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Maria Lúcia de Castro Gomes & Andrea Alves Guimarães Dresch

No documento Perspectivas em linguística forense (páginas 30-58)

Em tempos de turbulência política e social, são frequentes na mídia os casos que envolvem gravações de pessoas com conversas suspeitas, que podem servir como evidência de um crime. Sejam políticos e empresários envolvidos em corrupção, sejam traficantes e policiais em negociações espúrias, ou até mesmo pessoas famosas nas artes e nos esportes enredados com a criminalidade, são vários os casos em que vozes são gravadas por interceptação telefônica. O leitor deve se lembrar de alguns casos de repercussão nacional, como o caso do Ministro do Trabalho e Previdência Social do Governo Collor, o Ministro Antônio Rogério Magri, envolvido em um caso de corrupção; ou o caso do desaparecimento do pedreiro Amarildo de Souza depois de ter sido levado por policiais militares para prestar esclarecimentos em uma Unidade de Polícia Pacificadora no Rio de Janeiro; ou, ainda, o caso do cantor Marcelo Pires Vieira, o Belo, condenado por envolvimento com o tráfico de drogas. Todos esses casos tiveram materiais com gravação analisados que resultaram em laudos para compor o processo penal. Essa análise é uma das principais atividades do foneticista forense.

Fonética Forense é o termo difundido na área da Criminalística que trata da análise de materiais contendo registros sonoros, em especial sons de voz e de fala. Nesses materiais, podem ser explorados quaisquer elementos que possam auxiliar na materialização de um crime ou na determinação das circunstâncias em que o tal fato ocorreu, inclusive na atribuição de autoria. Tal vinculação (ou desvinculação) de

determinada voz a uma pessoa é possível por meio da comparação forense de locutores.

Este capítulo trata dos fundamentos da atividade de identificação humana pela voz na área forense. Dentre as disciplinas que alicerçam a Fonética Forense, a Linguística exerce um forte papel, especialmente a fonética, que por essa razão será nosso foco inicial. Vamos tratar da diferença entre fonética e fonologia, comentar sobre as diversas aplicações da fonética, em suas três perspectivas de análise — a articulatória, a perceptiva e a acústica — para então adentrar na fonética forense e, especificamente, na atividade de comparação forense de locutor. A abordagem irá contemplar a classificação dos materiais e os métodos de análise empregados.

O ESTUDO DOS SONS E A FONÉTICA FORENSE

A linguística é a ciência que estuda a linguagem humana em seus mais variados aspectos, buscando explicar os seus mecanismos, a organização de seus elementos estruturais e a sua relação com outras áreas de estudo, como a psicologia, a sociologia, a filosofia e muitas outras.

Um dos elementos estruturais da linguagem é o som, que pode ser estudado a partir de várias perspectivas. Efetivamente, são duas as disciplinas que tratam dos estudos do som na linguagem: a fonologia e a fonética. Essas duas disciplinas tiveram seus objetivos de estudo verdadeiramente definidos depois que Ferdinand de Saussure, no início do século XX, sistematizou os estudos linguísticos separando os estudos da língua — considerada como um sistema homogêneo e social — dos estudos da fala — heterogênea, multifacetada e individual. Como consequência da dicotomia língua/fala, um grupo de linguistas do chamado Círculo de Praga propõe também uma separação nos estudos dos sons da linguagem humana, ficando a fonologia responsável pelo estudo dos sons da língua, enquanto a fonética trataria do estudo dos sons da fala. Na prática, isso significa que cabe à fonologia estudar as unidades abstratas que compõem os sistemas sonoros das línguas em geral, ou seja, os fonemas, aquelas unidades distintivas que formam as palavras da língua — as consoantes e as vogais. A fonética vai tratar da realização desses sons, efetivamente produzidos, seja pela perspectiva do falante, seja pela propagação do som no ar, seja pela perspectiva do ouvinte.

