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FRANCÊS MÉDIO

1.4 MODELO MATEMÁTICO

1.4.3 M ODELAÇÃO M ATEMÁTICA DE P ROCESSOS Q UÍMICOS

Inicialmente pretende-se reflectir resumidamente sobre a noção de Tecnologia e a sua relação com o conceito previamente discutido de Ciência. Assim, sabe-se que, por definição:

Ciência (do Latim scientia, que significa “conhecimento”) é, no seu sentido mais lato, qualquer sistema baseado no conhecimento ou prática prescritiva capaz de resultar numa previsão ou num resultado previsível[16].

Tecnologia (do Grego technología (τεχνολογία) – téchnē (τέχνη), “arte”, “capacidade” ou “competência” e -logía (-λογία), o estudo de algo ou o ramo de conhecimento de uma disciplina) corresponde à capacidade dos humanos (ou de outros animais) de desenvolvimento e utilização de ferramentas ou competências, e a forma como estas afectam a sua aptidão para controlarem ou se adaptarem ao seu meio ambiente[17].

Afigura-se óbvio que ambos os conceitos referidos anteriormente se relacionam com a noção de conhecimento. No entanto, tal não implica que estejam obrigatoriamente relacionados entre si. Na verdade, a organização das sociedades tecnológicas modernas poderia fazer pensar que a Tecnologia seria essencialmente uma aplicação prática do conhecimento científico e, deste modo, estaria dependente deste. No entanto, uma análise à História do Homo sapiens sapiens permite concluir que uma das razões que conduziram ao seu inegável sucesso se deve à sua natural apetência para a adaptação e manipulação do seu meio envolvente ou seja, dada a própria definição, um especial talento para o desenvolvimento e aplicação de Tecnologia. De facto, o Homem constrói Tecnologia desde praticamente o seu surgimento como subespécie específica (há 195 000 anos atrás), muito antes do desenvolvimento formal do conceito de Ciência (e.g. descoberta e utilização do fogo, da roda, da metalurgia, etc). Assim, verifica-se que o fabrico de Tecnologia, a construção de conhecimento tecnológica numa determinada área, é perfeitamente possível, eficaz e útil, sem que o correspondente conhecimento científico se encontre solidificado. Assim, a produção de Tecnologia depende apenas do primeiro passo do modelo apresentado para o Método Científico: a caracterização dependente da observação e da experiência, ou seja de experimentação informal, não sistematizada nem controlada. Este facto continua a ser realidade, mesmo na contemporaneidade. Um exemplo paradigmático

relaciona-se com a descoberta dos Raios-X, oficialmente atribuída a Wilhelm Conrad Röntgen (1845-1923) em Novembro de 1895, cujas propriedades se revelaram imediatamente óbvias para uso no diagnóstico médico (vd. Figura 1.8). A primeira aplicação nesse âmbito foi realizada menos de três meses após a sua detecção fortuita, antes mesmo de se estabelecer um modelo cientificamente aceitável para a representação da própria natureza dos Raios-X (como indica o seu próprio nome)[18]. Deste modo, pode-se concluir que o processo científico pode ser muito importante na evolução (ou aceleração da evolução) da construção de Tecnologia, mas tal não significa que tenha de ser a sua condição necessária.

O profissional que ao longo dos tempos se especializou no desenvolvimento de Tecnologia é geralmente designado por Engenheiro (do Latim ingenium, que significa engenho). Genericamente um engenheiro moderno dedica-se ao estudo, desenvolvimento, projecto, construção, operação e controlo de sistemas tecnológicos. Deste modo, é possível afirmar que todos os engenheiros aplicam a Matemática, a Física (ou o conhecimento científico no geral) e engenho na resolução de problemas técnicos de uma forma segura e económica.

Figura 1.8 Primeira radiografia “médica” de Wilhelm Röntgen, da mão da sua esposa, tirada em 22 de Dezembro de 1895[18].

De entre os 4 ramos clássicos da engenharia (os “big 4”): engenharia electrotécnica (ou eléctrica), engenharia civil (ou da construção), engenharia mecânica (ou de máquinas) e engenharia química; que se debruçam sobre o estudo dos sistemas eléctricos, sistemas de construção, sistemas mecânicos e sistemas químicos, respectivamente, importa agora salientar o ramo específico da Engenharia Química.

O surgimento da profissão de engenheiro químico é essencialmente um processo que ocorre na viragem do século XIX para o século XX, num contexto anglo-saxão: da Grã- Bretanha para os Estados Unidos da América. Neste período, verifica-se o aparecimento de um novo profissional (que é designado por engenheiro químico), um

processos laboratoriais e a produção industrial em grande escala, sob uma perspectiva obrigatoriamente económica. Tal facto surge como resposta à necessidade que advém da crescente complexidade dos processos químicos industriais, nomeadamente devida à generalização de processos contínuos.

