• Nenhum resultado encontrado

O tipo, a quantidade, o tamanho, a forma e a distribuição das fases presentes em um sólido constituem a sua microestrutura. Enquanto a macroestrutura do concreto é aquela que pode ser vista a olho nu, a microestrutura é a porção com grandeza microscópica (10-6 m), sendo necessário o uso de microscópios eletrônicos

para analisar suas propriedades.

A morfologia da microestrutura da pasta de cimento começa a se definir já no início da hidratação. Quando o cimento é disperso em água, o sulfato de cálcio e os compostos de cálcio começam a entrar em solução e a fase líquida torna-se saturada de íons. Como resultado da interação entre cálcio, sulfato, aluminatos e íons hidroxilas, começam a aparecer os cristais de etringita (AFt). Poucas horas mais tarde, grandes cristais de CH e pequenos C-S-H fibrosos começam a preencher os vazios antes ocupados por água e os grãos de cimento em dissolução. Depois de alguns dias, a etringita pode se tornar instável e se decompor para formar monossulfoaluminato (Afm) (MEHTA; MONTEIRO, 2014).

Figura 26 - MEV de cristais hexagonais de AFm e cristais de AFt

Fonte: Mehta; Monteiro (2014).

Segundo Mehta e Monteiro (2014), os sólidos presentes em uma pasta hidratada podem ser classificados em quatro fases:

• C-S-H: compõe de 50 a 60% do volume de sólidos, tem elevada área superficial e fornece a maior parte da resistência e durabilidade.

• CH: compõe de 20 a 25% do volume de sólidos, com área superficial mais baixa.

• Sulfoaluminatos de cálcio (AFm e AFt): ocupam de 15 a 20% do volume de sólidos e tem papel mais secundário.

• Grãos de clínquer não hidratados: dependendo da distribuição do tamanho e grau de hidratação, alguns grãos de clínquer podem ser encontrados na microestrutura, mesmo muito tempo depois da hidratação da pasta. Geralmente, possuem tamanhos entre 1 e 50µm.

Segundo Neville e Brooks (2013), o volume total característico de uma mistura de cimento-água permanece inalterado durante a hidratação. Na medida em que os produtos da reação se hidratam, eles vão preenchendo os vazios antes ocupados pela

água e pelo cimento anidro, o que pode ser representado esquematicamente na Figura 27.

Figura 27 – Representação das proporções volumétricas antes da hidratação (esquerda) e durante a hidratação (direita).

Fonte: Neville; Brooks (2013).

4.2.1 Vazios na pasta de cimento hidratada

Além dos sólidos, a pasta de cimento contém muitos tipos de vazios, que têm diferentes influências em suas propriedades.

Figura 28 - Intervalo dimensional de sólidos e poros na pasta de cimento hidratada.

Fonte: Mehta; Monteiro (2014).

O espaço interlamelar consiste na largura do espaço entre as lamelas da estrutura do C-S-H, que varia de 5 a 25Å (1Å= 10-10m) e responde por 28% da

porosidade no C-S-H sólido (MEHTA; MONTEIRO, 2014).

Os vazios capilares representam os espaços que não são preenchidos pelos componentes sólidos da pasta de cimento hidratada. A quantidade, distribuição e o tamanho desses vazios são determinados pela relação a/c e o grau de hidratação do cimento. O volume total de vazios capilares é chamado de porosidade (MEHTA; MONTEIRO, 2014).

Duas características da porosidade capilar são mais importantes: seu volume e sua conectividade. O volume depende de vários parâmetros. O primeiro é a relação a/c, pois um maior volume de água gera um maior espaço entre grãos e maior porosidade capilar. O segundo é a distribuição granulométrica do material cimentício, pois partículas mais finas são capazes de preencher os espaços entre os grãos maiores, diminuindo a porosidade capilar. O terceiro parâmetro é o grau de hidratação, pois o volume molar dos hidratos é maior que dos anidros, o espaço ocupado pelo sólido aumentará com o aumento do grau de hidratação e a porosidade capilar vai diminuir (NONAT, 2014).

A conectividade da rede capilar é particularmente importante para a durabilidade do material. Quando o conjunto da porosidade capilar está conectado, os agentes agressivos externos podem facilmente penetrar no material e começar sua deterioração. A conectividade desses poros diminui com a hidratação. Quando a hidratação prossegue, os produtos vão obstruindo a entrada dos poros até que eles

estão conectados entre si apenas pela porosidade dos próprios hidratos (NONAT, 2014).

A porosidade é um fator fundamental atuante sobre a resistência de todos os materiais, não só do concreto (NEVILLE; BROOKS, 2013).

Em pastas de cimento bem hidratadas com baixa relação a/c, os vazios capilares podem variar entre 10 e 50nm. Em pastas com altas relação a/c, nas primeiras idades, os vazios capilares podem ser maiores, entre 3 e 5µm. A distribuição dos poros, e não a porosidade total, pode ser considerada como um melhor critério para avaliar as propriedades da pasta hidratada de cimento. Vazios capilares maiores que 50nm, chamados de macroporos, têm mais influência na resistência e permeabilidade, enquanto vazios menores que 50nm, chamados de microporos, tem maior influência na retração por secagem e fluência do concreto (MEHTA, MONTEIRO, 2014).

Os vazios de ar na pasta possuem geralmente formato esférico. Uma pequena quantidade de ar normalmente pode ficar aprisionada na pasta durante a mistura do concreto. Esses vazios de ar aprisionado podem chegar a 3mm de tamanho. Por várias razões, especialmente em climas frios, aditivos podem incorporar bolhas de ar na mistura. O tamanho dos vazios de ar incorporado varia entre 50 e 200µm. Tanto os vazios de ar incorporado, quanto de ar aprisionado, são muito maiores que os vazios capilares, podendo, então, afetar negativamente a resistência da pasta (MEHTA; MONTEIRO, 2014).

A busca por alta compacidade (menor porosidade) será sempre uma condição necessária para obter uma boa durabilidade dos concretos (OLLIVIER; TORRENTI, 2014).

4.2.2 Água na pasta de cimento hidratada

Os poros na pasta de cimento podem parecer vazios quando observados por microscópio eletrônico; porém, dependendo de sua umidade e porosidade, a pasta de cimento pode reter uma grande quantidade de água. A classificação da água apresentada a seguir, em diferentes tipos, é baseada, segundo Mehta e Monteiro (2014), no grau de dificuldade com que pode ser removida.

• Água capilar: água presente nos vazios maiores que 50 Å. É a água que está livre da influência das forças de atração exercidas pelas superfícies sólidas.

• Água adsorvida: água que se encontra próxima às superfícies sólidas dos produtos de hidratação e sujeita à força de atração dos sólidos, pois fica retida em suas superfícies. A perda da água adsorvida, por secagem próxima dos 30% de umidade, é a responsável pela retração da pasta de cimento hidratada.

• Água interlamelar: água associada à estrutura do gel de C-S-H. É perdida por forte secagem (abaixo de 11% de umidade), fazendo com que o C-S-H retraia consideravelmente.

• Água quimicamente combinada: conforme exposto no capítulo 3.5.3, faz parte da microestrutura dos produtos da hidratação e só é perdida por aquecimento.

A pasta de cimento hidratada saturada não é dimensionalmente estável. Desde que mantida a 100% de umidade, nenhuma variação dimensional vai ocorrer. Entretanto, quando exposta à umidade ambiente, menor que 100%, o material começa a perder água e retrai.