Albano (2001) apresenta as próprias palavras de Trubetzkoy, um dos linguistas do Círculo de Praga, para definir o objeto de cada uma das duas disciplinas: "grosseiramente falando, digamos que a fonética procura descobrir o que de fato se pronuncia ao falar uma língua, e a fonologia o que se crê pronunciar" (Trubetzkoy, 1981, apud Albano, 2001, p. 11). De acordo com a mesma autora, a "Fonética é uma ciência natural, que encara o som linguístico como realidade física; a Fonologia é uma ciência social, que encara o som linguístico como realidade semiológica, inserida no complexo sistema de signos que é a linguagem natural humana" (p.12). Albano, no entanto, não aceita uma fronteira nítida entre essas duas disciplinas e afirma que nas relações entre elas "reina a mais absoluta confusão" (p. 24). A autora segue uma linha de pensamento que não separa os componentes fonético e fonológico, mas sugere uma relação de solidariedade entre as duas disciplinas, principalmente nas questões de aquisição da linguagem.

Um estudo em fonologia trata o som como matéria prima de um sistema linguístico, como elemento da gramática de uma língua, como unidade que se contrasta com outras unidades, produzindo diferença de significado. Por exemplo, as palavras "cola" e "gola" se diferenciam significativamente apenas pelo vozeamento na consoante inicial da segunda. De acordo com Hora e Matzenauer (2017), a fonologia tem se tornado imprescindível em várias áreas dos estudos da linguagem, desde o ensino de línguas, passando pela compreensão dos fenômenos de variação e mudança, o planejamento linguístico, até as questões dos distúrbios de linguagem.

Os estudos em fonética também são de interesse nessas e em outras áreas. Conforme entende Cristófaro-Silva (2003), são várias as áreas que necessitam dos conhecimentos de profissionais da linguística, especificamente na fonética e fonologia: ensino de língua materna e estrangeira, planejamento linguístico, dramaturgia, fonoaudiologia, linguística computacional, ciência da telecomunicação, linguística indígena e linguística forense.

Dentro da linguística forense, a área que se preocupa com a análise do material sonoro, como fenômeno fisiológico e perceptual, é a fonética, que pode ser estudada em três perspectivas: acústica, perceptiva e articulatória. Segundo Laver (1994), "o nível inicial de análise da produção da fala, o mais próximo à parte física do próprio material de fala original, é o nível acústico". A fonética acústica, portanto, estuda as propriedades físicas dos sons da fala. O sinal de fala, quando gravado em algum tipo de mídia, pode ser submetido à análise acústica. O nível perceptual de análise, por sua vez, refere-se à captação do registro pelo sistema auditivo humano e pelo

processamento do sinal de fala por meio do sentido de audição. A fonética perceptiva (auditiva) vai se ocupar da forma como os sons da fala são percebidos pelo sistema auditivo. A terceira perspectiva, a articulatória, é mencionada por Laver (1994) como o nível orgânico de análise, aquele que trata de fatores anatômicos, tais como as dimensões, a massa e a geometria dos órgãos vocais. Sendo assim, a fonética articulatória vai tratar dos sons da fala a partir da produção pelo aparelho fonador, descrevendo e classificando os sons linguísticos sob o ponto de vista anatômico e fisiológico.

A partir do início dos estudos de fonética em contexto forense, nasce uma nova área: a Fonética Forense.

A FONÉTICA FORENSE

A criminalística tem como objetivo central trazer luz sobre elementos probatórios que são utilizados em contextos investigativos ou judiciais. Tais elementos normalmente estão relacionados à materialização de um delito ou à atribuição de autoria, e, quando estes se referem a conteúdo de áudio, entra em cena a Fonética Forense (FF). As atividades relacionadas à FF são diversas, incluindo, além da identificação do falante, a análise de conteúdo, tratamento para melhoria de inteligibilidade, verificação de edição de áudio, análise do perfil vocal, análise de sons relacionados a determinado evento (como disparo de arma de fogo, por exemplo), análise linguística para determinação de origem do falante, entre outras.

De maneira simplificada, o processo de comunicação humana se estabelece com a transmissão de uma mensagem (pelo falante), através de um canal (que pode ser o ar, ou um meio telefônico, por exemplo), até a recepção (pelo ouvinte). As etapas mencionadas são, respectivamente, relacionadas às áreas descritas na seção anterior: a fonética acústica, a fonética perceptivo-auditiva e a fonética articulatória. Cada perspectiva traz recursos para análise do material, que, em análises forenses, podem ser utilizados isoladamente ou em conjunto, de acordo com o tipo de atividade realizada.

