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Os meios de garantia da constitucionalidade e da legalidade da actividade regional expressamente previstos na

No documento As Regiões Autónomas e a aplicação das (páginas 41-98)

III. DIREITO PORTUGUÊS

2. Os meios de garantia da constitucionalidade e da legalidade da actividade regional expressamente previstos na

Constituição e na lei e o cumprimento das obrigações comunitárias

126 V. Alessandro Catelani, op. cit.. págs. 66 e 159 e segs..

127 V. Munoz Machado, op. cit., II, págs. 259 e segs..

124 V. AlessandroCatelani, op. cit., págs. 171 esegs.; GuidoMeale,op. cit., págs.

103 e segs.; Livio Paladin, op. cír.,págs.418 escgs.; Jole Buccisano, Considerazioni in tema di scioglimento del consiglio regionale, in R.T.D.P., 1977, n°4, págs. 1713 e segs..

129 V. Amâncio Ferreira, op. cit., pág. 150.

130 V. Oliveira Ascensão, O Direito. Introdução e Teoria Geral, Coimbra, 1991, págs. 445 e segs..

131 V. Diário da Assembleia Constituinte, n°126, de 26 de Março de 1976, pág.

4173. V. ainda Barbosa de Melo/Cardosoda Costa/Vieirade Andrade, Estudo e Projecto de Revisão Constitucional, Coimbra, 1981, pág. 273.

A possibilidade de dissolução de órgãos regionais não é, no entanto, uma originalidade da nossa Lei Fundamental. O artigo 236° da Constituição portuguesa actual inspira-se no artigo 126° da Constituição italiana de 1947. Este preceito admite, com efeito, a dissolução do Conselho Regional por decreto fundamentado do Presidente da República, ouvida a comissão parlamentar incumbida das questões regionais128.

Diz-se frequentemente que o poder de dissolução é mais amplo do que a mera possibilidade de recorrer à coacção estadual e, por isso, “faz normalmente parte dos poderes de tutela dos órgãos de soberania num Estado unitário”129. Poder-se-ia, inclusivamente, afirmar que uma regra que permite o mais permite o menos (argumento a maiori ad minus) e, nessa medida, o poder de dissolução comportaria a possibilidade de recorrer à mera coacção estadual. Todavia, embora aceitemos a validade desse tipo de argumentos, não ignoramos que o recurso à chamada

«interpretação enunciativa» exige algumas cautelas. “Sobretudo porque se pode dizer que em todos os casos há implícita uma valoração”130. Ora, no que toca ao artigo 236° da Constituição portuguesa, o elemento histórico revela que se pretendeu restringir a intervenção dos órgãos de soberania à dissolução dos órgãos de governo regional e, nessa medida, evitar que, através da formulação de hipóteses mais mitigadas para essa intervenção, se propiciasse aos órgãos de soberania meios mais eficazes de desvalorização da autonomia regional131.

Sublinhe-se ainda a existência de diferenças significativas entre o artigo 236° da Constituição e os preceitos constitucionais estrangeiros que admitem a dissolução dos órgãos de governo regional ou o recurso à coacção estadual. Para efeitos deste estudo importa, sobretudo, chamar a atenção para o facto de a Constituição portuguesa ser bastante mais restritiva na delimitação dos fundamentos que podem justificar a intervenção do Estado. E que, enquanto o Conselho Regional italiano

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pode ser dissolvido tanto por prática de actos contrários à Constituição como por graves violações da lei ou por razões de segurança nacional132, os órgãos de govemo das regiões autónomas portuguesas só podem ser dissolvidos por prática de actos contrários à Constituição. Também a Lei Fundamental de Bona autoriza o recurso à coacção estadual, quer quando os Estados federados infringem a Constituição, quer quando eles não cumprem as obrigações que lhes são impostas por leis federais. Do mesmo modo, as causas que podem justificar, em Espanha, o recurso à coacção estatal são bastante mais amplas do que aquelas que justificam a dissolução dos órgãos de governo regional no Direito português. De facto, a Constituição espanhola fala em não cumprimento das obrigações impostas pela Constituição ou por outras leis, bem como, ao contrário do artigo 37° da Lei Fundamental alemã, em acções ou omissões que atentem gravemente contra o interesse geral.

