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Luminotécnica e sonoplastia

4. Definição dos termos chave

3.4. Luminotécnica e sonoplastia

A luz e o som são mais dois elementos essenciais na hora de montar um espetáculo. A iluminação e as sonoridades utilizadas pela bailarina também ajudam a criar as várias ambiências e labirintos por onde Roriz nos conduz. Neste ponto visitaremos tais aspetos e procederemos à sua análise. Tanto um como outro criam ambientes e paisagens e ajudam a criar sensações e emoções no público, para além de nos contextualizarem no espaço e no tempo em que decorre a ação. Gill Camargo descreve da seguinte forma a importância da utilização da iluminação nas artes de palco:

Às vezes, a intenção é representar a realidade não por volumes e elementos móveis, mas só por efeitos atmosféricos, obtidos principalmente, por meio de combinação de cores, luzes, fumaça e projecções. (…)

Os elementos visuais do palco modificam-se completamente quando recebem luz, principalmente quando direccionada sobre eles. Compare-se a impressão que se tem do cenário, dos figurinos, dos gestos e das marcações dos atores quando se apresentam sob luz de serviço nos ensaios, com a impressão que deles se obtém na noite de estréia, quando são iluminados por reflectores. O poder de recortar, esculpir, esconder e revelar, dentre muitos outros efeitos que se podem obter com auxílio dos reflectores, transforma completamente o espaço e os elementos que estão inseridos nele.

A função selectiva da luz conduz o olhar do espectador somente para aquilo que deve ser visto, mergulhando o restante no escuro; a função dimensional revela que o corpo ocupa um lugar no espaço tridimensional e faz dele um ser que se expressa na horizontal, na vertical e na linha da profundidade. (…)

A função iluminante intensifica os sinais visuais pré-existentes nas coisas, nos corpos, nas figuras. Estes quatro papéis da iluminação cênica – visibilidade, dimensão,

277 Cf. Olga Roriz, entrevista gentilmente cedida a Rui Pires, Anexo A, p.114. Acrescento nosso. 278 Cf. Ibidem, p. 114-115.

73 selectividade e atmosfera – certamente interferem nas condições de percepção dos elementos visuais, podendo aproximá-los ou distanciá-los do espectador. (…)

A iluminação reforça e põe em evidência a natureza tridimensional do espaço cênico. As lentes, os graus de abertura e fechamento dos focos, os diafragmas, os filtros coloridos e a regulagem de intensidade das luzes atuam como se fossem verdadeiros operadores proxémicos, capazes de afastar ou aproximar os signos visuais.279

Contrariamente à rarefação de elementos cénicos, a luz acaba por assumir o papel de estar sempre presente280. O efeito da iluminação foi usado por Olga Roriz para criar texturas:

“para mim era muito importante, e apesar de eu não lhe tocar e não a utilizar, era uma ramagem que existia, uma trama de luz que existia sobre as paredes, e que também ia para cima dela, uma imagem muito forte.”281 A criadora adotou, assim, as potencialidades da luz

para poder transmitir as ambiências que lhe surgiram na cabeça em relação ao habitat e à carga psicológica de Electra e de sua família. Justifica a intérprete:

Eu tinha a sensação que aquela casa era enorme e estava cheia de raízes, como aquelas casas que estão cobertas de plantas, um emaranhado, obviamente muito simbólico, era a teia que cobria aquela família, aquela casa toda, que a sombreava e assombrava a ela. Foi isso que passei para o iluminista, disse que devia ter a sombra de uma floresta, umas raízes, uma coisa esquisita, um jardim imaginário, porque vejo esta mulher no exterior. Eu vejo sempre esta mulher no jardim.282

Quanto à sonoplastia, como vimos anteriormente, trata-se de um elemento de extrema importância, uma vez que “ os signos auditivos do espetáculo têm forte poder de aproximação com o público. (…) A música e os efeitos de sonoplastia, produzidos por meios naturais, ao vivo, ou por meios mecânicos, com sons pré-gravados.”283 Segundo Camargo, os

sons escolhidos para um espetáculo cumprem duas funções distintas:

