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É condição para a conclusão do Programa do Mestrado Profissional em Ensino de Ciências a elaboração de um ferramental de auxílio a outros professores no ensino de ciências. Não obstante à obrigatoriedade do trabalho científico, a principal preocupação residia na criação de um produto que abordasse um tema novo e interessasse (a canga) aos alunos do ensino fundamental II. Conforme se demonstrará, a solução para tal questão estava com os próprios alunos.

Na tentativa de compreender como os alunos se envolveriam com a proposta, numa folha branca de papel A4 foi-lhes questionado: Como você aprende? Trinta cópias deste documento foram fotocopiadas e entregues aos alunos do 6º ao 9º anos de uma das escolas em que leciono.A maioria das respostas dos alunos pôde ser enquadrada em quatro perfis de respostas padrão: “Com aulas interativas!”, “Com diversão!”, “Fazendo atividades!” e “Dialogando!”.

Com tais respostas visualizamos o desafio de satisfazer estes desejos ao desenvolver o material. Primeiramente, para criar a cartilha, estabeleceu-se por base os princípios da prática educativo-dialógica propostos por Paulo Freire no intuito de que a educação viesse a ocorrer em uma relação horizontal, dialógica e recíproca. Neste contexto, o aluno teria a oportunidade de conhecer e compreender sobre o conteúdo, além de poder refletir a respeito da intervenção sobre a realidade que o contextualiza, privilegiando o desenvolvimento da sua autonomia.

Em um segundo momento foi realizada uma pesquisa a respeito dos temas associados que seriam correlacionados com a temática central da cartilha. Ficou definido que estes temas associados seriam solo, água, flora e fauna característicos das regiões de canga, além de expor as principais ameaças a essas regiões e propor a conservação desse ecossistema tão importante. Com a perspectiva de tornar o material ainda mais próximo da linguagem dos alunos, foi escolhido um personagem para protagonizar e explicar tais atributos, um signo desenhado a partir das características morfológicas de cacto endêmico das regiões de canga do QF, o Arthrocereus glaziovii, personagem este que posteriormente fora batizado como Ecocereus.

36 Para a estrutura textual da cartilha foi realizada uma ampla pesquisa bibliográfica sobre o referido ecossistema. Os textos para cada temática foram pessoalmente elaborados, sempre acompanhados de atividades e ilustrações que reproduzissem em muitos aspectos a realidade do contexto no ecossistema canga. Para a diagramação final e estruturação das ilustrações da cartilha, um profissional prestador de serviços fora contratado.

Com o material finalizado e impresso, deu-se então a aplicação da cartilha e avaliação do seu potencial como descrito a seguir.

Local de desenvolvimento da proposta

Após aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Ouro Preto (CEP/UFOPCAAE:38379714.2.0000.5150), consentimento da Secretaria Municipal de Educação de João Monlevade, consentimento da direção da escola (APÊNDICE G), consentimento da professora, dos alunos e seus pais, foi então iniciada a pesquisa.

O presente estudo foi realizado na Escola Municipal Centro Educacional de João Monlevade - CEJM, localizada na Rua Wilson Alvarenga, 830 – Bairro Carneirinhos, João Monlevade - MG. A escolha dessa unidade de ensino se deu por sua localização estratégica no centro da cidade, sua facilidade de acesso, representatividade escolar (maior escola de ensino fundamental II do município - 6º ao 9º ano), além de ser uma das escolas em que trabalho atendendo alunos provenientes de diversos estratos sociais.

A escola conta com cinquenta e nove professores, um diretor, um vice-diretor e um auxiliar de direção. Atualmente (ano base 2015), tem-se um total de mil duzentos e quarenta e um alunos matriculados nos três turnos. A pesquisa foi limitada a uma turma de 9º ano contendo trinta e sete alunos regularmente matriculados. A escolha dessa turma foi feita por sorteio pela própria supervisora pedagógica do turno matutino. Como foram trabalhados conteúdos do eixo temático “Ambiente e Vida” presentes no currículo próprio do 9° ano do ensino fundamental, não houve qualquer interferência na programação e no currículo deste ano letivo e, portanto, sem qualquer prejuízo de atraso ao conteúdo programático.

37 Um questionário investigativo foi aplicado junto à turma selecionada para sondar o conhecimento dos alunos sobre alguns temas relacionados ao tema meio ambiente. Os alunos estavam organizados em filas e foi pedido a cada um que respondessem as questões individualmente para não haver chance de os resultados serem contaminados pelas opiniões dos outros.

