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Parte II. Análise da Organização Narrativa em Adultos: Comparação

2. Método

2.1 Participantes

A amostra da presente investigação é constituída por 126 adultos, 63 do sexo masculino

(50%) e 63 do sexo feminino (50%) com idades compreendidas entre os 20 e os 45 anos (M =

29,75; DP = 6,75), sem história de psicopatologia passada ou actual. Os sujeitos estão

distribuídos equitativamente por três Grupos Etários (20-25; 26-30; 35-45) e por três Níveis Sócio-culturais (NSC). O NSC foi definido tendo em conta o grau de escolaridade dos sujeitos da seguinte forma: NSC Baixo (grau de escolaridade até ao 9º ano inclusive); NSC Médio (grau de escolaridade entre o 10º e o 12º ano) e NSC Alto (ensino superior, a frequentar ou concluído).

A tabela 1 apresenta uma síntese da amostra por Grupo Etário, por NSC e por Sexo.

Tabela 1. Distribuição da amostra por idade, sexo e nível sócio-cultural.

Grupo Etário NSC Baixo NSC Médio NSC Alto

20 – 25 7 M e 7 F 7 M e 7 F 7 M e 7 F

26 – 30 7 M e 7 F 7 M e 7 F 7 M e 7 F

35 – 45 7 M e 7 F 7 M e 7 F 7 M e 7 F

M= Masculino; F= Feminino

A selecção dos sujeitos decorreu em diferentes locais: numa Escola Superior de

Enfermagem de Coimbra1, onde foi realizado um pedido de colaboração formal ao então

Presidente do Concelho Directivo (anexo 1), numa Escola de Formação Profissional, em

Coimbra2, onde foi realizado um pedido de colaboração informal à Presidente da Escola e, por

último, através de um sistema de rede de amigos e conhecidos que indicaram outros sujeitos (na zona de Coimbra, Esposende, Vila do Conde, Évora, Viseu e Setúbal).

2.2 Instrumentos

2.2.1 Instrumentos de recolha de dados relativos aos sujeitos

O primeiro contacto com os sujeitos foi realizado pessoal ou telefonicamente, servindo para aferir dados como o sexo, a idade, a disponibilidade e interesse em participar no estudo e, quando possível nesta primeira fase, para despistar a existência de psicopatologia prévia ou actual, uma vez que esta constituiu um factor de exclusão de participação no estudo. O segundo

contacto foi efectuado em horário e local previamente combinado (em casa do participante, em

consultório do entrevistador ou em local público) onde o sujeito preencheu o Protocolo de Participação Voluntária (anexo 2) e, posteriormente, a Ficha de Identificação e de Despiste de Psicopatologia (anexo 3). Esta última, para além de integrar questões relativamente aos dados demográficos e sócio-culturais do sujeito, inclui as seguintes questões de forma a complementar o despiste da existência de perturbação emocional: a) Já recorreu a ajuda psicológica ou psiquiátrica? b) Actualmente, encontra-se em acompanhamento psiquiátrico ou psicológico? c) Actualmente está a fazer tratamento com medicação psiquiátrica?

Os sujeitos que, após o preenchimento da Ficha de Identificação e de Despiste de Psicopatologia não corresponderem aos critérios definidos, não passaram à fase de administração dos instrumentos ou, se o fizeram, os seus dados não foram incluídos no estudo. Os sujeitos que revelaram critérios adequados ao estudo submeteram-se às tarefas de recolha de narrativas, através dos dois instrumentos explicitados no ponto que se segue.

2.2.2 Instrumentos de recolha das narrativas

A recolha das narrativas dos sujeitos foi realizada através de duas tarefas, pela seguinte ordem:

a) Indução de narrativa espontânea de questão única, sendo a narrativa áudio gravada na

presença do entrevistador. Este procedimento baseia-se no modelo de Entrevista de Elicitação de

três questões (acontecimento de vida; acontecimento de vida positivo; acontecimento de vida negativo). No presente estudo recorreu-se apenas à primeira questão, uma vez que não se registaram diferenças nas características das narrativas associadas a acontecimentos positivos e de narrativas de acontecimentos negativos.

A questão foi lida inicialmente pelo entrevistador e, posteriormente, facultada ao entrevistado por escrito. Passamos a transcrever a questão:

Pedimos-lhe que procure recordar-se de um acontecimento da sua vida. Pode ser um acontecimento qualquer. Tanto pode ser algo que aconteceu há pouco tempo, como algo que já tenha acontecido há muito tempo. E tanto pode ser um acontecimento que não gosta de recordar, como pode ser um que gosta de recordar. É à sua escolha. Depois de o recordar, pedimos-lhe que o conte para o gravador. Pode usar as palavras que quiser e levar o tempo que precisar.

b) Utilização do livro “Frog, where are you” (Mayer, 1979), constituído apenas por

imagens, para indução de narrativa de ficção.

Este instrumento, inicialmente usado por Bamberg (1986), tem sido utilizado em vários estudos de competência linguística dada a multiplicidade de processos, conteúdos, e elementos

estruturais sugeridos pelas imagens. (e.g., Reilly, Bates, & Marchman, 1998). O livro “Frog,

where are you?”, de 24 páginas, refere-se à história de uma rapaz, um cão e um sapo e está idealmente estruturado tendo em conta aquilo que as crianças e os adultos consideram ser uma história. De acordo com Wigglestworth (1997) o número de imagens permite ao participante envolver-se com a história, não sendo extenso a ponto de provocar cansaço e aborrecimento.