Essas diferenças são intencionais. A Assembleia Constituinte recusou expressamente a proposta de acrescentar aos motivos da dissolução a reiterada violação do estatuto regional, o grave desrespeito das leis gerais e razões de segurança nacional e, nas revisões constitucionais de 1982 e 1989, não obtiveram sucesso as tentativas de alargar a dissolução aos casos de grave violação do estatuto político-administrativo da região133.

Acresce que não basta, para a dissolução dos órgãos de govemo regional, qualqueracçãoouomissãocontráriaàs normas constitucionais134.

A dissolução prevista no artigo 236° da Constituição deve constituir, à luz do princípio da proporcionalidade, a “última garantia da constitucio- nalidade da autonomia regional”135.

Esse “remédio extraordinário, destinado a ter aplicação em casos- limite, não é, por isso, aplicável à generalidade das omissões imputáveis às regiões”136. Assim, só nos casos excepcionais em que o incumprimento das obrigações comunitárias pelas regiões autónomas comprometer gra­

vemente o “reforço da identidade europeia” e a “realização da coesão

134 V. Amâncio Ferreira, op. cit., pág. 151.

135 V. Gomes Canotilho/VitalMoreira,op. cit., II. pág. 379. V. aindaGuiooMEALE, op. cit., pág. 104; Livio Paladin. op. cit., pág. 419.

136 V. Oriol Casanovasy La Rosa, Le Regioni... cit., pág. 63.

132 Salvo no caso da Região Siciliana (V. Livio Paladin. op. cit.. págs. 428 e segs).

133 V., em sentido contrário ao alargamento dos fundamentos da dissolução, MOTA AMARAL, Diário da Assembleia Constituinte, n°126, de 26 de Março de 1976, pág.

4173.

2.3. Em relação à actividade legislativa

económica e social (n° 5 e 6 do artigo 7o da Constituição) e, nessa medida, puser em causa valores constitucionais, é que o Estado se pode socorrer do poder que lhe é conferido pelo artigo 236° da Lei Fundamental.

IA actividade normativa das regiões autónomas é controlada, tanto pelos Ministros da República, como pelos tribunais em geral.

b) Conforme sublinha MIGUEL GALVÃO TELES, “perante um conflito de normas de diversa autoridade não vemos que possa negar-se que, sob pena de preterir o próprio princípio da hieraraquia das fontes, o tribunal deva respeito à de força maior, não aplicando a de valor menor”.

a) Assim, nos termos do n° 1 do artigo 235° da Constituição, compete ao representante especial da soberania nas regiões autónomas assinar e mandar publicar os decretos legislativos regionais e os decretos regulamentares regionais. A assinatura não é obrigatória. O Ministro da República pode exercer o veto político (n°2, 3 e 4 do artigo 235°) ou, tratando-se de um decreto legislativo regional ou de um decreto regulamentar de lei geral da República137, requerer a apreciação preventiva ao Tribunal Constitucional (n°2 do artigo 278°)138.

Todavia, uma vez que o Tribunal Constitucional não conhece, em sede de fiscalização preventiva, da ilegalidade de normas jurídicas, o Ministro da República só pode impedir a vigência de normas regionais contrárias às directivas comunitárias através do recurso ao veto político.

Ora, tratando-se de um decreto da assembleia legislativa regional, esse veto é meramente suspensivo: se a assembleia legislativa regional confirmar o voto por maioria absoluta dos seus membros em efectividade de funções, o Ministro da República deverá assinar o diploma (n° 3 do artigo 235° da Constituição).

137 Anote-se, porém, que os Estatutos Político-Administrativos das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira estabelecem, ao arrepio da Constituição, que os regulamentos de leis gerais emanadas dos órgãos de soberania revestem a forma de decreto legislativo regional (respectivamente, o n°l do artigo 34° e o n°l do artigo 31°).