A professora pesquisadora disponibilizou quarenta minutos para que todas as questões pudessem ser feitas.

No questionário constavam as seguintes questões:

1 - Quando você pensa em ambiente, o que lhe vem à mente?

2 - Imagine um jardim com terra, pedras, grama, flores, frutas, minhocas, abelhas e pássaros, e que este jardim é aguado todos os dias por você. Quem são os seres vivos (bióticos) deste jardim? E os abióticos?

3 – Os fatores bióticos e abióticos desse jardim constituem um ecossistema com diversas espécies. Você também faz parte dele e tem uma função bastante importante nesse ecossistema. Qual a sua função nesse ecossistema?

4 – Caso você decida em acabar com as abelhas desse jardim e retirar todas as pedras do solo, o que ocorrerá? Os outros seres que compõem esse ecossistema serão afetados?

5 – Agora imagine que você descobriu uma porção de pedras preciosas debaixo da terra desse jardim, no entanto, sua alimentação e qualidade de vida dependem dele. Para retirar as pedras e ganhar dinheiro com elas, você irá destruir todo o jardim ao mesmo tempo em que irá piorar sua qualidade de vida. O que você faria?

6 – Qual a importância da água para você?

7 – Onde foi feita essa cadeira que você está sentado (a)? Do que ela é feita? De onde vêm os materiais?

8 – Caso quebre uma parte de seu assento você compraria outra ou tentaria consertar? Por quê?

9 – A mineração, que ajuda o homem na construção de uma porção de objetos para o seu bem-estar, pode ser ruim de alguma forma? Qual o possível malefício da mineração?

10 – Como você vê a relação do homem e a natureza? Um é parte do outro ou um depende do outro?

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Aplicação da cartilha e coleta de dados

Com a permissão da professora regente, os alunos foram conduzidos a uma sala mais ampla o que possibilitou dispor as carteiras em círculos onde alunos e a professora pesquisadora pudessem ser vistos e ouvidos.

Antes que as atividades viessem a ser iniciadas, foi feita uma breve explanação sobre a divisão temática da cartilha para que a mesma pudesse ser aplicada em etapas e que, ao final de cada aula, as cartilhas seriam recolhidas com o propósito de serem entregues no próximo encontro a fim de dar continuidade ao cronograma previsto.

No primeiro encontro foram desenvolvidas as seguintes atividades: I) foi realizada uma enquete para escolher o nome do cacto protagonista; II) foram cortados elementos bióticos e abióticos de revistas para fazer as atividades da página 9; III) foram discutidas as características do solo das regiões de canga e; IV) foi feita a redação de um pequeno texto sobre a importância de se preservar áreas onde são encontradas paleotocas presente na página 13.

No segundo encontro, dando sequência à cartilha, foram realizadas as seguintes ações: I) foi instituída uma conversa sobre água e seu ciclo, aquíferos e sobre o que temos feito para economizar esse bem tão precioso; II) foram estudados os principais rios que abastecem a região e que têm suas nascentes nas regiões de canga do QF; III) foram discutidas as adaptações que as plantas possuem para sobreviver às condições daquele local e sobre a raridade das mesmas e; IV) foi feito um relato de duas recentes descobertas ocorridas em cavernas nas regiões de canga do QF, página 28.

No terceiro e último dia de atividades foram abordadas: I) as principais ameaças ao ecossistema canga; II) a tragédia ocorrida com o rompimento da barragem de rejeitos da mineradora Samarco em Mariana – MG; III) as consequências do consumismo e a diferença entre ele e o consumo e; IV) a importância das unidades de conservação, em especial sobre o Parque Nacional da Serra do Gandarela e o conflito entre seus limites.

Ao longo da proposta foram utilizadas seis aulas de cinquenta minutos cada, duas por encontro, para que a cartilha fosse completamente trabalhada. No início de cada encontro as cartilhas foram entregues a cada um dos alunos para que esses pudessem interagir e trabalhar com o novo material de aporte didático sendo recolhidas ao final de cada encontro.

39 Ao término da sexta aula as cartilhas foram novamente recolhidas para coleta de dados. As aulas foram sempre dialógicas, tanto a professora pesquisadora quanto os alunos exploraram ideias, consideraram e discutiram diferentes pontos de vista.

Estrutura e roteiro da entrevista semi-estruturada

A entrevista também foi aplicada em sala de aula. Foi entregue a cada aluno uma folha contendo as seguintes questões:

1 - O que você achou da cartilha “Canga”?