A sequência do procedimento utilizado obedeceu à seguinte instrução: “gostaria que folheasse o livro, visualizando todas as figuras. Quando terminar, conte a história do livro, à medida que visualiza de novo as imagens”.

2.2.3 Instrumentos de análise das narrativas

- Sistema de Codificação da Coerência Estrutural Narrativa (Gonçalves, Henriques & Cardoso 2001; 2006).

Este sistema de Codificação baseia-se no modelo de estrutura narrativa de Labov & Walesky (1967) e inspirado na formulação de Baerger e McAdam’s (1999) de avaliação da coerência de histórias de vida. Estudos anteriores relataram níveis elevados de fidelidade inter- observadores (i.e., 96%) e de consistência interna (valores Alpha entre.79 e.92) (Gonçalves,

Henriques, Alves e Soares, 2002). A avaliação da Estrutura e Coerência Narrativa será feita

relativamente a quatro Parâmetros ou Sub-dimensões: Orientação, Sequência Estrutural,

Comprometimento Avaliativo e Integração, descritas anteriormente no enquadramento teórico. - Sistema de Codificação da Complexidade do ProcessoNarrativo (Gonçalves, Henriques, Alves & Rocha, 2001, 2006).

Este sistema de codificação, inspirado na proposta de Lynne Angus e colaboradores

(1996), permite a avaliação do grau de complexidade do Processo narrativo através da cotação

da diversidade da experiência sensorial, da complexidade dos estados subjectivos (emocionais e cognitivos) e da multiplicidade dos significados revelados pelo sujeito ao produzir as suas narrativas. Para tal, a avaliação é igualmente feita nos quatro Parâmetros anteriormente

descritos: Objectivação, Subjectivação Emocional, Subjectivação Cognitiva e Metaforização. Para

este instrumento encontraram-se elevados níveis de fidelidade inter-observadores (i.e., 89%) e de consistência interna (valores de Alpha entre .66 e .87) (Gonçalves, Henriques, Alves e Soares, 2002).

- Sistema de Codificação da Diversidade do Conteúdo Narrativo (Gonçalves, Henriques, Soares & Monteiro, 2001, 2006)

Este sistema de codificação procura avaliar a diversidade do Conteúdo narrativo, sendo operacionalizado através da cotação dos quatro parâmetros que constituem o Conteúdo e diversidade narrativa e descritos no enquadramento teórico da presente investigação: diversidade de Personagens, diversidade de Cenários, diversidade de Acontecimentos e diversidade de

Temas. A escala apresenta bons níveis de fidelidade inter-observadores (i.e., 94%) e de consistência interna (valores de Alpha entre .86 e .90) (Gonçalves, Henriques, Alves e Soares, 2002).

Os Sistemas de Codificação das Narrativas apresentados são cotados de acordo com um

conjunto de critérios comuns, mediante seis leituras de cada narrativa a cotar.A primeira leitura

visa estabelecer um contacto inicial global com o discurso do sujeito, avaliando-se, na segunda leitura, a existência ou não de uma narrativa, de acordo com o critério proposto por Labov &

Waletsky (1967) que postula a ligação de duas unidades de discurso no tempo. As quatro

restantes leituras têm como objectivo a codificação dos quatro parâmetros de cada uma das

Dimensões de análise, de acordo com o grau de presença na narrativa em causa, avaliado

através de uma escala de Likert de cinco pontos: 1 – nada ou muito pouco; 2 – pouco; 3 –

moderado; 4 – elevado; 5 – muito elevado. Este sistema de avaliação permite ainda um score

global, (que varia entre 0 e 80) como resultado da soma de cada um dos índices para os respectivos desvios.

2.3 Procedimentos

Os participantes no estudo procederam a duas tarefas de elicitação de narrativas (uma de narrativa autobiográfica e outra de narrativa de ficção), tal como explicitado anteriormente. Os entrevistadores neste processo foram quatro licenciados em psicologia, treinados para procederem à recolha de dados de identificação, à indução das duas tarefas de recolha das narrativas e à posterior transcrição das mesmas. As histórias narradas foram áudio gravadas, transcritas (todas as narrativas e transcrições correspondentes foram revistas pela autora do estudo de forma a uniformizar o mais possível os critérios de transcrição) e posteriormente

codificadas e analisadas nas três dimensões narrativas Estrutura e Coerência narrativa, Processo

e Complexidade narrativa e Conteúdo e Diversidade narrativa. Os Juízes responsáveis pela

codificação das narrativas foram constituídos por nove psicólogos treinados no uso dos sistemas de codificação referidos e ingénuos quanto aos dados de identificação dos sujeitos (sexo, idade e nível sócio-cultural). Os Juízes foram distribuídos da seguinte forma: 2 pares para a cotação do

Processo narrativo; 2 pares para a cotação da Estrutura narrativa e 1 par para a cotação do

Conteúdo narrativo. O cálculo do acordo inter-observadores foi efectuado sobre as narrativas cotadas por cada par, através do cálculo do coeficiente de correlação intra-classes para variáveis ordinais (Everitt & Hay, 1992). Os valores de acordo obtidos fixaram-se entre os 70% e os 100%

No documento A organização narrativa em adultos (páginas 54-59)