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Mobilidade, Acessibilidade e o Desenho Universal nos Espaços Públicos como

Capítulo I. Envelhecimento Humano e os Espaços Públicos: uma síntese sobre as

1.4. Mobilidade, Acessibilidade e o Desenho Universal nos Espaços Públicos como

Como visto no item anterior, é primordial para um bom envelhecimento, estimular os idosos e toda a população a frequentarem espaços de convívio e participação, especialmente os espaços públicos, pois é onde a maior parte das relações sociais e o convívio democrático ocorrem. Para isso, estes espaços públicos devem ser acessíveis e inclusivos, respeitando as individualidades de cada cidadão e devem fazer parte de um sistema articulado e eficiente de mobilidade urbana.

De acordo com a Política Nacional de Mobilidade Urbana, Lei 12.587/12, mobilidade urbana é definida como “condição em que se realizam os deslocamentos de pessoas e cargas no espaço urbano”. Ou seja, todas as formas de socialização, encontros e participação das pessoas irão depender e estarão sujeitas às condições de mobilidade. Impedir a mobilidade é impedir os deslocamentos das pessoas. De acordo com Metz (2000), a mobilidade se desenvolve em escalas espaciais e em periodicidades temporais diversas. Segundo a visão do mesmo autor, a noção geral de mobilidade deveria ser complementada pensando no idoso, incluindo cinco parâmetros, a saber: 1. A viagem/trajeto/deslocamento para conseguir acesso às pessoas e lugares desejados; 2. Os benefícios psicológicos do movimento; 3. Os benefícios do exercício; 4. Envolvimento com a comunidade local; 5.Potencialidade/capacidade da viagem (tradução nossa).

A viagem/trajeto/deslocamento para conseguir acesso às pessoas e lugares desejados, segundo o autor Metz (2000), devem ser feitos de modo tal que se minimize os custos gerais por deslocamentos que por algum motivo não ocorrem. Os benefícios psicológicos do

movimento estariam relacionados com os benefícios psíquicos de ir e vir, porém atrelados à

vulnerabilidade do idoso, como por exemplo, o sentimento de ansiedade perante sua segurança pessoal nos espaços públicos. Os benefícios do exercício, a mobilidade diária propicia os movimentos musculares diários necessários, que com ao passar dos anos tornam-se fundamentais em decorrência de perdas musculares. O envolvimento com a comunidade local, ao movimentar-se o idoso fica sujeito aos encontros e as redes locais informais de apoio, diminuindo inclusive os riscos de morte e por último, a potencialidade/capacidade da viagem está relacionada com a consciência de saber que a qualquer momento e a qualquer situação, um deslocamento pode ser realizado com as condições necessárias. Em função das necessidades

gerais dos idosos, os benefícios psicológicos, físicos e sociais com o envolvimento com a comunidade local, seriam os parâmetros de maior particularidade e importância.

Paralelamente à ideia de Metz (2000), Alsnih e Hensher (2003) entendem também que a mobilidade estimula o envelhecimento ativo e a qualidade de vida dos idosos, devendo assim, serem levadas em consideração as necessidades dos mesmos pelos agentes públicos, que desenvolvem e promovem os sistemas viários e os diferentes modais de transporte, assim, o sistema de transportes deve propiciar os sensos de segurança, independência e dignidade. Conforme o número absoluto dessa faixa da população acima dos 60 anos cresce, maiores serão as diferenças individuais entre eles, determinando consequentemente, maiores necessidades distintas.

Os idosos, em função das possíveis perdas físicas e psicológicas, tornam-se mais suscetíveis às condições adversas dos espaços públicos. Como forma de adaptação a essas perdas e necessidades adquiridas conforme a idade, os mais velhos acabam por desenvolver novas capacidades para superar as adversidades e os obstáculos.

Ainda assim, arquitetos e urbanistas, responsáveis pelo projeto e pelo desenho do espaço, e o poder público, devem garantir que os espaços públicos das cidades, as edificações, as construções e os transportes coletivos assegurem a todos a oportunidade e principalmente o direito de usufrui-los sem nenhum impedimento ou dificuldade, tornando assim, o meio ambiente físico acessível a todos. De acordo com a Lei Federal 10.098/00, que representou no país o principal marco da acessibilidade, a acessibilidade é a

possibilidade e condição de alcance para utilização, com segurança e autonomia, de espaços, mobiliários, equipamentos urbanos, edificações, transportes, informação e comunicação, inclusive seus sistemas e tecnologias, bem como de outros serviços e instalações abertos ao público, de uso público ou privados de uso coletivo, tanto na zona urbana como na rural, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida.

