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Mestre Chuluca: As controvérsias entre Estado e Capoeira nas memórias-não

PARTE I: Da ginga: O Registro

2. Os conceitos de patrimônio na visão dos mestres

2.2. Mestre Chuluca: As controvérsias entre Estado e Capoeira nas memórias-não

A gente não vê o tombamento com bons olhos, como que o Estado, prende, proíbe e depois tomba? Mestre Chuluca.

A pergunta de Mestre Chuluca, direcionada a mim, de forma retórica, durante a entrevista - no evento: “Eu sou capoeira 24 horas”, realizado pelo Contramestre Angolinha, em novembro de 2015, com apoio do Iphan - demonstra como o passado de perseguição, durante e pós-escravidão e criminalização são acionados hoje nas relações com o Estado para pautar a semantização e os olhares sobre a patrimonialização da Roda da Capoeira e do Ofício de Mestre. Mestre Chuluca tem relações como Iphan anteriores ao Registro, pois é natural da cidade de Goiás Velho, tombada como Patrimônio da Humanidade pela Unesco em 2001, onde o Iphan mantém um escritório técnico.

Nos discursos dos capoeiras os fatos históricos do período da escravidão são recontados como se presenciados, narrados como lembrança. A agência da noção de ancestralidade toma forma no discurso, materializa afetos e emoções na memória revivida

quando contada, deixa traços no ethos e visão de mundo do capoeira: uma “memória do não-vivido”.

A ancestralidade exalta a resistência traduzida corporalmente na Capoeira, libertadora da escravidão: “Não foi Isabé que me libertou, foi a Capoeira”, Mestre Zequinha fez esta declaração, em sua oficina no mesmo evento em que a entrevista com Mestre Chuluca foi realizada. Natural de Piracicaba, na região noroeste de São Paulo, Mestre Zequinha proferiu esta frase para chamar para as seguintes questões: a escravidão não pertence aos antepassados, o verbo está no presente, se realiza em sua própria liberdade; a necessidade de atentar para a trajetória da Capoeira a partir da oralidade dos mestres; discutir a dominação na história oficial do Brasil e compreender a Capoeira como instrumento de luta e libertação.

O fato histórico da Abolição da Escravidão é visto com um olhar crítico. Para os capoeiristas a libertação aconteceu apenas nos livros de história, a dominação e o sofrimento do povo negro não acabou. Segundo Mestre Aranha a abolição sem políticas públicas para os libertos aconteceu para extinguir os negros no Brasil, em declaração na Etapa Estadual do III Congresso Nacional Unitário de Capoeira (CNUC), realizada em Curitiba, em 2014.

Os mestres mais velhos, vindos do interior, tem memórias de infância análogas à escravidão. Como me explicou Mestre Limãozinho, naturalizado em São Paulo, ao comentar como Mestre Ananias, nascido em 1924 (falecido em julho de 2016), sentia-se diante de uma mulher branca como eu, dizendo que ele veio dos engenhos do Recôncavo, numa situação de trabalho rural, portanto as mulheres brancas para ele ainda eram sinhazinhas do engenho. A abolição não transformou nossas condições.

As agruras da escravidão, dos navios negreiros às senzalas, são rememoradas corporalmente em danças, nos nomes dos grupos, em cantigas como: “História da Escravidão”, “Navio Negreiro”, “Negro Escravo” e “Escrava Anastácia”, entre outros. São rememoradas as virtudes da Capoeira como luta, que possibilitou fugas, permitiu o enfrentamento e a existência dos quilombos. Não há um discurso de vitimização e sim de resistência.

A queima de documentos do período da escravidão por Rui Barbosa é um lamento em tom de combate à história oficial, ressentem-se da queima, pois creem terem sido incinerados por expor ainda mais a barbárie “dos opressores”. Mestre Luiz Renato

(1998) argumenta sobre a queima dos documentos, diz que nestes documentos não existiriam fontes complementares sobre Capoeira, pois como os outros documentos existentes nos arquivos são apenas registros de escravos:

(...) Rui Barbosa mandou queimar documentos referentes à escravidão do ministério da fazenda, que chefiava durante o governo provisório. Mas se tratava somente de documentos de uma repartição, sobretudo das matrículas de escravos criadas pela Lei do Ventre Livre (1871), cuja destruição dificultaria qualquer exigência de indenização por parte dos ex-proprietários de escravos – o que Rui Barbosa temia (1998, p. 6).

