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Marco epistemológico: Educação e Ciência (ou ciências) da Educação, um debate em aberto

Que nexos internos, causais e finais, existem entre um discurso abrangente sobre Modernidade, Filosofia, Ciência, Educação, Ciência e Ciências da Educação, Filosofia da Educação, (construção de) Conhecimento, Pedagogia e Pedagogias, Paradigma e paradigmas e as várias modalidades de educação, no interior da escola ou fora dela? Por que educação formal e não formal ainda aparecem separadas, de naturezas tão díspares, tanto na propositura como nos métodos, dentro do mesmo arco de ação no campo educacional? Quais fundamentos podemos buscar para contribuir com nossa compreensão sobre tal cisão? Que limites estão postos entre uma e outra modalidade, seja do ponto de vista das instituições educacionais (ênfase na escola), seja do ponto de vista dos sujeitos sociais envolvidos? Que qualidade pedagógica, tanto os sujeitos sociais quanto às

instituições envolvidas (como a universidade), aqui reconhecidos como produtores de uma memória resistente, produzem, de fato, para as interpretações e intervenções da práxis pedagógica? Finalmente – para o alcance dos objetivos da presente investigação –, que alcance, tanto da leitura dos fundamentos como a substância pedagógica de suas práticas (como nos estágios, por exemplo), as licenciaturas conseguem extrair da seara de contextos aqui identificados como complexos?

Não foi à toa que abrimos o arco de uma Filosofia da Educação, já colocando parte dos fundamentos na leitura dos sujeitos sociais, em suas diferenciadas estratégias de vida, como produtores de sua própria existência (o ser/estar, subjetivo e intersubjetivo produtor de identidades) e de conhecimento (de mudança ou conservação de relações, veladas ou explícitas de poder: ideologias, senso comum, ciência etc.) com suas respectivas linguagens, de resistência ou acomodação a esse ou àquele status social vigente, a esta ou aquela circunstância sócio-histórica.

Pode parecer estranho, mas o que acontece na produção de saberes de elite – e Dussel vai trabalhar como as racionalidades ―do Centro ou do Sistema‖–, como a Filosofia, a Ciência e a Ciência (ou ciências) da Educação, de modo abrangente, seus avanços, impasses, fraturas, acontece, lá na ponta, no modo de construir a práxis pedagógica com suas cisões, ambiguidades, aparentes distanciamentos. O que ―sobra‖ para a racionalidade das elites falta (como carência) de ―leitura‖ ao povo, mesmo assim (ainda bem) podendo ser considerado em sua produção cultural resistente como ―leitor de mundo‖ (FREIRE,1989 , 2005).

Assim, para responder a esse conjunto de questões, em vista do clareamento das fronteiras ainda ―difusas‖ que se estabelecem, por exemplo, entre a educação formal e não formal, a produção cultural ―letrada‖ e ―iletrada‖, em vista da candente questão do analfabetismo, ainda vigente como ponto nodal de nosso olhar (ênfase no Brasil, no contexto latino-americano), precisamos, a nosso ver, traçar um percurso que vai de uma abrangência de noções universalizantes até a especificidade dessas noções.

2.1.1 A “fratura” da Filosofia e a Ciência moderna na busca do “saber hegemônico”22

Não é de hoje que entendemos a longa tradição da Filosofia, no Ocidente, entre duas grandes vertentes: uma, (a) a tradição metafísica essencialista, desde suas raízes gregas, passando pela organicidade hegemônica do discurso teológico medieval como garantia da busca de uma ―verdade absoluta e perene‖. Na base desse conjunto de discursos, a incessante construção de respostas às questões postas, duradouras ou emergentes, marcadas pela exigência de garantir um status de ―inquestionabilidade‖ como ponto alto da Verdade, perseguida a todo custo; outra, (b) a tradição moderna, que, aos poucos, foi se delineando com uma vocação a se tornar ―pós-metafísica‖, numa Filosofia como construtora da crítica de si mesma.

