivo ao aleitamento materno e ao vínculo mãe-filho. Para aquelas com risco nutricional, atividades em educação e aconselhamento nutricional.

Crianças com peso baixo para a idade (P/I >-3 e <-2) e peso muito baixo para a idade (P/I <-3), estatura/altura baixa para idade (A/I <-2) e peso baixo para estatura (P/A <-2), conforme a WHO-ANTHRO, são de intervenção nutricional, acompanhadas em seu crescimento; as crianças de nossa pesquisa estão inseridas neste subgrupo.

O segundo grande núcleo - Núcleo de Promoção do Desenvolvimento da Criança e da Família - envolve o Programa de Desenvolvimento na Primeira Infância, o Programa de Fortalecimento das Competências Familiares e o Programa Geração de Renda Familiar.

O Programa de Desenvolvimento na Primeira Infância é destinado a assistir as crianças com ações de promoção do desenvolvimento, considerando as necessidades e potencialidades individuais, em parceria com as famílias, e tendo em vista o contexto social, econômico e cultural em que vivem. Este programa conta com uma equipe multiprofissional: pediatra do desenvolvimento, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta, fonoaudióloga, psicóloga e psicomotricista. Os sujeitos de nosso estudo também estão incluídos neste programa.

O programa inicia com a triagem do desenvolvimento realizada pela equipe multiprofissional, utilizando instrumento de avaliação proposto pelo Ministério da Saúde, possibilitando classificar as crianças em três grupos:

a) crianças sem alterações evidentes do desenvolvimento;

b) crianças com alterações psicomotoras e adaptativas; e

c) crianças com alterações psicoemocionais.

As crianças sem alterações evidentes do desenvolvimento apresentam risco em decorrência do seu estado nutricional, das condições de vulnerabilidade social e eventuais fragilidades no vínculo mãe-filho. Estas crianças passam por atendimento na sala de Mediação, junto com suas mães, para trabalhar a qualidade da interação do cuidador com a criança, utilizando a técnica MISC/ICDP da OMS; e pela Psicomotricidade, para serem estimuladas, por meio do movimento corporal e técnicas específicas, em seu desenvolvimento neuropsicomotor e socioafetivo. A maioria das crianças da pesquisa passa pelos atendimentos mencionados, pois são consideradas sem alterações evidentes no desenvolvimento.

O setor de intervenção precoce trata as crianças com problemas no desenvolvimento nas esferas adaptativa e motora, crianças com sequelas neurológicas e síndromes genéticas que comprometem o desenvolvimento. Uma das crianças da pesquisa é atendida neste setor por apresentar paralisia cerebral.

As crianças com problemas psíquicos com algum comprometimento no desenvolvimento psicossocial são avaliadas e acompanhadas pelo pediatra do desenvolvimento, podendo participar das ações dos setores de Mediação, Psicomotricidade e Atendimento psicológico individual.

Dentre as ações do Programa de Fortalecimento das Competências Familiares, desenhadas com o propósito de fortalecer o desenvolvimento das mulheres, destaca-se o Grupo Conviver, Projeto Mãe Colaboradora e o Projeto Mãe Acolhedora.

O Grupo Conviver, do qual participam eventualmente as mulheres envolvidas na pesquisa, é um espaço para mulheres que privilegia a escuta de suas aflições e alegrias, das impotências e resiliências, ou seja, da complexa dimensão das experiências cotidianas das mulheres/mães, assim como estimula a elaboração de propostas de superação e de projetos de vida; um atendimento pautado em atividades em grupo, facilitando a elevação da autoestima, o autoconhecimento e melhora da saúde mental das mulheres.

O Projeto Mãe Colaboradora tem a periodicidade de um ano e desenvolve ações de formação em serviço, objetivando desenvolver habilidades e competências para o universo do trabalho, com forte investimento em formação pessoal.

O Projeto Mãe Acolhedora tem como diferencial um programa de treinamento com teores específicos voltados para promoção dos cuidados à criança na primeira infância, desenvolvimento infantil e ludicidade.

O Programa Geração de Renda Familiar promove a ampliação das possibilidades de inserção no mundo produtivo, como também a elaboração de conceitos em relação ao planejamento e administração da renda familiar, além da conscientização dos mecanismos de acesso a direitos (IPREDE, 2010).