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Capítulo 4 - Processo de Investigação

4.2 Metodologia de Investigação

Nas últimas décadas muito se tem investigado na utilização e desenvolvimento de tecnologias para as práticas de ensino-aprendizagem. Entretanto, uma numerosa quantidade dos resultados publicados apresentam uma pobre relação entre a teoria e a prática, em que os mesmos são aplicáveis em contextos muito específicos, ou ainda carecem de informações para serem reproduzíveis (Liu et al., 2011). As investigações geralmente são realizadas com um rigoroso processo de amostragem, em ambientes demasiado controlados, ou seja, as observações são realizadas sobre um conjunto de alunos num laboratório, fora do contexto quotidiano de aprendizagem desses alunos. Quando se trata de educação existem muitas variáveis envolvidas, que não podem ser estudadas isoladamente, pois se entrelaçam, e o seu conjunto é melhor que a soma das partes (Collins, 1992; DBRC, 2003; Squire, 2005b; Akker et al., 2006; Walker, 2006). As pesquisas em tecnologias na educação não têm somente o objetivo de observar e entender o processo cognitivo, mas também de gerar transformações nos processos e práticas de ensino, assim como criar produtos compreensíveis e aplicáveis em novos contextos (Brown, 1992; Akker et al., 2006)⁠.

A Design-Based Research (DBR) é uma metodologia de pesquisa preocupada com a aplicação pragmática das teorias de aprendizagem, visando estreitar a relação entre teoria e prática, através de exemplos tangíveis de aprendizagem, que podem ser usados e reusados no mundo real (Cocciolo, 2005; Squire, 2005b). Os pesquisadores estão interessados em demonstrar a utilidade dos meios tecnológicos, realizando a conexão entre a aprendizagem efetiva, o projeto curricular e a forma mais sensata de empregá-los.

A sala de aula é o ambiente ideal para realizar a pesquisa devido à naturalidade em que ocorrem as relações entre os alunos entre si, assim como com os professores.

Os métodos tradicionais de investigação em laboratório com intervenções individuais permitem verificar um padrão emergente que pode se confirmar na sala de aula (Collins, 1992; Cobb et al., 2003; DBRC, 2003; Squire, 2005b). Além do contexto da sala, o sucesso da investigação também depende da participação ativa dos professores envolvidos, considerando-os como coautores da pesquisa. Juntos descobrem as mudanças mais importantes com as práticas experimentadas (Brown, 1992; Squire, 2005a). O envolvimento dos professores em todas as fases otimiza o processo fazendo com que os ensaios sejam melhor projetados e evitam intervenções desnecessárias. A sua presença reforça o contexto da pesquisa em sala promovendo os testes com os alunos. Outra possibilidade é a participação ativa dos alunos, mesmo nas fases iniciais de planeamento, para proverem ideias quanto à natureza do produto que se pretende desenvolver (Collins, 1992; Cobb et al., 2003; DBRC, 2003; Wang & Hannafin, 2005).

As experiências devem ter uma duração de várias semanas para que se possa compreender as transformações cognitivas nos alunos e, assim, deduzir pequenas generalizações reproduzíveis com certa profundidade em situações similares (Majgaard et al., 2011). Não é possível observar mudanças significativas na aprendizagem se a intervenção é conduzida por um período muito curto (Brown, 1992; Squire, 2005b).

A DBR caracteriza-se como um processo iterativo e intervencionista (Brown, 1992; Gravemeijer & Cobb, 2006). A Figura 4.1 ilustra este processo cíclico de projeto, experimentação e análise dos resultados. As primeiras iterações apresentam poucos resultados e frágeis usualmente. Contudo, o aspeto iterativo da metodologia permite que as teorias evoluam, sejam ajustadas e otimizadas durante as intervenções (DBRC, 2003; Akker et al., 2006). Os pesquisadores vão experimentando as teorias através de protótipos até amadurecerem as suas ideias com uma teoria mais robusta. A evolução do protótipo, e por consequência das teorias, contribui para a compreensão das ações que levam ou não à aprendizagem (Walker, 2006; Majgaard et al., 2011). Esta compreensão acontece exclusivamente através das experiências. Estas produzem e são produzidas por novas teorias (DBRC, 2003) e acontecem sobretudo num contexto do mundo real (Squire, 2005b).