Destaca-se o Art3º da Lei de Acessibilidade, alterado pela Lei 13.146/15 (Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência - Estatuto da Pessoa com Deficiência) “O planejamento e a urbanização das vias públicas, dos parques e dos demais espaços de uso público deverão ser concebidos e executados de forma a torná-los acessíveis para todas as pessoas, inclusive para aquelas com deficiência ou com mobilidade reduzida” e o parágrafo único “O passeio público, elemento obrigatório de urbanização e parte da via pública, normalmente segregado e em nível diferente, destina-se somente à circulação de pedestres e, quando possível, à implantação de mobiliário urbano e de vegetação.”. Quanto mais áreas públicas da cidade estiverem de acordo

com as condições inclusivas de uso por parte de todos os cidadãos, mais pessoas se sentirão convidadas e aptas a praticarem e exercerem seus direitos fundamentais de ir e vir mantendo sua independência.

A acessibilidade deve ser marcada pela autonomia e pela segurança, aspectos esses enfatizados pela OMS (2005) na abordagem do envelhecimento ativo. A autonomia “é a habilidade de controlar, lidar e tomar decisões pessoais sobre como se deve viver diariamente, de acordo com suas próprias regras e preferências” (p. 14), na perspectiva da acessibilidade autônoma, preza-se que o meio ambiente seja de maneira tal que a pessoa possa efetuar suas vontades e desejos por conta própria, sem o auxílio externo de terceiros, por exemplo. Quanto à segurança, existem lugares ou situações que podem oferecer riscos aos idosos e a sua saúde física, psíquica e até moral, tornando-se um lugar inseguro a eles. Deste modo, fica claro que no momento em que as pessoas optam por realizar uma determinada atividade e não outra em função de barreiras, riscos oferecidos ou dificuldades de acesso, a cidade ou aquele meio ambiente torna-se insatisfatório e inacessível.

Segundo a Lei de Acessibilidade - 10.098/00, alterada pela Lei 13.146/15 as barreiras são definidas por

qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que limite ou impeça a participação social da pessoa, bem como o gozo, a fruição e o exercício de seus direitos à acessibilidade, à liberdade de movimento e de expressão, à comunicação, ao acesso à informação, à compreensão, à circulação com segurança, entre outros.

Essa lei as divide em quatro categorias específicas: 1. Barreiras urbanísticas: as existentes nas vias e nos espaços públicos e privados abertos ao público ou de uso coletivo; 2. Barreiras arquitetônicas: as existentes nos edifícios públicos e privados; 3. Barreiras nos transportes: as existentes nos sistemas e meios de transportes e 4. Barreiras nas comunicações e na informação: qualquer entrave, obstáculo, atitude ou comportamento que dificulte ou impossibilite a expressão ou o recebimento de mensagens e de informações por intermédio de sistemas de comunicação e de tecnologia da informação. Segundo Marrara (2012), há ainda a partir de termos jurídicos as “barreiras negativas” ou “barreiras por omissão” que representam não somente a dificuldade de acesso por um obstáculo específico que possa a ser retirado, mas sim, pela ausência de um determinado instrumento e/ou equipamento que permita o acesso e a circulação das pessoas que assim necessitem e desejem.