138 V. Margarida Salema, ODireitode Vetona Constituição de 1976, Braga, 1980, págs 76 e segs.; Parecer da Comissão Constitucional n°21 /80, in Pareceres da Comissão Constitucional, XIII, págs. 32 e segs..

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Qualifique-se ou não o vício como inconstitucionalidade,a verdadeé que parece vigorarno Direito português um princípio, segundo oqualsão inaplicáveis os preceitos defonte inferior contráriosa preceitos de fonte superior”139 Assim, nostermosdoartigo 207° da Constituição, os tribunais, nos feitos submetidos a julgamento, não podem aplicar normas que infrinjam o princípio da hierarquia das fontes,tal comoéestabelecido na Lei Fundamental140. Com alcanceaté mais vastoestabelece o n° 3 do artigo 4o do Estatutodos Tribunais Administrativos e Fiscais(ETAF)141 que os tribunais administrativos efiscaisdevemrecusaraaplicação de normas inconstitucionaisou que contrariem outras dehierarquia supe­

rior" (itálico nosso). Ora, como é pacificamente entendido, o Direito comunitário prevalece sobre a legislação ordinária. A própriaConstituição, nos 5 e 6o do artigo7°, nos n° 2 e 3o do artigo8o eno2 do artigo277°, parece fornecerfundamento suficientepara a aceitação dessa primazia142.

Pode, pois, afirmar-se, com GOMES CANOTILHO, queos juizes devem também valorar a compatibilidadeentre as leiscomunitárias e as leis portuguesas, fazendo prevalecer as primeiras sobre as segundas, independentemente da relação de sucessão de leis no tempo. Aqui os juizes portugueses julgarão as normas internas conflituantes com as

normas comunitárias (...). Neste sentido, o Tribunal de Justiça da Comunidade tem sistematicamente repetido que o juiz nacional encarregado deaplicar,noâmbito dasua competência,asdisposições de Direito comunitário,tem a obrigaçãodegarantir aplenaeficácia dessas normas, desaplicando qualquer disposição contrastante da legislação nacional, mesmo posterior”143. Ou seja, nas palavras de ANTÓNIO VITORJNO, “o juiz nacional também é simultaneamente um juiz comunitário, porquechamado, no âmbito dasuaesferadecompetência,

139 V. Eficácia dos tratados na ordem interna portuguesa (condições, termos e limites), Lisboa, 1967, págs. 103 e segs..

140 Sobre os argumentos que permitem afirmar que a inconstitucionalidade relevante para efeitos de fiscalização difusa abrange a inconstitucionalidade directa e indirecta. V.

Rui Medeiros, Relações entre normas constantes de convenções internacionais e normas legislativas na Constituição de 1976, in O Direito, 1990. n°2, págs. 376 e 377.

141 Aprovado pelo Decreto-Lei n° 129/84, de 27 de Abril.

142 V. Motade Campos, Direito Comunitário, II, Lisboa, 1988, pág. 356; Nuno

Piçarra, op. cit., págs. 85 e segs..

143 V. Direito Constitucional, Coimbra. 1991, pág. 917. V. ainda Garcia de

Enterría/González Campos/Munoz Machado, op. cit., I, págs. 406 e segs. e 470 e segs..

a aplicar o Direito comunitário e inclusive a dar-lhe prevalência sobre o Direito interno contrário”144.

Em contrapartida, no domínio da fiscalização realizada pelo Tribu­

nal Constitucional, “a Lei Fundamental vem depois distinguir inconstitucionalidade directa da inconstitucional idade indirecta -baptizada de ilegalidade -, para, em princípio, apenas admitir o controlo nos casos de violação directa da Constituição”145. Os únicos casos em que a Constituição excepcionalmente admite o controlo da ilegalidade não contemplam a incompatibilidade entre normas de Direito interno e normas de Direito comunitário derivado (n°2 do artigo 280° e alíneas b), c) e d) do n°l do artigo 28 Io). Do mesmo modo, a previsão da alínea i) do n°l do artigo 70° da Lei do Tribunal Constitucional, além de duvidosa constitucionalidade146, só abrange, “como normas de referência, as disposições dos Tratados que instituem as Comunidades Europeias, ou seja, o Direito comunitário originário e não o Direito comunitário derivado”147.

