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O meio ambiente é um bem de interesse da coletividade, sua manutenção ou desgaste atingem não apenas um indivíduo ou um grupo, mas toda a sociedade e, assim, deve-se compreender a relevância do tema para a vida e para a saúde das gerações atuais e futuras (MILARÉ, 2011, p. 77).

Na definição legal, “entende-se por meio ambiente o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”, considerando-se, ainda, o “meio ambiente como um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo” (Lei 6.938, de 31.08.81, arts. 3º, I, e 2º, I) (BRASIL, Lei n. 6.938, 2019).

Federici (2019, p. 1) afirma que a água, o solo, o ar, entre outros exemplos que podem ser citados, são bens que não podem ser utilizados de acordo com a vontade de alguns, no interesse meramente privado, já que pertencem a todos os cidadãos e, assim, integram bens comuns, aqueles sobre os quais não

recai uma posse, mas que devem ser vistos como pertencentes a todos os cidadãos, inclusive àqueles que ainda não nasceram.

Se, por algum motivo, esses bens fossem utilizados para o atendimento dos interesses de alguns, em exclusão e em oposição ao interesse social, ao invés de serem vistos como bens da coletividade, ocorreria uma situação de riqueza nas mãos de uma parcela da população, com outras parcelas sofrendo os impactos de uma limitação ou, ainda, de uma escassez que precisa ser combatida (VARGAS; HERSCOVICI, 2017, p. 119-120).

Toda a atividade humana causa, em alguma proporção, impactos sobre o meio ambiente e, assim, o tema merece atenção contínua visando controlar esses impactos, bem como desenvolver formas de compensação. Em outras palavras, o homem precisa seguir com suas atividades para assegurar o desenvolvimento socioeconômico, no entanto, deve encontrar formas de equilibrá-las com o esforço de conservação dos recursos ambientais (CARVALHO, 2008, p. 40).

Pereira (2018, p. 53) destaca que todo dano ambiental trata-se, de fato, de um dano que atinge a sociedade. Não há vidas sem o meio ambiente e, assim, quando os recursos ambientais são degradados, a população deve entender que sua própria vida e saúde também se encontram em risco.

Quando se fala em proteção ambiental, deve-se compreender que se trata de um esforço amplo, cujo resultado auxilia a todos os cidadãos, evitando o comprometimento de suas condições de vida.

A amplitude dos problemas ecológicos hodiernos leva-nos, necessariamente, a considerar a ecologia e a proteção dos recursos naturais renováveis, o amparo à fauna e à flora, a defesa do ambiente saudável, sob uma multiplicidade de enfoques. Neste sentido, não é mais uma questão que interessa apenas aos cientistas, aos biólogos, aos químicos, aos botânicos, aos naturalistas, etc., mas, com idêntico relevo e importância, passa a ser uma preocupação que adentra ao âmbito do político – institucional, do econômico, do social, do filosófico e do ético e,

lastbutnotleast, do jurídico (CARVALHO, 2008, p. 10).

É uma imposição à toda sociedade, a todas entidades, e pessoas, unir-se pela proteção ambiental como um objetivo comum. Apenas esforços pontuais não são suficientes para evitar a degradação ambiental que evolui consideravelmente todos os anos. Ainda, a busca por uma tutela ambiental mais eficaz iniciou-se no passado. Entretanto, nesses períodos o direito ainda não possuía uma área específica de atenção a essas questões (CARVALHO, 2008, p. 12-13).

Para Pereira (2018, p. 54), criar uma consciência quanto os riscos que a degradação ambiental cria sobre a vida é essencial para a alteração de atividades que, no presente, são muito comuns. Sabe-se que o desenvolvimento econômico demanda do uso de recursos ambientais. Porém, enquanto a preocupação com a obtenção de lucro for maior do que com os homens e sua garantia de futuro, caminha-se para uma sociedade doente, prejudicada em todos os seus setores pelos impactos ambientais, com disponibilidade de recursos financeiros que não podem reverter os danos já causados.

