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Foto 24 Equipe da RPPN Serra do Tombador e pesquisadora

5.12 AS MOTIVAÇÕES DOS PROPRIETÁRIOS DE RPPNS

Com grande experiência na criação das reservas particulares, o Luciano elenca os principais motivos observados por ele ao longo dos anos no IBAMA e ICMBio. Acredita que, inicialmente, o principal motivo de criação de RPPNs e outras reservas privadas era a conservação da biodiversidade, pois não havia benefício algum aos proprietários. Hoje, além da conservação, ele acredita que os motivos mais comuns são: o valor sentimental pela terra, muitas vezes, herdada dos pais e avós; o medo de ter suas terras vendidas ou degradadas pelos futuros herdeiros; receio de invasões do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ou desapropriações pela reforma agrária.

Todavia, o perfil das RPPNs criadas por empresas, mostra que as principais motivações são a compensação ambiental devido a danos ambientais provocados pela própria empresa e o marketing verde, sendo percebida esta estratégia pela pequena área de RPPN em comparação ao tamanho da propriedade e, também, pela escolha da área da reserva, normalmente, dentro dos limites das APPs. De acordo com a pesquisa, várias

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motivações foram relatadas pelos proprietários de RPPNs. Algumas semelhantes à constatação do ICMBio.

A motivação parte de uma ideia, um pensamento que, ao provocar os sentimentos, se tem o desejo de agir, de por em prática, de buscar ações que consigam concretizar esse sentimento e essa ideia, frutos de uma consciência. A maioria das pessoas, comumente chamadas de massa, não possui consciência própria. Ela é conduzida ao consumismo e agressões da natureza para a satisfação de seus instintos primitivos. Porém, existem pessoas com mentes e corações que não cedem a este processo de massificação, ao contrário, possuem uma consciência ecológica (AGUIAR, 2002). De acordo com Aguiar (2002), consciência ecológica viria a ser a expressão do conhecimento, do sentimento daquilo que é bom ou mau, verdadeiro ou errado nas relações com a natureza. Seria uma cumplicidade nossa com o meio ambiente. Ela é singular e coletiva.

Nem todas as pessoas possuem essa conscientização do que é certo ou errado em relação ao meio ambiente. A grande parte dos indivíduos segue a lógica capitalista que se baseia na acumulação de capital. O pensamento racional econômico provocou uma corrida desenfreada para aumentar a produção, ignorando os limites ecológicos de recuperação da biodiversidade. Como consequência, tem-se a devastação no meio ambiente e também a transformação e destruição dos valores sociais, culturais e humanos (LEFF, 2001).

Diferente da racionalidade econômica, a racionalidade ambiental procura ter como base o equilíbrio ecológico para sustentar o sistema econômico e proporcionar um desenvolvimento sustentável. Além disso, suas normas morais são alicerçadas em princípios éticos, de respeito à natureza, e de valores políticos que buscam a democracia participativa e a equidade social (LEFF, 2001). A motivação de preservar áreas nativas pelo seu valor intrínseco, por sua beleza cênica e pelo respeito à natureza é a tradução dos valores ambientais em novos comportamentos dos agentes econômicos e dos atores sociais.

Foi esse contexto de racionalidade ambiental que a pesquisa percebeu nos proprietários de RPPNs da Chapada que, na maioria dos casos, decidiu pela região em busca de um novo padrão de vida, conectado à natureza, sem a correria e o stress das grandes cidades. O pensamento coletivo também está presente nos vários relatos de tentativas de comunidades alternativas que têm como princípio a cooperação entre os indivíduos. Seis proprietários afirmaram ter tentado viver em comunidades alternativas e três deles ainda possuem o desejo de formarem ecovilas ou ecocondomínios.

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Todos os proprietários alegaram a motivação de preservar a área contra agressões ao meio ambiente. Alguns motivados pela conservação de nascentes e outros pela beleza cênica do lugar. Além da preservação, os motivos relatados foram: impedir desapropriação pela reforma agrária, impedir invasões do MST, impedir instalação de PCH, impedir expansão urbana, recuperar área degradada, compensar impacto ambiental, criar marketing verde, agregar valor à terra, ter voz perante o órgão ambiental, implementar o ecoturismo, implementar educação ambiental e desenvolver pesquisas cientificas em suas áreas (Gráfico 9). 0 2 4 6 8 10 12 14 16 Motivações Nº de RPPNs

Gráfico 6 - Motivações para a criação das RPPNs da Chapada dos Veadeiros Fonte: Pesquisadora, 2012.