Em suma, como lembra JORGE MIRANDA, os tribunais em geral são competentes para apreciar e para não aplicar, em caso de infracção de norma de Direito comunitário por lei interna, a norma portuguesa. Mas já não há recurso para o Tribunal Constitucional dessa decisões e a sua lei orgânica não o contempla. “Na lógica do Direito comunitário, a haver recurso será para o tribunal das próprias Comunidades Europeias”148

Pode, pois, afirmar-se que, se as regiões autónomas adoptarem legislação que, em vez de cumprir o preceituado nas directivas, contenha normas que as contrariem, não só o Ministro da República pode vetar politicamente o respectivo decreto legislativo regional, como sobretudo, por força do primado do Direito comunitário, os tribunais devem recusar a aplicação dessas normas nos feitos submetidos a julgamento.

144 V. A adesão de Portugal às Comunidades Europeias - A problemática da aplicabilidade directa e o primado do Direito comunitário face ao nosso ordenamento jurídico, Lisboa, 1984. pág. 39.

145 V. Rui Medeiros, ibidem.

146 V., no sentido da não inconstitucionalidade, Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, II, Coimbra, 1991, págs. 408-409, em nota V; no sentido da inconstitucionalidade. Rui Medeiros, Relações... cit., loc. cit., págs. 375 e segs..

147 V. Nuno Piçarra, op. cit., pág. 107. V. ainda GarcIade Enterría/González

Campos/Munoz Machado, op. cit., I, págs. 627 e segs..

148 V. Direito Internacional Público, 1, Lisboa, 1991, (polic.), págs. 259 e segs..

AS REGIÕES AUTÓNOMAS E A APLICAÇÃO DAS DIRECTIVAS COMUNITÁRIAS 463

e

II Pelo contrário, nos casos em que ocorre uma violação das obrigações comunitárias por omissão do legislador regional, a fiscalização da inconstitucionalidade por omissão não oferece quaisquer garantias. É que, não só esse mecanismo constitucional está longe de ser eficaz149, como sobretudo o artigo 283° parece afastar do seu âmbito as omissões de leis internas para dar execução a tratados internacionais ou para proceder à transposição de directivas comunitárias150. A fiscalização da inconstitucionalidade por omissão visa tão-somente verificar o não cumprimento da Constituição por omissão das medidas legislativas necessárias para tornar exequíveis as normas constitucionais. O artigo 283° pretende impedir o não cumprimento de normas da Constituição formal que, de forma concreta, vinculem o legislador à adopção de medidas legislativas ou que reenviem para a lei a tarefa de lhes dar exequibilidade prática151. Ora, quando as assembleias legislativas regionais não procedem à concretização normativa das directivas, não está em causa uma norma constitucional não exequível por si mesma.

III Não se esqueça, porém, que as normas das directivas podem produzir efeitos directos152. Conforme é geralmente reconhecido, o efeito directo das directivas não se confunde com a aplicabilidade directa dos regulamentos comunitários153 Ora, independentemente do problema da recusa do efeito directo horizontal (relações entre particulares) das normas das directivas154, a possibilidade de produção de efeitos directos verticais (relações entre particulares e entidades públicas) constitui um dado adquirido. O efeito directo respeita a todos os órgãos da Adminis­

tração, ou seja, como afirmou recentemente o Tribunal de Justiça das

149 V. Gomes Canotilho/VitalMoreira, Fundamentos da Constituição. Coimbra, 1991, pág.263.

150 V. JorgeMiranda, Manual...cit., II, pág. 524.

151 V. Gomes Canotilho, Direito... cit., págs. 1100 e segs.; Constituição dirigente vincttlação do legislador, Coimbra, 1982, pãgs. 325 esegs..

