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Capítulo 2 Fornecimento de Serviço de Telecomunicações

2.3 Aspectos tecnológicos do fornecimento de serviço de telecomunicações

2.3.1 Mobilidade

O século XX foi um século de mudanças profundas. A mobilidade humana cresceu exponencialmente devido ao surgimento de meios de transporte mais rápidos e cómodos. No entanto, a mobilidade acarreta a necessidade humana de manutenção de comunicação. O desenvolvimento tecnológico verificado ao nível das comunicações permitiu que hoje seja possível estar contactável, em tempo real, em quase toda a parte. Este acesso ubíquo presentemente está disponível apenas nas comunicações de voz, e quer agora estender-se a outros tipos de comunicação e informação. Pretende-se atingir a universalidade de acesso ao universo dos conteúdos. Tudo isto, num ambiente em que o utilizador não necessite conhecer os detalhes técnicos, não necessite preocupar-se com a sua localização física e nem sequer preocupar-se em saber qual o operador que o está a servir em determinado instante. Assim, atingir-se-á a universalidade de acesso transparente à informação.

Problemática do Fornecimento de Serviço

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No entanto a mobilidade tem alguns problemas associados. Veja-se por exemplo o caso de um utilizador em roaming, que, apesar de estar fora da rede do operador com quem tem contrato, deve manter o mesmo número telefónico. Este processo implica a existência de sinalização entre os sistemas de gestão do operador com quem tem contrato e do operador onde se encontra no momento. Ainda a outro nível, a mobilidade pode também levar à portabilidade do número ou identificador pessoal. Isto já acontece hoje em Portugal entre os diversos operadores telefónicos, em que é possível o cliente mudar de fornecedor e manter o mesmo número. Quando transpomos estas características de funcionamento das redes telefónicas para as redes IP, colocam-se desafios tão grandes ou maiores do que os que existem nestas redes, que utilizam sinalização dedicada. Ou seja, estas funcionalidades terão de ser reproduzidas ao nível do IP, à custa da introdução de novos elementos e de uma sinalização mais complexa.

Grupos de normalização, como o 3GPP [3GPP], têm vindo a desenvolver esforços para dotar as redes celulares com os serviços actualmente disponíveis na Internet. Após a possibilidade de utilizar o telemóvel com funcionalidades de modem e servindo de interface para recepção e envio de dados através de um computador, estes grupos avançaram em direcção a algo mais ambicioso: levar a Internet aos terminais móveis. O GPRS trouxe já essa possibilidade, embora ainda de uma forma algo limitada em termos dos serviços que podem ser oferecidos. Com o UMTS, faseado em termos de funcionalidades e capacidades disponibilizadas, pretende-se alargar o espectro de utilizações possíveis de um terminal móvel, bem como o modo como o acesso aos serviços será feito. Com efeito, as release 5 e seguintes do UMTS [BR5U04] revêem que todos os serviços, incluindo o serviço de voz, sejam “all-IP”, atingindo a convergência de serviços e tecnologias.

As possibilidades de mobilidade nas actuais redes celulares são a de um terminal se mover de célula em célula, utilizando sempre a mesma tecnologia de suporte. Ainda a este nível, a mobilidade entre diferentes operadores é suportada na sua vertente de roaming, não sendo possível a mudança de fornecedor, em tempo real, durante uma sessão. Um outro exemplo de mobilidade ainda mais restrita é aquela que se consegue ao aceder à

Internet através de um Hotspot Wireless LAN (Local Area Network), em que os terminais

têm possibilidade de se deslocarem apenas dentro do Hotspot, normalmente de cobertura reduzida. Pretende-se no futuro poder ir um passo mais além e permitir que as mudanças se

Serviços Multimédia Sobre Redes Heterogéneas

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efectuem entre várias tecnologias distintas, envolvendo vários fornecedores em tempo real, durante o decurso de uma qualquer chamada telefónica ou de dados. Poder-se-á alegar que é desvantajoso para um operador permitir a mobilidade de uma tecnologia em que o utilizador paga mais (por exemplo, UMTS) para uma em que pagará menos (por exemplo,

Ethernet ou Wireless LAN). No entanto, isso não é verdade. Existem vários motivos que

justificam o interesse e vantagens do operador. O primeiro, não necessariamente o mais importante, é que a recusa de um operador em fazer isso poderá ser aproveitada comercialmente por outro: este suporte apresenta-se como algo inevitável e quem se adiantar terá vantagens, conseguindo mais clientes. Um segundo motivo prende-se com o facto de também a mobilidade em sentido oposto ser suportada, isto é, também haverá situações em que o cliente passa da tecnologia “mais barata” para a “mais cara” (quando por exemplo sai do raio de cobertura de um Hotspot Wireless LAN, tem em curso uma sessão que não quer terminar e utilizará os recursos UMTS que terá à sua disposição no momento). Por último, o facto de o cliente pagar menos pelo seu acesso, utilizando uma tecnologia “mais barata”, não quer dizer que o operador ganhe menos. Isto é, as tecnologias que saem menos dispendiosas ao cliente, também são aquelas em que o operador tem de investir menos para ter uma maior capacidade e são precisamente nestas que a margem de ganho é maior (por exemplo, é muito mais barato a um operador colocar 5 x 11 Mbps num acesso Wireless LAN, do que 11 Mbps num acesso UMTS – e aquilo que cobrará ao cliente por um e outro acesso não reflectirá potencialmente esta diferença do serviço).

Num futuro próximo pretende-se ainda expandir o conceito de mobilidade a níveis mais elevados, que permitam a transferência de uma sessão de um terminal para outro, sem cortes nem erros de comunicação. Por exemplo, o cliente desloca-se no seu veículo, com o seu filho no banco de trás (após o ter ido buscar à escola) jogando um jogo interactivo com um seu colega (e tendo também uma sessão de vídeo-telefonia com o seu amigo) a partir da consola disponibilizada pelo próprio veículo, e chega a casa. Ao chegar, o filho que ainda leva o jogo a meio, decide continuar o jogo através do seu terminal multimédia interactivo (o mesmo que utiliza na escola para receber os conteúdos disponibilizados pelo professor) e desloca-se para o interior da casa, para o seu quarto, onde por fim pode comutar toda a sessão para a sua estação multimédia fixa. Neste processo, o rapaz terá utilizado os recursos UMTS (através do veículo) enquanto viajava, comutou para o acesso

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Wireless LAN que cobre toda a sua casa e área envolvente, e por fim terá comutado para

um acesso “Multi Gigabit Ethernet” que tem no seu quarto. Tudo isto, sem quebra na sua sessão e ganhando pontos ao seu adversário.

Contudo, estas mudanças, evoluções e novos serviços têm custos elevadíssimos para os fornecedores de serviço e só com uma base de sustentação para os investimentos realizados é que isto pode ser tornado realidade. Desta forma, um factor determinante para o sucesso é a capacidade de os fornecedores conseguirem convencer os clientes a utilizarem e pagarem por estes novos serviços. Como o pagamento é feito de acordo com a utilização, as redes dos fornecedores devem estar preparadas para fazerem adequadamente essa contabilização aos utilizadores com quem têm contrato, mesmo em cenários em que os clientes estejam a mover-se constantemente.