A COMPARAÇÃO FORENSE DE LOCUTOR

O exame de comparação forense de locutor é um exemplo de atividade que exige um arsenal de recursos de análises provido por todas as áreas acima mencionadas. Os métodos de análise não automática são classificados como perceptivos-auditivos e acústicos-instrumentais, por meio dos quais o profissional deve não apenas reconhecer os elementos mais individualizantes do falante naquele caso específico, como também distinguir o que se trata de característica do trato vocal do falante do que se refere à influência do meio de transmissão e/ou de gravação de sinal.

MATERIAL DE ANÁLISE: AMOSTRA PADRÃO E AMOSTRA QUESTIONADA

O material resultante de gravação, entregue ao examinador, é chamado amostra questionada. Essa amostra, de um autor cuja identidade deve ser confirmada, será comparada com a amostra (de autoria conhecida) do indivíduo que se supõe ser o interlocutor em questão. Normalmente há dúvida sobre a autoria referente ao suspeito do crime (chamado de "acusado" na etapa investigativa ou de "réu" em processos penais), nada impedindo, porém, que a dúvida paire sobre a fala de uma testemunha ou da própria vítima. A esse material, a ser utilizado na comparação, se dará o nome de amostra padrão.

Às vezes há material de áudio passível de ser utilizado para comparação a partir de transmissão e/ou armazenamento em meios televisivo, radiofônico ou em sítios eletrônicos, conforme apontado por Sanches et al (2015, p.78). Contudo, em geral a perícia lança mão desse tipo de gravação apenas quando há impossibilidade de providenciar a coleta de material padrão que possa ser comparado com o material questionado, por meio de entrevista. Nas palavras de Gonçalves (2013), na tarefa de comparação de locutor "são analisadas as amostras apresentadas para confronto, tendo-se de um lado o áudio questionado fornecido pelo requerente [...] e, de outro, o áudio padrão, preferivelmente recolhido por peritos da área em procedimento técnico de colheita de material" (p.26).

Uma vez de posse dos materiais questionado e padrão, após todos os cuidados necessários para armazenamento e garantia da integridade dos materiais, que atualmente tratam-se em sua maioria de evidências digitais, a análise pode ser

iniciada. Antes de adentrarmos nos métodos de análise, porém, vale uma menção a Lei 9.296 para tratar de uma questão polêmica, mas também importante para o trabalho de perícia. Em seu Art. 6º, parágrafo 1º, a lei determina que:

§ 1° No caso de a diligência possibilitar a gravação da comunicação interceptada, será determinada a sua transcrição.

A polêmica da questão ocorre porque, embora definida na lei, a dificuldade prática na execução de transcrição de dados coletados em interceptações tem levado Ministros do STF a "assentar a prescindibilidade de degravação de todas as conversas colhidas nas interceptações telefônicas para fins de oferecimento da denúncia" (Aras, 2014). Não cabe neste texto a discussão sobre a importância ou obrigatoriedade da transferência de todo o material de áudio para a modalidade escrita, mas julgamos interessante apresentar o significado dos termos e indicar alguns textos que tratam da questão.

Rehder et al (2015a) tratam do tema com detalhes e Rehder et al (2014) apresentam a seguinte definição:

A degravação do material de áudio pode ser realizada utilizando-se a transcrição, que consiste em passar para a escrita exatamente o que está sendo ouvido, mantendo o conteúdo fonêmico e os traços de prosódia; ou a textualização que tem como base uma narrativa escrita das intenções comunicativas do falante. (Rehder et al, 2014, p. 1920).

Outra discussão relacionada, também importante para a tarefa de degravação, é quem deve ser autorizado a executá-la. Segundo Rehder et al (2015a), "a legislação atual permite que tais procedimentos sejam realizados por outros profissionais e não apenas por perito oficial" (p. 62). No VIII Seminário Nacional de Fonética Forense (2010), foi emanada Deliberação Técnica a respeito de materiais de áudio inteligíveis:

A transcrição fonográfica de material de áudio de satisfatória inteligibilidade auditiva, no qual não paire dúvida sobre seu conteúdo, não é perícia, pois não há no seu procedimento tratamento criminalístico ou elaboração de premissas técnicas que levem a conclusão sobre um fato (VIII SEMINÁRIO NACIONAL DE FONÉTICA FORENSE, 2010).