O homem, que no passado acreditava que os recursos naturais eram infindáveis, vem tomando consciência de que eles se esgotam e, paralelamente a isso, atingem as pessoas, sua saúde e qualidade de vida e, assim, indivíduos, empresas e sociedade vêm se mobilizando em busca de mudanças na questão ambiental, sua valorização e esforços em prol da preservação. Milaré (2011, p. 78) ressalta que “a devastação ambiental não é marca exclusiva de nossos dias ou deste século. Apenas a percepção jurídica deste fenômeno - até como consequência de um bem jurídico novo denominado ‘meio ambiente’ - é de explicitação recente”.

Para Carvalho (2008, p. 15) deve-se compreender que:

Objetivamente não se pode afirmar não ter havido, do ponto de vista legal, antes da década de 70, uma certa preocupação com os recursos naturais, a fauna e a flora. O que se constata porém é o fato de, até então, não ter permeado as formulações jurídicas um conceito amplo do meio ambiente que pudesse substancialmente lastrear uma coerente política ambiental. Em outros termos, as providências legais e administrativas eram sempre setoriais, tomando-se cada recurso de per si, como se fossem nichos independentes e estanques.

Freitas (2016, p. 25) enfatiza que o século XX pode ser visto como o período no qual acentuou-se a preocupação do homem com a questão ambiental. Esse tema, até então considerado como específico dentro de algumas atividades, como dos ambientalistas, tornou-se mais debatidos, surgiram eventos ressaltando a gravidade do cenário atual e, assim, o envolvimento de pessoas e empresas que até então acreditavam não ter nenhuma relação com o tema passou a ser maior e mais comum.

Figueiredo (2008, p. 28) ressalta que:

Ao final do século XX, a população mundial havia quadruplicado [...] houve uma multiplicação na produção de riquezas da ordem de 37 vezes [...] não há como negar o crescimento desequilibrado no volume de bens materiais

apropriados pela humanidade nos últimos cem anos. E estes elementos estão diretamente relacionados com a questão do aquecimento global. Assim sendo, compreende-se que ao mesmo tempo que as sociedades cresceram, se desenvolveram e a população mundial aumentou, a capacidade de lidar com o meio ambiente de forma equilibrada não seguiu o mesmo padrão de desenvolvimento e, assim, os recursos passaram a demonstrar sinais de escassez, gerando uma preocupação crescente e importante nas sociedades do mundo (FIGUEIREDO, 2008, p. 28).

Havendo-se compreendido a importância da questão ambiental, parte-se para uma análise do conceito e natureza jurídica do direito ambiental.

4.1 CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA

Quando se fala em meio ambiente, é comum que alguns indivíduos associem o termo apenas à natureza, porém, deve-se entender que este encampa um conceito muito mais abrangente. De acordo com Freitas (2005, p. 17), o meio ambiente como ser caracterizado como um meio que inclui “[...] urbanismo, aspectos históricos, paisagísticos e outros tantos essenciais, atualmente, à sobrevivência do homem na Terra”

Compreende-se, assim, que enquanto a natureza diz respeito apenas aos recursos naturais, o meio ambiente trata da associação desses recursos com o espaço em que estão inseridos, os acontecimentos nesse entorno, como a homem e suas atividades, a construção de espaços diversos, a associação entre todos os recursos que podem auxiliar ou prejudicar os indivíduos (esgoto, água, agentes contaminantes do solo, etc.) (FREITAS, 2005, p. 17).

A partir do momento em que o homem se dá conta da finitude dos recursos ambientais, bem como de sua importância para a manutenção da vida, passam a se delinear esforços para o desenvolvimento de um direito voltado à questão ambiental. Não se pode falar de um momento específico do surgimento do direito ambiental, mas de uma sucessão de esforços que, agregados, foram construindo o direito que atualmente rege as nações (BENJAMIN, 2011, p. 44).

