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2.2. Dois contributos para a compreensão da resposta à experiência estética

2.2.1 Michael Parsons

Michael Parsons no seu ensaio Como Compreender a Arte, inscrito no âmbito da psicologia do desenvolvimento cognitivo, refere que naturalmente existem diferentes respostas e reações face à mesma obra de arte. O que as pessoas procuram nos quadros, como os entendem e o que sentem quando fruem uma obra de arte são questões que assaltam o autor.

Parsons (1992) parte do pressuposto de que «as pessoas reagem de forma diferente aos quadros porque os entendem de forma diferente» (pp.17-19). Têm conceções diferentes quanto ao que é a pintura, às suas características e quanto à forma adequada de julgar o quadro. Este entendimento por vezes inconsciente influencia e determina a sua reação.

Neste ensaio o autor fala dos estádios de compreensão estética e define estádios como um conjunto de ideias e não propriedades daquele ou outro sujeito. Cada aglomerado será uma configuração ou estrutura de pressupostos, que se relacionam e tendem a associar-se ao espírito das pessoas por estarem internamente ou logicamente ligados.

Habitualmente o homem procura encontrar na arte a beleza, a expressividade, o estilo e as qualidades formais. Michael Parsons procura no desenvolvimento estético aperfeiçoar cada vez mais os conceitos descritos, defendendo e partindo de um primeiro pressuposto:

(…) de que a arte não se limita a ser um conjunto de objetos bonitos, constituindo antes uma das formas de que dispomos para articular a nossa vida interior… O segundo pressuposto é o de que a arte exprime mais do que aquilo que um individuo tem em mente num determinado momento. O que a arte nos permite compreender não é forçosamente o que o artista procurou conscientemente comunicar. O sentido da arte pertence, por assim dizer, ao domínio publico. A arte comporta diversas camadas de significação e pode revelar facetas dos seus criadores de que eles próprios não se aperceberam… Daqui decorre que toda e qualquer compreensão minimamente complexa de expressão artística é uma construção social e histórica, um produto colectivo, embora deva ser apreendido individualmente.29

De acordo com o autor, a significação de um quadro pertence ao domínio publico, não é uma visão particular do artista ou do espectador. Será algo a que o homem pode ser mais ou menos sensível.

Os estádios de desenvolvimento estético são níveis de capacidade crescente para interpretar a expressividade das obras de arte e a compreensão do modo como o homem pensa aquando da perceção estética, tendo por base a observação das ideias que os sujeitos utilizam – o interesse pelo tema, por exemplo, pela textura, pela forma, bem como pela expressão de emoções.

Neste sentido, o autor organizoua sua exposição tendo por base as ideias acima descritas: o tema (incluindo as ideias acerca da beleza e realismo); a expressão das emoções; a forma e o estilo; e a natureza dos juízos.

A sua análise baseou-se em cerca de trezentas entrevistas ao longo de dez anos com sujeitos diferentes, desde crianças em idade pré-escolar aos professores universitários de arte. As entrevistas eram constituídas pela discussão de cinco ou seis quadros.

Michael Parsons definiu os cinco estádios de desenvolvimento estético tendo por base o facto de cada estádio interpretar a pintura de forma mais perfeita do que o anterior. Os estádios assentam na capacidade crescente de empatizar com pontos de vista diferentes. O autor afirma que a nossa história do desenvolvimento mental é também a história do nosso desenvolvimento social, do sentimento de pertença à sociedade. Aprendemos a língua, a cultura, os valores, os juízos e constituímo-nos sujeitos e membros da própria sociedade. Mais tarde, pensamos autonomamente, desenvolvemos a capacidade de reflexão, de criação, e de independência face à cultura e à sociedade. Para o autor o desenvolvimento orienta-se sempre no mesmo sentido: da dependência para a autonomia, um ponto comum a todas as teorias do desenvolvimento que se traduzem no progresso da liberdade e da sociabilidade humana.

Esta evolução consta de dois grandes momentos: a libertação da dominação do impulso biológico, tornando-se o homem um bom membro da sociedade, e a libertação da dominação da sociedade, o que faz o homem criar pensamentos independentes dessa mesma sociedade. Nesta fase o que mais importa é o aperfeiçoamento e o progresso, ao invés da adaptação às normas vigentes que a sociedade impõe. O aperfeiçoamento da natureza social do homem encontra-se subjacente ao juízo estético, bem como às restantes formas do desenvolvimento cognitivo.

Os cinco estádios do desenvolvimento caracterizam-se pelas características que se seguem.

No primeiro estádio, a característica fundamental é a preferência, que se caracteriza por um gosto intuitivo, atracão pela cor e reação ao tema do quadro. Na base deste estádio está uma série de associações livres; é um estádio que se pauta do ponto de vista psicológico pela quase inexistência de consciência do outro. O estímulo do impacto estético funda uma experiência agradável.

O segundo estádio caracteriza-se pela beleza e pelo realismo; a ideia dominante é o tema e organiza-se à volta da ideia de representação. A emoção é um elemento a ser representado e o estilo é apenas apreciado do ponto de vista do realismo. A habilidade, a paciência e a minucia são fatores relevantes neste estádio. A beleza, o realismo e a habilidade do artista são os

fundamentos objetivos do juízo estético. Do ponto de vista psicológico este estádio representa já um progresso, pelo que tem em conta o ponto de vista do outro.

No terceiro estádio o que domina é a expressividade. A observação do quadro é feita em função da experiência que pode oferecer, e quanto mais intensa for a experiência melhor será o quadro. O sentimento expresso pode ser o do observador, do artista ou de ambos. A criatividade e a força de expressão dos sentimentos são valorizadas. O terceiro estádio acresce de mais um progresso pela capacidade de apreensão das ideias e sentimentos do observador e pela empatia pelo outro, no sentido em que passa a existir uma nova consciência da experiência e da vivência interna dos outros.

O quarto estádio caracteriza-se pelo estilo e pela forma; a nova perspetiva assenta no facto de se considerar que o significado de um quadro é mais social do que pessoal. A exploração é feita através da textura, da cor, da forma e do espaço, do estilo e das relações estilísticas e históricas. Neste estádio, o observador acrescenta progresso à capacidade de adotar a perspetiva da tradição. A par e passo, desenvolve-se esteticamente, porque considera relevantes os meios de expressão, a forma e o estilo, e estabelece uma distinção entre a ação literária do tema e do sentimento e o que em si mesmo a obra realiza. Assim, permite a descoberta da função crítica da arte, enquanto orientadora da nossa perceção, e considera o juiz estético em simultâneo, como suscetível e objetivo.

O quinto estádio é o da autonomia e nele o sujeito deverá avaliar os valores e os conceitos através dos quais a tradição constrói a significação das obras de arte. É de não esquecer que os conceitos evoluem a par e passo com a história, o que implica um contínuo reajustamento.

Para o autor, este estádio representa um avanço, porque permite a capacidade de questionar transcendendo a própria cultura instituída. Do ponto de vista estético, possibilita reações com maior subtileza e a compreensão do quanto as perspetivas tradicionais podem ser falaciosas. Permite entender a arte quer no momento da criação, quer no de avaliação, como uma constante readaptação do homem na exploração de valores em circunstâncias históricas mutáveis, abrindo espaço para outras e novas interrogações quanto à criação e no que diz respeito a toda a cultura envolvente (Parsons, 1992).