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Capítulo 2 Modelação da gasificação de carbonizados em leito fluidizado

2.4 Modelo de leito fluidizado borbulhante

2.4.2 Modelos de leitos fluidizados

É possível encontrar na literatura vários modelos que para descrever o escoamento gasoso dum leito fluidizado em regime borbulhante, dotados de diferentes complexidades e assentes sobre considerações várias (Davidson & Harrison, 1963, Partridge & Rowe, 1966; Kunii & Levenspiel, 1969; Kato & Wen, 1969). Geralmente tratam-se de modelos multifase, que consideram que o escoamento gasoso do leito fluidizado se realiza em paralelo através de duas ou três regiões distintas (i.e., as fases de emulsão, bolha e nuvem), com comportamentos hidrodinâmicos diferentes. Cada uma dessas fases é representada por uma equação de balanço mássico, sendo geralmente atribuído à fase de emulsão o comportamento ideal de mistura perfeita e à fase de bolha o comportamento ideal do tipo pistão, com um termo em cada equação relativo à transferência de massa entre fases. De facto, tem sido realizada alguma investigação sobre a importância do modelo de mistura considerado em cada fase, sendo possível encontrar trabalhos que apontam para uma influência reduzida deste aspecto sobre as previsões dos modelos e outros que alertam para o efeito do modelo de mistura considerado (Lewis, 1959; Chavarie & Grace, 1975; Matos, 1988; Matos et al., 1990a)

A teoria de Toomey & Johnstone (1952) constitui o primeiro passo no sentido dos modelos multifase de leito fluidizado, sendo conhecida pela teoria das duas fases (fase de emulsão e fase de bolha), cujos principais considerandos são: (i) mistura perfeita para o gás e os sólidos na fase de emulsão; (ii) escoamento pistão para o gás na fase de bolha; (iii) as reacções heterogéneas ocorrem apenas na fase de emulsão; (iv) a emulsão permanece às condições de mínima fluidização (umf e εmf); (v) os sólidos da emulsão

encontram-se estacionários, excepto durante a passagem das bolhas; e (vi) os efeitos térmicos são reduzidos. Davidson & Harrison (1963) desenvolveram o primeiro modelo multifase, assente na teoria de Toomey & Johnstone (1952), assumindo ainda que o diâmetro das bolhas permanece constante ao longo do leito e a transferência de massa entre as bolhas e a emulsão recebe uma contribuição difusiva e uma contribuição convectiva (estes autores desenvolveram também um modelo analítico integral que considera escoamento do tipo pistão tanto na emulsão como nas bolhas).

Entretanto, foram surgindo outros modelos multifase que resultaram essencialmente da análise da aplicabilidade da teoria das duas fases. Nomeadamente, Kunii & Levenspiel (1991) sugerem que a hidrodinâmica dum leito fluidizado afigura-se mais complexa do que o previsto pela teoria das duas fases, sobretudo na presença de alturas de leito razoáveis (> 30 cm), onde a emulsão parece não manter as condições de mínima fluidização e os sólidos desenvolvem movimentos pronunciados de recirculação no leito.

Também Chavarie & Grace (1975) defendem que o modelo de Davidson & Harrison (1963), baseado na teoria das duas fases, prevê coeficientes de transferência de massa relativamente elevados em resultado de considerar apenas as fases de emulsão e de bolha para o escoamento do gás.

O modelo de Partridge & Rowe (1966) introduz precisamente uma alteração ao nível da transferência de massa entre fases, pois considera apenas a existência de transporte difusivo. Este modelo introduz também o conceito da nuvem das bolhas, considerando que estas constituem juntamente com as próprias bolhas uma única fase, que estabelece transferência de massa com a emulsão. Nestas circunstâncias, as reacções químicas heterogéneas deixam de ser exclusivas da emulsão e passam a ocorrer também na fase de nuvem/bolha.