No dossiê, no subcapítulo “As cidades da capoeira”, a partir da pesquisa documental de historiadores é destacada a “capoeira escrava”, no contexto urbano e do trabalho, em oposição ao capoeira ligado à marginalidade. Destaca-se a atuação das maltas no Rio de Janeiro, Nagoas e Guaiamuns no período que antecedeu à Proclamação da República, definidas como “grupos de capoeira que disputavam a geografia da cidade” (2014, p. 23). Os afetos produzidos pela escravidão nos capoeiristas hoje não são mencionados, preteridos diante dos textos dos historiadores, que têm como referência a documentação do período da Capoeira nas cidades.

Na análise geral das narrativas, ouvindo as entrevistas e retomando as notas do caderno de campo nota-se na oralidade das “memórias não-vividas”, que os capoeiras preferem destacar as lutas contra o outro, não entre escravos. As maltas são lembradas não por seu revanchismo e sim porque tinham certo poder contra o sistema político. Embora existam divergências entre grupos na atualidade, as maltas são mencionadas como forma de solicitar o posicionamento político dos capoeiras em tempos de confronto polarizado e eminente no Brasil, como foram os últimos anos. Assim como o enfrentamento dos capoeiras contra a ditadura militar também é lembrado. O enfoque nas lutas contra o outro e não entre si no passado, projeta as necessidades de hoje dos grupos “sentarem juntos” para discutir políticas públicas, um conflito não corporal repleto de embates.

Nestas narrativas invisibilizadas pela documentação oficial, principalmente baseada em arquivos da polícia, há uma Capoeira que nunca deixou de lutar e resistir. A Guerra do Paraguai (1864-1879) é uma fato histórico ressignificado pelas “memórias não- vividas”, um período a se exaltar, porque guerrearam pelo Brasil, a Capoeira ajudou a vencer batalhas e contribuiu com a libertação daqueles que serviram ao exército brasileiro. Na animação “Eu que nunca viajei, a Capoeira Angola na Guerra do

Paraguai”118, Luciano Ferreira constrói o roteiro a partir dos principais fatos históricos

das trajetórias entre Capoeira e Estado, o vídeo inicia-se na comemoração da descriminalização da Capoeira, seguida de referências a escravidão e as Maltas e por fim a presença dos capoeiristas na Guerra do Paraguai, contada como uma dupla estratégia de Dom Pedro II para livrar-se do contingente de capoeiristas nas ruas da capital imperial e preencher o exército nacional na Guerra, com intenção de exterminá-los, porém com promessas de libertação para os retornados e da legalização da Capoeira .Um fato onde o Estado valeu-se da Capoeira.

Entre os capoeiristas a Guerra do Paraguai é capitalizada, ao mostrar como as guerras da Capoeira não foram apenas revoltas contra o opressor e no plano dos direitos, como hoje. A Capoeira já esteve num campo de batalha real. Memória esta presente nos corpos e ethos dos capoeiras, como observado na etapa estadual do Paraná do III CNUC, realizada em 30 de junho de 2015, na Reitoria da Universidade Federal do Paraná, no momento das digressões, três capoeiristas referiram-se ao episódio da Guerra do Paraguai, para: assegurar que sempre estiveram em guerra, que são guerreadores e que a Capoeira já venceu uma Guerra. Mestre Kunta, em entrevista, descreveu em pormenores esta concepção da Capoeira em guerra:

Se você procurar nos livros não vai encontrar nada, não vai encontrar a referência. Volta um pouquinho no passado e analisa que nós não tínhamos, que nosso país não tinha exército. Opa! Nós temos que arrumar soldado. E qual soldado que tinha? Material humano que tinha era o negro escravizado, entendeu? Eram os negros e branco tinha uma meia-dúzia (...) Negro e na sua maioria capoeira na essência, entendeu? E quando a capoeira se desenvolve como luta é na Guerra do Paraguai. Fortalece lá, porque o exército não tinha armamento pesado (...) para seus tenentes ou capitão branco. E o não-branco? Ele lutou com perna, pau, pedra, porrete e as próprias pernas. A capoeira, ela esteve na guerra do Paraguai (...) se fortaleceu lá e contribuiu! É negado dentro da sala de aula, os professores não passam isto pro aluno. A Guerra aconteceu e o soldado era negro!

