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Localização relativa de Manchester e Ashton-under-Lyne no Reino Unido.

A I LHA DE M OÇAMBIQUE E A EMERGÊNCIA DO PREDOMÍNIO B ANEANE

Mapa 6: Localização relativa de Manchester e Ashton-under-Lyne no Reino Unido.

Fonte: Mapa adaptado pelo autor.

Manchester era porém uma cidade em processo de transformação, se não numa avançada fase de reconversão. A paisagem urbana tinha-se transformado expressivamente nos anos anteriores. A transfiguração radical da urbe mancuniana estendeu-se até às suas periferias, sendo o seu impacto especialmente visível nas zonas de Salford Quays e Old Trafford. A recepção dos Commonwealth Games de 2002, candidatura premiada em 1995, foi responsável por um amplo projecto de renovação urbana cuja concretização ultrapassou os 600 milhões de libras92. Os

92 Em http://news.bbc.co.uk/sport2/low/special_events/commonwealth_games_2002/2151192.stm ou

consultar relatório em http://www.sportdevelopment.org.uk/manimpactcpc.pdf.

Embora a Manchester pós-guerra não constituísse um destino particularmente atractivo não há dúvidas que esta veio a representar um importante ensejo económico para as populações sul-asiáticas aí estabelecidas. No entanto, como percebemos mais tarde, por mais auspiciosa que a entrada em Manchester pudesse parecer a um estudante de doutoramento que pretendia aí encontrar um tipo bastante específico de imigrantes, os hindus-gujaratis provenientes da África Oriental, esse cenário particular era na sua maioria controlado por muçulmanos de origem paquistanesa e apesar de interessante pouco útil se revelou aos propósitos que então nos guiavam.

Mapa 6: Localização relativa de Manchester e Ashton-under-Lyne no Reino Unido.

Fonte: Mapa adaptado pelo autor.

Manchester era porém uma cidade em processo de transformação, se não numa avançada fase de reconversão. A paisagem urbana tinha-se transformado expressivamente nos anos anteriores. A transfiguração radical da urbe mancuniana estendeu-se até às suas periferias, sendo o seu impacto especialmente visível nas zonas de Salford Quays e Old Trafford. A recepção dos Commonwealth Games de 2002, candidatura premiada em 1995, foi responsável por um amplo projecto de renovação urbana cuja concretização ultrapassou os 600 milhões de libras92. Os

92 Em http://news.bbc.co.uk/sport2/low/special_events/commonwealth_games_2002/2151192.stm ou

grandes armazéns e complexos industriais, despojos de uma revolução acontecida há mais de dois séculos e memórias do declínio e falência de uma indústria exaurida, deram lugar, na última mudança de século, a um impressionante lugar de vanguardismo arquitectónico e cultura. Teatros, arenas musicais, museus, galerias de arte e comerciais entre outros, distinguem hoje o, outrora, espaço de docas e entrepostos. Os diferentes centros da cidade estão repletos de restaurantes experimentais, bares, clubes nocturnos que tentam recapturar a imagem vibrante da ‘Madchester’ dos anos 80. Na Manchester do novo milénio tudo se alinha na promoção de uma imagem cultural afluente e cosmopolita.

AS MIGRAÇÕES NA HISTÓRIA DE MANCHESTER

A economicamente pujante, mas insalubre e socialmente aviltada Manchester, que inspirou Engels (1958 [1845]) na sua narrativa sobre a Condition of the Working Class in England, foi perdendo o seu fulgor financeiro ao longo de todo o séc. XX. Após o ápice de 1913, ano em que a indústria de transformação do algodão de Lancashire foi responsável por 65% da produção mundial, Manchester não mais recuperaria o seu estatuto de capital indiscutível do algodão. Os dois conflitos mundiais e as mudanças internacionais custaram os mercados coloniais, dentre os quais a Índia que absorvia cerca de 45% das exportações têxteis britânicas (Kidd, 2002, p. 187). Apesar de resistir durante algum tempo à oferta que chegava de fora das ilhas, o mercado interno acabou também por ceder, desempenhando a sua parte na complexa rede de factores que ‘afundou’ as fiações e toda a economia adjacente no Lancashire. Durante a Segunda Guerra, a presença na região de um importante pólo de engenharias, nomeadamente aeronáutica, e os complexos fabris passíveis de serem reconvertidos em unidades capazes de auxiliar o esforço de guerra criaram um novo momento na economia local. A contrapartida assentava na importância estratégica dessa mesma concentração que fazia da cidade um alvo para os bombardeiros alemães. No pós-guerra a importância das docas de Manchester e do canal de navegação diminuiu acentuadamente até à irrelevância completa na década de 70. Mas apesar da desindustrialização inequívoca, Manchester manteve-se até aos anos 60 como um importante centro de distribuição e manufactura. A cidade industrial transformou-se progressivamente numa cidade de serviços. Em 1976, 72% da