Tanto a acessibilidade quanto a mobilidade esbarram nos direitos básicos e fundamentais dos cidadãos e no direito urbanístico das pessoas (MARRARA, 2015). As cidades, por sua essência, são espaços que aglomeram pessoas e serviços facilitando suas trocas e fluxos. Deste modo, todas as pessoas têm direito a usufruir de tais serviços e, consequentemente, devem ter acesso facilitado a todas as funções sociais e econômicas da cidade. Afirma-se desta forma, que o espaço urbano condiciona e viabiliza os direitos fundamentais dos cidadãos, fazendo com que a função social da cidade seja também cumprida. Assim, quando não há mobilidade, grande parte dos direitos, das vantagens, dos bens e dos serviços que a cidade proporciona se perdem por se tornarem inacessíveis. O autor ainda afirma que

a mobilidade é uma condição urbana instrumental para o direito urbanístico. Ela não configura um fim em si mesmo, mas sim o requisito essencial para que se concretizem a liberdade de iniciativa, a liberdade de manifestação, o direito ao lazer e à cultura, o direito ao trabalho, o direito ao mínimo de bem estar por meio do acesso a serviços públicos sociais e econômicos etc. (MARRARA, 2015, p. 123)

A fim de esquematizar de maneira normativa as questões da acessibilidade nas construções e instalações do meio urbano foi designada a partir da Associação Brasileira de Normas Técnicas a Norma Brasileira 9050 – NBR9050 (Acessibilidade a edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos), que atualmente está na sua terceira edição (suas edições anteriores foram de 1985, 1994 e 2004). Em termos teóricos, a NBR 9050 define-se nos parâmetros do Desenho Universal, que será discutido adiante, visando a “utilização de maneira autônoma, independente e segura do ambiente, edificações, mobiliário, equipamentos urbanos e elementos à maior quantidade possível de pessoas, independentemente de idade, estatura ou limitação de mobilidade ou percepção”.

A NBR 9050 estabelece alguns parâmetros técnicos específicos tais como, sinalização e comunicação, acesso e circulação, equipamentos urbanos e equipamentos mobiliários, assim como indica o quadro resumo a seguir. Uma série de especificações e aplicações são estipuladas variando desde a coloração de sinalização, figuras, sons, materiais e maneiras construtivas.

Quadro 4. Quadro síntese dos parâmetros para a adequação do espaço público segundo a NBR9050/04.

Fonte: LANVERLY, L., 2010, p. 63.

É importante dizer, que a Norma de Acessibilidade gera sempre muita polêmica e indagações quanto ao seu cumprimento total. Deve-se ter um limiar entre a norma e o desenho de projeto, sendo assim importante o conceito e as atribuições do Desenho Universal.

Como resposta às necessidades diversas de cada indivíduo, bem como a promoção à acessibilidade e à mobilidade sem distinção, de forma igualitária, surgiu nos Estados Unidos o termo Desenho Universal. De acordo com a SMPED (2008), inicialmente, em 1963, era denominado de “Desenho Livre de Barreiras” e em 1985, o termo evoluiu ao que conhecemos hoje como Desenho Universal. Conforme Cambiaghi (2007) aponta, Ronaldo Mace desenvolveu em 1985 o termo de Desenho Universal como forma de estabelecer a todas as pessoas, independentemente de suas características físicas ou habilidades, produtos e espaços adequados. O objetivo era que tal medida contribuísse com a inclusão das pessoas, extinguindo a segregação e a diferenciação desses espaços e produtos. Muitas vezes, é possível confundir o desenho universal com a acessibilidade, porém o primeiro é tratado como mais abrangente e igualitário.

Contribuindo com a ideia do Desenho Universal, na década de 1990, o Center of

Universal Design - CUD, na Carolina do Norte, Estados Unidos, elaborou sete princípios de

orientação a qualquer tipo de projeto, seja de produtos, ambientes ou de comunicação, destacados a seguir (PRADO, 2003):

1. Desenho equitativo – é o desenho do espaço ou do produto que pode ser utilizado por pessoas com habilidades e capacidades diferentes, promovendo um ambiente igualitário, evitando a segregação ou a estigmatização dos usuários. A figura 8 a seguir é um exemplo disso, a automatização das portas faz com que não haja a necessidade de utilização da força física ou manual para abri-las. A figura 9 também é outro exemplo para esta situação. A implantação de rampas no centro histórico, corresponde à facilidade para a circulação por todas as pessoas em uma zona mais íngreme, anteriormente acessível apenas por escadas ou ruas de alta inclinações.

