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4. Metáfora e terminologia

4.2 Metonímia

Para Kövecses e Radden (1998:39) apud (Tercedor Sanchez et al., 2012:40) a metonímia é um processo cognitivo na base do qual uma entidade conceptual, o veículo, fornece acesso mental a outra entidade conceptual, o alvo, dentro de um mesmo domínio conceptual.

Já para Croft (1993:348) apud (Tercedor Sanchez et al. 2012:40), a metonímia visa evidenciar um subdomínio do contexto do domínio matriz.

Um bom exemplo disso é a caracterização feita numa enciclopédia inglesa para violin que se refere ao instrumento musical, à pessoa que toca o instrumento, à música composta para o instrumento e à música produzida pelo instrumento (Tercedor Sanchez et al. 2012:40-41):

1- He bought a new violin at the store the other day (instrumento musical) 2- The violin in the chamber music group is very good (pessoa que toca)

3- The violin in the second movement of that symphony is difficult to play (música composta para o instrumento)

4- The violin was off-key during the entire concert (música produzida pelo instrumento) (Faber 2012:40)

Nos últimos três exemplos, figuram metonímias, uma vez que não se trata de um violino propriamente dito, mas de uma entidade que se encontra no domínio experiencial do violino.

Numa perspetiva terminológica, a metonímia permite a criação de expressões nas áreas da ciência e da tecnologia. É através dela que grandes inventores dão os seus nomes às invenções e os grandes clínicos às patologias que descobrem. Podemos citar alguns exemplos amplamente conhecidos como a doença de Alzheimer, patologia descoberta por Alois Alzheimer ou o newton, unidade de força, cuja designação decorre do seu inventor Isaac Newton.

Ambas as ferramentas cognitivas mencionados anteriormente, a metáfora e a metonímia, também são muito importantes no âmbito da linguagem especializada, uma vez que textos das ciências ambientais utilizam frequentemente a metáfora conceptual ECOSSISTEMAS SÃO PACIENTES. Isto deve-se à existência do Princípio da Invariância (Invariance Principle) (Lakoff e Turner 1989, Lakoff 1990, 1993) apud (Tercedor Sanchez et al., 2012:43-44) que advoga que a estrutura do esquema imagético do domínio-fonte se afigura determinante na estruturação do domínio-alvo. Assim sendo, partindo do exemplo mencionado, ECOSSISTEMAS SÃO PACIENTES, podemos ver que estão presentes os domínios da Ciência Ambiental e da Medicina cuja metáfora se encontra no mapeamento metafórico que preserva a topologia do domínio-fonte da Medicina (Tercedor Sanchez et al.45-46):

- (...) the division from the rivers was increasing and the river health was in decline. (… a divisão dos rios estava a aumentar e a saúde do rio estava em declínio)

- Symptoms of beach erosion are repeatedly being treated through major programs (…) (Os sintomas da erosão da praia estão a ser tratados por recurso a vários programas) - (…) can we take the pulse of nature?

(podemos tomar o pulso à natureza?)

- Similarly, the healing of fluid filled cracks progresses rapidly (…)

Onde também é válida a metonímia, o Princípio da Invariância só levanta dificuldades no que diz respeito a mapeamento feitos através de esquemas imagéticos. De acordo com Ruiz de Mendoza (1998) apud (Tercedor Sanchez et al. 2012:47), um Princípio de Invariância alargado deve preservar a estrutura de nível genérico do domínio-alvo para que seja consistente com a estrutura do nível genérico do domínio-fonte. Desta forma, as metáforas de nível genérico estão relacionadas com os esquemas de nível genérico. Este tipo de esquema é fundamental para a criação de unidades terminológicas e inclui os seguintes elementos (ibidem):

- Categorias ontológicas (entidade, estado, ação, situação, etc) - Características dos seres (atributos, comportamentos, etc)

- Tipo de evento (momentâneo ou alargado, único ou repetido, completo ou por terminar, etc)

- Relações causais (facultar, originar, etc)

- Esquemas imagéticos (regiões delimitadas, percursos, forças, etc) - Modalidades (habilidade, necessidade, possibilidade, etc)

Tendo em conta os esquemas genéricos, algumas áreas são ativadas e evidenciadas através de designações terminológicas no que diz respeito, por exemplo, à natureza de tumores malignos, tal como (Tercedor Sanchez et al. 2012: 48):

- ORIGEM: carcinoma basocelular (basocelular é o tipo de células da pele de onde o cancro surge)

- EVOLUÇÃO: cancro cervical invasivo (tipo de cancro que já evoluiu, invadindo tecidos vizinhos)

Refira-se ainda que Kövecses (2003:80) introduz a noção de âmbito da metáfora – todo o conjunto de casos, ou seja, todos os domínios-alvos aos quais um domínio-fonte específico se aplica. A partir disto, é possível distinguir uma extensão metafórica de domínio com restrição – depende do mapeamento conceptual numa escala limitada – de uma extensão metafórica de domínios sem restrição que se baseia em extensões metafóricas produzidas para vários domínios-alvos.

No que diz respeito a extensão metafórica de domínio sem restrição, a mais produtiva dentro do domínio das Ciências Ambientais é aquela relacionada ao corpo humano. Por exemplo, características geográficas são normalmente designadas por palavras ligadas ao corpo humano: pé da montanha, boca do rio, braço do rio, etc), contudo, é por demais evidente que as extensões metafóricas podem variar de língua para língua. No caso da boca, esta é extremamente produtiva em mapeamentos geográficos, tanto no inglês como no francês, estando ligado às noções de estuário, canal, baía, entre muitas outras. Por outro lado, é possível que o mapeamento metafórico selecione como domínio-fonte uma parte do corpo diferente. Por exemplo, em inglês, o dedo da encosta, da duna, da margem

corresponde em Espanhol ao pé (pie), que dá origem a palavras como cordilheira (serra), presa (barragem) e ladera (montanha).