Com base no problema que se pretende resolver, são formuladas conjeturas teóricas que serão testadas através das intervenções. A intenção do investigador é criar condições para que essas teorias possam ser derrubadas (Brown, 1992),

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determinar os limites na aplicação dessas teorias (Cobb et al., 2003), e, assim, fazer emergir os caminhos de aprendizagem (Squire, 2005b). Com base nos ganhos e perdas advindos dessas teorias, os pesquisadores constroem os seus produtos finais (Collins, 1992). Estes produtos podem ser a compreensão da influência dos ambientes no ensino e na aprendizagem, as práticas e recursos que devem constar em materiais instrucionais e a relação das didáticas com a metacognição (Walker, 2006).

Figura 4.1 – Processo da DBR

Antes de se iniciar a pesquisa, existe uma fase de preparação. É o momento de definir uma teoria instrucional local que será a base de toda a investigação (DBRC, 2003; Cocciolo, 2005; Gravemeijer & Cobb, 2006). Esta teoria é a composição dos objetivos de aprendizagem de um domínio de conhecimento e as teorias de aprendizagem e meios (tecnologia) que darão suporte ao processo. Para elaborar os objetivos de aprendizagem, os pesquisadores utilizam o conhecimento do perfil dos alunos envolvidos na experiência e revisões da literatura, assim como avaliações de sala de aula de turmas anteriores para identificar lacunas que podem ser exploradas na pesquisa (Squire, 2005a; Majgaard et al., 2011). Desta forma, é possível determinar que mudanças se pretende alcançar nos alunos e, posteriormente, mensurar essas mudanças. Essas medidas são criadas e não descobertas, e a sua criação está entre os elementos mais importantes a serem definidos na pesquisa (Cobb et al., 2003; Wang & Hannafin, 2005; Gravemeijer & Cobb, 2006). As teorias de aprendizagem e os meios para darem suporte são criados a partir de estudos sobre como os estudantes e professores interagem para solucionar o problema que se pretende investigar (Cobb et al., 2003).

Como resultado desta etapa são elaboradas conjeturas teóricas que serão testadas durante as experiências (Walker, 2006). Elas não são estáticas, mas refinadas durante as próximas etapas. Cada experiência é composta de um conjunto bem limitado de conjeturas e objetivos, permitindo que o processo seja dinâmico e os resultados dessas etapas sirvam às etapas subsequentes (Cobb et al., 2003; Gravemeijer & Cobb, 2006).

A partir das conjeturas a serem testadas, determina-se o plano inicial de implementação, que é constituído pelas intervenções, que são ciclos repetitivos de projeto, experimentação e análise, com o objetivo da revisão, refinamento e generalização da teoria instrucional local, a definição dos meios necessários para aplicar essa teoria e compreender como funciona a aprendizagem (Wang & Hannafin, 2005).