Ainda assim, seja em caso de perícias de materiais probatórios de pouca inteligibilidade, seja em materiais a serem textualizados ou transcritos para formalização do processo, inconsistências em degravação podem induzir a erros. Fraser (2014) alerta para a importância de pesquisas colaborativas entre as ciências da linguagem e do direito para o desenvolvimento de práticas para garantir que as transcrições sejam confiáveis. Tais práticas poderão favorecer o processo de análise.

MÉTODOS DE ANÁLISE

A comparação de vozes em material gravado em mídia é uma atividade relativamente recente no meio forense, pois decorre da crescente utilização de equipamentos tecnológicos para gerar provas que serão processadas nos ambientes policiais, jurídicos e periciais. Sendo uma área nova, e considerando o avanço progressivo da tecnologia, as pesquisas se tornam de fundamental importância para que os métodos de análise sejam aprimorados no mesmo passo.

Após realizarem uma pesquisa internacional sobre metodologias adotadas, Gold e French (2011) afirmam que não há consenso de opinião na comunidade científica sobre o melhor método de análise para a comparação forense de locutor. Os autores agrupam os métodos em quatro grandes tipos: 1. análise fonético-auditiva; 2. análise fonético-acústica; 3. análise auditiva e acústica combinadas; 4. análise de reconhecimento automático. O resultado da pesquisa aponta para uma enorme disparidade entre as práticas realizadas ao redor do mundo.

Rose (2002, p. 20, tradução nossa) alerta para a complexidade da atividade de comparação de vozes e sugere que exemplares de fala devam ser comparados auditiva e acusticamente. Sugere também que a identificação forense de falante "requer conhecimento especializado e não apenas de uma, mas de várias áreas especializadas relacionadas à ciência da fala. Essas áreas incluem subáreas da linguística, acústica e estatística". No cenário brasileiro observa-se ainda a preocupação com tópicos de processamento digital de sinais, haja vista que o sinal de voz em análise é transmitido e armazenado por equipamentos eletrônicos, e é preciso ter em mente como podem afetar a forma como alteram a percepção daquela fala.

Vamos começar nosso estudo pela análise mais básica, a análise perceptivo- auditiva, que é aquela que sempre vai preceder qualquer outra, mesmo que não seja a principal adotada pela perícia, aquela que terá como instrumento o ouvido

humano.

ANÁLISE PERCEPTIVO-AUDITIVA

Esta seção vai tratar da análise perceptivo-auditiva em comparação forense de locutor, que é realizada por ouvintes especialistas, sejam foneticistas, sejam fonoaudiólogos, engenheiros eletricistas, ou outros profissionais treinados. Não vamos entrar no mérito de qual profissional está mais ou menos qualificado para realizar a análise; vamos enfatizar a atividade forense de comparação de locutor como uma atividade multidisciplinar (vide Gomes et al, 2012; Gomes e Carneiro, 2014; Gomes et al, 2016 para discussões sobre a multidisciplinaridade). Acreditamos que cada profissional desenvolve, em sua formação, habilidades específicas para a análise de voz, que de alguma forma tenha sido captada em uma gravação, que é aqui o nosso objeto de estudo.

Segundo Rose (2002, p. 51, tradução nossa), "a análise auditiva estará predominantemente preocupada em comparar exemplares linguisticamente, em especial com respeito aos aspectos do sistema sonoro subjacentes à fala". Os aspectos subjacentes a que o autor se refere são os elementos linguísticos que formam as palavras da língua, e que podem ser transcritos com a ajuda de uma série de símbolos como o IPA (International Phonetic Alphabet — Alfabeto Fonético Internacional) . Os símbolos do IPA representam as consoantes e vogais das línguas 1 naturais, a partir de parâmetros articulatórios de produção pelo aparelho fonador. Além dos sons segmentais, o IPA também contém símbolos que representam aspectos suprassegmentais da fala, como o acento e a entoação, e parâmetros tonais. Ademais, para Rose (2002), a análise auditiva não deve se limitar a descrever as características linguísticas do exemplar de fala, mas também descrever elementos não linguísticos, nomeadamente a qualidade vocal. O autor defende que a análise perceptiva deve tratar desses dois aspectos da voz, a análise da realização dos fonemas da língua e a análise da qualidade vocal do falante, pois são dois aspectos caracterizadores do produtor da fala. Além dos elementos fonéticos e da qualidade de voz, outras características ainda podem ser inferidas pela audição: características físicas, como sexo, idade, dimensão corporal, estado de saúde; características sociais, como origem regional, escolarização, profissão; ou características psicológicas, como personalidade, inteligência, estado emocional (Kreiman e Sidtis, 2013).