Retrospectivamente e em favor da clareza didática, podemos identificar três momentos (mais modelos do que propriamente períodos) históricos na evolução legislativo-ambiental brasileira. Não se trata de fases históricas cristalinas, apartadas, delimitadas e mutuamente excludentes. Temos, em

verdade, valorações ético-jurídicas do ambiente que, embora perceptivelmente diferenciadas na forma de entender e tratar a degradação ambiental e a própria natureza, são, no plano temporal, indissociáveis, já que funcionam por combinação e sobreposição parcial, em vez de substituição pura e simples. A interpenetração é sua marca, deparando-nos com modelos legais que convivem, lado a lado — o que não dizer harmonicamente —, não obstante suas diversas filiações históricas ou filosóficas, o que, em certa medida, amplia a complexidade da interpretação e implementação dos textos normativos em vigor (BENJAMIN, 2011, p. 45). Compreende-se, assim, que tanto a preocupação ambiental quanto o direito ambiental são construções históricas relacionadas com a mudança da percepção dos homens e das sociedades a respeito do valor dos recursos ambientais e dos riscos relacionados à sua escassez (BENJAMIN, 2011, p. 44).

Carvalho (2008, p. 9) esclarece que “o Direito Ambiental, enquanto formulação teórica articulada, é recém-nascido e vem ao mundo num momento de crise, tanto de valores éticos quanto a própria vida no planeta”.

O Direito Ambiental é um ramo do Direito Público, já que o Poder Público tem presença constante nas questões ambientais, atuando no controle da qualidade do meio ambiente, proteção dos recursos, identificação de condutas ilícitas, aplicação de sanções, etc. (SILVA, 2019, p. 19).

Pensando-se na natureza jurídica do direito ao meio ambiente, ressalta-se que a Constituição Federal de 1988 apresentou papel decisivo na proteção do meio ambiente como um recurso indispensável para o bem comum dos cidadãos, destacando os recursos ambientais como sendo indispensáveis para que o homem possa viver, evoluir, trabalhar, etc. (FIORILLO, 2009, p. 44).

O direito ambiental constitucional será observado na Constituição Federal de 1988 exatamente dentro de aludido contexto: um direito à vida, voltado às necessidades de toda população brasileira, interessado em proteger os valores fundamentais da pessoa humana (FIORILLO, 2010, p. 50-51). Para Antunes (2017, p. 61), a Constituição Federal oferece uma base de grande importância para o direito ambiental, não apenas no art. 225, mas em outros que esclarecem a concepção de que o direito ambiental faz parte da lei de maior relevância na nação e, assim, não pode ser ignorado ou considerado como um ramo secundário do direito. “Essa é uma realidade nova e inovadora em nossa ordem jurídica” (ANTUNES, 2017, p. 61).

A vigente Constituição Federal Brasileira, de 8 de outubro de 1988, introduziu, pela primeira vez em nossa história, um capítulo próprio para o meio ambiente. Além de demonstrar o acolhimento das ideias de grupos ambientalistas organizados, rasgando, de forma inédita, o modelo

meramente burocrático estatal e desenvolvimentista, a CF o considerou como bem jurídico autônomo e de uso comum, representando uma quebra de paradigma em relação à exploração econômica fundada no descontrole fundiário, na degradação ecológica e na desigualdade social (MARCHESAN

et al., 2010, p. 15).

Deve-se enfatizar, assim, que a natureza jurídica do direito ao meio ambiente engloba um direito de todos os cidadãos, mas também um dever de todos, inclusive do Estado e não apenas deste. Quando o próprio cidadãos assume condutas lesivas ao meio ambiente, ele está colocando em risco a integridade de um bem que não lhe pertence, mas está devidamente citado na Constituição Federal como um bem a ser resguardado para que todas as pessoas, as que vivem na terra e as que virão a nascer, possam ter acesso a ele de forma equilibrada e saudável (FREITAS, 2005, p. 18).

