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Momento três: o conhecimento existente, o conhecimento que se busca

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4.3.3 Momento três: o conhecimento existente, o conhecimento que se busca

Através do terceiro bloco de questões buscou-se identificar os conhecimentos que as professoras possuíam sobre os projetos. O interesse estava em saber se estas práticas se constituíam a partir da compreensão pelas professoras, da existência de saberes necessários ao desenvolvimento de uma prática de ensino voltada à investigação.

Ao serem interrogadas sobre quais conhecimentos se faziam presentes quando de suas opções pelo trabalho com projetos, as professoras afirmaram que estes foram adquiridos nos seus respectivos cursos de graduação, embora não tenham referendado nenhum deles, citando apenas suas origens. A professora Auta não respondeu a essa questão e a Professora Palmira informou que seu conhecimento sobre o tema veio das

[...] experiências com projetos realizados no período em que participei de um curso de formação de professores no um curso de formação de professores no (Instituto) Kennedy54, percebi que um projeto bem elaborado

facilita o nosso trabalho em sala de aula tornando-o as aulas mais dinâmicas e eficientes. (informação verbal à pesquisadora em março de 2008).

Quando questionada a respeito dos conhecimentos que se faziam presentes quando de sua opção, isto é, com base em que se deu sua tomada de decisão pelo trabalho com projetos, a professora Myriam afirmou: “Minha decisão em trabalhar com projetos está baseada nas profundas aulas que tive em minha graduação em pedagogia, daí percebi como é possível tornar conteúdos insignificantes em aprendizagens significativas”. (informação verbal à pesquisadora em março de 2008).

A professora Zila contou que seu contato inicial com o projeto ocorreu ao longo de seu curso de graduação – Pedagogia. Relacionou esse fato a percepção que tem despontado nos docentes quanto à necessidade da aprendizagem precisar se tornar significativa para os alunos. Segundo ela, “ao fato de que hoje, os educadores estão mais voltados a praticar atitudes de educação com enfoque à aprendizagem significativa” A colaboração da Professora Zila foi a “de que ao realizarmos um projeto – seja ele de que natureza for – obtermos resultados positivos”.

54 Instituto de Educação Superior Presidente Kennedy- IFESP que oferecia o Curso De Formação De Professores

O reconhecimento da contribuição advinda das instâncias formativas através dos cursos de formação inicial, na aquisição dos conhecimentos sobre os projetos ficou evidente nas falas das professoras. Inferiu-se que a origem desses conhecimentos residiu nas experiências vivenciadas como alunas, e que essas experiências funcionaram como aspectos que influenciaram na percepção positiva a respeito do trabalho com projeto. Essas experiências subsidiaram a transposição didática dos conhecimentos acadêmicos para a realidade escolar, demonstrando a interação teoria-prática.

Longe de pretender apresentar uma única interpretação desse conceito buscou-se entendê-lo e explicitá-lo da melhor maneira possível, visando demonstrar a compreensão que havia sobre ele. Assim, por transposição didática entendeu-se o trabalho que foi realizado sob um conhecimento considerado científico na intenção de este, ao ser transformado possa se constituir em um conhecimento a ser ensinado na escola. Este conhecimento escolar, denominado de objeto de ensino, no entanto não perde a profundidade inicial, mas sofre uma adaptação capaz de promover sua apreensão pelo aluno.