Percebe-se que o desejo de trabalhar com turismo e educação ambiental foi a maneira encontrada por alguns proprietários de se manter financeiramente com atividades possíveis dentro das áreas protegidas. Da mesma forma, relaciona-se a motivação do marketing verde a de agregar valor à terra. A compensação ambiental foi citada pelo Sr. Richhard, dono da pousada Vale das Araras que possui um conceito de sustentabilidade, em que a RPPN também seria uma forma de compensar a pegada ecológica causada pelo estabelecimento. Muitos proprietários acreditam na vocação para pesquisa de suas áreas e possuem o desejo de serem transformadas em centros de pesquisa.

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Ter o status de UC federal também foi uma motivação para o Sr. Ângelo que esperava ter mais prioridade na busca por ajuda contra o fogo ou outros tipos de auxílio do governo. A motivação de impedir a expansão do povoado de São Jorge demostra por um lado o receio de desapropriação, mas, por outro, o cuidado em não permitir o avanço de loteamentos irregulares que, além de prejudicarem o meio ambiente, não possibilitam boas condições de vida à população. A motivação de impedir a instalação da PCH foi devido à preocupação de ver áreas de mata e cachoeiras sendo encobertas pelas águas da represa, o que se pode inferir como um cuidado com a natureza.

De acordo com Nash (1989), quanto maior for a abundância de natureza selvagem, intocada, menor será a preocupação daqueles que vivem esta realidade em preservá-la. Já em lugares onde quase não existem mais trechos de matas nativas ou forem distantes tais lugares, a natureza selvagem é mais valorizada e admirada por aqueles que não a têm por perto.

Isso pode ser percebido quando evidenciada a origem dos proprietários de RPPNs da Chapada dos Veadeiros. Apenas dois deles nasceram na região, em meio a grande exuberância natural da Chapada. Os demais proprietários vieram de cidades grandes onde já se percebia a ausência da natureza. Além disso, em praticamente todos os relatos, os proprietários comentaram sobre o sentimento de fascínio que as belas paisagens, o clima agradável e o imenso contato com uma natureza intocada provocaram ao primeiro encontro com a região.

De acordo com Aguiar (2002), a religião se constituiu patrimônio entre os povos, presente em todos os tempos. O fato religioso consegue exercer enorme influência sobre a sociedade, e mais que isso, consegue chegar até os escaninhos do coração humano. Ele declara que a religião inspira o comportamento do homem diante da natureza e que, por isso, é um fator que alcança a realidade ambiental.

Sendo assim, há de se considerar uma forte motivação religiosa entre alguns proprietários de RPPNs da Chapada. Essa motivação seria num sentido mais amplo, não pensando em uma determinada doutrina religiosa, mas numa ligação entre o homem e o que o transcende. Alguns proprietários se remeteram a um chamado interior, um chamado da terra ou uma missão dada por Deus em conservar a natureza. Essa constatação demostra que uma motivação interior de cunho espiritual também está presente em algumas RPPNs.

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De acordo com a pesquisa, seis proprietários não estão satisfeitos com suas reservas e desses, quatro proprietários se posicionaram como arrependidos, não fariam a RPPN novamente. Os motivos da insatisfação é a decepção com as expectativas, tanto no sentido de implementar seus projetos particulares como na motivação de preservar áreas de uma forma institucionalizada, mas que não possuem a ajuda governamental para isso. Segundo os proprietários, eles não precisam criar a RPPN para preservar. A falta de apoio do governo é o grande desmotivador dos proprietários. Das 15 RPPNs federais na Chapada, três já foram vendidas, pertencendo a novos proprietários. Essa informação não consta no cadastro do ICMBio23 o que dificulta a localização dos reais proprietários das RPPNs em questão.