Foi o cenário do nascimento e da consolidação da Ciência Moderna o ―espaço epistemológico‖ novo de racionalização sobre os fenômenos, com ênfase nos fenômenos naturais. Estava aberto o caminho do movimento intelectual que gerou a chamada escola empirista, imediatamente posterior, provocando as primeiras rachaduras no edifício do paradigma metafísico anterior. Em troca, emergiu a necessidade de se colocar uma ―nova racionalidade‖, fruto agora de um sujeito que pudesse dar conta de interpretar os fenômenos. A antiga ―essência‖ inquestionável das coisas (de Deus, do mundo, da alma etc.), então postulada à moda cartesiana da relação dual entre a res cogitans e a res extensa, passaria pelo ―filtro‖ de uma subjetividade latente, construtora, ela mesma, de sentidos. Já no esforço kantiano de uma crítica radical à própria Filosofia, no marco do essencialismo substancialista anterior, uma nova elaboração teórica fora marcada por um ―desmonte‖ de um mundo passível de ser compreendido em sua totalidade

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que aqui vai ser colocado no marco de uma contextualização geral nos serve apenas para fazer um traçado, ainda que superficial, dos problemas que envolvem a racionalidade ―da elite‖ como um modo de pensar – que Dussel quer romper, desde que pleiteou como uma vertente da Filosofia da Libertação. Não é nosso objetivo historias desse périplo da racionalidade ocidental, tarefa já realizada, sobejamente, por historiadores (e dicionaristas) da Filosofia: Michele Federico Sciacca, Mario Manacorda, Nicolau Abbagnano, José Ferrater Mora, Roland Corbisier, entre tantos outros.

―acabada‖, apenas como construto lógico da mente humana como ―razão pura‖. Resultado: a (antiga) razão que fundamenta não dava mais conta de responder, a contento, as novas exigências da razão que interpreta, em meio a um novo cenário cultural que, por sua vez, viria marcado por uma radical ―virada antropocêntrica‖.

Sobre essa passagem, a autora Talma Bastos de Barros nos auxilia:

O projeto da modernidade, situado em torno do século XVI, põe em questão os valores e conceitos estabelecidos pela sociedade que, no caso, eram tidos como absolutos. O primeiro esforço da modernidade é distinguir ciência, arte e moral em ramos específicos do conhecimento humano. Se antes, a ciência e arte deveriam servir à moral, neste novo cenário isso não fazia mais sentido. Esta rejeição ao absoluto extra-humano desencadeia uma série de eventos na história das nações e do pensamento ocidentais. Apenas para citar dois exemplos: a Revolução Francesa e o Iluminismo, com seu programa de desencantamento do mundo, visando à substituição da imaginação pelo saber. Contudo, esta nova vivência não mais sob o controle das instituições medievais, elege outro poder que criam ser capaz de conduzir o sentido das ciências e da sociedade: a razão (p. 1-2).

No interior desse novo e hercúleo trabalho da razão, em processo de revisão de si mesma, que, nas postulações de Kant, ansiava por uma síntese Racionalismo- Empirismo a partir de um movimento autocrítico da própria Filosofia (criticismo kantiano) no cenário que se denominou chamar de Modernidade, era o terreno fértil para a consolidação das bases epistemológicas do paradigma científico moderno, desde tal polaridade. Daí em diante, bastava alimentar a pretensão de acercamento definitivo dos objetos de conhecimento e domínio da natureza. Era o embrião de um novo método, gerador de um novo sistema ―universal‖ de saber, com uma nova vocação hegemônica no campo dos saberes humanos, historicamente constituídos e acima (ou contra) outros saberes, estranhos à Ciência nascitura.

As bases epistemológicas da modernidade foram lançadas logo em seu início, e, de certo modo, igualmente totalitárias aos da Idade Média, uma vez que nega o caráter racional de outras formas de conhecimento, como o senso comum, o cultural, por serem tidos como não sustentados por princípios epistemológicos das ciências naturais. (...) Convém observar que a mudança de referencial da ciência moderna distinta da antiga e da medieval, é que não se deseja

apenas fundar uma ciência que conheça mais profundamente a realidade: sua pretensão é de universalizar o saber, de modo que fosse possível evitar qualquer forma de controle individual sobre a verdade, ou seja, prescindindo da evidência da experiência imediata, esta nova forma de ciência distancia o senso comum do saber científico, tornando-o acessível apenas a especialistas (p. 2-3).

Ainda que, hoje, quando nos convencionamos falar em ―paradigma moderno‖ – conceito muito difundido principalmente após a produção teórica da Escola Frankfurtiana, em sua investida numa revisão crítica do projeto iluminista da Modernidade já na primeira metade do século findo –, a passagem ao paradigma moderno não aconteceu sob a forma de um discurso unidimensional, mas em ―saltos qualitativos‖ dentro dessa própria vocação de universalidade. Assim, do ponto de vista da revolução científica, podemos nos referir a ―paradigmas‖ científicos: (olhar epistemológico) dentro do paradigma moderno mais abrangente (olhar histórico contextual).