Indo mais adiante, a transposição manifesta-se quando o professor aprende a estudar continuamente buscando outras formas de atuação, “quando [...] passa a ter coragem de abandonar moldes antigos e ultrapassados e aceita o novo. E o aceita porque tem critérios para transformá-lo” (ALMEIDA, 2007, p. 33)

Ainda segundo Almeida (2007), tem-se em Yves Chevallard55 (1998) seu maior significativo representante, que amplia o conceito da transposição didática como sendo composto por

[...] três partes distintas e interligadas: o savoir savant (saber do sábio), que no caso é o saber elaborado pelos cientistas; o savoir a enseigner (saber a ensinar), que no caso é a parte específica aos professores e que está diretamente relacionada à didática e à prática de condução de sala de aula; e por último o savoir enseigné (saber ensinado), aquele que foi absorvido pelo aluno mediante as adaptações e as transposições feitas pelos cientistas e pelos professores. (ALMEIDA, 2007, P. 10)

Demonstrou-se, assim, haver diferenças entre o que é elaborado “nos espaços puramente científicos” e o que é feito nos espaços educativos escolares, acrescentando que essas diferenças não são conceituais, mas “textuais, pois estão no campo semântico e léxico”

55 Obra original: La transposition Didatique: Du savoir savant au savoir enseigné – editions La Pensée Sauvage,

(ALMEIDA, 2007). Para que a transposição didática ocorra, o saber precisa sofrer modificações para se tornar apto a ser ensinado.

Isso demanda o desenvolvimento de competências no professor como sujeito de aprendizagem sobre ensino e aprendizagem. Partindo do entendimento de competências como “fruto de [...] habilidades primárias levadas a um aprofundamento nos critérios teóricos e nos direcionamentos práticos” (ALMEIDA, 2007, p. 31), consideram-se integrantes dela aspectos técnicos e subjetivos, adquirido através de estudos teóricos e atividades práticas.

É importante que essas competências surjam, porque são elas que garantirão, mesmo diante da falta de recursos e de investimentos, ações que podem, se bem pensadas e bem conduzidas, levar os alunos aos lugares mais distantes e a um mundo bem menos desconhecido” (ALMEIDA, 2007, P. 32)

Na composição dessa idéia reside a percepção dos ambientes educativos, os quais podem colaborar, tornando-se meios para que o professor realize a transposição. Ainda segundo Almeida (2007), o ambiente educativo é qualquer espaço no qual o professor possa fazer o aluno ver além da aparência, incorporando novos olhares sobre diferentes óticas. Incluiu então a própria sala de aula alegando que ela

[...] precisa ser um organismo vivo, precisa ter conflitos, precisa ter negociações, precisa ter clima de aprendizagem. Para a existência desse clima, a dúvida é uma questão fundamental, pois onde há dúvida, ou onde ela pode existir sem medo, há pesquisa, há vontade de buscar. (ALMEIDA, 2007, p. 28).

Reconhecer a sala de aula como ambiente educativo bem como outros espaços exige uma mudança de concepção sobre o processo de ensino-aprendizagem e sua condução. A perspectiva do professor se tornar um profissional que estuda constantemente, aprimorando suas competências, é um passo decisivo para a efetivação da transposição didática, porém soma-se a esta situação a necessidade de conhecimento dos grupos de alunos, para que possa escolher a maneira mais apropriada de conduzir as situações de ensino.

Parecendo óbvio citar, mas considerar o que os alunos já sabem sobre o assunto, sintetizar este saber, interligá-lo a outros e uni-los em função do que se quer introduzir no ambiente de aprendizagem compreende a habilidade do professor em discernir: avaliar,

planejar, re-planejar e re-avaliar. Todas essas ações e situações precisam ainda estar contextualizadas:

É a contextualização que deixa claro para o aluno que o saber é sempre mais amplo, que o conteúdo é sempre mais complexo do que aquilo que está sendo apresentado naquele momento. (ALMEIDA, 2007, p. 39).

Em principio, buscar compreender o conceito de transposição didática pareceu supérfluo frente à discussão travada sobre os projetos, porém, um olhar mais escrutinador revelou a possibilidade de interdependência entre eles. Explique-se que a idéia relacionou-se ao próprio processo de aprendizagem das professoras em suas vivências educativas e formativas, as quais consideradas significativas, suas experiências pessoais funcionaram como alicerce para as ações por elas empreendidas na sala de aula, através do recurso ao projeto. Desse modo justificou-se a abordagem mais especifica a transposição didática por revelar-se compatível e suscetível ao trabalho com projeto, envolvendo elementos anteriormente explicitados.