As perspectivas preconceituosas do exército paraguaio sobre o brasileiro, chamando de “exército de macacos”, consolidaram a doxa de que os soldados brasileiros em sua maioria eram negros escravos e teriam dizimado o exército paraguaio se utilizando “das pernas” e os “movimentos de agilidade” da Capoeira119. Nestas narrativas os

capoeiristas acessam a Guerra do Paraguai como batalha ganha pela Capoeira, ao lado da

118 Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=LgoEFAFD7Zc, acessado em 14 de agosto de 2016. Animação realizada por alunos das escolas públicas de Uberlândia/MG, em oficinas ministradas com apoio da Universidade Federal de Uberlândia.

119 André Amaral de Toral (1995) afirma que a partir dos documentos da época não é possível precisar o total de

nação. Mortos dos dois lados. O “outro” foi incorporado e incorporou-se: a Capoeira lutou pelo Brasil.

Mestre Limãozinho, em sua oficina de música na Capoeira120, contou que a música “Paraná ê”121 era cantada pelos soldados negros quando retornavam da Guerra do

Paraguai, “na volta para Bahia”: “Vinham cantando, vinham puxando a infantaria e quando chegaram na estrada do Paraná, acharam que tavam perto de casa: “Paraná, Paranaguá, Vou me embora, vou me embora, Paraná, Paraná”. No Paraná, alguns grupos reportam ao fato para reafirmar a presença negra e da Capoeira no Paraná, esta passagem teria adensado a população negra do estado. Um dos fatores que faz este repertório ser acessado é o canto, muito comum nas Rodas de Capoeira, com várias versões discutidas:

“Paraná”

Paraná ê, Paraná ê, Paraná

Quem não pode com mandinga Não carrega patuá, Paraná Quem não pode com besouro Não assanha mangangá, Paraná Quem tem telhado de vidro Não joga pedra pro ar, Paraná Paraná, Paraná ê

Paraná, Paraná ê Paraná

Coro: Paraná ê, Paraná ê Paraná. (Mestre Bola Sete, 2001, p.154)

A letra acima foi retirada do livro “A Capoeira Angola na Bahia”, do Mestre Bola Sete (2001), do capítulo “Cantos corridos”. Optei por copilar esta versão porque tem os elementos do “corrido”, parte do verso imutável. E, também porque o livro traz nos Cantos de Ladainha outra canção chamada “Guerra do Paraná”, com elementos onde existe uma corruptela entre Paraguai e Paraná, como cantada na animação “Eu que nunca viajei: a Capoeira na Guerra do Paraguai122”, que inclui os versos “Eu que nunca viajei,

nem pretendo viajar, pelos campos e campinas, Pernambuco e Ceará, era eu, era meu mano, era meu mano mais eu.”

120 Evento “Iê Viva Meu Mestre: Ananias Pedra 90”, realizando pelo Mestre Kunta Kintê, com apoio do Iphan/PR em novembro de 2014.

121 De acordo com o Antônio Liberac, em palestra na III Roda de Estudos de Capoeira, em julho de 2014, o “Paraná ê” vem do Candomblé de Caboclo, um assistente capoeirista (não identificado na ocasião) comentou: “há outras versões, ainda dizem que existia uma capoeirista com apelido de Paraná, ou que um aluno do Mestre de João Grande era do Estado do Paraná”. Liberac completou: “É, mas eu nunca vi religião pegar música de capoeira”. Mais uma controvérsia.

