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O mapa conceitual – uma possibilidade de trabalho com o texto filosófico

3.1 O FILOSOFAR NO ENSINO MÉDIO COM O ESTUDANTE SURDO

3.1.3 O mapa conceitual – uma possibilidade de trabalho com o texto filosófico

outros espaços, como a Olimpíada de Filosofia promovida pelo NESEF/UFPR, por exemplo, verificamos o seu entusiasmo para novos desafios. Contudo, não se nega, com isso, todas as dificuldades já descritas pelos autores quanto à Filosofia no Ensino Médio.

Ao contrário desse processo de afirmação, da leitura e da Filosofia no espaço escolar, podemos refletir num viés de formação do sujeito sujeitado, que recebe os conhecimentos necessários para satisfazer o mercado, fazendo com que os sujeitos se adaptem à produção. Desse modo, a alienação se concretiza, legitimada pela ideologia que busca apontar a mobilidade social como fruto de uma escola que prepara o estudante para o mercado de trabalho, e não para se posicionar diante das várias circunstâncias da existência, de maneira a fazer uso da razão para decidir o que é viável para si e para a sociedade. Nessa perspectiva, o estudo de Filosofia, esse saber não parece significativo ao pragmatismo e imediatismo pregado por setores da sociedade pelos quais o jovem vivencia (meios de comunicação, discursos de que o aprender deve ser para obter benefícios – capital).

A Filosofia não deve ser entendida como a disciplina salvífica, mas junto com o processo da educação deve permitir aos estudantes outra perspectiva de entendimento da realidade. Como quando se realiza um discurso para um Surdo que busca a conclusão do Ensino Médio para ser incorporado por multinacionais, visando, assim, melhor remuneração e acreditando que isso garante melhor posição social e realização pessoal e profissional. Todavia a intencionalidade dessa contratação poucas vezes é questionada, se ela ocorre para cumprir a lei ou para realização de um trabalho insalubre (por exemplo, um local com barulho excessivo).

É nesse sentido que a leitura de fragmentos de textos como a Ética a Nicômaco, de Aristóteles (2001), permite abordar qual a finalidade da vida, permite indagar essa postura, sendo que isso surge com os próprios estudantes. Para, então, apresentar sua compreensão, podemos utilizar vários recursos metodológicos.

3.1.3 O mapa conceitual – uma possibilidade de trabalho com o texto filosófico

É direito de todos os cidadãos, receberem educação; para colaborar com esse direito se propõem maneiras de aprendizado na perspectiva da emancipação dos estudantes. Segundo Fabbrini (1995), a Filosofia é uma possibilidade de os

estudantes entenderem as regras de produção do discurso filosófico para desmontá- lo, compreendendo a linguagem empregada nesse saber. Esse processo ocorreria mediante o contato com o subterrâneo do texto, ao saber qual a intencionalidade da produção, condições históricas, sociais e econômicas do autor no período de desenvolvimento do texto, e qual epistemologia o texto apresenta e como se liga ao problema que o autor busca superar.

Tentamos ressaltar que a produção dos autores permite aos estudantes uma aproximação da formação de um discurso próprio, pois é preciso entender como os outros fizeram e quais os métodos utilizados auxiliam na tarefa de saber como se faz para responder os problemas que se enfrenta hoje no mundo, na cultura com os outros e consigo. A tarefa do educador de Filosofia, assim sendo, auxilia no processo de “desconstruir e reconstruir a linguagem do texto – trabalhá-lo: retraçar seu ‘plano de imanência’ reinventar ‘seus conceitos e sua consistência’”. (FABBRINI, 1995, p. 90).

Uma possibilidade de trabalho com o texto, pelos estudantes nas aulas de Filosofia, ocorre através do recurso do mapa conceitual33 a ser construído pelos estudantes. Apresenta-se uma série de proposições que através da explicação e dos questionamentos feitos pelos pares e pelo professor, vão permitindo um revelar da intenção do autor no mapa e, consequentemente, dos conceitos nele presentes.

Através da mediação do mapa conceitual na aula de Filosofia, sugerimos pensar em proposições que, ao invés de analisar a estrutura – sujeito, cópula e predicado (S v P) –, colaboram para pensar o conceito concatenado com outro conceito, através de: verbo, preposição, conjunção, advérbio e/ou outras perspectivas que demonstram a intencionalidade da ligação dos conceitos e, assim, permitem a expressão dos entendimentos, dúvidas e análises do estudante num processo do filosofar.

Podemos perceber essa particularidade do rigor conceitual desde a origem, como é levado de maneira fundamental no filosofar de Sócrates, que solicitava dos seus interlocutores que definissem, de maneira consistente e consciente, os conceitos dos seus discursos.

