2. CONTEXTUALIZAÇÃO: EDUCAÇÃO SUPERIOR NO BRASIL E A FORMAÇÃO
2.1 PANORAMA DA EDUCAÇÃO SUPERIOR PÓS LDB 9.394/96
2.1.11 Mercadorização
2.1.10 Lento incremento na taxa de escolarização superior
O incremento na taxa de escolarização superior vem ocorrendo, embora
muito distante do preconizado pelo Plano Nacional de Educação de 2001 e
sabidamente minado pelo elitismo histórico instalado. A incorporação de
significativos contingentes de pessoas acima de 24 anos, que estiveram excluídos
da educação superior, revela a grave e crônica defasagem idade-série da Educação
brasileira como um todo.
A realidade atual mostra que 40% dos estudantes da educação superior
estão fora da idade apropriada (18 a 24 anos). Em 2004, apenas 10,4% da
população de 18 a 24 anos estavam matriculados na educação superior, e em 2010
chegou-se a aproximadamente 14%. Esses percentuais não só estão entre os mais
baixos do mundo, mas colocam o País na situação de desperdiçar o potencial de
milhões de pessoas que poderiam contribuir com o desenvolvimento nacional e com
a melhoria da qualidade da vida. (RISTOFF, 2008). Na EAD, segundo dados do
último censo da EAD, a média de idade está entre 30 e 34 .
2.1.11 Mercadorização
A expressão mercadorização é um neologismo que traduz o processo de
conformação da educação em uma mercadoria a ser regida segundo os ditames do
mercado. A acelerada mercadorização da Educação Superior é um fenômeno
relativamente novo no modelo de expansão.
À sombra das recomendações do documento do Banco Mundial, de 1994, Higher education: the lessons of experience (Educação Superior: as lições da experiência), que propunha, entre outras coisas, uma muito maior diferenciação institucional e diversificação de fontes de manutenção da educação, incluindo o pagamento pelo aluno das IES públicas; que considerava a universidade de pesquisa (neo-humboldtiana) inadequada para os países em desenvolvimento e em seu lugar propunha a adoção da universidade de ensino (sem pesquisa); que recomendava às autoridades que ficassem “atentas aos sinais do mercado”, aprovava-se, em dezembro de 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. (SGUISSARDI, 2008, p.1000).
A LDB/96, que definiu as linhas gerais de um projeto nacional de Educação,
em todos os seus níveis e modalidades, foi aprovada como um tipo de lei
“guarda-chuva jurídico”, possibilitando a criação de vários documentos de política, que
enquanto dispositivos normalizadores estavam alinhados com essas
recomendações citadas por Sguissardi. Dentre as políticas editadas após da LDB/96
destaca-se o Decreto n.2.306, de 19 de agosto de 1997 (regulamenta, para o
Sistema Federal de Ensino, as disposições contidas nos artigos. 19, 20, 45, 46 e §
1º, 52, 54 e 88 da Lei nº 9.394/96), que reconhecia a educação superior como um
bem de serviço comercializável, ou seja, entendia a educação como um objeto de
lucro ou acumulação. Um trecho desse decreto diz que: “as pessoas jurídicas de
direito privado, mantenedoras de instituições de ensino superior, previstas no inciso
II do art. 19 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, poderão assumir qualquer
das formas admitidas em direito, de natureza civil ou comercial” (BRASIL, 1997,
Artigo 1º). Nesse texto, podemos perceber a ideia de educação como uma
mercadoria, de interesse dos empresários da educação.
Esse decreto, norma brasileira rara ou única no mundo jurídico educacional,
antecipava-se à discussão de um ponto polêmico posto na Agenda dos Acordos
Gerais do Comércio e dos Serviços (AGCS), da Organização Mundial do Comércio
(OMC), em 1996, que propunha a desregulamentação dos serviços educacionais,
especialmente de nível superior, como se fossem comerciais. Este item da Agenda
dos AGCS continua sem acordo no âmbito dessa Organização, mas o artigo 7º do
Decreto n. 2.306 é de clareza meridiana, quando estabelece que:
As instituições privadas de ensino classificadas como particulares, em sentido estrito, com finalidade lucrativa, ainda que de natureza civil,
quando mantidas e administradas por pessoa física, ficam submetidas ao regime de legislação mercantil, quanto aos encargos fiscais, parafiscais e trabalhistas, como se comerciais fossem, equiparados seus mantenedores e administradores ao comerciante em nome individual. (BRASIL, 1997).
Na Conferência Mundial sobre a Educação Superior, promovida pela
UNESCO no ano de 1998 em Paris, circulou um documento do Banco Mundial que
apresentava uma tese que respaldou a abertura do mercado educacional de
educação superior no Brasil à iniciativa privada ou à chamada “livre iniciativa
empresarial”. Trata-se da tese de que a educação superior teria “muitas das
características de um bem privado” (WORLD BANK, 1998).
No documento do Banco Mundial intitulado: “the financing and management
of higher education: a status report on worldwide reforms”, é defendida a posição de
que a educação superior é primeiramente um bem privado do que um bem público.
Para o Banco Mundial a educação superior possui várias características de um bem
privado, uma vez que entende que: 1. Detém capacidade de competitividade (oferta
limitada); 2. Exclusividade (pode-se obtê-lo por meio de pagamento); 3. Possui
capacidade de recusa (não é requerido por todos). A partir dessas características o
Banco acredita que a educação superior deva ser vista como um serviço comercial.
(WORLD BANK, 1998).
Apesar das pressões do Banco Mundial, a UNESCO vem conseguindo
manter a proposta de educação como um bem público, como é possível observar no
documento da UNESCO com o Plano de Ação da CRES 2008 e WCHE 2009
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Os valores e princípios da Declaração da CRES 2008, particularmente o conceito de Educação Superior como bem público social, direito universal e dever do Estado, conduzem a Educação Superior (ES), independentemente da natureza jurídica das IES, a: • afirmar a noção de qualidade vinculada à pertinência e inclusão social; • formar e promover uma cultura democrática e cidadã, em colaboração com os níveis prévios de educação; • afirmar os valores humanísticos e da promoção da cultura de Paz, o respeito e valorização da diversidade cultural e o compromisso com o desenvolvimento humano e sustentável; • gerar condições para o diálogo entre pares com outras regiões do planeta, com ênfase na cooperação sul-sul; • contribuir para a solução dos problemas sociais mais graves e para o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM). (UNESCO, 2009, p.1)
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