O cientista brasileiro Ronaldo Rogério de Freitas Mourão, num artigo publicado no jornal Folha de São Paulo, intitulado ―Cientistas sabe-tudo são sempre reacionários‖, nos lembra:

O primeiro paradigma surgiu com a revolução copernicana, que permitia o homem libertar-se do geocentrismo em que vivia. O homem deixou de ser o centro do Universo. O segundo foi a revolução cartesiana, que tornou o cosmo acessível à razão. A capacidade de análise lógica, fez com que o homem assumisse o domínio da ciência e da técnica e se transformasse no arquiteto de ideias do mundo futuro. O terceiro foi a revolução darwiniana, que reconduziu o homem à natureza e libertou-o do antropocentrismo. O quarto é a revolução sistêmica, que está permitindo reintegrar os conhecimentos como um todo coerente. (apud BARROS, op. cit. p. 3).

2.1.2 Sobre a propalada “crise” do paradigma moderno: outra fratura que se desenha no campo do saber hegemônico da própria Ciência Moderna

Não é demais frisar que a revolução epistemológica que produziu os ―paradigmas‖ em fases distintas da Ciência Moderna, como descrito na referência

acima, pelo menos até o terceiro paradigma (darwiniano), nos finais do século XIX e início do XX, trouxe para seus umbrais tudo o que podia, como garantidora do discurso da Verdade, atirando para a beira da estrada tudo o que não manifestasse ―cientificidade‖, a que passou a chamar de ―senso comum‖. A rigor, todo esforço de postulação do discurso e prática da Ciência Moderna agiu contra o senso comum.

Até mesmo as ciências humanas, num primeiro momento, absorveram o método e a própria ideologia das ciências da natureza, com sua ânsia quantitativista, postada basicamente na relação causa-efeito dos fenômenos verificáveis, com uma crescente fragmentação da antiga unidade do saber. O chamado Racionalismo Cartesiano, postulado em seu Discurso do método, um modo novo de absorver e abrigar a própria racionalidade ocidental, desde os gregos, e ter o conhecimento (da realidade, do mundo, dos fenômenos) como o modus operandi de apropriar-se da realidade, tornou-se a nova ferramenta da razão. Foi uma tendência irreversível e crescente. Por exemplo, o fato de Comte, já no século XIX, criar os primeiros traços de uma ―ciência da sociedade‖ (a Sociologia nascente) e chamá-la de ―Física Social‖ é o sintoma mais evidente dessa nova busca de hegemonia da razão em torno das ciências da natureza. Na rabeira dessa tendência, estiveram outras ciências humanas e sociais nascentes: Psicologia, Psicanálise, Antropologia, Economia...

A despeito da contribuição decisiva da Filosofia, antes ―fraturada‖ por Kant, e posteriormente com a dialética hegeliana, o Marxismo, com sua Filosofia da práxis e a Fenomenologia, com sua recolocação do sujeito, cuja consciência se torna doador de sentido aos fenômenos, o Positivismo fez os efeitos de certa forma esperados. Decorrente dessa prepotência da razão moderna, típico da ideologia iluminista, em querer enquadrar os saberes produzidos pela humanidade, passam a permanecer enclausurados nesse paradigma novo, isto é, dentro do guarda-chuva desse ―saber por excelência‖. Não foi por acaso que o ―preconceito‖ quanto a tudo o que não emergia do conhecimento da experiência quantificável era relegado ao nível até de certo ―descaso‖ à subjetividade humana.

Verdade é que já se encontrava embutida uma nova crise futura do sujeito, hoje experimentada num novo contexto crítico tido como ―pós-moderno‖ haurido da averiguação de sua capacidade de ser de fato o emanador de uma razão universal. Evidenciou-se, na segunda metade do século findo, uma crescente suspeita sobre a

validade do que os pós-modernos chamam de ―metanarrativas‖ da Modernidade e a sua (pior ainda) capacidade de mudar a realidade – por exemplo, no paradigma da luta de classes. Vale dizer, passamos a navegar num mar revolto, no âmago da própria contradição: em plena era potencial do sujeito, a própria crise do mesmo sujeito moderno, hoje à procura de outro paradigma de racionalidade – como Mourão nos fez lembrar do paradigma sistêmico de Ciência em voga –, cujo estoque de saber produzido precisa voltar a repensar uma unidade capaz de abrigar outros saberes. Assim, do tanto que ―andamos para frente‖ com a Ciência Moderna, fica a suspeita do tanto que ―andamos para trás‖, quando universalidade (de um conhecimento racional hegemônico) e unidade (de um saber humano integrado) não parecem convergir.