Kunii & Levenspiel (1969) desenvolveram um modelo, conhecido por modelo de três fases, que considera que a nuvem das bolhas constitui, efectivamente, uma fase própria. Assim, o coeficiente de transferência de massa entre as bolhas e a emulsão passa a receber uma contribuição quer da transferência de massa entre as bolhas e as respectivas nuvens quer da transferência de massa entre as nuvens e a emulsão. Este modelo considera que ocorrem reacções químicas heterogéneas quer na fase de emulsão quer na fase de nuvem. Em relação a outros aspectos, o modelo segue sensivelmente a os pressupostos da teoria das duas fases.

Outro modelo bastante referido na literatura é o de Kato & Wen (1969), chamado

Bubble Assemblage Model, cujas particularidades residem essencialmente no facto do

leito fluidizado ser modelizado através dum conjunto de compartimentos de altura igual ao diâmetro de bolha, constituídos pela fase de emulsão e pela fase de bolha, sendo que o diâmetro de bolha é uma função da altura do leito.

Também Grace (1986) apresentou um modelo analítico de leito fluidizado que considera a existência de partículas na fase de bolha, eventualmente reactivas, no seguimento do modelo de Kunii & Levenspiel (1969). Os pressupostos deste modelo rompem com a teoria das duas fases ao nível das condições de escoamento na fase de emulsão, pois considera que todo o gás de fluidização atravessa o leito na forma de bolhas.

Chavarie & Grace (1975) realizaram uma avaliação dos resultados de vários modelos de leito fluidizado, por comparação com resultados experimentais relativos à decomposição catalítica de ozono num leito fluidizado. As principais conclusões dos autores são: (i) o modelo de Davidson & Harrison (1963) com mistura perfeita na emulsão subestima significativamente os resultados experimentais de conversão química, sendo

possível alcançar maior concordância no caso de se considerar escoamento pistão; (ii) o modelo de Partridge & Rowe (1966) apresenta incompatibilidades físicas ao nível do diâmetro das bolhas dado prever valores para este parâmetro superiores ao diâmetro do leito fluidizado, estando muito além das dimensões observadas; o modelo de Kunii and Levenspiel (1969) é o que representa melhor os resultados experimentais, nomeadamente em termos de conversão química, sendo atribuído estes resultados sobretudo aos menores coeficientes de transferência de massa entre as bolhas e a emulsão e à ocorrência de reacção química ao nível da nuvem das bolhas; por fim, o modelo de Kato & Wen (1969) foi apresentado como o mais adequado para representar a complexa hidrodinâmica dum leito fluidizado, em resultado do diâmetro de bolha ser variável, embora tenda a sobrestimar significativamente os resultados de conversão química.

Por outro lado, Matos (1988, 1995) observou que nos modelos analíticos integrais de Davidson & Harrison (1963) e de Grace (1986) o termo cinético das equações de balanço mássico para a emulsão refere-se a cinéticas de reacções homogéneas, não sendo, portanto, directamente aplicáveis à modelização de reacções heterogéneas em leito fluidizado. Com efeito, as referidas equações não fazem intervir a massa de partículas reactivas do leito, as quais constituem efectivamente a fase sólida que participa na reacção. O autor adaptou esses modelos, envolvendo diferentes configurações para o regime de escoamento na emulsão e nas bolhas, para a modelização de reacções heterogéneas em leito de leito fluidizado borbulhante.

Em resumo, não existe um modelo de leito fluidizado com aplicabilidade universal sendo possível apontar prós e contras a todos eles, dependendo da aplicação particular (Yang, 2003). Por exemplo, o modelo de Kunii and Levenspiel (1969) considerado um dos que aproxima melhor o comportamento dum leito fluidizado, apresenta claramente desvantagens ao nível do esforço de implementação computacional.

No geral, o modelo teórico de gasificação de carbonizados com NO, apresentado nos pontos seguintes, segue os trâmites da teoria das duas fases e em particular do modelo de Davidson & Harrison (1963), sobretudo devido à sua simplicidade e também no seguimento dos trabalhos de Matos (1988, 1995).