Disponível em: http://www.internationalphoneticalphabet.org. Acesso em 26/09/2017. 1

Mas quanto à análise propriamente dita, Rehder et al (2015b) recomendam que o processo se inicie com um exame da qualidade e quantidade do material, para verificação da viabilidade da análise. Ruído (em especial na amostra questionada que não pode ser controlada) pode prejudicar a análise, assim como a insuficiência de material linguístico na gravação pode impossibilitar o trabalho. Se o material apresentar qualidade e quantidade suficientes para a análise, o próximo passo é a escolha de parâmetros, ou seja, "peculiaridades sonoras que fundamentam o discurso e que sejam passíveis de análises mais profundas" (Rehder et al, 2015b, p. 91).

Os parâmetros para a análise perceptivo-auditiva podem ser de natureza linguística ou não linguística (paralinguística). As de natureza linguística se referem às informações de ordem fonológica, morfológica, sintática e semântica, enquanto as informações paralinguísticas expressam atitudes e emoções (Kreiman e Sidtis, 2013). Além de informações linguísticas e paralinguísticas, Camargo e Madureira (2008) acrescentam um terceiro tipo de informação, a extralinguística, como as que indicam condições físicas e patológicas.

É bastante comum na prática de análise perceptivo-auditiva o uso de protocolos, conforme os propostos por Porto e Gonçalves (2007), Camargo e Madureira (2008) e Gonçalves e Petry (2015). Esses protocolos são na verdade uma lista de elementos que vão servir como guia para o analista. Para exemplificar os parâmetros comumente usados em análises perceptuais, vamos descrever de forma geral dois protocolos: a adaptação realizada por Camargo e Madureira (2008) para o protocolo de Laver (1980), o qual pode ser utilizado para realidade forense apesar de não ter sido idealizado para esse fim, e o proposto por Gonçalves e Petry, este sim tendo sido desenhado especificamente para a análise forense.

O BP-VPAS é uma adaptação para o Português Brasileiro do esquema 1 elaborado por Laver (1980). Esse protocolo, conforme já mencionado, não foi elaborado e nem adaptado para uso com propósito de análise forense, entretanto, pode ser utilizado em face de sua abrangência em parâmetros de investigação. Por ser fundamentado em um modelo fonético, que descreve os ajustes articulatórios que o falante realiza para controlar o seu aparelho muscular e produzir a fala (Laver, 1980), o VPAS pode ser usado para diversos propósitos que envolvam a produção e percepção dos sons da fala (Camargo e Madureira, 2008).

BP-VPAS — Voice Profile Analysis Scheme for Brazilian Portuguese — Protocolo de Análise de Perfil 1

Laver (1980) apresenta a ideia de "ajustes articulatórios" (articulatory settings) como configurações musculares de longo termo dos órgãos vocais, ou seja, do nosso aparelho fonador. O protocolo VPAS se constitui em uma tabela dividida em três elementos de análise: o trato vocal, a tensão muscular e a fonação. Os ajustes realizados na região supralaríngea do trato vocal se configuram, conforme Figura 1, o BP-VPAS (Brazilian Portuguese Vocal Profile Analysis Scheme) de Camargo e Madureira (2008).

Os ajustes são analisados em termos de sua relação com um ajuste de referência, chamado por Laver (1980) de ajuste neutro. O autor ressalva que a neutralidade do ajuste não significa que seja um ajuste "normal", nem que esteja em posição de descanso. Trata-se apenas de uma referência e poderia ser a posição habitual e sem emoção de determinado órgão vocal de um indivíduo. A neutralidade seria, por exemplo, lábios não protraídos, laringe nem abaixada, nem levantada, ou a raiz da língua nem avançada, nem retraída.

No documento Perspectivas em linguística forense (páginas 30-58)