As falas seguintes referentes à percepção do caráter de cientificidade presente nos projetos coadunaram com a própria idéia e vivência da transposição didática no tocante ao processo de estudo do professor. Assim, em continuidade ao processo de reflexão sobre as repostas das professoras, e considerando que o projeto, em sua origem, carrega em si a existência de um processo de investigação sobre um assunto ou problema, foi questionado se as professoras identificavam a possibilidade delas mesmas aprenderem a partir do desenvolvimento de projetos em sala de aula. A Professora Palmira seguiu dizendo que

Sem dúvidas é possível o professor adquirir novos conhecimentos, diante destes projetos. O professor para melhor desenvolvê-los tem que estudar e assim trabalha em sua sala de aula de uma maneira mais estruturada e multidisciplinar. (informação verbal à pesquisadora em março de 2007).

A Professora Auta acrescentou que o projeto oportunizava “[...] uma maior observação [do conteúdo] e exigia do educador um aprofundamento a respeito de determinado assunto, ampliando seus conhecimentos”. (informação verbal à pesquisadora em março de 2008).

Em relação à perspectiva da aprendizagem docente através dos projetos, disse a professora Myriam que está “sempre atenta a novas aprendizagens”, porém não esclareceu sua posição e concluiu dizendo que “[...] o trabalho com projetos funciona na aprendizagem dos alunos partindo da motivação dos mesmos”. Zila colocou-se da seguinte forma: “O trabalhar com projetos faz fluir com maior facilidade os objetivos a se alcançar”. (informação verbal à pesquisadora em março de 2008).

As respostas possibilitam perceber que as professoras reconhecem que para desenvolver um projeto é preciso deter conhecimentos e quando não, saber buscar estes conhecimentos mediante estudos. O projeto permite aprofundar os conteúdos escolares mediante a observação destes pelas professoras; através dele pode-se desenvolver novas aprendizagens, pois possibilita identificar os objetivos do trabalho com mais clareza.

Porém, algo ecoou diante de tais respostas: o principio da cientificidade era compreendido como inerente ao projeto e elemento para a aprendizagem dos alunos? Essa questão permeou as sessões de observação: a condução do projeto frente às atividades e tarefas desenvolvidas por professoras e seus alunos.

Outra questão afirmava que o trabalho com projeto não era algo ‘novo’ e que sua origem remontava ao Movimento da Escola Nova. Esta informação demonstrava que o projeto não era assim tão ‘atual’. Assim, foi perguntado as professoras quais os motivos que poderiam ser apontados para a ênfase dada ao caráter inovador dos projetos atualmente.

Uma pergunta justificada pelo interesse em compreender qual perspectiva estava sendo utilizada o termo inovação; se as percepções dessa inovação vinculavam-se ao fato do projeto ser reconhecido como uma metodologia dentro da perspectiva pedagógica escolanovista e que realmente adquiriu o status de inovadora por se contrapor ao modelo existente de escola, ou de estar sendo compreendido como algo inédito no contexto educacional contemporâneo, negando-se seu histórico. O termo inovador apontado nesSa questão foi/é utilizado em muitos exemplos de publicações contemporâneas sobre a temática, todavia convém refletir se ele expressa realmente um caráter de inovação.

A professora Palmira não emitiu uma opinião direta a respeito do trabalho com projeto como também não comentou a volta deste tipo de ação às salas de aula na atualidade. Para Auta, o retorno do projeto às salas de aulas devia-se “as renovações, os avanços tecnológicos, novos métodos utilizados na rede escolar de ensino”.

