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Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais do Nordeste – MMTR – NE

4.2 As organizações parceiras

4.2.3 Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais do Nordeste – MMTR – NE

O MMTR/NE surgiu nos anos 1990 em decorrência de problemas enfrentados com as secas. Ocasião na qual grupos de mulheres do Sertão Central de Estados de Pernambuco sentiram-se excluídas das frentes de trabalho. A pesquisadora Rosineide Cordeiro, da UFPE, realizou sua tese de Doutorado sobre a representação das mulheres trabalhadoras rurais do Sertão Central. Segundo ela, as mulheres começaram a se reunir e a se mobilizar para serem inseridas nas frentes de trabalho. A partir de então, procuraram o sindicato rural, como os únicos espaços de organização dos trabalhadores(as) no campo. Encaminharam um documento ao Governo Federal denunciando a exclusão das mulheres, causando grande repercussão e mudanças no Programa de Combate à Seca.

Com a reformulação do Programa de Combate à Seca, as mulheres acabaram sendo designadas à preparação dos alimentos para os homens que trabalhavam nas outras atividades e isso causou novas reações. As discussões se ampliaram para outros locais, culminando com a constituição de frentes de trabalho compostas e coordenadas somente por mulheres (Cordeiro, 2006). Resultado desse processo foi a criação do Movimento de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Sertão Central em 1984, envolvendo os Estados de Pernambuco e Paraíba, mais precisamente em Serra Talhada (PE) e em Brejo (PB) atingidos pelas secas desse período. Após a fundação, as trabalhadoras rurais deste Movimento começaram a provocar uma discussão sobre a importância de participarem dos sindicatos, tendo em vistas que estes eram as organizações mais localizadas e com as quais elas possuíam relação mais próxima. A partir de então, formularam uma proposta sobre a

56 A partir de então, a CONTAG incorporou a expressão “trabalhadores e trabalhadoras” rurais presente

necessidade de participação das mulheres nos sindicatos e apresentaram algumas questões do seu interesse.

Conforme abordado no capítulo III sobre os movimentos sociais no campo, os sindicatos rurais exerceram um papel muito forte de assistência às áreas rurais, tanto em relação à saúde, quanto à previdência. O fato das trabalhadoras rurais ficarem ausentes naquele momento fez com que elas se sentissem em desvantagem com relação aos homens chefes de família, principalmente na questão dos benefícios da aposentadoria. Enquanto os homens, considerados os chefes de família, recebiam 50% do valor do salário mínimo, as mulheres só tinham direito quando ficavam viúvas, mas a pensão só equivalia a 30% do valor do salário mínimo.

Este debate resultou na organização de um grupo de mulheres trabalhadoras rurais que obtiveram o apoio da Federação de Pernambuco para apresentar a proposta no 4º Congresso da CONTAG, em 1985. Uma das principais questões apresentadas pelas trabalhadoras rurais foi o seu reconhecimento como sindicalista, pois a sua inserção garantiria o direito à previdência (Deere, 2004). Foi nesse mesmo período que ganhou força também a organização das trabalhadoras da região Sul.

O MMTR/NE surge em 1986 como um movimento autônomo, formado por mulheres com ações em todos os 9 Estados do Nordeste com estrutura organizativa que compreende: organizações de base (assentamentos, comunidades rurais); coordenações municipais, estaduais e a diretoria regional, composta por 3 representantes de cada Estado e uma Secretária Executiva. Define-se como um movimento feminista desde a sua formação que contou com a participação de mulheres trabalhadoras rurais e assessoras de Pernambuco e Paraíba num Seminário realizado, em Cajamar, São Paulo, organizado por movimentos feministas (Ilda57, 2007).

A entrevistada ressalta ainda que, o Movimento participou da elaboração da Plataforma Política Feminista em 200258, e no Seminário do Cajamar, as mulheres rurais

reagiram ao constatar as poucas trabalhadoras rurais no movimento feminista. Mencionou ainda que, na formação deste Movimento elas tiveram bastante apoio de suas assessoras que, alegavam não se conformar quando chegavam nas casas dos trabalhadores rurais para

57 Entrevista realizada com Margarida Pereira da Silva, conhecida como Ilda (Ibdem). 58

Este documento foi aprovado na Conferência Nacional de Mulheres Brasileiras, realizada em Brasília nos dias 6 e 7 de junho de 2002, contém a Carta de Princípios da Conferência e temas como a democracia política, o estado democrático, a liberdade sexual e reprodutiva; é assinada por várias redes e organizações de mulheres .

reuniões e as mulheres não davam as caras, somente os homens “chefes da família” (Ibdem).

Dentre suas principais ações e reivindicações desde a sua fundação, destaca-se a

Campanha de Documentação da Trabalhadora Rural, que se tornou programa de

Governo, citado neste trabalho. O MMTR/NE tem privilegiado vários temas em sua agenda que vão desde a defesa do meio ambiente, da educação, da saúde, do parto humanizado ao combate à violência contra a mulher. Nesse contexto destaca-se, também, a formulação de propostas coletivas que atingem diretamente as mulheres, por meio de sua participação em conselhos, comitês gestores e em eventos nacionais e internacionais em parceria com ONGs, Igreja Católica e outros movimentos de mulheres e feministas.

É importante registrar que o MMTR-NE insiste em se afirmar como um movimento autônomo, demarcado nas relações com o movimento sindical, nas quais muitas trabalhadoras ligadas a este Movimento também são associadas a outros sindicatos rurais. Essa relação é marcada por parceria e tensões permanentes, tendo os principais motivos são nas disputas de base, principalmente quando se refere à representação política. Além disso, considera-se o fato de que o MMTR-NE firmou rupturas com os movimentos no momento do seu surgimento.

A autonomia reivindicada pelo MMTR-NE parece indicar um desafio permanente em construção. Uma mesma trabalhadora pode estar vinculada ao MMTR/NE, ao sindicato, cooperativas, associações e outras. Muitas mulheres quebradeiras de coco estão vinculadas aos sindicatos rurais, ao movimento de quebradeiras e às cooperativas de produção. Para Ilda (2007), “no início da organização do MMTR/NE muitos sindicatos e Federações tiveram problemas com o MMTR. Havia muita incompreensão, mas hoje já há mais proximidade” (Ibdem).

Em relação à parceria na Marcha das Margaridas, a boa relação em nível nacional não impediu nas relações cotidianas as disputas locais entre sindicatos rurais e MMTR-NE.

O MMTR/NE é composto por mulheres de diferentes etnias, gerações, credos religiosos que desenvolvem atividades produtivas distintas: agricultoras familiares, pescadoras, artesãs. São mulheres trabalhadoras rurais que,

Aprenderam a recusar as classificações que as identificam como “doméstica” ou “do lar”, lutam para ter acesso aos direitos previdenciários e registram na documentação que são trabalhadoras rurais. Além disso, transgridem os espaços que lhes são socialmente

delimitados e assumem novas posturas e interesses diante das suas vidas e do mundo a sua volta. (Cordeiro, 2006, p. 217).