Figura 8. Porta com sensor automático

Figura 9. Rampas elétricas no centro antigo de Álava, Espanha

Fonte: Disponível em: http://www.archdaily.com.br/br/600044/rampas-eletricas-no-centro-antigo- slash-roberto-ercilla-plus-miguel-angel-campo. Acesso em: 14 dez. 2016

2. Flexibilidade de uso – estipula que a diversidade de habilidades e de preferências de cada usuário estejam previstas nos projetos e que estes sejam adaptados a todos. Faz com que, por exemplo, pessoas canhotas e destras possam utilizar o mesmo produto da mesma maneira, facilitando a precisão destes usuários (Figura 10). Nos espaços públicos, um exemplo seria a sinalização de pedestres que contém além do aviso luminoso o aviso sonoro que auxilia pessoas com alguma dificuldade de visão ou cegas (Figura 11).

Figura 10. Adaptações aos produtos

A imagem da esquerda corresponde a um computador com teclado e mouse ou com um programa especializado para pessoas cegas. A imagem da direita corresponde a uma tesoura que

se adapta a canhotos e destros.

Figura 11. Travessias sonorizadas

Fonte: http://www.calgarycitynews.com/2016_06_01_archive.html. Acesso em: 14 dez. 2016.

3. Uso intuitivo e simples – os equipamentos e os espaços devem ser de fácil acesso e entendimento, não necessitando qualquer experiência, conhecimento, proficiência linguística ou nível de concentração por parte do usuário.

Figura 12. Placa informativa através de ícones no Parc de Can Solei de Ca’Arnús, Barcelona

Figura 13. Placas informativas através de ícones

A imagem apresenta uma placa do aeroporto de Copenhague, Dinamarca. Mesmo uma pessoa que não fale dinamarquês ou inglês, conseguirá associar as áreas de embarque e desembarque e

retirada de bagagens, por exemplo.

Fonte: autora.

4. Informação perceptível – a informação dos espaços e das atividades é transmitida de maneira eficiente ao usuário, independentemente de suas condições e habilidades sensoriais.

Figura 14. Escultura da Torre de Belém

A reprodução em miniatura em bronze da Torre de Belém, localizada em frente a original em Lisboa, Portugal, possibilita ao visitante que tenha problemas de visão por exemplo, explorá-la

através do tato.

5. Tolerante a erros - o desenho de projeto contém elementos que minimizam as chances de erro acidentais ou não intencionais.

Figura 15. Elevador com sensor

A figura representa um elevador com sensores que impedem que as portas se fechem atingindo as pessoas ainda em trânsito.

Fonte: CARLETTO, A.C.; CAMBIAGHI, S. (sem data)

6. Exige pouco esforço físico – o espaço ou equipamento devem prever níveis de conforto ao usuário, evitando a fadiga, o esforço e o cansaço.

Figura 16. Parklet, São Paulo.

A iniciativa da instalação de Parklets contribui para aumentar as áreas de descanso e permanência nos espaços públicos.

Fonte: http://www.designweekend.com.br/parklets-convivencia-e-design-sob-um-olhar-urbano. Acesso em: 15 dez. 2016.

Figura 17. Esteiras rolantes

A presença de esteiras rolantes em aeroportos (acima representado pelo aeroporto Barajás em Madrid, Espanha) e estações de transporte público, ajudam a diminuir as longas distâncias

percorridas pelos usuários.

Fonte: autora.

7. Tamanho e espaço adequados para aproximação, alcance, manipulação e uso – são estabelecidos e garantidos o espaço adequado a todos os usuários independentemente do porte do mesmo, sua postura (sentado e em pé) ou sua mobilidade.

Figura 18. Assento destinado a uma criança e elevação dos canteiros sensoriais

Destinação, por exemplo, de assentos para crianças em um ônibus público na cidade de Madrid, Espanha e elevação dos canteiros sensoriais para pessoas com dificuldade em agachar-se ou para

pessoas em cadeiras de rodas, no Jardim Botânico do Rio de Janeiro.

Fonte: Imagem da direita: autora. Imagem da esquerda:

<https://turismoadaptado.wordpress.com/viagens/rio-de-janeiro-rio-de-janeiro/jardim-sensorial- jardim-botanico/>. Acesso em: 24 nov. 2016

Espera-se que estes princípios estejam presentes nos novos projetos e nos espaços públicos já existentes, qualificando-os e equipando-os a todos, para que se faça valer seus direitos, desejos e necessidades de maneira autônoma e independente e com segurança.