Tava em minha casa Sem pensar nem imaginar Quando ouvi bater na porta Mandei minha mulher olhar Ela então respondeu Salomão veio te buscar Para ajudar a vencer A Guerra do Paraná Minha mãe então falou Meu filho você não vá A batalha é perigosa Eles podem te matar A marinha é de guerra O exército é de campanha

Todo mundo vai à guerra > Mestre Pastinha

Todo mundo é que apanha (Mestre Bola Sete, 2001, p.85 e 86)

O teor da canção faz alusão à convocação dos escravos à Guerra do Paraguai, enviados no lugar dos brancos convocados ou negros que se alistavam em troca de liberdade. O período da “capoeira escrava” vivido na ancestralidade dos capoeiras é uma memória de luta com o “outro” (que pode se rearranjar, no Brasil eram escravos africanos, na Guerra do Paraguai eram um exército de brasileiros), na qual a protagonista é a resistência. E, contar a Guerra do Paraguai como “memória não-vivida” tem a intenção de produzir ação nas lutas por direitos hoje. Nesta perspectiva a Capoeira é luta, capitalizada em valor cultural por sê-la.

No dossiê o episódio é mencionado da seguinte forma, apenas: “Antes da proclamação da República, em 1889, os escravos capoeiras ganharam prestígio devido a sua participação na Guerra do Paraguai, que ocorreu entre 1864 e 1870” e na citação dos documentos baianos do período, que também mencionam o alistamento de escravos para Guerra do Paraguai.

A libertação dos escravos aconteceu 18 anos depois do fim da Guerra do Paraguai. Apenas dois anos depois de “Maio de 1888”, a capoeiragem foi inclusa no “Mundo do Crime” como nominou Soares (1993), por meio do Código Penal de 1890, o primeiro da República Velha. Fato que compõem o léxico de Estado hoje para o capoeira. Nas narrativas foi um crime do Estado, lesou a Capoeira de forma “moral”, quando seus agentes já livres foram marginalizados enquanto cidadãos, o que perdurou socialmente para além do período de repressão oficial (descriminalizada no primeiro Código Penal do Estado Novo, em 1937). Os artigos do Código Penal descreviam a prática da “capoeiragem” e previam punição:

Figura 10 e 11: Reproduções dos Artigos 402, 403 e 404 do Código Penal do Brasil, 4º Edição, 1929. Reproduzido na biblioteca do Senado e postado no Facebook por Mestre Luiz Renato, em março de 2017.

Criminalizar a Capoeira, manifestação de rua de maioria negra, objetivava invisibilizar a presença negra na paisagem cultural das cidades, para além da manutenção da ordem, conforme se mascarava no Código Penal de 1890. Neste mesmo período, os Códigos de Postura e de Conduta regulamentavam o cotidiano nas cidades para transformação da vida urbana, contiguamente ligados aos ideários “modernos”, como o higienismo e o eugenismo, que vigoraram entre os séculos XIX e XX. Nestes códigos a Capoeira era citada em diferentes regiões do Brasil. O Código Penal e os Códigos de Postura e Conduta da República pretendiam superar o passado escravocrata e colonial, vistos como um índice de atraso a ser apagado na pretensa moderna República. De acordo com Maria Bernadete Ramos Flores (2007) buscava-se a construção do tipo brasileiro, não podia se negar a presença negra como constituinte, então miscigenação era vista como uma etapa necessária a um suposto aperfeiçoamento que livraria a nação dos traços de negritude, num processo que também era educacional dos corpos:

O branqueamento, portanto, da parte visível da nação brasileira expressava-se na postura civilizada do corpo. Uma conduta moderada com relação à sexualidade, uma boa aparência do corpo, hábitos de higiene, aspiração de acesso social, educação, trabalho seriam índices para classificar homens e mulheres para uma taxonomia étnica brasileira (2007, p. 67).