Resultado: tudo sugere – é cedo demais para ―certezas‖, em plena era ―de incertezas‖, resultado de um século ―de extremos‖ (HOBSBAWM, 1995) – que o nosso tempo, o do intenso século XX (em continuidade nesse início de século XXI), que começou com a suspeita frankfurtiana da realização do ―progresso humano‖ por vias da razão instrumental, chega a esse ―quarto paradigma‖ na emergência de uma nova postura dialógica, para dizer, à moda freiriana, entre os saberes, onde a Filosofia, mais uma vez, pôde reivindicar a si mesma o direito de apresentar-se, novamente, como a vigilante da própria razão. Estamos às voltas com a necessidade de compreensão desse périplo, ou desse movimento histórico-cultural, dialético, de linha e agulha da razão no imenso tecido dos saberes como patrimônio da própria humanidade – mesmo num tempo em que um pragmatismo sociocultural grassa nos muros das ações humanas como erva daninha.

Razão seja dada, sobretudo, aos frankfurtianos em seu pioneirismo revisionista do ―projeto iluminista da Modernidade‖ (SEVERINO, 1992)23. O presente, pelo que acarreta de ―progresso‖ científico e tecnológico inarredável e o futuro da Ciência e Tecnologia, em sua epistemologia de recortes, de mera relação

23

Embora estejamos usando esta obra de cunho didático do autor, em função de seu uso intensivo em nossas aulas, passaremos a nos referir de modo especial ao texto Educação, sujeito e história, uma obra que integra e sintetiza o que há de mais significativo e substancioso da produção teórica do autor, ao longo de algumas décadas, no campo da Filosofia da Educação, seu legado à ensaística brasileira nesse campo. (ver SEVERINO, 2001)

causa-efeito, de ocultamento de outros saberes ―inferiores‖, nunca esteve tão em jogo. É a epifania de um tempo muito especial em que buscamos de novo o ar fora d‘água, agora, quem sabe, despidos da ―soberba‖ de uma razão instrumental que esteve por longo tempo refém do antigo movimento teórico e ideológico empirista. Estamos, na verdade, e guardadas as proporções de tempo, espaço e contexto, numa era parecida com o próprio Renascimento, útero que gerou a Ciência Moderna. Por quê?

Ora, o que se nota, hoje, é que não há um quarteirão no mundo – não só de academias de pensamento, mas de produção de ações socioculturais e sociointerativas – em que esse saber hegemônico não esteja sendo posto em estado de suspeita e de revisão, quando possível, desde a voz de filósofos irrequietos até, mais importante ainda, de uma profusão de sujeitos sociais esquecidos em suas diversidades de linguagens e ações culturais, como reivindicação do direito, por um lado, ao usufruto do componente de ―progresso‖ humano e, por outro, à expressão das diferenças.

E tal suspeita já vem de longe. Desde que Rousseau, lá no nascedouro do Iluminismo, seja por um ato bravo da própria razão, seja por uma força intuitiva pessoal (de qualquer forma, uma ―profecia‖), afirmou, na Academia de Dijon, que a Ciência não traria o progresso esperado (ou necessitado) pela humanidade.

Como não se trata de uma expressão de nossos dias; nossos dias é que são a expressão de uma revisão crítica da razão, que não estacionou na obra de Kant e criou as primeiras suspeitas nos próprios filósofos iluministas, desde Rousseau, como vimos. Resultado: desde o final do século XIX uma vigilância filosófica intensificou-se, a continuar nos trabalhos de investigação incansável dos fenomenólogos, de Nietzsche, Heidegger, Ricoeur, os frankfurtianos já lembrados (ênfase em Habermas), os filósofos preocupados com o teor de verificabilidade da Ciência (como Popper), até chegar aos pós-modernos: Lyotard, Foucault, Baudrillard, Rorth, entre outros.

