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Modelação: manutenção do produto musical

2. ENQUADRAMENTO CONTEXTUAL E TEÓRICO

2.6 Modelação e imitação: estratégia de ensino e de aprendizagem instrumental

2.6.1 Modelação: manutenção do produto musical

O modelo geral do ensino de música deriva frequentemente do modelo tradicional de conservatório em que o foco está na partitura e o professor analisa a performance, identifica problemas e sugere soluções.41 (Trad. minha)

O estudo comportamental no campo da educação musical esteve, a princípio, centrado na instrução dada pelo professor-modelo, propondo um ajuste directo do comportamento que se distancia dos processos construtivistas que deveriam pautar a educação de visão holística, tal como explicita Sink (2002):

Nos modelos instrutivistas, o professor lidera e conduz os alunos no sentido da aquisição e geração de um conhecimento específico e claramente definido na forma dos conceitos (i.e., conhecimento de), proposições (i.e., porquê), estratégias (i.e., como), e operações (i.e., como fazer). Processos instrutivos que compreendem sequências cuidadosamente construídas no sentido de atingir objectivos específicos de aprendizagem têm sido absorvidos pelo termo instrução directa.42 (Trad. minha)

Neste sentido, embora as investigações explanadas anteriormente revelem a eficácia da modelação, demonstrando melhorias na prestação instrumental dos alunos implicados na prática metodológica, parece importante referir que este processo foca o ensino, sobretudo, no produto musical (Tait, 1992). Deste modo, alguma cautela deve ser tomada aquando do uso da modelação (especialmente a musical), que permita a imitação sem que o aluno atribua qualquer significado às aprendizagens realizadas, pois tal como refere Tait (1992):

[e]m alguns casos, a modelação parece útil na clarificação de imagens musicais de maneira criativa e essencialmente artística. Noutros casos pode evocar comportamentos de imitação, reduzindo assim a iniciativa do aluno. E, conquanto as vantagens a curto prazo possam parecer impressionantes, a melhoria da musicalidade individual e da resolução de problemas podem ser inibidos.43 (Trad. minha)

41 The general model for teaching music has often derived from the conservatory master teacher where the focus is on musical score and the teacher analyzes the

performance, identifies problems, and suggests remedies. (Tait, 1992, p. 532).

42 In instructivist models, the teacher leads and directs students to acquire and generate specific, clearly defined knowledge in the form of concepts (i.e., knowledge

of), propositions (i.e., why), strategies (i.e. how), and operations (i.e., how to). Instructional processes that involve carefully constructed sequences to achieve explicit learning outcomes have been subsumed under the term direct instruction (…). (Sink, 2002, p. 315)

43 In some instances modeling appears helpful in clarifying musical images in criative and essentially artistic ways. In other instances it can evoke imitation behaviors,

thus reducing student initiative. And while the short-term gains may seem impressive, growth in individual musicianship and problem solving may be inhibited. (Tait, 1992, p. 529)

De igual modo, tomando nota das declarações do pianista Andre Watts (1989) em representação do grupo de professores que deliberadamente não utilizam a modelação musical no ensino, verifiquemos os seus motivos:

Eu evito tocar para os alunos. Há alguns que podem não estar tecnicamente à altura e então toco um pouco para eles. Mas não toco para os que têm mais capacidade técnica, porque estes são também muito bons a imitar. Uma vez copiado o som, simplesmente repetem-no e deixa de ter qualquer significado.44 (Trad. minha)

Ainda que Watts não equacione se a maior capacidade técnica de alguns alunos provém da sua facilidade em imitar, considera-se evidente que o objectivo último da aprendizagem, sobretudo nos alunos mais avançados, não se deve colocar na simples cópia da interpretação do professor, por mais eficiente e bem sucedida que se revele. Neste seguimento, é plausível equacionar-se, mediante a análise dos poucos estudos realizados a respeito, que a crença pessoal sobre a natureza da música e a própria experiência de aprendizagem dos docentes, influencie grandemente a metodologia escolhida (Tait, 1992). Se o professor revela fortes convicções sobre a importância da tradição e crê em modelos musicais canónicos, é provável que o seu papel esteja centrado em “proporcionar um modelo claro, provavelmente um modelo musical que, espera-se, o aluno possa copiar tão fielmente quanto possível”45 (Trad. minha), dedicando uma grande