No entanto, nem todas as potências industriais adoptaram esta solução. De facto, a resposta alemã para o scale-up industrial envolveu a cooperação entre químicos e engenheiros mecânicos, para a realização da tarefa de transferência do conhecimento químico do laboratório para a indústria. Acreditavam que esta estratégia possibilitava que os investigadores laboratoriais pudessem permanecer criativos, libertos das condicionantes das práticas de engenharia. Deste modo, a profissão de engenheiro químico apenas surge na Alemanha na década de 1960.

Salientam-se algumas personalidades importantes no processo de construção da profissão de engenheiro químico, a saber[19]:

• George E. Davis (1850-1906): considerado o pioneiro na introdução do conceito de Engenharia Química; em 1887 apresenta uma série de 12 palestras sobre a operação de processos químicos na Manchester Technical School; em 1901 publica o "Handbook of Chemical Engineering"; Davis foi o maior responsável pela aplicação do termo “Engenharia Química” à nova profissão emergente, e contribuiu de forma significativa na definição do papel do engenheiro químico actual.

• Lewis Mills Norton (1855-1893): professor de química orgânica e industrial no Massachussets Institute of Technology (MIT); a partir de 1888, foi responsável pelo primeiro curso de quatro anos em Engenharia Química intitulado "Course X".

• William Page Bryant: foi em 1891, o primeiro graduado de sete candidatos do Curso X, tornando-se o primeiro engenheiro químico formal do mundo.

• Arthur D. Little (1863-1935): introduziu o termo "operação unitária " em 1915 e liderou o “AIChE's Committee on Chemical Engineering Education”, que adoptou e enfatizou este conceito, para além de ter procurado acreditar e normalizar os programas dos cursos de formação em Engenharia Química. Assim, considerando a definição anterior de engenheiro e a história resumida do surgimento da engenharia química, conclui-se que um engenheiro químico se dedica primariamente ao estudo, desenvolvimento, projecto, construção, operação e controlo de sistemas químicos, nomeadamente sistemas químicos industriais ou processos químicos.

Deste modo, convém agora concentrar a atenção no papel da modelação matemática no campo específico dos processos químicos. Mas, como se define um processo químico?

Numa perspectiva rigorosa um processo químico pode ser definido como um sistema onde ocorre pelo menos uma transformação química, ou seja uma modificação dos componentes presentes. No entanto, numa óptica de “engenharia”, considera-se que um processo químico representa qualquer unidade que se incorpora num processo de síntese industrial, o que inclui sistemas meramente físicos. Deste modo, um processo

químico na sua definição mais lata, associada ao conceito de operação unitária, consiste numa entidade física identificável e separável, que se apresenta como um passo bem definido numa sequência de estágios inter-relacionados organizáveis num esquema ou flowsheet industrial. Assim, um processo químico assume-se apenas como um tipo específico de entidade física observável, que, como qualquer outra realidade, pode ser objecto de modelação matemática.

De facto, sendo um modelo matemático uma abstracção matemática de uma realidade, verifica-se no caso específico dos processos químicos que os modelos matemáticos podem ser extremamente úteis, para, nomeadamente[20]:

• Possibilitar um melhor entendimento de processos existentes;

• Facultar o projecto e a simulação de novos processos;

• Permitir a optimização das condições operatórias processuais;

• Proporcionar o projecto de estratégias de controlo de processos;

• Constituir uma ferramenta para a formação de operadores.

Devido aos fenómenos característicos envolvidos no âmbito da modelação teórica de processos químicos, verifica-se que esta envolve a conjugação de diversos tipos de áreas de estudo como: transferência de massa, transferência de energia, mecânica de fluidos, termodinâmica, cinética química, síntese orgânica e inorgânica, tecnologia de sólidos, bioquímica (numa tentativa de aproveitamento do potencial das células vivas como microbioreactores geneticamente programáveis), etc; para além das considerações económicas sempre presentes no trabalho de Engenharia.

Objecto de estudo Nível de integração Processos Industriais Operações Unitárias

Fenómenos Físicos e Químicos

Figura 1.9 Esquema que ilustra a evolução dos diferentes paradigmas relacionados com os níveis de conhecimento em Engenharia Química, quer em termos de objectos de estudo como de unidades de integração.

No entanto, a complexidade do procedimento está directamente relacionada com o grau de interdependência ou de integração entre as diversas operações unitárias presentes no processo industrial (ou mesmo entre processos industriais adjacentes), especialmente importante para processos contínuos, já que a integração (mássica ou energética) se relaciona directamente com a rede de correntes que interliga as diferentes unidades, e que se constituem como as suas entradas e saídas. Ao longo do tempo constata-se um aumento considerável do grau e da escala de integração das unidades industriais, por razões quer económicas (devidas ao aumento do custo da

energia a partir dos anos 70) como ambientais. Curiosamente, observa-se também uma evolução contrária correspondente a uma diminuição de escala dos fenómenos modelados (vd. Figura 1.9), desde o nível mais geral do processo industrial como um todo, até ao nível fundamental das próprias partículas, definidas à escala nanométrica em domínios descontínuos.