E o resultado mais recente é que se voltam, hoje, a acender novas luzes sobre a Ciência, seus contornos, caminhos e destino, a ponto de produzir obras como a de Edgar Morin (MORIN, 2001), que reclama a recostura da unidade do

saber ao que chama de ―paradigma perdido‖, no marco da reconstrução inter e transdisciplinar dos saberes. Ou de Boaventura de Souza Santos (SANTOS, 1989), que pensa numa ciência pós-moderna, no âmbito do que irá chamar de ―Ciência para uma vida decente‖ – só para citarmos dois grandes expoentes, cujas obras ainda estão em fase de assentamento. É nesse cenário que entram, tanto a Educação, como as chamadas ‖ciências da Educação‖24.

2.1.3 A Educação e as “Ciências da Educação” no contexto do paradigma moderno

Como fica a Educação nesse cenário até agora exposto? Por que falamos em Filosofia, razão, Ciência, método, Iluminismo para tratar de um assunto – o povo como sujeito de ações, saberes e memória resistente – que, pelo menos aparentemente, passa ao largo desses temas? Precisamos ajeitar as abóboras na carroça para avançar mais no presente trabalho. Lá onde os discursos abrangentes do saber das elites (a Ciência, a Filosofia...) ―esconde o povo iletrado‖; onde ele, contraditoriamente, se revela, nem sempre para todos.

Em primeiro lugar, Educação não é Ciência, in stricto sensu. Educação é uma prática social, profunda e complexa – complexa não porque é difícil de ser compreendida, mas porque vazada de muitas possibilidades de ―leituras‖ – marcada por uma polissemia de discursos cada vez mais resultantes de uma teia/rede de relações mais significativas que às vezes imaginamos.

Sobretudo a educação escolar que, em tese, apresenta-se, sempre, num espaço/tempo da ação humana, sociocultural e sociointerativa, que trabalha com os saberes, que tem por objetivo os garantir aos sujeitos aprendentes. Por quê? Porque – aqui, não em tese, mas seguramente – na educação, especialmente a escolar, trabalha-se no dorso da própria realidade, seja a revelando, seja a ocultando ou dissimulando. Está sempre em pauta uma estreita relação entre necessidade e utilidade, interesse e desinteresse, mesmo que nem sempre bem explicitados e,

24

Sobre Edgar Morin, ver, por exemplo, a obra: Sete saberes necessários à Educação do século XXI, publicado pela UNESCO, em 2001 (vide referência).

muito menos, resolvidos. E isso vale para a educação formal, não formal e informal, escolar e extraescolar.

Contudo, podemos suspeitar, a partir da colocação anterior, que pode emergir, para o leitor, a seguinte questão: se a Educação é uma prática social que trabalha saberes teórico-práticos, como a Medicina, o Direito, as engenharias, e essas se postulam como ―ciências‖ (ciência do Direito, da Matemáticas etc.), por que a Educação não se insere, também, na categoria de ―ciência‖? Ou existe uma Ciência da educação, cujo discurso garante a compreensão de sua natureza, e cuja episteme possa ser explicitada?

Três caminhos podem ser apontados como alternativas a tal dúvida. A saber: o primeiro é o de afirmar, para nossa compreensão aqui, pelo menos provisoriamente, que a Ciência por excelência da Educação é a Pedagogia25. Por quê? Porque sua atribuição precípua é a de abrigar as questões relacionadas à Educação, com ou sem pretensão positivista – de postular uma ―positividade‖ à Pedagogia – na tentativa de compreender sua natureza e seus caminhos, ainda que dentro do fazer da educação, em suas propostas metodológicas, existam ciências que se erigiram com o passar do tempo. Por exemplo, a Didática (Geral) como ciência do ensino e suas metodologias ou as Didáticas Especiais, encarregadas de fazer o discurso crítico-avaliativo dos métodos específicos: Didática da Matemática, da Geografia, da Educação Física etc.

O segundo caminho é o da necessidade de ir aos fundamentos que estão fora do arco da Pedagogia, mas que regam seu campo numa articulação, por via de regra, convergente de discursos: filosóficos, históricos, sociais, da natureza (natureza ―natural‖ e natureza humana), entre outros. De tais fundamentos, é a

25Trouxemos a Pedagogia pela necessidade de recolocá-la (ou recolocar ―as pedagogias‖) no centro do debate num tempo em que esta noção goza, a nosso ver, de um ―menosprezo‖ verificado em alguns setores da área acadêmica. Contudo, para efeito de nossa investigação e pela necessidade de retomar os contornos conceituais da ou das ciências da educação, o trabalho de Dussel trafega num campo de fundamento dessa Ciência por excelência da práxis educativa ao colocá-la num campo adjetivo, isto é, ―a pedagógica‖, como parte substancial