1. Sons que atuavam como elemento de discurso cênico, servindo como uma espécie de operador ou de elemento de articulação entre micro-estruturas (as cenas) e a macro-estrura do espectáculo; ou mesmo de sons que se sobrepunham às cenas, com as mais diversas finalidades. (…) 2. Sons que atuavam como elementos internos do plano ficcional: uma derrapagem de automóvel, barulho de coisas caindo, personagem tocando piano em cena ou ouvindo uma música que vinha dos arredores. Nesse caso, tratávamos de sons que eram ouvidos simultaneamente pela personagem e pelo espectador.

Enquanto a primeira perspectiva dizia respeito a sons que se sobreponham ao plano ficcional, como recursos expressivos vindos de fora, a segunda falava de sons integrados no plano ficcional, como se fossem parte do mundo representado.

A música desempenha uma série de funções no espectáculo: atua como elemento de suspense, como recurso intensificador ou suavizador; é capaz de multiplicar a impressão que se tem sobre algo, resumir ideias, prolongar conflitos, comentar situações, estabelecer contraste, fazer citações, expressar estados da mente, evocar o passado, criar um clima, criticar, ironizar, parodiar etc. Todas essas funções da música permitem a natureza referencial, expressiva, conotativa, fática, metalingüística e poética da linguagem e apresentam-se, pois, com forte intenção comunicativa284

279 Cf. Roberto Gill Camargo, Palco & Platéia – Um Estudo Sobre Proxêmica Teatral, p. 192, 195-199. 280 Cf. Olga Roriz, Entrevista gentilmente cedida a Rui Pires, Anexo A, p. 116.

281 Cf. Ibidem. 282 Cf. Ibidem.

283 Cf. Roberto Gill Camargo, Palco & Platéia – Um Estudo Sobre Proxêmica Teatral, p. 206. 284 Cf. Ibidem, p. 208-209.

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A escolha musical para Electra, como nos confidenciou Roriz, começou com uma seleção de “ambiências, de autores e compositores” feita pela coreógrafa, juntamente com Paulo Reis, seu cúmplice criativo. Afirma Olga Roriz o que pretendia para Electra:

(…) [sons] que podiam ter uma ambiência contemplativa, nostálgica, triste, às vezes penosa, mas por outro lado, precisava também de momentos fortes, agrestes, porque acho que a Electra é agreste, às vezes até parece homossexual.285

A criadora vê esta mulher sempre “virada só para outras mulheres”, de aparência “altíssima”, capaz de impor “respeito” por um lado, mas, por outro, encontra-a “pequenina e ínfima e frágil.”286 A ideia sempre foi encontrar “ambiências sonoras a pensar nestas

caraterísticas.”287 Assim, das suas pesquisas, Olga Roriz escolheu cinco músicas que lhe

pareciam as mais adequadas. São elas: “Bryars Amjad nº 2”, pertencente ao álbum Amjad, composto por Gavin Bryars em 2007; “Waltz by the River”, do álbum Dust of Time, pelo compositor Eleni Karaindrou de 2009; “Crime Scenes”, pertencente ao disco Residue, composto por Erik Honorel e Jan Bang em 2007; “Release from Tension” do ábum com o mesmo nome de Carlos Zíngaro; e “The Seesaw Room” que integrava o disco Maison des

Rendez-Vous do compositor Benco & Hladnik288.

285 Cf. Olga Roriz, Entrevista gentilmente cedida a Rui Pire, Anexo A, p. 116. Acrescento nosso. 286 Cf. Ibidem.

287 Cf. Ibidem.

288 Olga Roriz, correio electrónico gentilmente enviado em (12/09/2014). Por questões de privacidade, não incluímos o seu endereço eletrónico.

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C

APÍTULO

4

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ELAÇÃO PERSONAGEM MITOLÓGICA

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MULHER

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ORIZ

4.1. Relação antropomórfica e leituras sociocríticas da