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Mestrado em Ciências da Educação Parar para Reflectir

No documento Estrutura funcional RVCC-PRO (páginas 125-130)

Capítulo I. Narrativa Autobiográfica Centrada no Percurso Profissional

14. Mestrado em Ciências da Educação Parar para Reflectir

Termino a narrativa autobiográfica com uma das últimas experiências a que me propus, o Mestrado em Ciências da Educação.

Há mais de uma década que me dedicado ao desafio da Educação e Formação de Adultos, sendo que a apetência por esta área aguçou-se nos últimos tempos. A etapa a que agora me proponho com este

mestrado é encarada como a consolidação da experiência adquirida, na plena intenção de que possa vir a reforçar o meu desempenho profissional, como também melhorar as práticas quotidianas do processo de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências. Senti, acima de tudo, que era altura de parar para pensar!

Agrade-me que a inscrição neste mestrado tenha tido por base uma motivação intrínseca para o autodesenvolvimento. Todavia, a quando da data da sua conclusão já não pode dizer-se o mesmo! Actualmente, este trabalho de mestrado está a ser pressionado pelos concursos públicos que se avizinham (ou não) para os Profissionais de RVC, o que lhe retira algum sabor - devo confessar.

A implementação do sistema de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências, há cerca de dez anos em Portugal, revelou-se um factor inovador e adequado à realidade nacional, contrapondo com o monopólio do sistema de ensino tradicional que, enquanto única alternativa à qualificação, era francamente redutor. Actualmente, qualquer adulto pode optar por:

- Adquirir e desenvolver conhecimentos / competências de forma estruturada e durante um longo período (sistema de ensino tradicional);

- Ou, caso o seu percurso de vida o justifique, ver reconhecidos os conhecimentos / competências adquiridos ao longo da sua vida (sistema de RVCC).

Poder-se-á tratar de uma cooperação de estratégias ajustadas a diferentes realidades. Anteriormente, e de acordo com o que Illich (2003) alertou, é que os Professores se consideravam serem os únicos (peritos) capazes de definir e certificar aprendizagens. Para Illich (ídem), a educação de adultos (mais do que um sistema institucional de educação de adultos) deve mesmo ser encarada como uma alternativa aos processos de institucionalização da educação.

É como afirma Illich (cita Silvestre, 2003:46):

“Não podemos continuar a “olhar o futuro pelo retrovisor”. O que antes era importante, hoje pode não o ser.”

O carácter prático do presente mestrado foi sem dúvida o que mais me aliciou, o chamado mestrado profissionalizante. Mas por outro lado, confesso que me assusta profundamente a escalada de qualificação pela via formal a que estamos actualmente sujeitos, diria mesmo pressionados. Além de que, não existe presentemente qualquer garantia de que o aumento da qualificação por esta via represente melhores oportunidades de emprego. Fazer um mestrado por fazer, sem qualquer aplicação, mesmo que conceptual ou reflexiva, consiste numa prática cada vez mais frequente, na tentativa (às vezes inglória) de adquirir mais um grau académico que, caricatamente, se coloca ou retira do currículo, consoante o anúncio do jornal solicite pessoas mais ou menos qualificadas!

Paulo Freire afirmava (cita Silvestre, 2003:45):

“…se não forem (re)pensados novos objectivos, estratégias, actividades (…) que não as de modelo único, Após as mudanças de paradigma ocorridas não podemos ter a ousadia de parar de

pensar nestes assuntos. Com o presente mestrado desejo continuar a trabalhar conceptualmente e no terreno para todos os dias colhermos frutos de acordo com as expectativas e com os pressupostos ideológicos em que o sistema de RVCC foi criado.

Canário (2008) relembra que com meio século de progressos da escolarização de massas, o aumento da produtividade e da competição económica (que nos levam a esta escalada da qualificação) não trouxe grandes vantagens, no que se refere à fome, ao ambiente, ao desemprego e à exclusão social. Afirma o autor que a qualificação escolar elevada deixou de ser um mecanismo garantido de luta contra a exclusão. Consideramos que a formação pode até ser um instrumento individual para a conquista de emprego, todavia, pouco tem significado para a prosperidade colectiva.