Já a professora Myriam colocou-se da seguinte forma: “Hoje temos que inovar em sala de aula para atrair a atenção e o desejo de aprender do aluno; na minha opinião fora da escola tem coisas mais atrativas de onde ele tem acesso a novas aprendizagens porém não são

sistematizadas”(Informação verbal à pesquisadora em março de 2008). Zila se posicionou afirmando que a volta dos projetos devia-se “ao fato de que hoje, os educadores estão mais voltados a praticar atitudes de educação com enfoque à aprendizagem significativa” (Informação verbal à pesquisadora em março de 2008).

Às respostas fluíram demonstrando uma compreensão do projeto como uma prática que poderia inovar a sistematização das aprendizagens e dotá-las de maior sentido e representatividade para o aluno sem nenhuma vinculação a perspectiva pedagógica do qual se origina. Não se pode identificar com clareza nas ideias das professoras o que significaria essa inovação ou em que residia o caráter inovador.

No percurso investigativo, entendeu-se ser complementar para identificação dos conhecimentos das professoras sobre os projetos relacionar os autores que estariam subsidiando suas leituras sobre a temática e o desenvolvimento da prática. No entanto, essa situação não se configurou por muito tempo, pois nas sessões de observação dos planejamentos muitos textos circularam entre as professoras, além de consultas a vídeo sobre a questão56.

A professora Auta nesse sentido afirmou trabalhar sempre com os PCNS; sua fala foi expressa da seguinte maneira: “No trabalho com projetos sempre recorro aos PCNs, nas diversas áreas do conhecimento” (Informação verbal à pesquisadora em março de 2008). Esses eram os referenciais com os quais ela trabalhava; já Palmira, Myriam e Zila não apontaram nenhum referencial.

Nas respostas apresentadas pode-se identificar a presença de termos como

interdisciplinaridade e motivação que foram relacionados à conquista de resultados

satisfatórios obtidos pelos alunos: aprendizagem. Esses termos ao se destacarem na fala das professoras deixaram subentendido que o fator decisivo para o desenvolvimento dos projetos era o reconhecimento da possibilidade de trabalho diversificado como propulsor do processo de aprendizagem e dinamismo no processo de ensino.

Figurou também como elemento de interrogação a existência de conclusões pessoais advindas da experiência com os projetos. Assim, a Professora Auta alegou

Que o professor necessita de maior espaço de tempo para elaborar um projeto, mas as tarefas trabalhadas em sala de aula são bastante proveitosas, oferecendo assim uma melhor aprendizagem ao aluno. (Informação verbal à pesquisadora em março de 2008).

Acrescentou que o projeto havia “contribuído bastante para a minha prática” (Informação verbal à pesquisadora em março de 2008).

Palmira conclui que “o trabalho com projetos proporciona um melhor aproveitamento por parte dos alunos, pois se abre um leque de ligação em várias áreas do conhecimento, permitindo então a interdisciplinaridade em um curto espaço de tempo”. Embora não tenha citado exemplo de seu cotidiano, disse apenas que “a necessidade de inserir inovações no cotidiano escolar foi à principal causa para o começo do trabalho com projetos”. Particularmente voltou a explicação do que lhe levou ao trabalho com os projetos demonstrando coerência com o que havia dito anteriormente (entrevista a pesquisadora em março de 2007).

Myriam assim disse: “concluo que o trabalho com projetos funciona na aprendizagem dos alunos partindo da motivação dos mesmos”, atribuindo aos projetos créditos pelo bom desempenho dos alunos: “uma vez interessados em aprender conseqüentemente terão bom desempenho” (Informação verbal à pesquisadora em março de 2008).Zila se colocou dizendo: “De que ao realizarmos um projeto – seja ele de que natureza for – obtermos resultados positivos” (Informação verbal à pesquisadora em março de 2008).

A reflexão sobre as respostas apresentadas apontou para a discussão sobre a prática. Assim, na intenção de organizar a última etapa da entrevista inicial definiu-se como objetivos discutir respostas anteriores e esclarecer dúvidas. Foi pedido para que as professoras descrevessem um dia típico de trabalho com projetos em sala de aula.