quantidade de tempo à prática instrumental, aperfeiçoando assim a execução através da representação simbólica do objecto observado. Por outro lado, se o professor acredita num processo de aprendizagem musical que inclua a descoberta e o desenvolvimento musical e pessoal, adaptará as suas estratégias “às necessidades dos alunos, de modo a que, quando uma estratégia não seja eficaz, seja aplicada uma estratégia ou um modelo alternativo”46 (Trad. minha). Nesta perspectiva, para um total entendimento do

papel da exemplificação instrumental, é importante esclarecer que o âmbito da modelação no ensino pode ser abrangente, considerando-se a idade dos discentes e as suas dificuldades (Tait, 1992). Ainda que a imitação seja o campo de acção do aluno e a modelação o do professor, tal como nas estratégias verbais, esta prática pode surgir adaptada, invertendo-se os papéis na realidade escolar quotidiana:

Por exemplo, pode acontecer que o professor decida imitar um aluno de modo a evidenciar um problema específico deste. Por vezes, um aluno pode modelar outro aluno ou estilo de performance procedente de outra fonte que não o professor.47 (Trad. minha)

O dilema em causa, considerando a opinião pedagógica de alguns educadores que mostram reservas quanto à modelação musical como estratégia “facilitadora” da aprendizagem, resultando num domínio superficial e impessoal da linguagem musical pelos discentes, parece encontrar resolução face à

44 I try to avoid playing for students. There are some who may not be up to par technically so I’ll play a bit for them. But I don’t play for those who have a lot of

technical equipment, because they also very good at imitating. Once they’ve copied the sound, they just repeat it and it doesn’t mean anything. (Tait, 1992, p. 528)

45 “providing a very clear model, probably a musical model that student will be expected to copy as faithfully as possible.” (Tait, 1992, p. 531) 46 “to the need of learners, so that where one strategy is not effective an alternative strategy or a composite model is employed.” (Tait, 1992, p. 531)

47 For example, sometimes a teacher may choose to imitate a student in order to highlight a student’s particular problem. Sometimes a student may model another

manipulação consciente e regrada da metodologia, aproximando-se do estilo de ensino utilizado nas estratégias verbais “nas quais o professor faz perguntas em vez de afirmações, forçando assim o aluno a tentar descobrir uma resposta”48 (Trad. minha). Assim, parece importante realçar que a profissão sairá

favorecida do uso de um leque variado de estratégias de ensino, articuladas mediante o tipo de conteúdos que necessitem ser trabalhados, já que segundo Schuell (1988) podem ser identificados sete tipos de

conhecimento49 no domínio musical da aprendizagem, considerando-se, igualmente, as necessidades

educativas dos alunos implicados no processo (Tait, 1992).

Tentando entender-se de que modo a interacção professor-aluno em sala de aula afecta a disposição dos discentes e a sua aprendizagem, verificou-se que a atenção prestada pelos alunos a determinado estímulo é fortemente influenciada pelas actividades directamente relacionadas com música, perdendo intensidade em longas descrições que pouco se relacionem com actividades “on-task”, isto é, com a prática musical (Sink, 2002). Apesar de os estudos até então realizados demonstrarem que não há, de forma significativa, uma relação directa entre o reforço da atenção e desempenho musical dos estudantes, Sink (2002) refere que: “[o]s alunos prestam mais atenção, em parte, devido ao tipo de participação que têm na prática musical, podendo a actividade de tocar música afectar positivamente as suas conquistas e atitudes

musicais”50 (Trad. minha), tornando-se evidente que a intensidade com que o professor rege as suas aulas -

colocando-se num patamar de líder musical - assim como, o incentivo e o feedback dado pelo mesmo, parecem ter um efeito positivo na atenção captada, reduzindo os comportamentos sociais inapropriados e melhorando a atitude perante a aprendizagem musical (Sink, 2002). Assim, vejamos como a exemplificação instrumental pelo professor actua nas relações interpessoais, aclarando o seu papel na interação directa professor-aluno, em sala de aula.