Se quisesse reflectir sobre o que esta experiência de mestranda me trouxe, ainda não conseguiria fazê-lo. Para conseguirmos ter uma análise objectiva das situações penso que temos de ter o tempo suficiente para nos afastarmos delas. É como ter um livro colado à cara, está tão perto que nem consigo lê-lo. Vou deixar esta reflexão para mais tarde.

Assim termino a minha narrativa autobiográfica. Tenho pena de não poder contextualizá-la de forma mais profunda de acordo com outras leituras que fiz e tantas outras que ficaram por fazer, mas fico contente pois deixo aqui uma base de trabalho a explorar num projecto futuro. Do ponto de vista pessoal, a realização desta narrativa não tem valor! Fico com uma ideia muito concreta do que fiz, do que desenvolvi, mas sobretudo do que tenho para melhorar.

Ao desejar deixar uma nota no final nesta narrativa, e falando de experiência, deixaria para todos um texto escrito por “alguém” (daqueles que circulam nos e-mails e que certamente já conhecem) no formato de uma carta de candidatura a um emprego. Por mais que me “instrua”, continuam a ser as coisas simples que me cativam:

“Já fiz cócegas à minha irmã só para que deixasse de chorar, já me queimei a brincar com uma vela, já fiz um balão com a pastilha que se me colou na cara toda, já falei com o espelho, já fingi ser bruxo.

Já quis ser astronauta, violinista, mago, caçador e trapezista. Já me escondi atrás da cortina e deixei esquecidos os pés de fora.

Já roubei um beijo, confundi os sentimentos, tomei um caminho errado e ainda sigo caminhando pelo desconhecido.

Já raspei o fundo da panela onde se cozinhou o creme.

Já me cortei ao barbear-me muito apressado e chorei ao escutar determinada música no autocarro. Já tentei esquecer algumas pessoas e descobri que são as mais difíceis de esquecer.

Já subi às escondidas até ao terraço para agarrar estrelas. Já subi a uma árvore para roubar fruta, já caí por uma escada.

Já fiz juramentos eternos, escrevi no muro da escola e chorei sozinho na casa de banho por algo que me aconteceu.

Já fugi de minha casa para sempre e voltei no instante seguinte.

Já corri para não deixar alguém a chorar, já fiquei só no meio de mil pessoas, sentindo a falta de uma única. Já vi o pôr-do-sol mudar do rosado ao alaranjado.

Já mergulhei na piscina e não quis sair mais, já tomei whisky até sentir os lábios dormentes. Já olhei a cidade de cima e nem mesmo assim encontrei o meu lugar.

Já senti medo da escuridão, já tremi de nervos, já quase morri de amor e renasci novamente para ver o sorriso de alguém especial.

Já acordei no meio da noite e senti medo de me levantar.

Já apostei a correr descalço pela rua, gritei de felicidade, roubei rosas num enorme jardim, já me apaixonei e pensei que era para sempre, mas era um 'para sempre' pela metade.

Já me deitei na relva até de madrugada e vi o sol substituir, já chorei por ver amigos partir e depois descobri que chegaram outros novos e que a vida é um ir e vir permanente.

Foram tantas as coisas que fiz, tantos os momentos fotografados pela lente da emoção e guardados nesse baú chamado coração...

Agora, um questionário pergunta-me, grita-me desde o papel: Qual é a sua experiência? Essa pergunta fez eco no meu cérebro. Experiência... Experiência... Será que cultivar sorrisos é experiência? Agora... Agradar-me-ia perguntar a quem redigiu o questionário: Experiência?! Quem a tem, se a cada momento tudo se renova?”

De uma “viagem” que obriga a tantas paragens, por vezes “exóticas”,

veio um maravilhoso Gauguin

Há tanto para observar, tanto para ouvir e tanto para dizer! Parar para reflectir, pode ser mesmo muito absorvente.

No documento Estrutura funcional RVCC-PRO (páginas 125-130)