Essa perspectiva do filosofar pode ser compreendida pela proposta de Kant, “quanto ao que respeita à razão, apenas se pode, no máximo, aprender a filosofar” (2001, p. 672). Assim, não se ensina Filosofia, mas sim a filosofar. E como descreve

33Mapa conceitual, segundo Ontoria (2005, p. 39), “é um recurso esquemático para representar um

Obiols, ao tratar da proposta kantiana, “não é um formalista que preconiza que se deve aprender um método no vazio ou uma forma sem conteúdo”. (OBIOLS, 2002, p. 77).

Pensar significa reconhecer a tradição, os conteúdos, as formas e as interrogações propostas, anteriormente, pelos filósofos em seus textos. O mapa conceitual pode ser uma dentre várias outras maneiras de permitir que o estudante elabore, como comenta Severino (2009, p. 26), a leitura várias vezes na busca de fazer o seu filosofar.

A leitura é uma etapa importante na aprendizagem significativa, para que o desconhecido possa ser pensado e se consiga encontrar um subsunçor é preciso reconhecer o que se sabe ou ignora de um dado tema. Para Ausubel (2003), a aprendizagem significativa ocorre quando um saber novo se liga, como uma âncora, aos saberes prévios, afirmando, negando ou ressignificando esse saber prévio, sobretudo de tal forma a não ser mera “decoreba”, e sim algo que se utiliza no processo do pensar uma realidade na formulação de argumentos no processo da existência.

Nesse caso, alguns problemas precisam ser encarados: como fazer a leitura do mapa conceitual, respeitando o foco inicial do sujeito do processo sem desconsiderar onde ele precisa chegar? Qual a intencionalidade que o docente deve estabelecer de maneira clara e consciente para que a leitura do mapa não ocorra de maneira inflexível ou subjetiva no que consiste em trazer para o processo avaliativo a empatia estabelecida, ou não, entre educador e estudante? Como proceder à leitura qualitativa do mapa conceitual? Como a pergunta norteadora do mapa privilegia a possibilidade de o sujeito trazer os seus saberes prévios do assunto? Como esse elemento pode influenciar ou modificar o conteúdo proposto inicialmente no PTD34? Como fazer alterações a partir do que o estudante apresenta sobre uma temática sem perder a intencionalidade? Tomando as reflexões de Freire (2016), pensar uma prática consiste em levar em consideração o sujeito real com a sua cultura, ou, ainda como Heller (2004) aponta, a vida cotidiana não pode ser desprezada no fazer política e prática educativa.

34 PTD – Plano de Trabalho Docente, documento importante no processo educativo, por ter manifestado

o conteúdo, objetivo, metodologia, instrumentos metodológicos, critérios e instrumentos avaliativos e referências que serão utilizados para o desenvolvimento da aula.

Um conceito que poderia ser explorado como estruturante para essa prática avaliativa seria de o estudante, como um “sujeito na perspectiva do esclarecimento”, fazer uma análise da realidade. O estudante, como ser ativo do processo, é mobilizado a buscar novas possibilidades de entendimento do problema e/ou conceito. Ao buscar estruturar o mapa conceitual, surge a necessidade de rever o texto, na tentativa de que os argumentos e as críticas, conceitos apresentados no texto filosófico em estudo, possam ser socializados aos demais. Outro aspecto a ser considerado é como essa compreensão permite entender a vida cotidiana dos sujeitos do processo de ensino e aprendizagem e como a realidade pode ser entendida ou problematizada a partir dessa leitura? Consideramos, também, outro ponto a ser explorado: a explicação através da apresentação dos estudantes, pela qual os argumentos sobre o mapa elaborado devem ser manifestados, proporcionando um diálogo sincero sobre a produção e a compreensão do texto, pois, essa troca de entendimentos com os colegas e o educador favorece o processo do filosofar.

Na perspectiva de ser significativo o processo de produção do mapa, o diálogo entre os sujeitos de ensino e aprendizagem deve permitir questionamentos, revistar os textos, os problemas oriundos do cotidiano, criando um espaço de entendimento e envolvimento, sem deixar de lado o rigor e cair num viés de vale tudo. Pois, o processo é mediado pelo texto bem como pelo educador que possui uma maior vivência no filosofar.

Partindo da tese de que o ensino da Filosofia consiste, basicamente, em trabalhar com conceitos, buscamos entender não somente o seu significado ou sua genealogia, mas também ele como elemento que auxilia a pensar a realidade e expressá-la. Esse processo parece também ser relevante quando o Surdo pode se apropriar dos conceitos de maneira paciente, entender sua aplicação no pensamento e numa compreensão do problema posto por um filósofo, permitindo um entendimento sobre uma dada realidade, sendo ferramenta para o seu processo de constituição.

3.1.4 Relação da cultura surda com o filosofar

Quando resolvemos analisar a educação nas suas várias perspectivas, é preciso observar a tese de Forquin (1993, p. 14), na qual apresenta a relação indissociável da educação com a cultura. Pois a educação só ganha significado de