O corpo do capoeira, em seus movimentos de agilidade, postura e comportamento, necessitava de processo correcional com a repressão dos corpos. O Código Penal era a instância máxima penalizadora, com tal ação faz-se notar o quanto a Capoeira já era compreendida não só em seu ato, mas em sua dimensão simbólica como resistência e representação de negritude. Tais medidas cabiam também ao patrimônio material colonial, no limiar entre os séculos eram dadas a demolição, destituição, expropriação e apagamento. Em nome de um porvir, pretendia-se apagar traços não mais toleráveis de um passado colonial recente nas fachadas e também dos corpos, empreendimento baseado em ideários da modernidade. No patrimônio material podemos considerar que o efeito imediato foi o eclético123 nas casas e no patrimônio imaterial a doutrinação dos corpos e das manifestações populares.

Embora temporalmente criminalização estivesse próxima à escravidão, os sentidos atribuídos distanciam-se nas memórias atuais. A escravidão é lembrada como afeto, a criminalização enquanto fato e a descriminalização como engodo. Na oralidade do capoeira a criminalização não é narrada como “memória não-vivida”, é descrita como

123 Casas do início do século XX, que mesclam traços de referências do neoclássico grego, do renascimento, do barroco e bizantino, não é classificado como estilo arquitetônico.

um fato histórico em si, já simbolizado por sua forma, independente do que seu conteúdo possa revelar. Não há narrativas sobre as condições e o que sofriam quando presos no período. O fato em si da Capoeira ser criminalizada no Código Penal da República basta- se.

De acordo com o dossiê de registro, os conflitos com polícias no período foram acirrados e a Capoeira de rua “desapareceu” no Rio de Janeiro no final do século 19 e no início do século 20. De acordo com Mestre Mestrinho: “Maior repressão contra prática da Capoeira veio em 1893, quando Código Penal Brasileiro, através do Decreto nº 145, autorizou o governo a constituir uma “Colônia Correcional” destinada aos vadios e capoeiras processados” (2001, p. 66).

Pouco se exalta entre os capoeiras a descriminalização em 1937, com os mesmo contornos das críticas à abolição, de que o fim oficial não configurou como fim social. Com a abolição não se libertaram e com a descriminalização não deixaram de ser criminalizados. Há relatos de prisões “por capoeiragem” até meados dos anos 80, com um período de intensificação durante a Ditadura Militar. De acordo com Mestre Kunta, apenas a Constituição de 1988 descriminalizou a “vadiagem”, até então os capoeiristas não eram mais presos por capoeiragem, mas entravam “no código da vadiagem”.

Por isto, embora a escravidão e a criminalização sejam agentes na luta por direitos para a Capoeira hoje, são agenciadas de diferentes modos. Quanto à escravidão cabe ao Estado uma política de reparação, até porque esta tem um sentido amplo para toda a negritude, um crime contra a humanidade. Enquanto à criminalização cabe uma política de redenção à capoeira e aos capoeiras, criminalizados de suas práticas culturais. Tanto a redenção como a reparação não são mais aceitos em suas formas simbólicas, tampouco como compaixão.

A entrada da Capoeira no “Mundo do Crime”, supostamente com objetivos de manutenção da ordem, foi uma forma de regulamentação de um poder simbólico já exercido, institucionalizado e reprimido legalmente124, que agora opera como forte

124 Os dados da pesquisa Pires (2010) demonstram como os objetivos dos artigos 402 e 403 estavam aquém dos criminais, pois as prisões por capoeiragem nem sempre estavam associadas aos ‘movimentos de agilidade”, mas a outros “habitus” associados a ela. Sendo uma minoria dos acusados realmente considerados culpados e penalizados com a reclusão na Ilha de Fernando de Noronha.

argumento de uma política de retratação para entrada da Capoeira no “Mundo do Patrimônio”. A escravidão e criminalização são dispositivos que conferem certa uniformidade aos discursos do capoeira, diferente de outros momentos como a controvérsia em torno da gênese, por isto permeiam a definição do conceito de patrimônio hoje, servem para reclamar o direito à memória e demandar por políticas públicas com resultados eficazes. Sem ação, os olhares para patrimonialização são contínuos ao mesmo stado que escravizou e criminalizou no século XIX. O registro “não muda nada”, como afirmou Mestre Chuluca, assim como a “libertação” e “descriminalização” não mudaram nada na concepção de muitos dos mestres.

2.3. Mestre Moreno: os sentidos do conceito de patrimônio