2 - Qual a importância da canga no ciclo da água? 3 - Cite duas características da canga.

4 - Você gostaria de ter uma disciplina que discutisse as relações que ocorrem na natureza? Por quê?

5 - Qual a necessidade de se preservar a canga?

A aplicação desta etapa de avaliação se deu durante cerca de trinta minutos. Os alunos estavam organizados em filas como de costume, e cada qual respondeu ao material proposto de forma individual e explicitando a percepção pessoal acerca de todo o processo de trabalho ocorrido nas etapas anteriores.

Cronologia das atividades

Primeiramente, no dia 21 de outubro de 2015 a turma 906 foi informada sobre o sorteio feito pela supervisora e sobre o contexto da pesquisa que estava em desenvolvimento. Também foi entregue aos alunos uma carta de esclarecimento aos pais (APÊNDICE B) e o TCLE (APÊNDICE E), juntamente com o TALE (APÊNDICE F) do aluno, já que a participação era voluntária. O conhecimento prévio entre professor e alunos favoreceu a realização da pesquisa.

Num segundo momento realizado no dia 23 de outubro de 2015 foram recolhidos dos alunos os TALEs e os TCLEs de seus pais. Foi surpreendente ver que todos os trinta e sete alunos trouxeram os mesmos assinados e relataram estar ansiosos para o início das atividades previstas. Com a liberação da professora regente através de seu TCLE (APÊNDICE G), que

40 cedeu uma aula para que o questionário pudesse ser aplicado, seis aulas para aplicar toda a cartilha e mais uma aula para entrevistar os alunos, perfazendo um total de oito aulas (Figura 12).

Figura 12: Percurso metodológico. Fonte: Acervo da autora.

Após ter em mãos todos os TCLEs e TALEs assinados, no dia 28 de Outubro de 2015 o questionário foi aplicado na própria sala de aula aos alunos participantes da pesquisa. Para melhor organizar os dados definimos a representação de cada aluno pela simbologia aluno A1, A2 (...) (ANEXO I).

O questionário visa à obtenção de informações acerca dos conhecimentos dos alunos sobre os ecossistemas, funções ecológicas, os impactos da mineração e a relação existente entre homem e natureza. Optou-se pela escolha do questionário devido à sua objetividade e grande importância em estudo científico. Para Barros & Lehfeld (2000, p. 90), “o formulário é o instrumento mais usado para levantamento de informações. Não está restrito a uma determinada quantidade de questões [...] e pode possuir perguntas fechadas e abertas e ainda a combinação dos dois tipos”.

Em seguida, foi aplicada a cartilha “Canga” (ANEXO II) trabalhada dialogicamente com os alunos, buscando viabilizar um aprendizado de forma mais lúdica e contextualizada. Ao mesmo tempo, seu conteúdo é exposto de forma didática e adaptado, trabalhando também o tema da EA do homem enquanto componente da natureza e a importância da conservação

QUESTIONÁRIO 28/10/15 CARTILHA 04, 11 e 18/11/15 ENTREVISTA 20/11/15 DESENHO 26/11/15 EXPOCIÊNCIAS 28/11/15 REDAÇÃO 09/12/15

41 dos ecossistemas diante a ação predatória antrópica, situando em destaque os campos rupestres ferruginosos.

Nos dias 04, 11 e 18 de novembro de 2015, a professora regente cedeu suas aulas na referida turma, os alunos foram retirados da sala de aula e levados para a sala de matemática por ser mais ampla e com mesas circulares coloridas que facilitaram o agrupamento em círculos com seis alunos cada uma. Os alunos escolheram as mesas pela predileção da cor. A cartilha foi entregue a cada um dos alunos recolhendo-a posteriormente ao final de cada aula, as quais foram gravadas em áudio e vídeo. Foram utilizadas seis aulas para aplicação de toda a cartilha.

Após a aplicação da cartilha foi efetuada uma terceira coleta de dados por meio de entrevistas semi-estruturadas no dia 20 de Novembro de 2015. A entrevista semi-estruturada é também chamada de entrevista focalizada, na qual o entrevistador faz perguntas específicas, mas também deixa que o entrevistado responda em seus próprios termos (ALVES- MAZZOTTI e GEWANDSZNAJDER, 2000), caracterizando um tipo de entrevista qualitativa.

Para Manzini (1990/1991, p. 154), a entrevista semi-estruturada está focalizada em um assunto sobre o qual confeccionamos um roteiro com perguntas principais, complementadas por outras questões inerentes às circunstâncias momentâneas à entrevista. Para o autor, esse tipo de entrevista pode fazer emergir informações de forma mais livre e as respostas não estão condicionadas a uma padronização de alternativas.