152 V. Augusto Rogério Leitão, O efeito jurídicodas directivas comunitárias na ordem internados Estados-membros, in Documentaçãoe Direito Comparado. n°14, 1983,págs.27 e segs.;JoséMariadeAlbuquerqueCalheiros, Algumas considerações sobre o princípio da interpretação conforme do direito interno face às directivas comunitárias, in Documentação e Direito Comparado. n°45/46. 1991. pág. 12.

153 V., por exemplo, GarcíadeEnterría/González Campos/Munoz Machado, op.

cit.,I, págs. 398 e segs.e 472 e segs..

154 V. José Mariade AlbuquerqueCalheiros, op. cit., loc. cit., págs.14 e segs..

segs..

Comunidades Europeias, o efeito directo vale também para os órgãos descentralizados155.

Isto significa que, no caso de haver incumprimento das obrigações comunitárias por inexecução (ou execução deficiente) das directivas pelas regiões autónomas, os particulares que se sintam lesados poderão opor às autoridades nacionais, nos tribunais estaduais, as normas das directivas cujo conteúdo seja claro, preciso e incondicional. Assim, para além do controlo do próprio Tribunal de Justiça no âmbito de uma eventual acção por incumprimento e da possibilidade de os tribunais nacionais fiscalizarem a legalidade da actuação das entidades regionais, o particular lesado pode propor uma acção de indemnização por omissão de medidas legislativas necessárias à concretização da directiva comunitária156.

Isso mesmo parece ter ficado comprovado no Acórdão FRANKOVICH. O Tribunal de Justiça considerou que o princípio da responsabilidade do Estado-membro pelos danos causados aos particulares pelo incumprimento das obrigações comunitárias é inenerente ao sistema do Tratado e, em relação ao problema da não transposição das directivas, enunciou um conjunto de condições que, uma vez preenchidas, garantem o direito à indemnização: em primeiro lugar, o resultado preceituado pela directiva deve incluir a atribuição de posições de vantagem aos particulares;

em segundo lugar, o conteúdo dessas posições de vantagem deve poder ser identificado com base em disposições da directiva; finalmente, deve existir uma relação de causalidade entre a violação da obrigação que incumbe ao Estado-membro e os danos suportados pelos particulares. O Tribunal de Justiça remeteu, no entanto, a solução do problema da efectivação do direito à reparação dos danos para o Direito nacional de cada Estado-membro, porquanto a ordenamento jurídico comunitário não o regula157.

De qualquer forma, o direito de indemnização já resultava do artigo 22° da Constituição ao dispor que o Estado e as demais entidades públicas

155 V. Oriol Casanovasy La Rosa, Las competências... cit., loc. cit., págs. 772 e 156 V. Motade Campos, op. cit., II, págs. 488 e segs..

157 V. Maria LuIsa Duarte, A harmonização da legislação nacional no domínio da fiscalidade sobre as sociedades e a recentejurisprudência do Tribunal das Comunidades Europeias sobre as directivas e a responsabilidade dos Estados-membros, polic., Abril de 1992.

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2.4.Emrelação àactividadeadministrativa

I A aplicação das directivas comunitárias comprende também, comosedeixou antever,o exercício de funçõesadministrativaspelas autoridadesnacionais competentes, por forma a obter-seo pleno eeficaz cumprimento das obrigaçõescomunitárias.

Também ao nível do exercício da actividade administrativa, os órgãosregionais podem incumprir as obrigaçõesdecorrentesdatrans­ posição para o direito internodas directivas comunitárias.