Na etapa de projeto determinam-se (Cobb et al., 2003; DBRC, 2003; Akker et al., 2006; Gravemeijer & Cobb, 2006): a) as conjeturas a serem testadas (uma do conjunto original ou uma nova criada a partir da intervenção anterior); b) seleciona-se a amostra (alunos experimentados anteriormente, de um novo grupo, ou uma mescla de ambos); c) as regras para a aplicação da experiência (como será integrada no currículo, definir se realizada em laboratório ou sala de aula); d) o período e a duração da experimentação; e) o desenvolvimento ou modificações nos meios tecnológicos que serão usados; f) a definição das formas de avaliação, pré e pós testes quantitativos e/ou qualitativos. Sugere-se aplicar pré e pós testes a toda a amostra (experimental e de controle) e combinar uma análise aprofundada com alguns estudantes (Collins, 1992; Akker et al., 2006; Gravemeijer & Cobb, 2006; Majgaard et al., 2011). Os métodos qualitativos podem ser usados para observar tendências e consequências não previstas (Brown, 1992). As generalizações das teorias instrucionais são criadas a partir dessas tendências. Para confirmá-las, pode-se tentar reproduzir essas tendências com um grupo experimental em laboratório. Através dessa reprodução também podem ser encontradas novas conjeturas a serem testadas em sala de aula (Squire, 2005a). A análise quantitativa normalmente é usada em detrimento da análise qualitativa quando se pretende analisar amostras de grande dimensão (Brown, 1992).

A etapa de experimentação é iniciada com o esclarecimento dos alunos das intenções e objetivos dos testes. Os professores desempenham o seu papel naturalmente em sala de aula, auxiliando os alunos nas dificuldades (Brown, 1992).

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Os pesquisadores observam como ocorrem as relações e comunicações entre os alunos e com o professor (Brown, 1992), pois dessas observações podem resultar explicações de como os alunos procederam para resolver os problemas. Também para entender o processo de resolução de problemas, quando da interação com os meios tecnológicos, os alunos devem pensar alto (Cobb et al., 2003). Todas essas interações devem ser monitorizadas e registadas para fornecerem dados para a próxima etapa.

A última etapa do ciclo, a análise dos dados, é o momento em que o conhecimento da pesquisa é gerado (Squire, 2005a). Todas as fases anteriores devem ser documentadas: tanto a preparação, como o projeto e a experimentação. Esses dados podem incluir vídeo e áudio das aulas, das reuniões e das entrevistas, antes e depois da experiência, registos das tarefas e avaliações realizadas pelos alunos, log das interações com os meios tecnológicos, anotações, e pré e pós testes (Cobb et al., 2003).

A maior dificuldade em administrar a DBR está nesta etapa. Durante a pesquisa são produzidas grandes quantidades de dados e somente uma pequena parte é aproveitada, havendo muito desaproveitamento e podendo, assim, influenciar negativamente a pesquisa (Brown, 1992; Gravemeijer & Cobb, 2006; Walker, 2006). Sugere-se que no momento de obter os dados já se façam anotações e destaques sobre a parte mais interessante ou significante observada e, dessa forma, ir catalogando e pré-selecionando a parte mais relevante dos resultados (Cocciolo, 2005; Wang & Hannafin, 2005).

No intuito de averiguar como a DBR pode ser conduzida com o desenvolvimento de jogos sérios, foram examinados os trabalhos de Squire (2005b), Magnussen (2008), Eseryel & Ge (2010), Shelton & Scoresby (2010), Majgaard et al. (2011), Wong et al. (2011) e Eseryel et al. (2012). Na sua fase de preparação utilizaram algumas das práticas descritas anteriormente, adicionalmente consultaram especialistas e literatura a respeito de desenvolvimento de jogos. Alguns relataram usar o mesmo grupo de alunos e outros tiveram disponibilidade de grupos diferentes durante as intervenções. Destes trabalhos, cabe destacar:

 Na fase de preparação usou-se intensivamente a prototipagem (papel ou digital), ou apresentação de software similares, envolvendo professores e por vezes também os alunos;

 Antes da versão ser experimentada em sala, passou-se por uma fase de versão alfa, testada por professores e/ou alunos;

 Os jogos foram ainda utilizados mais uma vez (versão beta), antes de projetar a sua integração no currículo;

 Os jogos sofreram grandes mudanças durante as intervenções, tanto a nível de jogabilidade e mecânica, como da forma como o conteúdo era abordado;

 Somente um dos trabalhos relatou a não integração do professor no processo e justifica isso como uma das principais razões do fracasso do projeto até aquele momento.