Após a realização da entrevista semi-estruturada, foi proposto aos alunos que redigissem um texto explicitando a importância da canga nos contextos biológico, histórico, social e econômico, estimulando a criação de um esquema ou desenho que retratasse esses quatro contextos, aos que quisessem fazê-lo.

A princípio ficou acertado que esses textos deveriam ser entregues no dia 02 de dezembro de 2015, mas como esse dia coincide com a semana de provas bimestrais na escola, achamos melhor recolher no dia 09 de Dezembro 2015 para que nenhum aluno fosse prejudicado.

Como acontece todos os anos na escola, no dia 28 de novembro de 2015 foi realizada a VI Expociências (Figura 13), cujo tema do ano é “sustentabilidade”.

42 Figura 13: Convite feito para a Expociências 2015 e entregue as escolas públicas de

João Monlevade com ensino fundamental II. Fonte: Acervo da autora.

Ficou estabelecido com os alunos que o melhor desenho, escolhido pela coordenação pedagógica da escola, seria impresso e estamparia um mural da escola no dia da feira. Esse desenho deveria ser entregue até o dia 26 de novembro de 2015 para que pudesse ser votado e impresso.

No dia 26 de novembro de 2015 os desenhos feitos pelos alunos foram recebidos e encaminhados para a equipe pedagógica do turno matutino. Foram selecionados quatro desenhos e o melhor foi impresso no tamanho 2,70 x 2,0 cm, estampando um mural na escola. No dia 28 de novembro de 2015 aconteceu a VI Expociências na escola, oportunidade em que os alunos dos 8º e 9º anos expuseram seus trabalhos.

No dia 09 de dezembro de 2015foram recebidas as redações como combinado. A partir delas foram colhidas importantes informações sobre a cartilha e sobre o aprendizado obtido com seu uso.

Todas as observações e perguntas, além de dados da pesquisa, foram registradas no caderno de campo, bem como foram analisados todos os materiais de áudio e vídeo que, por sua vez, contribuíram para a análise realizada a partir dos objetivos do trabalho proposto. A

43 manutenção de um registro organizado é a maneira de revisar o que foi feito agregando credibilidade documental dos dados colhidos a serem interpretados.

Com o auxílio do material de áudio e vídeo, das anotações do caderno de campo e, sobretudo, de toda a amostra gerada nas etapas anteriores, tivemos respaldo para inferir a respeito da viabilidade da proposta dialógica da EA junto aos alunos do ensino fundamental II.

O uso de diferentes técnicas de investigação constitui uma forma de obtenção de dados de diferentes tipos, os quais proporcionam o cruzamento de informações e maior clareza na interpretação das mesmas.

Avaliação qualitativa dos resultados

A análise da pesquisa respeitou a cronologia estabelecida em pré-análise, exploração do material e o tratamento dos resultados, a fim de sistematizar as ideias obtidas na aplicação dos diferentes métodos de investigação. Para tanto foi utilizado como corpus - conjunto de documentos a serem submetidos à análise - o questionário, a entrevista semi-estruturada, desenhos e redações. (BARDIN, 1977).

Todos dados obtidos foram submetidos a uma pré-análise que pudesse aflorar nos pesquisadores percepções e impressões iniciais. Posteriormente foram sistematizados de forma a serem elencadas categorias a cada uma das perguntas presentes nos questionários, entrevistas e redações.

Os desenhos por sua vez surgiram como material artístico, por possibilitarem uma educação libertadora que incentive a inventividade e expressão do aluno por meios outros além da escrita e a oralidade, e cognitivo acerca do tema trabalhado. A análise nessa etapa foi intrínseca à proposição.

Com esse arcabouço de procedimentos investigativos, buscou-se a análise do alcance da cartilha enquanto material pedagógico capaz de contextualizar a educação ambiental na promoção da conservação, sobretudo dos campos rupestres ferruginosos.

A orientação por hipóteses implícitas ao tema central do trabalho referenciou-se na análise posterior à qual o trabalho tem como problema de pesquisa.

Para o alcance de uma pesquisa com relevância cientifica, foi feita a preparação do material proposto aos alunos de modo que pudesse possibilitar aos pesquisadores obter

44 informação através da organização sistemática dos resultados nos quais foram utilizadas técnicas que conseguem extrair inferências e consequente interpretação das etapas.

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