Em geral, quando se fala em direito ambiental, há uma ideia inadequada de que se trata do ramo do direito que protege tão somente os recursos ambientais. Essa percepção demonstra somente uma parte da questão, que é muito mais ampla do que isso. O direito ambiental visa proteger o meio ambiente pensando no homem, na perpetuação da vida e das espécies (SILVA, 2019, p. 21-25).

Para Prado (2009, p. 64), “a questão ambiental emerge, portanto, no terreno político-econômico e da própria concepção de vida do homem sobre a terra”. Em outras palavras, o direito ambiental surge como um elo entre a natureza, o homem e a vida, destinando um olhar específico do direito para essas questões, os pontos de intercessão entre elas e a necessidade de haver normas jurídicas que regulamentem esse agrupamento de condições para a sobrevivência futura.

O Direito Ambiental pode ser definido como um direito que se desdobra em três vertentes fundamentais, que são constituídas pelo direito ao meio ambiente, direito sobre o meio ambiente e direito do meio ambiente. Tais vertentes existem, na medida em que o Direito Ambiental é um direito humano fundamental que cumpre a função de integrar os direitos à saudável qualidade de vida, ao desenvolvimento econômico e à proteção dos recursos naturais. Mais do que um Direito autônomo, o Direito Ambiental é uma concepção de aplicação da ordem jurídica que penetra, transversalmente, em todos os ramos do Direito. O Direito Ambiental, portanto, tem uma dimensão humana, uma dimensão ecológica e uma dimensão econômica que se devem harmonizar sob o conceito de desenvolvimento sustentado (ANTUNES, 2017, p. 9).

Assim, enquanto o meio ambiente envolve a vida, os recursos e as pessoas, o direito ambiental trata-se de uma proteção a todas essas questões. Não se refere apenas a proteger os recursos ambientais da atividade do homem, mas a demonstrar ao homem que este está diretamente ligado ao ambiente e, assim,

quando prejudica esses recursos, atinge também a si mesmo (CARVALHO, 2008, p. 42).

O direito ambiental representa a evolução do direito privado, consagrador dos direitos de primeira geração, e do direito público, consagrador dos direitos de segunda geração. Por esse motivo, não deve ser contextualizado no mundo jurídico como sub-ramo do direito privado, tampouco como sub- ramo do direito público (GRIZZI, 2008, p. 20).

Antunes (2017, p. 10) ressalta que o direito ambiental, em seu percurso de desenvolvimento, gerou alterações sobre o posicionamento da sociedade diante das questões ambientais, assim como também incorporou as percepções e os esforços desenvolvidos pelas pessoas. É preciso atuar no sentido de que esses recursos sejam usados com limites, com a consciência de que, ao se esgotarem, a própria vida estará em risco.

Provavelmente, a principal ruptura que o Direito Ambiental cause na ordem jurídica tradicional seja com o antropocentrismo tradicional. Com efeito, toda a doutrina jurídica tem por base o sujeito de direito. Com o direito Ambiental ocorre uma transformação do próprio sujeito de direito, pois mediante a utilização de um vasto sistema de presunções e de atribuição de personalidade jurídica e processual a coletividades, associações e reconhecimento de algum status jurídico a animais e ecossistemas, tem sido possível a defesa de formas de vida não humana. As normas de Direito Ambiental, nacionais e internacionais, cada vez mais, vêm reconhecendo direitos próprios da natureza, independentemente do valor que esta possa ter para o ser humano (ANTUNES, 2017, p. 25).

Compreende-se, assim, que o valor do direito ambiental não recai apenas sobre o meio ambiente, mas sobre a vida de todos os cidadãos, quaisquer que sejam suas características, pois não se pode separar a vida das pessoas (e demais espécies) dos esforços de proteção ambiental (GRIZZI, 2008, p. 21-22).

Na sequência, aborda-se o direito ao meio ambiente equilibrado como direito fundamental.

4.3 DIREITO AO MEIO AMBIENTE EQUILIBRADO COMO DIREITO

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