grandes armazéns e complexos industriais, despojos de uma revolução acontecida há mais de dois séculos e memórias do declínio e falência de uma indústria exaurida, deram lugar, na última mudança de século, a um impressionante lugar de vanguardismo arquitectónico e cultura. Teatros, arenas musicais, museus, galerias de arte e comerciais entre outros, distinguem hoje o, outrora, espaço de docas e entrepostos. Os diferentes centros da cidade estão repletos de restaurantes experimentais, bares, clubes nocturnos que tentam recapturar a imagem vibrante da ‘Madchester’ dos anos 80. Na Manchester do novo milénio tudo se alinha na promoção de uma imagem cultural afluente e cosmopolita.

AS MIGRAÇÕES NA HISTÓRIA DE MANCHESTER

A economicamente pujante, mas insalubre e socialmente aviltada Manchester, que inspirou Engels (1958 [1845]) na sua narrativa sobre a Condition of the Working Class in England, foi perdendo o seu fulgor financeiro ao longo de todo o séc. XX. Após o ápice de 1913, ano em que a indústria de transformação do algodão de Lancashire foi responsável por 65% da produção mundial, Manchester não mais recuperaria o seu estatuto de capital indiscutível do algodão. Os dois conflitos mundiais e as mudanças internacionais custaram os mercados coloniais, dentre os quais a Índia que absorvia cerca de 45% das exportações têxteis britânicas (Kidd, 2002, p. 187). Apesar de resistir durante algum tempo à oferta que chegava de fora das ilhas, o mercado interno acabou também por ceder, desempenhando a sua parte na complexa rede de factores que ‘afundou’ as fiações e toda a economia adjacente no Lancashire. Durante a Segunda Guerra, a presença na região de um importante pólo de engenharias, nomeadamente aeronáutica, e os complexos fabris passíveis de serem reconvertidos em unidades capazes de auxiliar o esforço de guerra criaram um novo momento na economia local. A contrapartida assentava na importância estratégica dessa mesma concentração que fazia da cidade um alvo para os bombardeiros alemães. No pós-guerra a importância das docas de Manchester e do canal de navegação diminuiu acentuadamente até à irrelevância completa na década de 70. Mas apesar da desindustrialização inequívoca, Manchester manteve-se até aos anos 60 como um importante centro de distribuição e manufactura. A cidade industrial transformou-se progressivamente numa cidade de serviços. Em 1976, 72% da

população empregada em Manchester estava no sector dos serviços e, em 1981, a industria têxtil empregava 10% do número de empregados que reclamava em 1951 (Werbner, 1994, p. 105.). Não obstante, o declínio industrial e demográfico e a inevitável contracção económica, a Grande Manchester provou ser um terreno próspero para a imigração indiana e paquistanesa.

Pela sua localização e pela natureza dos desenvolvimentos pioneiros associados a várias actividades económicas fixadas no centro e na sua periferia, Manchester tem uma história antiga na recepção de alguns contingentes imigrantes, como explorámos no primeiro capítulo, que se reactualizaria na segunda metade do século XX. A mecanização da indústria, a crescente procura mundial pelos têxteis de Lancashire e o gigante entreposto em que a cidade, em particular, se transformou desde o séc. XVIII atraiu, para além dos propínquos vizinhos irlandeses escoceses e galeses, também alemães, franceses, italianos, gregos, arménios, holandeses, portugueses, espanhóis e marroquinos entre outras nacionalidades. Algumas destas nacionalidades desapareceram ou diluíram-se durante o séc. XX; enquanto outras se mantiveram visíveis até hoje, como é perceptível pelos nomes de algumas igrejas ou associações recreativas ainda em funcionamento na cidade. A confluência de nacionalidades, personalidades e dinheiro foi igualmente responsável pelo crescimento de instituições de ensino e investigação na cidade e a história da Universidade de Manchester, juntamente com a indústria química, são testemunhos da influência directa da imigração na cidade (Frangopulo, 1977).