II Importa, desdejá, fazerum esclarecimento. A tarefa detransposição das directivas comunitáriasparao Direitointerno é, comovimos, uma tarefa que seintegranormalmente no âmbito da funçãolegislativa,pelo que o incumprimento administrativo das obrigações impostas pelas são civilmenteresponsáveis,em forma solidária com os titulares dos seus órgãos, funcionáriosou agentes, por acçõesou omissões praticadasno exercício das suas funçõese porcausa desse exercício, de queresulte violação dos direitos, liberdadese garantias ou prejuízo para outrem. Na verdade, embora este preceito se refiraunicamente àresponsabilidade por factos ilícitos e culposos,abrange todos oscasos em que,por acção ou omissãodo legislador, ocorre umaviolação de um direitosubjectivo ou de um interesse legalmente protegido. Acresce que o artigo 77°

consagra um direito fundamental de natureza análoga à dos direitos, liberdades e garantias,logo directamenteaplicável mesmo na ausênciade lei158.

Ora, dada a primazia do Direito comunitário originário ou derivado sobre a legislaçãoordinária, a não concretização de uma directiva pelas regiões autónomas, admitindo a competência destas para tal função, constitui uma omissão ilícita. Por isso, desdeque culposa, dará lugarà obrigaçãoderepararosdanos que adequadamenteresultemda violação de direitos ou interesses legalmente protegidosdos particulares15’.

158 V. Rui Medeiros, Ensaio sobre a responsabilidade civil do Estado por actos legislativos, Coimbra, 1992, págs. 85 segs..Diferentemente. recusando a aplicabilidade directa do artigo 22° da Constituição, V„ por último, Motade Campos, La sanction...cit.

loc cit, pág. 374.

159 Recorde-se que, nos termos gerais, pode o Estado ser solidariamente responsável com as regiões autónomas nos casos em que os órgãos de soberania também devam proceder à referida concretização.

145.

directivas é questão que diz respeito à violação, por parte dos órgãos administrativos regionais, do conteúdo normativo das disposições internas de natureza legal.

Não podendo as directivas comunitárias, apesar da intensa densificação do seu conteúdo que os órgãos comunitários têm vindo a adoptar e que constitui já hoje uma prática de certa forma consolidada, servir de lei habilitante para a produção subsequente da actividade adminstrativa regulamentar ou decisória (através de regulamentos ou de actos administrativos de aplicação), visto não possuírem a característica necessária da aplicabilidade directa, a execução administrativa das obrigações comunitárias traduz-se, no fundo, numa actividade admi­

nistrativa de execução de legislação nacional.

Com isto queremos apenas advertir que o problema que agora nos ocupa se coloca justamente no seio dos termos gerais do controlo da actividade administrativa de entidades públicas autónomas.

160 V. Sérvulo Correia, Noções de Direito Administrativo, I, Lisboa, 1981, pág.

III A determinação da extensão dos poderes de fiscalização do Estado sobre as regiões autónomas em matéria de actividade adininistrati va passa, essencialmente, pela interpretação da alínea d) do artigo 202° da Constituição. Esse preceito determina que compete ao Governo “dirigir os serviços e a actividade da administração directa do Estado, civil ou militar, superintender na administração indirecta e exercer a tutela sobre a administração autónoma" iTudo depende, portanto, do significado que se deva atribuir à referência constitucional à administração autónoma.

Há quem defenda que as regiões autónomas se integram na administração autónoma e, por conseguinte, a sua actividade administrativa está também sujeita ao poder de tutela do Governo160.

Outros autores sustentam, pelo contrário, que as regiões autónomas não entram na administração autónoma sujeita a tutela do Governo161.

A segunda interpretação harmoniza-se melhor com o texto consti­

tucional português. Desde logo, por decorrência da autonomia regional,

161 V. Jorge Miranda, Manual de Direito Constitucional, III, Coimbra, 1988 (reimp.), págs. 186 e 187, em nota; As associações públicas no Direito português, in RFD(L), 1988, pág. 79. V. implicitamente J. Baptista Machado, Participação e Descentralização, Coimbra, 1982, págs. 8 e segs.; Marcelo Rebelode Sousa, A natureza jurídica da Universidade no Direito português, Mem Martins, 1992, pág. 48.

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