No cômputo geral, Kövecses (2002) afirma que o domínio-fonte mais comum de um vasto conjunto de metáforas conceptuais é o CORPO HUMANO, juntamente com dos ANIMAIS, PLANTAS, COMIDAS E FORÇAS. Contudo, no âmbito da Ciência Ambiental também é possível que termos metafóricos decorram de domínios-fonte de objetos do quotidiano, como por exemplo a bancada ou o leque, dando origem às seguintes metáforas convencionalizadas, bancada de rochas (rock mattress) ou leque de aluvião (alluvial fan). Alguns conceitos neste âmbito também podem ser concebidos como contentores, mas o tipo de contentor pode variar consoante a língua. Por exemplo, ao depósito natural ou artificial para armazenar água atribui-se o termo técnico (reservoir basin), ao passo que em espanhol é um vaso (copo), que deriva do latim vas, um recipiente adaptado para o uso doméstico.

Segundo Faber (2012:63), as semelhanças funcionais e morfológicas entre os objetos do quotidiano e os fenómenos geológicos ou naturais são os principais geradores de extensões metafóricas quer na linguagem geral e quer na especializada. Relativamente às extensões metafóricas de domínios com restrição, é possível dizer que tanto no domínio das Ciências Ambientais como no das Ciências Médicas encontram-se com frequência imagens do domínio-fonte da guerra ou da luta:

The seacoast is a battlefield where humankind and the elements – or even the elements among themselves – fight each other. (Faber, 2012:63)

Observe-se que o mapeamento conceptual anterior está ligado à metáfora da guerra, em que o corpo humano é conceptualizado como uma fortaleza que pode ser atacada por agentes externos ou internos. Nos domínios especializados como a Medicina, Ciências Informáticas e Ambiente é frequente o uso de mapeamentos construídos a partir do domínio-fonte da GUERRA, conforme exemplos de Faber (2012,64). Sublinhe-se que a sua tradução para português segue os desígnios desta metáfora conceptual, como se pode ver nas nossas traduções abaixo:

- Once a virus invades a living cell, it directs the cell to make new virus particles.

(Quando um vírus invade uma célula viva, obriga-a a fabricar novas partículas do vírus).

- This is especially true along the cliffed coasts of the San Diego Region, where waves directly attack the seacliffs during severe winters

(Isto verifica-se essencialmente nos penhascos costeiros da Região de San Diego, em que as ondas os atacam diretamente durante os invernos rigorosos).

É possível descortinar que, em referência aos exemplos anteriores, os fenómenos ambientais, tais como ondas e sedimentos são conceptualizados como forças invasivas. Já,

no domínio especializado da Medicina, as forças invasivas ou de ataque são os vírus, células imunes ou processos de modificação celular.

Contudo, o mapeamento conceptual mais produtivo do nosso corpus de metáforas conceptuais é TERRA É UM SER VIVO (EARTH IS A LIVING BEING) que deriva da nossa compreensão do meio ambiente a partir do nosso corpo. O referido mapeamento á passível de ser identificado na seguinte ocorrência (Faber 2012:63), em cuja tradução se reproduz o mapeamento supracito:

In geology and geomorphology theorists presented views that contained various stages of maturity, and compared landscape evolution metaphorically to a developing organism.

(Os cientistas da geologia e da geomorfologia apresentaram perspetivas que continham vários estádios de maturidade e comparam metaforicamente a evolução da paisagem a um organismo em evolução)

A partir deste mapeamento conceptual é possível entender que a terra é representada como um organismo vivo, conforme patenteado nos exemplos abaixo (Faber 2012:65) e na nossa tradução dos mesmos para português:

Early history of the Earth Scientists believe the Earth began its life about 4.6 billion years ago.

(Os primeiros estudiosos da Terra apontaram que a terra começou a sua vida aproximadamente há 4.6 biliões de anos. As dunas começaram a ter vida como uma pilha imóvel de areia que se forma atrás de um tipo de obstáculo vertical)

Variations in the diffusivity coefficient, over the life of the alluvial fan is a concern because a varying coefficient will complicate the process of gully-profile evolution.

(Variações em que o coeficiente de difusão pra além da vida do leque de aluvião são uma preocupação, na medida em que um coeficiente variável pode complicar um perfil de evolução dos sulcos no terreno).

Esta metáfora também pode ser utilizada em corpos aquáticos, ondas e eventos marítimos (1). Também é possível encontrá-la na duração de fenómenos atmosféricos (2), substâncias (3) e construções resultantes da atividade humana (4):

(1) The life cycle of cascades is subdivided into different phases.

(2) Most hurricanes live for about a week. However, if a hurricane remains over worm water its life can be extended.

(3) The half-life for a pesticide defines the number of days required for a given pesticide concentration to be reduced by one-half.

(4) When storm activity does remove the artificial beach, generally long before its projected life span” (Faber 2012:65-66)

O estudo anterior demonstrou como a metonímia e a metáfora são importantes para a Terminologia, tanto na linguagem geral como na especializada. Demonstrou também como um dado mapeamento metafórico pode ser analisado através do estudo de unidades terminológicas em textos especializados e como estes surgem.

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