Independentemente do que se possa saber hoje sobre a imigração e o seu impacto nas sociedades de acolhimento é difícil, e particularmente enganador, tentar abordar o fenómeno migratório no mundo ocidental a partir de uma perspectiva universalista. Pensar a imigração enquanto significante relativamente consensual e partir daí para pensar as suas consequências nos países receptores, seja no mercado de trabalho, na economia ou no tipo de reacções sociais de um modo abstracto é um erro frequente e com custos analíticos elevados. Um dos objectivos centrais deste trabalho, como tem sido referido, é compreender a importância das ligações tecidas ao longo da história entre populações receptoras e populações de origem imigrante. Manchester é, a este propósito, um exemplo bastante interessante. O papel da imigração na construção da cidade nos sécs. XVIII e XIX e a presença quase constante nesta de contingentes imigrantes é invocado coloquialmente como um legado que atesta um registo histórico de neutralidade no campo da coabitação inter-étnica. Os registos

população empregada em Manchester estava no sector dos serviços e, em 1981, a industria têxtil empregava 10% do número de empregados que reclamava em 1951 (Werbner, 1994, p. 105.). Não obstante, o declínio industrial e demográfico e a inevitável contracção económica, a Grande Manchester provou ser um terreno próspero para a imigração indiana e paquistanesa.

Pela sua localização e pela natureza dos desenvolvimentos pioneiros associados a várias actividades económicas fixadas no centro e na sua periferia, Manchester tem uma história antiga na recepção de alguns contingentes imigrantes, como explorámos no primeiro capítulo, que se reactualizaria na segunda metade do século XX. A mecanização da indústria, a crescente procura mundial pelos têxteis de Lancashire e o gigante entreposto em que a cidade, em particular, se transformou desde o séc. XVIII atraiu, para além dos propínquos vizinhos irlandeses escoceses e galeses, também alemães, franceses, italianos, gregos, arménios, holandeses, portugueses, espanhóis e marroquinos entre outras nacionalidades. Algumas destas nacionalidades desapareceram ou diluíram-se durante o séc. XX; enquanto outras se mantiveram visíveis até hoje, como é perceptível pelos nomes de algumas igrejas ou associações recreativas ainda em funcionamento na cidade. A confluência de nacionalidades, personalidades e dinheiro foi igualmente responsável pelo crescimento de instituições de ensino e investigação na cidade e a história da Universidade de Manchester, juntamente com a indústria química, são testemunhos da influência directa da imigração na cidade (Frangopulo, 1977).

Independentemente do que se possa saber hoje sobre a imigração e o seu impacto nas sociedades de acolhimento é difícil, e particularmente enganador, tentar abordar o fenómeno migratório no mundo ocidental a partir de uma perspectiva universalista. Pensar a imigração enquanto significante relativamente consensual e partir daí para pensar as suas consequências nos países receptores, seja no mercado de trabalho, na economia ou no tipo de reacções sociais de um modo abstracto é um erro frequente e com custos analíticos elevados. Um dos objectivos centrais deste trabalho, como tem sido referido, é compreender a importância das ligações tecidas ao longo da história entre populações receptoras e populações de origem imigrante. Manchester é, a este propósito, um exemplo bastante interessante. O papel da imigração na construção da cidade nos sécs. XVIII e XIX e a presença quase constante nesta de contingentes imigrantes é invocado coloquialmente como um legado que atesta um registo histórico de neutralidade no campo da coabitação inter-étnica. Os registos

