1.2 Fundamentos das Propriedades Materiais
1.2.1 Massa Específica
Os óxidos, tipo alumina alfa – α-Al2O3 e urânia - UO2, têm a composição da forma AnOm, onde A e O são representações do metal e do
oxigênio, e n e m expressam, respectivamente, a proporção de átomos de cada elemento na composição do material. Uma série de propriedades térmicas de materiais cerâmicos, tais como a condutividade térmica, é expressa em relação a uma massa específica de referência (WEISMAN, 1977 FINK, 2000). No processo de fabricação do combustível nuclear UO2 é desenvolvida uma porosidade que atende a uma especificação de
projeto ( ASSMANN, 1978, DÖRR et al., 1981, PINHEIRO et al., 1988). Esta especificação determina a massa específica e ainda as distribuições de tamanho de grão e de porosidade, ou seja, tamanhos médios de grãos e de poros, respectivos desvios padrões, percentuais de poros acima de tamanho limite e de suas distribuições inter e intragranular. Além da composição do material e sua estrutura cristalina, a massa específica depende também da expansão térmica que, por sua vez, estabelece a necessidade de uma temperatura referencial para a determinação de uma massa específica de referência.
A maioria das estruturas simples de óxidos metálicos pode ser montada com base no empacotamento quase fechado de íons de
oxigênio, com os interstícios disponíveis preenchidos, parcial ou totalmente, com cátions (KINGERY et al. 1976).
Como parâmetro referencial, a massa específica teórica pressupõe o arranjo ordenado de um número inteiro z de bases (ou unidades) AnOm na célula unitária, ou seja, z.n átomos A e z.m
átomos O em posições determinadas da célula unitária do cristal. Correspondendo ao material AnOm isento de imperfeições
estruturais, a massa específica teórica, ρDT, também chamada de
densidade teórica (DT), é dada pela seguinte expressão (van VLACK, 1970, PINHEIRO et al., 1988):
ρDT= z . M
NA. Vref
onde NA é o número de Avogadro, z é a quantidade de bases AnOm na
célula unitária, M é a massa molecular da base AnOm e Vref é volume
da célula unitária a uma temperatura de referência, Tref.
Usualmente, a temperatura de referência é tomada como 0 oC ou como a ambiente.
A massa molecular da base AnOm é obtida por meio da
expressão:
MA
nOm=n . MAm . MO
onde
M
A eM
O são as massas atômicas dos elementos A e O,respectivamente.
No caso do combustível nuclear UO2, dois outros parâmetros devem ser ainda considerados: as variações das frações isotópicas, que são alteradas pelo processo de enriquecimento isotópico, e o desvio da estequiometria.
O urânio U235, presente na natureza com abundância de 0,72%, é o elemento isotópico de interesse para a geração de energia a partir da fissão nuclear. O processo de enriquecimento isotópico visa a aumentar a concentração deste elemento em relação ao total de átomos de urânio, o que é um requisito de projeto em diversos tipos de reatores nucleares (LAMARSH, 2001). Este processo produz a alteração da distribuição de frações molares dos isótopos
naturais do urânio yUi e, por conseguinte, a avaliação da massa atômica do metal U é dada por:
MU=
∑
yUi. MUi=yU234. MU234yU235. MU235.. .yU238. MU238
Em termos práticos e para valores baixos ou médios do enriquecimento isotópico de U235 em relação ao total de U,
ε
, a massa atômica do urânio pode ser estimada por meio da expressão:MU=ε . M
U2351−ε . MU238
Sendo x o desvio em relação à razão estequiométrica O/U = 2, ou seja, a medida do excesso (+) ou da carência (-) de átomos de oxigênio em relação aos átomos de urânio, a massa molecular passa a ser expressa por:
MUO
2±x=MU
2±x
. MOO UO2-x representa uma solução sólida substitucional ao acaso de lacunas na rede cristalina do oxigênio. Por outro lado, o UO2+x significa a presença de átomos de oxigênio em posições intersticiais da rede cristalina. Para efeito de cálculo da massa específica teórica, ambos os casos representam o arranjo de 2.z átomos de oxigênio na célula unitária e cada átomo com massa
atômica
1±x2
. MO , onde o sinal + é usado para o materialhiperestequiométrico e o – para o material hipoestequiométrico. Em soluções sólidas de compostos fortemente iônicos, o desvio da estequiometria resulta no aparecimento de defeitos estruturais carregados para a manutenção do balanço de carga eletrônica. Os efeitos dimensionais, que as imperfeições estruturais da rede cristalina promovem na massa específica teórica do material, são determinados, de forma experimental, por meio do seu efeito no parâmetro de rede e, por conseguinte, no volume da célula unitária.