históricos mostram, contudo, que estes primeiros fluxos migratórios, apesar de se terem introduzido conspicuamente no espaço público da cidade, se distinguem dos fluxos que foram protagonizados durante o século XX. Quer a imigração judaica ocorrida após a ascensão do Partido Nacional Socialista na Alemanha, quer, em particular, a imigração não-branca originária dos territórios da Commonwealth são movimentos profundamente distintos da imigração burguesa sobrevinda durante o auge da revolução industrial para o noroeste britânico. Não pretendemos com isto desvalorizar o exercício comparativo aplicado ao fenómeno migratório, muito menos depreciar a relevância da historiografia que lhe está subjacente. O que queremos salientar é precisamente a pertinência histórica das continuidades particulares do enquadramento social e político de determinados tipos de fluxos. Se, por um lado, a comparação dos fluxos migratórios ‘não-brancos’93, com o seu início significativo no pós-Segunda Guerra, com a imigração de industriais e investidores ao longo de todo o século XIX não se mostra particularmente interessante na observação da evolução das relações inter-étnicas em Inglaterra, sobretudo devido à diferente composição social e económica desses mesmos fluxos e aos nichos que ocupavam; por outro lado, comparar a posição estrutural, e por conseguinte, o tipo de obstáculos que tiveram de enfrentar os irlandeses na vaga de industrialização de finais do séc. XVIII, e daí em diante, com indianos, paquistaneses e afro-caribenhos é, por sinal, revelador da persistência de alguns elementos produtores de antagonismo social no que à imigração diz respeito. Regressando a Engels (1958 [1845], p. 105), um imigrante ele próprio, a descrição que faz dos irlandeses e da sua influência nos colegas de fábrica ingleses que encontramos num dos seus principais trabalhos é sintomática de uma percepção generalizada e abusadoramente culturalista, sobre este fluxo migratório em particular. A caracterização da população irlandesa como incivilizada e primitiva e como foco de contágio, nos modos e costumes, do operário inglês está perigosamente próxima das reacções viscerais dos nacionalistas britânicos um século mais tarde. Voltaremos a esta questão adiante.

Pese embora o acentuado declínio da indústria têxtil no século XX é a ela que cabe o papel de principal factor de captação de imigrantes e foi este o sector que, na região, mais imigrantes absorveu nos últimos três séculos. O principal vector de uma

93 A designação ‘não-brancos’ é uma tradução não literal mas o mais aproximada possível da expressão

coloured que atravessa todo o período colonial até à ex-metrópole e que traduz exemplarmente a ideia

de continuidades no esquema de relações inter-étnico entre o colonial e o pós-colonial.

históricos mostram, contudo, que estes primeiros fluxos migratórios, apesar de se terem introduzido conspicuamente no espaço público da cidade, se distinguem dos fluxos que foram protagonizados durante o século XX. Quer a imigração judaica ocorrida após a ascensão do Partido Nacional Socialista na Alemanha, quer, em particular, a imigração não-branca originária dos territórios da Commonwealth são movimentos profundamente distintos da imigração burguesa sobrevinda durante o auge da revolução industrial para o noroeste britânico. Não pretendemos com isto desvalorizar o exercício comparativo aplicado ao fenómeno migratório, muito menos depreciar a relevância da historiografia que lhe está subjacente. O que queremos salientar é precisamente a pertinência histórica das continuidades particulares do enquadramento social e político de determinados tipos de fluxos. Se, por um lado, a comparação dos fluxos migratórios ‘não-brancos’93, com o seu início significativo no pós-Segunda Guerra, com a imigração de industriais e investidores ao longo de todo o século XIX não se mostra particularmente interessante na observação da evolução das relações inter-étnicas em Inglaterra, sobretudo devido à diferente composição social e económica desses mesmos fluxos e aos nichos que ocupavam; por outro lado, comparar a posição estrutural, e por conseguinte, o tipo de obstáculos que tiveram de enfrentar os irlandeses na vaga de industrialização de finais do séc. XVIII, e daí em diante, com indianos, paquistaneses e afro-caribenhos é, por sinal, revelador da persistência de alguns elementos produtores de antagonismo social no que à imigração diz respeito. Regressando a Engels (1958 [1845], p. 105), um imigrante ele próprio, a descrição que faz dos irlandeses e da sua influência nos colegas de fábrica ingleses que encontramos num dos seus principais trabalhos é sintomática de uma percepção generalizada e abusadoramente culturalista, sobre este fluxo migratório em particular. A caracterização da população irlandesa como incivilizada e primitiva e como foco de contágio, nos modos e costumes, do operário inglês está perigosamente próxima das reacções viscerais dos nacionalistas britânicos um século mais tarde. Voltaremos a esta questão adiante.