A porosidade p, formada pela aglomeração de lacunas na rede cristalina, é uma fase quase sempre presente em cerâmicos, que sejam produzidos a partir da compactação de pós, seguida de
tratamento térmico, como a sinterização. A porosidade pode ser caracterizada quanto à fração volumétrica (%V) e quanto à distribuição de tamanho e/ou forma dos poros presentes. Muitas propriedades térmicas de materiais cerâmicos são fortemente dependentes da forma e distribuição dos poros (KINGERY et al., 1976). Na queima do combustível UO2 em reatores do tipo PWR (processo de fissão nuclear), cerca de 30 átomos de isótopos estáveis ou de meia-vida longa de Xe e Kr são produzidos a cada 100 fissões (DIAS, 1982). Em função da temperatura e do tempo, esses elementos gasosos ficam solubilizados na matriz ou migram, por difusão, na forma de átomos ou de bolhas de gases de fissão, para as porosidades, contornos de grãos e superfícies livres do combustível nuclear. O acesso às superfícies livres resulta no aumento da pressão interna da vareta combustível, que, entre outros, constitui um parâmetro associado com limites de projeto para os elementos combustíveis de centrais nucleares (PINHEIRO et al., 1988). Assim, tornam-se importantes as distribuições dos poros inter e intragranulares. Da mesma forma, a fração de poros conectados com o exterior (fração de porosidade aberta) representa o aumento da superfície livre do combustível nuclear.
A medida de volume dos materiais cerâmicos utiliza o método por imersão (MPI) em fluido padrão de alta permeabilidade ou sob pressurização. Este método permite a determinação da porosidade total e seu fracionamento em aberta ou fechada. As demais características, como a forma e a distribuição de tamanhos dos poros são obtidas por meio da análise microestrutural ceramográfica (DÖRR et al., 1978). Em função das diversas possibilidades de medidas pelo MPI, os volumes de um corpo de prova cerâmico são expressos por (van VLACK, 1970, KINGERY et al. 1976):
Vtotal = Vaparente =(volume geométrico+poros abertos e fechados)
Vsólido aparente = Vaparente – Vporos abertos
Vreal = Vaparente – Vtotal dos poros e as respectivas massas específicas por:
ρgeométrica=ρg=massa/Vaparente
sólido¿aparente=ρsa=massa/Vsólido¿aparente
ρ¿
¿
ρreal=massa/Vreal
Uma vez que a composição e a massa do material sejam conhecidas, o volume real é estimado pela expressão 2.3.1.10:
Vreal = massa/ρDT.
A porosidade total p, expressa como uma fração do volume aparente, é dada pela relação (KINGERY et al. 1976):
p=1− ρg ρDT
Esta equação aplicada à equação 2.3.1.1 permite expressar o efeito da porosidade na estimativa da massa específica:
ρg=ρ1− p =
1− p
. ρDT=
1− p
.Nz. MA.Vref
onde ρ(1-p) denota a massa específica expressa em termos de porcentagem da
massa específica teórica, como por exemplo ρ95%DT, ou simplesmente ρ95% para
um material com 5% de porosidade total.
Finalmente, a dependência com a temperatura, ρg(T), é dada pela
relação:
ρg
T
=
1− p
. ρDT
T
=
1− p
. z . MNA. Vc
T
onde Vc(T) representa o volume da célula unitária à temperatura T.
Sendo γ T o coeficiente de dilatação térmica volumétrica
médio do material, entre as temperaturas Tref e T, este volume é
dado por:
Vc
T
={
1 γ .
T −Tref}
. VrefDesta forma, a expressão da massa específica em função da porosidade, massa molecular dos elementos constituintes do sistema, célula unitária e expansão térmica é dada por:
ρg
T
=
1− p
. z. MNA.
{
1 γ .
T −Tr}
. VrEsta expressão introduz dois aspectos fundamentais para os materiais cristalinos, como o UO2 e o Al2O3: a expansão térmica e a célula unitária ou parâmetro de rede.