Pese embora o acentuado declínio da indústria têxtil no século XX é a ela que cabe o papel de principal factor de captação de imigrantes e foi este o sector que, na região, mais imigrantes absorveu nos últimos três séculos. O principal vector de uma

93 A designação ‘não-brancos’ é uma tradução não literal mas o mais aproximada possível da expressão

coloured que atravessa todo o período colonial até à ex-metrópole e que traduz exemplarmente a ideia

região fortemente industrializada, Manchester, foi durante mais de um século a capital da indústria têxtil mundial. Após o segundo conflito mundial, a aguda escassez de mão-de-obra sobreposta à competição que se intensificou desde a viragem do século, da parte de outros países produtores, onde temos novamente a Índia em plano de destaque, associada à vulgarização internacional das tecnologias têxteis obrigaram a indústria têxtil mancuniana a um último esforço no sentido da manutenção da sua competitividade. A produção incessante, sem períodos de descanso para a maquinaria, e a captação de mão-de-obra suficiente para operarem, por turnos, os equipamentos industriais concederam um último fôlego e representaram simultaneamente uma oportunidade de emprego para os imigrantes provenientes do subcontinente. É neste momento que as histórias de três continentes se voltam a entrelaçar reinventando a cartografia migratória num movimento que converteu colónias e ex-colónias em locais de origem e que Ballard (2002) qualificaria como ‘colonização invertida’.

Regressando ao presente e à cidade que nos ocupa, embora seja notável o trabalho extenso dos planeadores urbanos na metamorfose operada sobre a face envelhecida da cidade é impraticável transitar por Manchester e ignorar as ‘cicatrizes do passado’ ostentadas numa ubíqua arquitectura fabril agora reconvertida em sofisticados e inflacionados lofts, tal como é impossível atravessar as linhas de fronteira do centro urbano sem tropeçar nas diferentes cidades que fazem a cidade. As reminiscências de um extenso passado industrial e da numerosa força de trabalho imigrante que o suportou, sobretudo na sua fase terminal, são ainda perfeitamente visíveis na periferia e nas imensas ruas que desafiam a perspectiva de quem as olha sustentando durante centenas de metros as exíguas habitações de tijolo vermelho, tão características como indistintas. São os incontáveis quilómetros quadrados de tijolo vermelho enegrecido e despersonalizado e as altas chaminés, que já pouco fumo libertavam no final dos anos 70, que enquadram a atmosfera urbano-depressiva que deu origem a fenómenos musicais e sociais como os Joy Division, os The Smiths e o epicêntrico Hacienda (rapidamente transformado num dos principais ex-líbris da cidade durante os anos 80). O desprazer e a angústia existencial de uma geração que herdou uma cidade sem vida voltaram a colocar Manchester no mapa mundo, embora esta eclosão não tivesse tido uma repercussão suficientemente forte de modo a reverter a condição socioeconómica desfavorável que a ‘cottonopolis’ do séc. XIX atravessava e que se vinha agudizando desde as primeiras décadas do séc. XX.

região fortemente industrializada, Manchester, foi durante mais de um século a capital da indústria têxtil mundial. Após o segundo conflito mundial, a aguda escassez de mão-de-obra sobreposta à competição que se intensificou desde a viragem do século, da parte de outros países produtores, onde temos novamente a Índia em plano de destaque, associada à vulgarização internacional das tecnologias têxteis obrigaram a indústria têxtil mancuniana a um último esforço no sentido da manutenção da sua competitividade. A produção incessante, sem períodos de descanso para a maquinaria, e a captação de mão-de-obra suficiente para operarem, por turnos, os equipamentos industriais concederam um último fôlego e representaram simultaneamente uma oportunidade de emprego para os imigrantes provenientes do subcontinente. É neste momento que as histórias de três continentes se voltam a entrelaçar reinventando a cartografia migratória num movimento que converteu colónias e ex-colónias em locais de origem e que Ballard (2002) qualificaria como ‘colonização invertida’.

Regressando ao presente e à cidade que nos ocupa, embora seja notável o trabalho extenso dos planeadores urbanos na metamorfose operada sobre a face